Discurso durante a 32ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Registro de evento comemorativo do Dia Internacional da Síndrome de Down, hoje, no Auditório Nereu Ramos da Câmara dos Deputados, destacando requerimento, de autoria de S.Exa., para criação de uma comissão especial no Senado Federal para tratar do tema.

Autor
Lindbergh Farias (PT - Partido dos Trabalhadores/RJ)
Nome completo: Luiz Lindbergh Farias Filho
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
SAUDE. HOMENAGEM.:
  • Registro de evento comemorativo do Dia Internacional da Síndrome de Down, hoje, no Auditório Nereu Ramos da Câmara dos Deputados, destacando requerimento, de autoria de S.Exa., para criação de uma comissão especial no Senado Federal para tratar do tema.
Publicação
Publicação no DSF de 22/03/2011 - Página 7674
Assunto
Outros > SAUDE. HOMENAGEM.
Indexação
  • REGISTRO, ATO, COMEMORAÇÃO, DIA INTERNACIONAL, DEFICIENTE MENTAL, LOCAL, CAMARA DOS DEPUTADOS.
  • REQUERIMENTO, ORADOR, CRIAÇÃO, COMISSÃO ESPECIAL, PESSOA DEFICIENTE, OBJETIVO, REGULAMENTAÇÃO, CONVENÇÃO, ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS (ONU).
  • APOIO, PROJETO DE LEI, AUTORIA, DEPUTADO FEDERAL, ASSUNTO, APOSENTADORIA, PESSOA DEFICIENTE.

                          SENADO FEDERAL SF -

            SECRETARIA-GERAL DA MESA

            SUBSECRETARIA DE TAQUIGRAFIA 


            O SR. LINDBERGH FARIAS (Bloco/PT - RJ. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Senador Randolfe, hoje tivemos, no Auditório Nereu Ramos, da Câmara dos Deputados, um grande evento comemorativo do Dia Internacional da Síndrome de Down. Dia 21 de março, 21º cromossomo; o três, de março, refere-se à trissomia.

            Quero começar parabenizando o Deputado Romário, que eu acho vai ser um grande Deputado, porque tem uma causa que ele pegou com muita força e que não é só a causa da Síndrome de Down, é a causa da luta de todas as pessoas com deficiência neste País.

            Acho que é uma situação nova neste Parlamento, tanto no Senado quanto na Câmara. Na Câmara dos Deputados, além do Deputado Romário, há três Deputados cadeirantes que querem colocar a discussão da pessoa com deficiência no centro dos debates nacionais. Aqui, no Senado, há também uma situação nova. Além de mim, temos o Senador Wellington Dias, que fez um trabalho lá no Piauí e que é pai da Danielle. Temos o Senador Paulo Paim, que presidia esta sessão, Senador Randolfe, que tem um trabalho de tempos, inclusive o funcionário que o assessora aqui neste plenário do Senado luta há muito tempo e expressa o sentimento de todas as pessoas com deficiência.

            Mas quero falar sobre o evento de hoje, que foi um evento muito bonito. Além da presença de vários parlamentares, nós tivemos técnicos, especialistas e, fundamentalmente, mães, pais, crianças e adultos Down. Depoimentos belíssimos! A apresentadora do evento foi uma carioca, a Fernanda, que se autointitula a primeira repórter Down do mundo.

            Ontem, estive no Rio também, fui convocado pela RJDown, em uma marcha que fizemos, a partir das 15 horas, na praia de Ipanema. Uma marcha organizada pela RJDown, em relação ao dia 21. E foi muito bacana vermos a participação e exemplos de jovens e de pessoas que se superam.

            Hoje, estava presente nesse evento de comemoração a Eliane, daqui de Brasília, que virou minha amiga, que trabalha no STJ e tem vários livros publicados.

            Também ontem, no Rio de Janeiro, estávamos com o Breno, que está assumindo a liderança, porque tem um processo muito interessante hoje. Há a Federação Brasileira de Síndrome de Down. Só que eles têm dito: “Nós não precisamos que nos representem. Nós temos condições de falar dos nossos problemas, da nossa luta”. E o Breno, no Rio de Janeiro, é uma liderança. Quantos discursos o Breno fez na caminhada, na marcha de ontem!

            Então, a luta de todos nós é pela autonomia. E víamos no exemplo do Breno, em seus discursos, para nós que participávamos daquilo, para todos os pais, para todas as mães, como era bacana ver ele dizendo que viajava sozinho pelo mundo inteiro, morava só, conseguia tocar sua vida.

