Discurso durante a 20ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Reflexão sobre reforma política; e outros assuntos.

Autor
Marinor Brito (PSOL - Partido Socialismo e Liberdade/PA)
Nome completo: Marinor Jorge Brito
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
REFORMA POLITICA.:
  • Reflexão sobre reforma política; e outros assuntos.
Aparteantes
Eduardo Suplicy, Flexa Ribeiro, João Pedro.
Publicação
Publicação no DSF de 03/03/2011 - Página 5843
Assunto
Outros > REFORMA POLITICA.
Indexação
  • COMENTARIO, POSIÇÃO, MEMBROS, BANCADA, PARTIDO POLITICO, PARTIDO SOCIALISMO E LIBERDADE (PSOL), ORADOR, RELAÇÃO, NECESSIDADE, REFORMA POLITICA, ALTERAÇÃO, FINANCIAMENTO, CAMPANHA ELEITORAL.

                          SENADO FEDERAL SF -

            SECRETARIA-GERAL DA MESA

            SUBSECRETARIA DE TAQUIGRAFIA 


            A SRª MARINOR BRITO (PSOL - PA. Como Líder. Sem revisão da oradora) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, com tantos fatos de extrema relevância ocorrendo no mundo e em nosso País, eu poderia estar falando, neste momento, da nossa alegria, da alegria dos militantes socialistas do Brasil e do nosso contentamento com os processos de mudanças levados a efeito pelos povos de diversas nações árabes, que nas ruas têm derrubado seus ditadores e opressores. Poderia também estar falando hoje das inúmeras ocupações de latifúndios e áreas de grileiros levadas a termo pelos trabalhadores rurais em diversos Estados brasileiros, em especial em meu Estado, o Pará.

            Porém, decidi ocupar a tribuna no dia de hoje para falar de um tema que considero de absoluta relevância para a história política do nosso País e que, depois de um longo e tenebroso inverno, voltou a ser assunto nesta Casa. Falo aqui da reforma política, só que, desta feita, sob nova ótica que considero essencial para entender os interesses que estão em jogo nesse momento da história recente do nosso País, quando se fala desse assunto.

            Todos aqui sabem que eu pertenço ao PSOL, o Partido Socialismo e Liberdade, desde a fundação em 2005, quando consagramos uma palavra de ordem que dizíamos e ainda dizemos: estamos construindo um novo Partido contra a velha política. É isso que estamos procurando fazer aqui, eu e o meu companheiro de bancada, o Senador Randolfe Rodrigues, juntamente com aqueles que estão usando este espaço para defender os interesses da classe trabalhadora e da maioria do povo brasileiro.

            Quero me debruçar sobre o tema do financiamento público de campanha, do financiamento de campanha e sobre a nossa proposta para que, após aprovação pelo Congresso, todas as campanhas sejam financiadas exclusivamente com recursos públicos e sob a rígida fiscalização da Justiça Eleitoral, do Ministério Público e da população.

            Quero citar aqui o Prof. Léo Lince, do PSOL do Rio de Janeiro, que trouxe importante contribuição a esse debate quando afirmou: “O formato atual de financiamento das campanhas eleitorais é um fator incontrolável da corrupção no nosso País”. Além de atropelar a ética, esse tipo de financiamento é uma fonte de aberrações que colocam as eleições no Brasil entre as mais caras do mundo, como se o nosso País fosse um país cujo povo vivesse com dignidade, como se nós pudéssemos estar desperdiçando dinheiro nos processos eleitorais. Essa organização acontece de tal forma que fica impossível fiscalizar efetivamente o processo eleitoral em nosso País.

            Os dados sobre financiamento de campanha constituem um mistério profundo. A ferocidade da competição entre milhares de candidaturas individuais que arrecadam e gastam fora de controle cria um quadro caótico. São pouquíssimos os países que permitem aos candidatos arrecadar e despender fundos de campanha, na maioria dos casos, uma competência exclusiva das organizações partidárias.

            Aqui no Brasil é a regra, no entanto. Com partidos fracos e sem programa nítido, os candidatos acabam montando máquinas pessoais voltadas para a distribuição de bens, compra de votos e formação de clientela. O abuso do poder econômico e o uso das máquinas públicas nas campanhas eleitorais, Senador, têm sido uma constante.

