Discurso durante a 32ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Registro de subscrição por S.Exa. de requerimento que solicita a realização de Sessão Especial do Senado destinada a comemorar o centenário da Igreja Evangélica Assembleia de Deus; e outro assunto.

Autor
Gleisi Hoffmann (PT - Partido dos Trabalhadores/PR)
Nome completo: Gleisi Helena Hoffmann
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA CULTURAL. HOMENAGEM.:
  • Registro de subscrição por S.Exa. de requerimento que solicita a realização de Sessão Especial do Senado destinada a comemorar o centenário da Igreja Evangélica Assembleia de Deus; e outro assunto.
Aparteantes
Aloysio Nunes Ferreira.
Publicação
Publicação no DSF de 22/03/2011 - Página 7634
Assunto
Outros > POLITICA CULTURAL. HOMENAGEM.
Indexação
  • REGISTRO, SUBSCRIÇÃO, ORADOR, REQUERIMENTO, REALIZAÇÃO, SESSÃO ESPECIAL, COMEMORAÇÃO, CENTENARIO, IGREJA CATOLICA.
  • DEBATE, PROPOSTA, PROJETO DE LEI, FLEXIBILIDADE, DIREITO AUTORAL, OBJETIVO, ISENÇÃO, PAGAMENTO, EXECUÇÃO, OBRA MUSICAL, BENEFICIARIO, INSTITUIÇÃO RELIGIOSA, AUSENCIA, LUCRO.

                          SENADO FEDERAL SF -

            SECRETARIA-GERAL DA MESA

            SUBSECRETARIA DE TAQUIGRAFIA 


            A SRª GLEISI HOFFMANN (Bloco/PT - PR. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão da oradora.) - Muito obrigada, Sr. Presidente. Obrigada pela palavras também.

            Srs. Senadores que aqui estão, eu, em primeiro lugar, gostaria de registrar à Casa que, com a concordância do seu primeiro signatário, Senador Marcelo Crivella, estou subscrevendo um requerimento que propõe a realização de Sessão Especial para comemorar aqui, nesta Casa, o centenário da Igreja Evangélica Assembleia de Deus, em 13 de junho deste ano.

            Trata-se de uma justa homenagem que o Senado renderá em reconhecimento aos cem anos de serviços prestados por essa igreja na consolidação dos nossos mais altos valores morais e espirituais, colaborando, de forma expressiva, para a construção da cidadania do povo brasileiro, com uma forte ação na área social em favor do povo mais pobre deste País.

            Quero aqui fazer uma referência ao Pastor Ival Teodoro, Presidente da Convenção da Assembleia de Deus no meu Estado, Paraná, a quem eu rendo homenagens. Com certeza, contaremos com a sua presença aqui no dia 13 de junho, quando homenagearemos a Igreja Assembleia de Deus.

            Aproveitando a oportunidade, não apenas em homenagem à Igreja Assembleia de Deus, mas procurando atender a uma demanda de todas as formas de manifestação religiosa do País, estou apresentando à Casa um projeto com objetivo de isentar da arrecadação dos direitos autorais ao Ecad a execução, por qualquer meio, de obras musicais ou litero musicais no âmbito de cultos, cerimônias ou eventos realizados por organizações religiosas, sem objetivo de lucro.

            Atualmente, nos termos da Lei nº 9.610, de 19 de fevereiro de 1998, para qualquer representação ou exibição pública de obras teatrais, musicais ou litero musicais, há necessidade de autorização do autor ou titular de direito patrimonial do autor, com o respectivo pagamento ao Escritório Central de Arrecadação e Distribuição, o famoso Ecad, independentemente de haver objetivo de lucro. Essa norma, especialmente se considerarmos a existência de associações desprovidas de fins econômicos, como as de cunho religioso, protege excessivamente o autor ou titular de tais obras em detrimento do interesse geral da coletividade, criando obstáculos à difusão da cultura e, particularmente, neste caso, da manifestação religiosa, da profissão de fé.

            O Sr. Aloysio Nunes Ferreira (Bloco/PSDB - SP) - Permite-me um aparte, Senadora?

            A SRª GLEISI HOFFMANN (Bloco/PT - PR) - Sim, pois não, Senador Aloysio. Concedo-lhe um aparte.