            Então, a luta dos pais e das mães hoje, centralmente hoje, é por isto: para que seus filhos tenham autonomia. Muitos veem de fora a Síndrome de Down, como uma coisa distante, uma coisa... Como se as famílias tivessem um problema em casa. Eu quero dizer uma coisa aqui, e eu falei isso hoje lá: todos os pais e todas as mães de crianças, de adultos com Down são completamente apaixonados, não queriam que o filho fosse diferente nem uma vírgula. O amor é tão grande, são figuras tão extraordinárias, que ensinam tanto e tanto! Eu sinto que há muito isso. As pessoas olham como se ali tivesse um grande fardo, um grande problema, e não é nada disso. É o contrário. Quem estava lá hoje via que os pais não estavam lá para reclamar. É claro que muitas coisas precisam ser conquistadas. Mas era uma festa, era um ato de amor, de dedicação.

            Como falou o Senador Wellington da filha dele, da Danielle, que tem autismo, são tantas batalhas no dia a dia, são tantas as conquistas: é o sentar, é o primeiro passo para engatinhar, é uma coisa que aproxima de uma forma tão intensa!

            Então, o primeiro ponto que eu queria ressaltar aqui, Senador Randolfe, é com relação à situação em que, quando trocamos experiências com outros pais e outras mães, vemos que os pais e as mães mais babões do mundo são os pais e as mães de uma criança com Down.

            Agora, qual é a nossa maior preocupação? São muitas as lutas, mas qual a maior preocupação? É a luta contra o preconceito. V. Exª sabe, e hoje, em vários depoimentos, o Dr. Zan falava, que, há vinte, trinta anos, a política com a população Down era de confinamento, de esconder, deixar fora, exclusão total. Agora, não. Por isso que esses eventos são muito importantes. Eu achei muito bacana quando Romário trouxe a filha dele e mostrou. Não há vergonha. Muito pelo contrário, há orgulho dos seus filhos. Então, ocupar esse espaço é muito importante.

            Agora, é um momento novo, porque é o momento da inclusão. Neste País, a exclusão era total. Está havendo e vai haver mais, e nós temos que brigar, cada vez mais, pela inclusão na rede regular de ensino. Temos que ocupar esse espaço. E é claro que tudo isso nos leva às preocupações. Cada conversa que tenho com mãe, com pai, eu sei da angústia que é. E eu já fico pensando no futuro. Sua criança, seu filho, com 4 anos, entrando na escola, como vai ser tratado pelas outras crianças, se vai haver bullying, como é que as crianças vão encarar aquilo.

            Então, vejo que esse trabalho de conscientização da sociedade, dos pais e das crianças é fundamental. Pensar no acolhimento.

            Eu conversava agora com a mãe do Lúcio, um artista plástico de 15 anos, aqui de Brasília, fantástico! Quem puder ir ver a exposição dele, está na Câmara dos Deputados. Não só dele, vi do Tonico, vi do Henrique... V. Exª precisa ver. E a mãe do Lúcio dizia: “Lindbergh, fica tranquilo. O Lúcio está cheio de amigos na escola. Criou um grupo de relacionamento fantástico na escola”. Mas este é o aperto no coração de todos nós: é ver como nossos filhos podem ser bem recebidos naquele ambiente escolar.

            E, hoje, também, o tempo todo - eu, sentado junto ao Romário -, nós falávamos que o fundamental na criança com Down é o estímulo. É você poder fazer uma boa fisioterapia, frequentar fonoaudiólogo, ficar ali em cima, dia a dia. Mas e as crianças que não têm acesso a isso? Pessoas chegam a falar: “Há vários graus de Síndrome de Down”. Não, não há graus de diferenciação na Síndrome de Down. É tudo a mesma coisa. A diferença que observamos é em razão do estímulo. Do estímulo. A grande discussão é como democratizar o acesso a todos dessas possibilidades, que não estão ligadas só à fisioterapia e à fonoaudiologia, estão ligadas à saúde. Cinquenta por cento dos Downs que nascem têm problemas cardíacos. Graças a Deus, minha filha não teve, Senador Randolfe! É um aperto na hora, mas esse ainda é um problema que causa muitas mortes. E não ter uma cirurgia cardíaca quando é necessário ter faz muita falta. E morrem os filhos das pessoas mais pobres, que não moram nos grandes centros urbanos.

            E há uma série de questões ligadas à saúde. As pessoas com Down têm hipotonia, não possuem os músculos tão rijos, e isso tem decorrências; há problemas auditivos; devem ser tomados alguns cuidados em relação à alimentação.