            O Prof. Léo Lince destaca, em seu brilhante estudo sobre essa realidade, que os dados sobre os financiadores de campanha são precários, limitam-se aos gastos declarados, revelando que, no Brasil, mais do que em qualquer outro país, há um peso desmedido de contribuições ou doações de fontes empresariais.

            Sr. Presidente, Srs. Senadores, Srªs Senadoras, o que estou dizendo aqui é do conhecimento de V. Exªs, basta ver o valor declarado das respectivas campanhas junto aos tribunais regionais eleitorais, tomando como exemplo as eleições do ano de 2010. E quem são os financiadores privados principais das candidaturas dos próprios Senadores e Senadoras desta República? Claro, tudo dentro da lei, tudo em acordo com a lei, porém uns recebem milhões dos empresários, e outros candidatos não recebem nada.

            Esse formato de financiamento perpetua o status quo, estreita os vínculos entre as máquinas eleitorais e os interesses empresariais das grandes corporações, criando obstáculos intransponíveis para que novos valores e interesses sociais conquistem espaço nas instituições representativas.

            As últimas eleições confirmam: campanhas cada vez mais caras, formação escancarada de bancada das grandes corporações e espaço menor para os candidatos de opinião.

            Eu quero ressaltar que a minha candidatura, comparada com a de todos os Senadores e Senadoras eleitos, foi a de menor valor de todo o Brasil. Houve um gasto de apenas R$53 mil em toda a campanha.

            O Senador Flexa Ribeiro deu um sorriso. Eu não sei o que passou na cabeça do Senador Flexa Ribeiro, mas com certeza, Senador, a campanha de V. Exª teve um aporte financeiro muito superior. Pelo menos o que foi declarado...

            O Sr. Flexa Ribeiro (Bloco/PSDB - PA) - V. Exª me permite um aparte?

            A SRª MARINOR BRITO (PSOL - PA) - Claro, mas eu acho muito interessante o sorriso que me pareceu até meio irônico.

            Espero que não tenha sido. Eu não mereceria isso de V. Exª.

            O Sr. Flexa Ribeiro (bloco/PSDB - PA) - Posso?

            A SRª MARINOR BRITO (PSOL - PA) - Pois não, pode falar.

            O Sr. Flexa Ribeiro (Bloco/PSDB - PA) - Senadora, quando V. Exª voltou a vista para o Senador Flexa Ribeiro, eu estava sorrindo em função de uma mensagem que eu tinha acabado de receber. Não era sobre o pronunciamento de V. Exª. Eu não vou duvidar nunca da palavra da Senadora Marinor dita da tribuna. Pelo contrário. Quero parabenizá-la por ter tido o êxito que teve com um gasto realmente...Quero parabenizá-la porque o Senador Suplicy dizia aqui, na legislatura passada, que havia sido eleito com R$300 mil. V. Exª ganhou do Senador Eduardo Suplicy. O motivo do meu sorriso foi a mensagem que tinha acabado de receber aqui. Quero parabenizá-la por isso.

            A SRª MARINOR BRITO (PSOL - PA) - Agradeço os parabéns. V. Exª testemunhou que, dos 144 Municípios que o nosso Estado contém, consegui ir a 7: minha cidade, Alenquer, Santarém, Cametá e outros na região metropolitana de Belém.

            Isso, por si só, já exclui qualquer possibilidade de ter gastos maiores, visto que o deslocamento na nossa região é muito caro. Encontrei-me uma única vez com V. Exª no aeroporto quando estava voltando de Cametá.

            Reafirmo o que estava dizendo aqui...

            O Sr. João Pedro (Bloco/PT - AM) - V. Exª me concede um aparte, Senadora Marinor?

            A SRª MARINOR BRITO (PSOL - PA) - Pois não, Senador João Pedro.