            O Sr. Aloysio Nunes Ferreira (Bloco/PSDB - SP) - Senadora Gleisi, sempre acompanho o trabalho legislativo profícuo de V. Exª e, evidentemente, aguardo a apresentação do projeto a que V. Exª se refere. Agora, eu queria apenas fazer apenas uma observação à senhora. O direito autoral é o resultado do trabalho da pessoa. Não há renda que derive do trabalho tão diretamente quanto a do direito do autor. É a sua criação intelectual, a sua manifestação artística, que é protegida por lei. Imagine se essa regra que V. Exª propõe se generaliza. V. Exª diz: “Mas não tem fins lucrativos!”. No entanto, imagine a senhora uma quermesse, por exemplo, organizada por uma associação beneficente religiosa ou de outro cunho. O organizador da quermesse, pelo fato de a quermesse ser beneficente, não tem o direito de buscar uma rês no curral de um proprietário rural e abatê-la para servir como prenda, digamos assim, na quermesse. Por que o criador de uma obra musical e literária será obrigado a ceder, sem nenhuma contrapartida, sequer a sua autorização, o produto da sua obra? Coloco apenas para reflexão de V. Exª esse tema, que me é muito caro.

            A SRª GLEISI HOFFMANN (Bloco/PT - PR) - Está certo. Agradeço o aparte, Senador Aloysio.

            Não estamos aqui, em nenhum momento, discutindo ou flexibilizando o direito autoral. Não é essa a minha intenção. Estamos pontuando muito especificamente para as questões relacionadas a cultos religiosos, a manifestações religiosas. Em grande parte dos shows religiosos, os próprios artistas, os cantores, sejam católicos ou evangélicos, abrem mão, inclusive, mas são obrigados a fazer o recolhimento, porque a legislação assim determina, e acabam discutindo na Justiça o fato de terem aberto mão em relação ao tema.

            O Sr. Aloysio Nunes Ferreira (Bloco/PSDB - SP) - Permite-me, mais uma vez?

            A SRª GLEISI HOFFMANN (Bloco/PT - PR) - Sim.

            O Sr. Aloysio Nunes Ferreira (Bloco/PSDB - SP) - É prerrogativa do autor autorizar a divulgação da sua obra. Se o autor autorizar a divulgação da sua obra, não há quem determine o pagamento pela sua divulgação. É propriedade do autor. O autor é que pode autorizar. Se ele autorizar, não há nenhum problema. Não há por que a entidade lutar na Justiça contra a sociedade arrecadadora, que é uma sociedade que representa os autores. Portanto, ele estará exercendo a sua prerrogativa pessoal de autorizar a utilização da sua obra. Caso contrário, não vejo por que, seja em manifestação de qualquer tipo, com finalidade de lucro ou não, se possa dispor do direito de outrem. Na verdade, o que V. Exª propõe é que a lei obrigue alguém a dispor do seu direito, o que, no meu entender, não é razoável.

            A SRª GLEISI HOFFMANN (Bloco/PT - PR) - O senhor vai conhecer o projeto, Senador. Na realidade, não se trata disso. Trata-se da inexigibilidade de cobrança de valores em relação a eventos organizados por entidades religiosas, em que, invariavelmente, o Ecad realiza a cobrança, e aí se conduz essa cobrança para a esfera judicial. Temos vários processos já nesse sentido. Não é a disposição da obra; não é a divulgação, por exemplo, do CD; não é a divulgação, é a realização de shows. Muitas vezes o artista diz que não precisa, mas a comunidade religiosa é obrigada a recolher ao Ecad. Então, o projeto permite que isso que está sendo discutido em esfera judicial, em nítido prejuízo aos interessados, possa ser regulado para os interessados.

            Para pacificar a controvérsia que ainda hoje paira sobre a matéria é que propomos isentar do recolhimento dos direitos autorais a execução de obras musicais ou litero musicais em cultos, cerimônias e eventos organizados por entidades religiosas em que não haja intuito de lucro direto ou indireto.

            Nas palavras de Carlos Alberto Bittar:

Há o incontestável interesse coletivo na difusão de obras intelectuais; existe a necessidade de acesso de diferentes camadas populacionais [...] aos textos e obras públicas; e impõe-se a expansão da cultura como esteio do desenvolvimento geral da Nação. [...] Por essa razão é que certos interesses de caráter público têm imposto baliza aos direitos autorais ao longo do tempo, em todos os países, as quais se refletem no direito positivo, por meio de formulação de regras de exceção, que vêm a mitigar o caráter absoluto da exclusividade conferida ao autor.

            É o que nós discutíamos há pouco, Senador Aloysio, as exceções.

            Saliente-se que não há conflito entre a modificação legislativa aqui proposta e o inciso XXVII do art. 5º da Constituição, que assegura proteção ao direito autoral, pois se aplicam outros dois dispositivos constitucionais: o inciso VI do mesmo art. 5º, segundo o qual “é inviolável a liberdade de consciência e de crença, sendo assegurado o livre exercício dos cultos religiosos e garantida, na forma da lei, a proteção aos locais de culto e a suas liturgias”; e o art. 23, inciso V, que dá competência à União, aos Estados e aos Municípios para “proporcionar os meios de acesso à cultura, à educação e à ciência”. O caso, a bem da verdade, é de harmonização de normas e princípios de status constitucional.

