Discurso durante a 21ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Considerações sobre o endividamento rural dos micro e pequenos produtores, especialmente do Nordeste brasileiro e do semiárido.

Autor
Eunício Oliveira (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/CE)
Nome completo: Eunício Lopes de Oliveira
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA AGRICOLA.:
  • Considerações sobre o endividamento rural dos micro e pequenos produtores, especialmente do Nordeste brasileiro e do semiárido.
Aparteantes
Jorge Viana.
Publicação
Publicação no DSF de 04/03/2011 - Página 6045
Assunto
Outros > POLITICA AGRICOLA.
Indexação
  • NECESSIDADE, REVISÃO, POLITICA AGRICOLA, ESPECIFICAÇÃO, ALTERAÇÃO, NORMAS, CONTRATAÇÃO, CREDITO RURAL, MODERNIZAÇÃO, SETOR, APOIO, PRODUTOR RURAL, AUMENTO, INVESTIMENTO PUBLICO, INFRAESTRUTURA, LOGISTICA.

                          SENADO FEDERAL SF -

            SECRETARIA-GERAL DA MESA

            SUBSECRETARIA DE TAQUIGRAFIA 


            O SR. EUNÍCIO OLIVEIRA (Bloco/PMDB - CE. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Senadora Gleisi, aproveito a oportunidade para informar a V. Exª, que estava presidindo estes trabalhos, que, quanto ao seu projeto, acabei de designar a Senadora Marta Suplicy como Relatora. Assim, numa homenagem justa às mulheres brasileiras, nós vamos, se Deus quiser, aprová-lo na primeira sessão da Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania em que a Senadora Marta Suplicy apresentar o seu relatório.

            A Srª Gleisi Hoffmann (Bloco/PT - PR) - Obrigada, Senador.

            O SR. EUNÍCIO OLIVEIRA (Bloco/PMDB - CE) - Srª Presidente Vanessa Grazziotin, Srs. Senadores, Srªs Senadoras, o que me traz à tribuna, nesta tarde de hoje, é um tema que envolve a questão do endividamento rural dos micro e pequenos produtores do Nordeste brasileiro e do semiárido.

            O Brasil deverá crescer a taxas mais elevadas nos próximos anos. Vamos continuar com o processo de distribuição de renda e avançar na redução da taxa de juros, que caiu significativamente nos últimos anos.

            Um dos setores que mais têm sentido o reflexo da crise internacional e da consequente elevação das taxas de juros é o setor agrícola. O crédito, antes abundante, oferecido pelas tradings, desapareceu e a queda nos preços das commodities agrícolas no mercado mundial trouxe à tona a discussão de um novo modelo de financiamento.

            Antes mesmo de assumir o Palácio do Planalto como Presidente da República, a Presidenta Dilma Rousseff, então Chefe da Casa Civil, dizia que existem dois setores que geram rapidamente emprego e garantia de trabalho no Brasil. Um é a construção civil e o outro, certamente, é a agricultura.

            A Presidenta Dilma tem sido sensível a esse drama e por isso voltamos a chamar a atenção para esse assunto tão importante.

            Na Câmara dos Deputados, tive a honra de relatar a medida provisória que ajudou a equacionar as dívidas rurais dos micro e pequenos produtores, principalmente do Nordeste e do semi-árido brasileiro.

            Conseguimos, com isso, amenizar o sofrimento de muitos produtores rurais, mas não resolvemos totalmente o problema. Ainda há diversas imperfeições e injustiças que precisam ser corrigidas.

            Mesmo com todas as medidas de incentivos, refinanciamento e até o perdão de algumas dívidas de micro e pequenos agricultores, um quarto desse valor, somente um quarto desse valor foi atingido, meu caro Senador Wilson Santiago.

            No Ceará, são pelo menos 300 mil produtores rurais endividados e mais de 12 milhões em todos os Estados do Nordeste brasileiro, Minas Gerais e Espírito Santo - região do semiárido, segundo cálculos da Associação Nacional de Amparo Jurídico ao Produtor Rural. Esses são efetivamente os números verdadeiros.

            Com a nossa luta pelo refinanciamento, conseguimos incluir dívidas de agricultores do Nordeste que receberam empréstimos de R$2 mil até R$250 mil nos seus valores originais.