            O Sr. João Pedro (Bloco/PT - AM) - Primeiro, para concordar com a avaliação que V. Exª faz da importância para o Estado brasileiro, para a sociedade brasileira, da reforma política. E V. Exª levanta um item sobre o financiamento de campanha. Se nós, se o Congresso, Câmara dos Deputados e o Senado, não discutirmos esse tema para valer - não para fazer de conta -, não vamos contribuir com uma representação do povo brasileiro aqui nesta Casa, porque, a legislação que temos - essa é a verdade, dói - privilegia o poder econômico. Por exemplo, quantos índios há aqui no Congresso Nacional?

            A SRª MARINOR BRITO (PSOL - PA) - Quantos negros há aqui no Senado Federal?

            O Sr. João Pedro (Bloco/PT - AM) - Quantos negros há no Congresso Nacional, no Senado?

            A SRª MARINOR BRITO (PSOL - PA) - Quantas mulheres? Quantos deficientes?

(Interrupção do som.)

            O Sr. João Pedro (Bloco/PT - AM) - Nós precisamos fazer uma reforma para quebrar esse muro, esse apartheid que impede, por conta de uma legislação, que, verdadeiramente, setores da Nação brasileira venham para o Congresso Nacional: os negros, as mulheres, os deficientes, os trabalhadores rurais...

            A SRª MARINOR BRITO (PSOL - PA) - Os quilombolas, os pescadores.

            O Sr. João Pedro (Bloco/PT - AM) - Então, nós precisamos fazer uma reforma para fazer com que a Nação seja, verdadeiramente, representada. Isto não é simples: financiamento público de campanha. Eu quero concordar com V. Exª. A sociedade precisa pautar para si também esse debate. Ele não pode ficar nos marcos do Congresso Nacional. A CNBB, a União Nacional dos Estudantes, a Associação Brasileira de Imprensa, instituições que têm tradição de pensar o Brasil. É hora de nós pensarmos a reforma política no sentido de fazer com que possamos ter equidade, transparência e uma representação verdadeira do povo brasileiro. Muito obrigado pelo pronunciamento.

            A SRª MARINOR BRITO (PSOL - PA) - Eu que agradeço, Excelência.

            O Sr. Eduardo Suplicy (Bloco/PT - SP) - V. Exª me permite um aparte?

            A SRª MARINOR BRITO (PSOL - PA) - Eu já ia até falar de V. Exª. Eu ia dizer que não tenho procuração de V. Exª, mas como conheço a trajetória de V. Exª...

            O Sr. Eduardo Suplicy (Bloco/PT - SP) - Eu quero esclarecer, porque o Senador Flexa Ribeiro talvez não esteja com a sua memória tão agudamente perfeita. O que eu disse é que, na campanha de 2006, os gastos foram inteiramente transparentes. E já antes da realização das eleições, no fim de setembro, estavam registradas, inteiramente, todas as contribuições de pessoas físicas e jurídicas...

(Interrupção do som.)

            O Sr. Eduardo Suplicy (Bloco/PT - SP) - ...que foram da ordem de R$1,5 milhão, em 2006. Foram R$300 mil na primeira eleição, em 1990. Talvez ele possa ter... Mas o que eu sempre aqui defendo é que devemos ter todas as contribuições de pessoas físicas e jurídicas transparentemente registradas para todos. Cumprimento V. Exª por ter sido eleita com essa transparência e pela soma modesta de contribuições...

            A SRª MARINOR BRITO (PSOL - PA) - E, lamentavelmente, Senador Suplicy...

(Interrupção do som.)

            O Sr. Eduardo Suplicy (Bloco/PT - SP) - ... a favor do financiamento público de campanha. Inclusive, se for para ser exclusivo, acho positivo. Obrigado.

            A SRª MARINOR BRITO (PSOL - PA) - E, lamentavelmente, os Congressistas que aqui chegam pelo voto de opinião, sem o abuso do poder econômico, sem o uso das máquinas públicas, dos esquemas fraudulentos, o que é comum, infelizmente, na política brasileira, nós representamos apenas 5% deste Congresso. Não são dados meus, mas do Congresso Nacional, de pesquisas de ONGs que têm atuado no combate à corrupção eleitoral. Eu me sinto privilegiada por furar um bloqueio como esse.