            Em suma, entendemos que, desde que a representação ou execução pública da obra se dê no âmbito de evento destinado a manifestação religiosa e sem finalidade lucrativa, não há por que sujeitá-la à prévia autorização e, especialmente, à arrecadação de valores por parte do Ecad, tendo em vista que os responsáveis não auferirão nenhuma vantagem pecuniária e, portanto, não tirarão proveito econômico algum das obras utilizadas, não havendo, pois, ofensa aos direitos patrimoniais do autor.

            A Constituição Federal, no art. 150, veda a instituição de imposto sobre templos de qualquer natureza. Sendo assim, não me parece razoável que o Estado brasileiro abra mão de cobrança de imposto e o Ecad não possa fazer o mesmo em relação à sua arrecadação.

            O Sr. Aloysio Nunes Ferreira (Bloco/PSDB - SP) - Permite-me um aparte, mais uma vez?

            A SRª GLEISI HOFFMANN (Bloco/PT - PR) - Pois não, Senador Aloysio.

            O Sr. Aloysio Nunes Ferreira (Bloco/PSDB - SP) - V. Exª, realmente, parece-me estar confundindo a cobrança pela utilização de uma obra intelectual, devida ao autor dessa obra, ao indivíduo autor dessa obra, com o imposto. Não tem nada a ver uma coisa com a outra, perdoe-me V. Exª. E não se trata apenas da cobrança. A prerrogativa do autor é uma prerrogativa absolutamente inafastável de autorizar ou não autorizar a utilização da sua obra. O jurista que a senhora citou, o Dr. Bittar, seguramente, não haveria de ficar feliz se visse os seus livros reproduzidos por aí sem que lhe auferissem o justo direito de autor pela publicação de seus livros. E mais, se V. Exª abre uma porta para as manifestações religiosas, logo mais virão manifestações beneficentes não religiosas, virão manifestações esportivas, manifestações comunitárias, todas querendo utilizar-se de obras que são produto do trabalho intelectual, da criação intelectual, projeção da individualidade do autor e, muitas vezes, o seu ganha pão, sem que ele possa sequer ser ouvido. Creio que, na minha visão, que sou muito apegado à questão do direito autoral, até por que fui o relator da lei que V. Exª pretende modificar, que passou pelo Senado também, foi submetida a um crivo muito rigoroso no Senado, penso que não se deve dar barretada com o chapéu alheio. O direito do autor é do autor, não é possível fazer benemerência com algo que não pertence àqueles que organizam a manifestação, mas pertence ao autor da música ou da obra literária. Enfim, teremos oportunidade de discutir isso. Vejo que aí há uma porta que tenho receio de que se abra, porque se discute hoje - e, especialmente antes da chegada da Ministra Ana de Hollanda, o Ministério da Cultura promovia discussões a este respeito - uma mudança da Lei Autoral num sentido extremamente detrimentoso aos autores. Penso que esse projeto de V. Exª será objeto de um debate importante entre nós, que contribuirá para o esclarecimento da natureza jurídica do direito do autor.

            A SRª GLEISI HOFFMANN (Bloco/PT - PR) - Com certeza, Senador. Não quero, em nenhum momento, ferir aqui os direitos, tampouco quero regulamentar uma situação que pode, inclusive, privar cultos ou manifestações religiosas de fazerem a sua liturgia. Nós temos vários exemplos de cantores religiosos que têm suas músicas cantadas em missas, em grandes cultos, em estádios. Como vamos trabalhar com uma situação dessas? Isso é uma manifestação de fé das pessoas. Imagine o senhor uma missa em um grande estádio e todos nós cantando uma música do Padre Zezinho, de quem sou fã! Mas, para realizar essa missa campal, para poder fazer uma manifestação de fé por meio de uma música que louva a Deus, enfim, que caracteriza a fé daquelas pessoas que ali estão, tem-se que pagar.

            É uma matéria complexa, eu sei disso. Apresento o projeto e gostaria muito de conversar com o senhor. Tenho certeza de que vamos debater muito essa matéria. Talvez encontremos um caminho, com esse projeto, de termos proteção a essa situação de que estou falando, de proteção a tantos outros cultos, inclusive evangélicos, que acontecem. Que possamos resguardar o direito do autor, mas também a manifestação de fé das pessoas, a liberdade de culto, que são tão importantes para o nosso País e para a fé do nosso povo.

            Agradeço, Sr. Presidente.


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Este texto não substitui o publicado no DSF de 22/03/2011 - Página 7634