            De fato, muitas das regras do crédito rural são consideradas ilegais e injustas por alguns juristas e até por decisões definidas em termos judiciais.

            Até uma auditoria feita nos bancos oficiais que operam com o crédito rural, realizada há alguns anos, feita pelo Tribunal de Contas da União, encontrou procedimentos contestáveis.

            Banco do Brasil, Banco da Amazônia (BASA) e Banco do Nordeste (BNB) tiveram a metodologia de cálculo utilizada nas operações rurais dos micro e dos pequenos produtores questionada pelo Tribunal de Contas da União, como, por exemplo:

            - Utilização de taxa efetiva no lugar de taxa nominal;

            - Cobrança de juros de mora superior ao limite legal;

            - Cobrança de multa acima de 2%;

            - Encargos de inadimplência elevados;

            - Cobrança indevida de tarifa contratual;

            - Utilização do ano comercial - 360 dias - em vez do ano civil - 365 dias - na apuração da taxa de juros diária;

            - Metodologias matemáticas que anulam o rebate legal concedido nos financiamentos com recursos dos Fundos Constitucionais, entre outros problemas.

            Outra ilegalidade comumente encontrada nos contratos rurais é o excesso de garantias nas operações de securitização e PESA, que chegam ao absurdo de mais de 500% do valor do financiamento!

            A última medida provisória sobre o tema, aprovada no ano passado aqui, no Senado Federal, renegociou, sim, a dívida de 116 mil agricultores, no valor de R$1,3 bilhão.

            Mas tudo isso ainda é insuficiente para equacionar de vez o drama que aflige os micro, os pequenos e os médios produtores rurais do Nordeste brasileiro.

            O risco da inadimplência continua, e continua muito alto, porque os custos financeiros subiram e os preços não acompanharam o crescimento das taxas de juros. É um cenário que deve desencadear mais uma renegociação da dívida do setor rural. Ou seja, é o velho problema do cachorro correndo atrás do rabo.

            O Governo tem aperfeiçoado os instrumentos de política agrícola, mas muitos não estão funcionando melhor por problema de natureza macroeconômica, como a taxa de juros ou pela burocracia excessiva.

            A taxa de juros da economia torna pouco atrativa a aplicação em títulos agropecuários e trava os negócios e os papéis ligados à agricultura. Esses mecanismos podem captar volumes maiores de recursos para o setor.

            Srª Presidente, Srªs e Srs. Senadores, a política agrícola precisa ser repensada. Não se trata apenas de uma questão pontual, mas da elaboração de uma nova política com mecanismos mais adequados à economia globalizada.

            O uso de certos instrumentos é deficiente ou, na melhor das hipóteses, tem-se revelado incoerente em relação às necessidades essenciais da agricultura, sobretudo em momentos de instabilidade.

            Há questões urgentes a serem enfrentadas, como a infraestrutura de sua logística e os custos tributários sobre essa atividade. Estudo da Confederação Nacional dos Transportes indica a necessidade de R$280 bilhões em investimentos para dotar o País de infraestrutura adequada, quase cinco vezes o total previsto no PAC para todas essas áreas.

            Mas, sem dúvida alguma, o maior problema continua sendo o crédito rural. O tema parece cair sempre na vala comum do financiamento bancário.

            A qualquer renegociação de dívidas, os bancos, mesmo os oficiais, utilizam a nefasta ferramenta da “classificação de risco” dos pequenos e dos micro produtores rurais. Isso quer dizer que o produtor, ao renegociar um financiamento, fica impedido de obter novas linhas de crédito para o custeio de sua produção, paralisando, assim, muitas vezes, sua atividade.

            Existem, ainda, entraves de ordem ambiental que têm paralisado as obras tão essenciais ao setor agrícola.

            Outro problema grave é a questão tributária. Estudos apontam uma incidência de carga fiscal de 16,45% sobre os alimentos no Brasil - um tratamento muito diferente do dado por outros países. Os gastos com alimentação nas regiões metropolitanas representam 65% da renda das pessoas de classe baixa. Por isso, reduzir a tributação direta ou indireta sobre a produção agrícola de alimentos, com certeza, aumentará a renda e a produção em disponibilidade para as famílias. Tanto é verdade que, em muitos casos...