            Obviamente, outros fatores contribuíram para a minha chegada aqui, como a Lei da Ficha Limpa, a participação em CPI da Pedofilia, em viagens, em lutas sociais diversas, de que tive oportunidade de participar em meu Estado.

            Mas não estou falando da minha...

(Interrupção do som.)

            A SRª MARINOR BRITO (PSOL - PA) - ...Estou falando que, diante desse quadro, não tem sentido fazer uma reforma política que seja verdadeira se a estratégia central - o PSOL defende e vai defender isso - não for o financiamento público de campanha. Não tem sentido! Ele é necessário para se garantir a independência e a viabilidade do candidatos e dos eleitos ante o poder econômico, além de salvaguardar o princípio da igualdade na disputa. Ou alguém aqui vai me dizer que existe igualdade na disputa eleitoral em nosso País?

            O financiamento público precisa ser exclusivo, aplicando pesadas punições para quem violá-lo. Até hoje, são raros os casos de políticos que...

(Interrupção do som.)

            A SRª MARINOR BRITO (PSOL - PA) - ...nessa reforma, vai ser necessário que se estabeleça um teto de gastos para cada cargo em disputa, além da montagem de um rigoroso aparato de fiscalização sobre o uso do Fundo Público Eleitoral.

(O Sr. Presidente faz soar a campainha.)

            A SRª MARINOR BRITO (PSOL - PA) - O direito do voto assegurado de maneira igualitária ao cidadão requer que o direito de ser votado não sofra a interferência indevida do poder econômico. Este é o sentido maior da nossa luta em defesa do financiamento exclusivamente público das campanhas eleitorais.

            Sentimos muito, em nome da Bancada do PSOL - vou reafirmar aqui -, que nós tenhamos sido boicotados, de uma certa forma, pela Presidência desta Casa quando excluiu, na conformação da Comissão de Reforma Política, o Partido Socialismo e Liberdade. Nós achamos que somos legítimos, vamos defender os pontos de vista que avancem na democratização do processo político do País, vamos trabalhar de forma firme na luta pela democratização da comunicação no País, porque este é um outro fator importante. Não é possível o que acontece no Pará, onde os meios de comunicação são desse ou daquele candidato e quem não é alinhado com os interesses econômicos desse ou daquele grande grupo de comunicação, todos com concessão pública, não tem o direito de falar, de aparecer em um debate ou de ser convidado para uma entrevista. Parece que isso é uma coisa do outro mundo. Não é! Essa é a realidade brasileira. No Estado do Pará é assim que acontece: se você é amigo de um grupo, você passa a ser inimigo do outro grupo, e vice-versa.

            As oportunidades, Senadores, são desiguais. Eu participei na mesma condição,...

(Interrupção do som.)

            A SRª MARINOR BRITO (PSOL - PA) - ...teoricamente, do Senador Flexa Ribeiro, na disputa eleitoral, do ex-Deputado Jader Barbalho e de outros candidatos que concorreram ao Senado Federal. Eu não tive oportunidade de falar em nenhuma entrevista...

(Interrupção do som.)

            A SRª MARINOR BRITO (PSOL - PA) - ...os demais candidatos tiveram oportunidades, disputaram em condições iguais.

(O Sr. Presidente faz soar a campainha.)

            A SRª MARINOR BRITO (PSOL - PA) - Já não basta a diferença do poder econômico, ainda tem o poder midiático, que sempre é um elemento que dá gosto na salada, é o tempero da salada eleitoral.

            Então, eu queria dizer aqui que fomos defender com muita firmeza...

(O Sr. Presidente faz soar a campainha.)

            A SRª MARINOR BRITO (PSOL - PA) - Eu trouxe aqui esta reflexão desse companheiro que considero uma pessoa importante, um brilhante estudioso do cenário político brasileiro, o Professor Léo Lince, do Rio de Janeiro. A partir desse tipo de diálogo, dessas reflexões, Senadores, vamos apresentar, passo a passo, ao Senado Federal e à Câmara Federal, por meio dos nossos Deputados, os nossos posicionamentos sobre a reforma política, de que o Brasil precisa e que já está atrasado em fazer.

            Muito obrigada.


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Este texto não substitui o publicado no DSF de 03/03/2011 - Página 5843