Discurso durante a 21ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Comentários acerca do resultado de pesquisa do DataSenado, divulgado hoje, sobre a violência doméstica e familiar contra a mulher.

Autor
Marta Suplicy (PT - Partido dos Trabalhadores/SP)
Nome completo: Marta Teresa Suplicy
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
FEMINISMO.:
  • Comentários acerca do resultado de pesquisa do DataSenado, divulgado hoje, sobre a violência doméstica e familiar contra a mulher.
Aparteantes
Gleisi Hoffmann.
Publicação
Publicação no DSF de 04/03/2011 - Página 6038
Assunto
Outros > FEMINISMO.
Indexação
  • REGISTRO, RESULTADO, PESQUISA, SENADO, OPINIÃO PUBLICA, MULHER, COMEMORAÇÃO, ORADOR, AUMENTO, CONSCIENTIZAÇÃO, IMPORTANCIA, LEGISLAÇÃO, PROTEÇÃO, FEMINISMO, COMBATE, VIOLENCIA.
  • CRITICA, DECISÃO, SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA (STJ), COMPATIBILIDADE, LEGISLAÇÃO, PROTEÇÃO, MULHER, JUIZADO ESPECIAL, POSSIBILIDADE, SUSPENSÃO, PENA, APOIO, ORADOR, PROJETO DE LEI, AUTORIA, GLEISI HOFFMANN, SENADOR, IMPEDIMENTO, RETROATIVIDADE.

                          SENADO FEDERAL SF -

            SECRETARIA-GERAL DA MESA

            SUBSECRETARIA DE TAQUIGRAFIA 


            A SRª MARTA SUPLICY (Bloco/PT - SP. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão da oradora.) - Obrigada, Senador Pedro Taques.

            Boa tarde, Presidente Pedro Taques, Senadoras e Senadores!

            Tenho em mão o resultado de uma pesquisa de opinião pública divulgada esta manhã. O trabalho foi realizado pelo DataSenado, o instituto de pesquisa de opinião desta Casa, e trata de violência doméstica e familiar contra a mulher. É importante destacar que essa pesquisa ouve apenas mulheres e constata uma mudança cultural na opinião feminina sobre a violência doméstica de que muitas delas são vítimas.

            Percebam a mudança! Senadora Vanessa Grazziotin, vamos poder alegrar-nos um pouco.

            A pesquisa questiona um dos aspectos fundamentais para a punição de agressores, porque pergunta às entrevistadas se elas denunciariam, caso presenciassem, um ato de violência contra a mulher. A boa notícia é que 81% das pesquisadas disseram “sim”, denunciariam. Ou seja, está ocorrendo uma mudança profunda no comportamento da mulher. Essa informação me deixa bastante entusiasmada, já que revela que a maior parte das mulheres não está mais disposta a entender a violência doméstica como assunto particular da vida dos casais. É uma mudança grande. As mulheres, finalmente, percebem que a questão não vai ser resolvida dentro de casa. É preciso denunciar, levar essa grave ferida para além da porta de casa. É um problema de que o Estado precisa participar.

            Pelos dados da pesquisa, mais da metade das entrevistadas, 63% delas, disseram que procurariam uma delegacia de polícia para denunciar a agressão, e 24% procurariam uma delegacia especializada da mulher. Ou seja, quase 90% das mulheres não recorreriam inicialmente à ajuda de amigos e de familiares - o que, até ontem, acontecia -, mas iriam atrás de ajuda policial. É um progresso enorme! Esse número mostra que as mulheres têm, cada vez mais, a consciência de que é preciso que haja intervenção para resolver o problema da violência doméstica.

            Por essa razão, Senador Taques, é fundamental o entendimento de que agressões contra a mulher são também questão de Estado, que necessita, cada vez mais, de enfrentamento e de políticas públicas eficientes. Não dá mais para esperar que a situação mude dentro de casa - até pouco tempo atrás, havia essa crença. Acompanhei muito essa questão no TV Mulher e na Prefeitura, como mulher, como cidadã: quando ocorre isso, a consequência é mais um olho roxo, mais um braço quebrado, quando não é a morte, Senador Taques.