            O Sr. Jorge Viana (Bloco/PT - AC) - Senador Eunício, V. Exª me permite um aparte?

            O SR. EUNÍCIO OLIVEIRA (Bloco/PMDB - CE) - É com prazer que escuto V. Exª.

            O Sr. Jorge Viana (Bloco/PT - AC) - Ilustre Senador Eunício, eu queria me associar ao posicionamento de V. Exª, especialmente depois de fazer uma análise da situação em que o nosso País, especialmente a Região Nordeste, se encontra. O Governo da Presidenta Dilma tem um desafio muito grande, que é encontrar estabilidade para o crescimento do nosso País. E, mais do que isso, além de garantir a estabilidade de crescimento do País, garantir que o País se desenvolva de forma sustentável. Digo isso, porque há uma grande diferença entre crescimento e desenvolvimento; desenvolvimento implica melhoria substancial na vida da população. E, se há algo que ainda está em descompasso com esses propósitos de nosso Governo e que se constitui em uma necessidade do País, é todo o aparato de crédito do Brasil. Hoje em dia, como muito bem ressalta V. Exª, não só os pequenos têm dificuldades de acesso ao crédito. Fica parecendo que a estrutura financeira e de crédito do País é voltada apenas para quem já tem dinheiro, porque as exigências feitas, especialmente nas garantias, proíbem aqueles que têm bons propósitos, boas ideias e bons projetos de acessar os recursos necessários para implementá-los. Penso, portanto, que o discurso de V. Exª merece uma atenção especial por parte dos agentes financeiros, por parte daqueles que são responsáveis pela consolidação de uma política começada no Governo do Presidente Lula e que tão bem está fazendo ao País. O Brasil não só está crescendo como está se desenvolvendo. A busca agora é pela sustentabilidade, seja por crescimento, seja por desenvolvimento. Acho que, com posicionamentos como os de V. Exª, nós vamos encontrar a estabilidade tão sonhada pelo povo brasileiro, e é justo que isso aconteça agora no Governo da Presidenta Dilma, que quis dar sequência à política iniciada no Governo do Presidente Lula. V. Exª está de parabéns, Senador Eunício Oliveira.

            O SR. EUNÍCIO OLIVEIRA (Bloco/PMDB - CE) - Eu agradeço e incorporo as palavras de V. Exª ao meu pronunciamento.

            As garantias exigidas pelas instituições financeiras são um dos maiores entraves enfrentados pelos produtores. As regras de contratação do crédito rural são as mesmas que regem todo o sistema financeiro, e isso não pode continuar acontecendo.

(Interrupção do som.)

(O Sr. Presidente faz soar a campainha.)

            O SR. EUNÍCIO OLIVEIRA (Bloco/PMDB - CE) - E tenho convicção de que a sensibilidade da Presidenta Dilma vai fazer com que esse entendimento seja modificado.

            As regras de contratação do crédito não podem ser as mesmas regras do sistema financeiro como um todo. Por isso, sugiro que adotemos medidas necessárias e urgentes, como:

            - a reavaliação do patrimônio em parâmetros justos;

            - a aceitação de outros bens que não a propriedade como garantia;

            - a liberação de parte do bem proporcionalmente ao que já foi quitado para que sejam contraídos novos empréstimos;

            - a aceitação de garantias em segundo e terceiro graus, de modo que uma mesma propriedade possa ser instrumento de validação de mais de um pequeno empréstimo feito pelo microagricultor.

            O produtor agrícola precisa se precaver de novos prejuízos para que possa se manter no campo e continuar trabalhando e dando sustento aos seus familiares.

            O seguro rural, nos moldes em que se aplica no Brasil, não atende às especificidades do setor, já que se restringe a expectativas de produção baseadas apenas em parâmetros defasados.

            Em um país de proporções territoriais gigantescas, como o nosso querido Brasil, o setor agrícola é estratégico. E estratégica deve ser a política de financiamento, de crédito e de seguro para os pequenos e microprodutores, principalmente do Nordeste brasileiro, do semiárido.

            Não modernizar o setor é torná-lo inviável. Inviabilizá-lo é inviabilizar o Brasil. Muito obrigado.


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Este texto não substitui o publicado no DSF de 04/03/2011 - Página 6045