            Então, essa consciência que hoje estamos vendo, o fato de a mulher ter coragem de fazer a denúncia, tudo isso é importantíssimo. Essa é a primeira pesquisa, que veio pela mão do Senado, que nos chega com essa mudança.

            O Governo do Presidente Lula deu um salto imenso nessa direção quando, há cinco anos, criou a Lei Maria da Penha. Creio que a mudança de comportamento, no sentido de denunciar a agressão, deve-se muito à aplicação dessa Lei. A pesquisa do DataSenado só corrobora essa impressão, já que revela que o nível de conhecimento das mulheres sobre a Lei cresceu 15% nos dois últimos anos, alcançando a marca de 98%. Ouso afirmar que, considerando que a margem de erro da pesquisa é de três pontos percentuais, todas as mulheres entrevistadas conhecem a Lei Maria da Penha. Posso dizer, com orgulho, que não existe hoje, em nosso País, lei tão coberta de êxito quanto a Maria da Penha no que se refere à defesa da integridade das mulheres.

            Por outro lado, esse dado da pesquisa é tão confuso, preocupante e contraditório, que quero analisar e entender sua profundidade. Vamos precisar de tempo. Esse dado apurado pela pesquisa, que vou mencionar, mostra que muitas das mulheres entrevistadas - e a maioria delas informou que revelaria, denunciaria agressões que presenciassem - entendem que, mesmo conhecendo a lei, as vítimas da agressão nem sempre levam o fato às autoridades. Então, nisso, há certa contradição. Sabemos que, muitas vezes, a entrevistada responde, dizendo que está falando sobre outra pessoa, mas, no fundo, fala sobre ela mesma. Então, temos de estudar. Voltamos ao ditado que diz: “Em briga de marido e mulher, ninguém mete a colher”. Mas se tem de pensar por quê. Por que estariam tendo essa afirmação? É o medo. A pesquisa mostra isto: o medo continua sendo a razão principal para evitar a exposição dos agressores. São 68% das respostas evidenciando que o fato de a vítima não mais poder retirar a queixa da delegacia faz com que a maioria das mulheres deixe de denunciar seu agressor. Aí, eu apontaria duas hipóteses: uma é o medo de apanhar se denunciar, que a gente sabe que existe. Nunca vou esquecer-me de quando, na TV Mulher - faz muitos anos isso, Senador Taques -, eu respondia a uma carta de uma espectadora que dizia que o marido havia decepado sua orelha. Eu dizia: “Volta, enfrenta!”. Nem havia delegacia da mulher. E ela me disse: “Mas não posso voltar. Não posso denunciar, porque ele vai cortar a minha outra orelha”. Aí, pensei: “Meu Deus, é verdade!”.

            Enquanto não houver políticas de acolhimento, casas-abrigo para que a mulher possa denunciar e sair dessa situação de perigo, será muito difícil conseguirmos que, em determinadas regiões do País, a mulher denuncie. Afora isso, há a questão econômica, que, muitas vezes, prevalece: a mulher não tem como se sustentar, nem aos filhos. Mas o que temos de reiteradamente dizer é que, muitas vezes, a pessoa fica com medo e acaba morrendo. Muitas vezes, essas denúncias que não foram feitas acabam em morte.

            Então, é muito complexo o tema, o que a pesquisa está mostrando. Há uma ambivalência agora. Estamos em um momento de transição: todas já sabem que têm direitos. Elas têm vontade, mas ainda têm dificuldade, em virtude da falta de políticas públicas para ampará-las.

            O DataSenado também buscou saber o que pensam as mulheres sobre a nova interpretação da Lei Maria da Penha, estabelecida pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ) em dezembro último. A Corte entendeu que a Lei é compatível com a dos Juizados Especiais, permitindo a suspensão da pena nos casos em que a condenação for inferior a um ano. Quando isso ocorrer, o juiz poderá trocar a pena de prisão por uma pena alternativa ou ainda suspender o processo. A pesquisa apurou que 79% das mulheres têm certeza de que a decisão enfraquece a Lei. Quero parabenizar o DataSenado, que foi em cima da questão. Essa discussão vai render agora.

            Com esse dado, penso que é fundamental que exerçamos, pelo menos na esfera do Legislativo, uma vigília constante. A Senadora Gleisi Hoffmann já entrou com projeto de lei, do qual vou ser a Relatora, para impedir que isso aconteça. Nosso enfrentamento, nesse caso, está respaldado pela resposta de um membro da instância maior do Judiciário brasileiro, o Ministro Luiz Fux, que, durante sabatina realizada nesta Casa, para aprovar sua indicação ao Supremo Tribunal Federal (STF), disse, com todas as letras - o Senador Taques estava lá, bem como a Senadora Vanessa e outros aqui presentes -, que afrouxar as punições previstas na Lei Maria da Penha é um “retrocesso”. Abro aqui um pequeno parêntese para saudar o Ministro, que toma posse nesta tarde no STF.

            Os dados da pesquisa, que pode ser acessada na página do Senado - não deixem de olhar, porque está interessantíssima! -, na Internet, revelam um fato interessante: todas essas opiniões divulgadas aqui independem da raça, da idade e da renda. A consciência das mulheres a respeito da violência é quase uniforme e ultrapassa qualquer tipo de grupo social. Todas partilham esse mesmo sentimento de indignação de que não é mais possível se calar, contrariando um refrão do rock brasileiro - não sei se os senhores se lembram disto -, na música da banda Skank, que dizia que “a nossa indignação é uma mosca sem asas, não ultrapassa as janelas de nossas casas”. Está ultrapassando, está ultrapassando, está mudando!

            Para finalizar, Sr. Presidente, eu gostaria de destacar uma última informação, divulgada pelo estudo do DataSenado, que, de modo especial, me toca e me entristece. Quando perguntadas se acham que a mulher é tratada com respeito no Brasil, apenas 6% das entrevistadas responderam “sim”. Gente, apenas 6% disseram “sim”! Às vésperas do Dia Internacional da Mulher, entendo que temos muito trabalho pela frente. Precisamos e devemos continuar lutando, denunciando, indignando-nos, gritando, se for necessário. Nosso instrumento de denúncia está previsto em lei. Esse é o instrumento mais forte de uma democracia justa e solidária, que funciona para todos e para todas.

            Quero externar meus parabéns à Secretaria de Pesquisa e Opinião do Senado por essa excelente pesquisa apresentada no mês da mulher. Parabéns!

            A Srª Gleisi Hoffmann (Bloco/PT - PR) - Permite-me um aparte, Senadora Marta?

            A SRª MARTA SUPLICY (Bloco/PT - SP) - Pois não, Senadora Gleisi.

            A Srª Gleisi Hoffmann (Bloco/PT - PR) - Primeiro, quero cumprimentá-la pelo pronunciamento. São muito bons os dados do DataSenado, que também quero parabenizar - junto-me a V. Exª. De fato, esses dados refletem uma realidade muito triste e constrangedora para nós, mulheres, mas acredito que é uma realidade que melhorou. A realidade já foi pior, porque, antes, nem isto existia: pesquisas feitas sobre o mundo feminino, sobre as aspirações das mulheres, sobre aquilo de que as mulheres são vítimas, em termos de violência, em termos de desrespeito. Hoje, conseguimos chamar a atenção para o tema. Eu queria parabenizar V. Exª por ter sido uma das precursoras, uma das que começaram a trabalhar esse tema, desde a TV Mulher, quando foi Deputada Federal, depois como Prefeita e, agora, como Senadora. Então, nós lhe devemos muito por essa trajetória, juntamente com outras mulheres que também ousaram, num momento em que a abordagem desse tema era muito difícil. Falar sobre as questões da mulher era quase uma política de gueto, e, hoje, a gente conseguiu colocar esse tema na pauta da política. Então, fico muito feliz de estar aqui, ouvindo V. Exª falar, tratando desses dados, que são muito importantes e que o Brasil tem de conhecer. Portanto, quero parabenizá-la e parabenizar também o DataSenado pela divulgação de dados que são muito importantes. Muito obrigada.

            A SRª MARTA SUPLICY (Bloco/PT - SP) - V. Exª tem toda a razão, Senadora Gleisi: até pouco tempo atrás, não tínhamos nem o direito de sermos pesquisadas. Esse foi um grande avanço, e os dados são, realmente, muito promissores.

            Muito obrigada, Sr. Presidente.


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Este texto não substitui o publicado no DSF de 04/03/2011 - Página 6038