            Participei, com a Federação de Down, de um encontro com o Ministro Padilha. E a preocupação da Federação e do Dr. Dennis, um pediatra fantástico de Brasília, é a de criar um protocolo que fale de um procedimento nacional, porque alguns médicos, alguns pediatras sabem o que deve ser feito, mas é muito difícil. Grande parte dos médicos, dos pediatras, não conhece as especificidades, os cuidados que devem ser tomados.

            Sabemos que houve um aumento fantástico da expectativa de vida da população Down no último período. Há dez, vinte anos, morria-se com vinte e poucos anos de idades; hoje, estamos acima de 40, 42 anos. Com tratamento adequado, com alguns cuidados, com preocupação com o envelhecimento, alimentação antioxidante, chega-se a 60. O último Down que morreu mais velho no País foi com 79 anos. Hoje, há um com 74, e conheço vários acima de 60. Mas precisamos seguir esse protocolo, seguir um conjunto de ações que os melhores especialistas do País já sabem, mas que não estão amplamente divulgadas. Essa é uma luta, com o Ministro da Saúde, para que seja criado e disseminado esse protocolo para cada cidade deste País. Se a criança nasceu com Down, estão presentes as características, vamos fazer primeiro o exame cardíaco e uma série de procedimentos. Isso é muito importante.

            Em outras batalhas, a inclusão no mercado de trabalho. A preocupação das mães sabe qual é, Senador Randolfe? Hoje, no Brasil, há uma pensão quando os pais morrem, e quem entra no mercado de trabalho perde essa pensão. Temos de resolver isso. Temos de ajudar na inclusão, dissociar essa pensão do trabalho.

            Há uma série de coisas. Não quero alongar-me muito, mas há uma série de coisas que temos de fazer.

            Fiz o requerimento para criação de uma comissão especial para tratar do tema nesta Casa, para aperfeiçoar a legislação; na verdade, para regulamentar a convenção da ONU que está na nossa Constituição. O que queremos fazer nessa regulamentação? Dar efetividade, porque as leis têm de ser cumpridas; se não forem cumpridas, têm de haver sanção e formas de fazer valer aquilo que está lá.

            Estive com o Presidente Sarney, pedindo a criação dessa comissão, e encontrei nele um grande aliado, Senador Randolfe. Ele tem sua história pessoal. O Presidente Sarney, como Presidente da República, teve um papel muito importante na primeira legislação séria e consequente do Brasil sobre o tema. Deu-me todo o apoio, toda a força.

            Então, veja bem, vamos ter uma comissão especial neste Senado para regulamentar a convenção da ONU. Mas é pouco, o problema não é só legislação. O problema é muito mais fazer cumprir. Eu, com todas as minhas falas aqui, neste Senado, continuo com essa preocupação no dia a dia. Sempre falo que temos de aproximar este Senado da vida real, dos problemas do povo. E temos de tentar fazer as coisas andarem, acontecerem aqui.

            Fico muito preocupado, porque, às vezes, temos debates aqui estratosféricos, situação e oposição, e o povo que está do outro lado vê: “o que eles estão fazendo pela nossa vida, por nós, que temos enormes problemas a enfrentar no dia a dia?”.

            Tenho uma preocupação, Senador Randolfe. Digo que mais importante do que o aperfeiçoamento da legislação tem de ser a nossa briga nessa área pelo fazer cumprir, pelo ajudar a resolver. Queremos aqui fazer uma espécie de câmara de conciliação. Se as pessoas com deficiência auditiva reclamam do problema de prótese, temos de chamar o Ministro da Saúde e dizer: “Ministro, o que está acontecendo? Fale um prazo. Como pode ser feito?”.

            Então, esse é meu desejo. Eu conversava muito com Romário e estou confiante de que agora vai ser diferente, que vamos chamar a atenção do País para esse tema. O último censo afirma que 14% da população brasileira é de pessoas com deficiência, com algum tipo de deficiência - 14% da população brasileira. Mas é um tema proibido; infelizmente, é um tema que a imprensa não pauta; é um tema de que alguns se esquivam; é um tema tão importante, mas que está fora da agenda nacional, não se fala nisso.

            Então, falo sempre: aqui, temos um objetivo que é o de aperfeiçoar a legislação, o de fazer cumprir, mas acho que vamos ter de fazer um pouco como no passado, quando éramos líderes estudantis - eu falava isso hoje com Romário -, vamos ter de ajudar a criar um movimento, fazer seminários, ir aos Estados, porque sei que, se fizermos uma marcha das pessoas com deficiência neste País, daí não haverá jeito: vamos impor nossa pauta para todo mundo, para o Governo Federal, para os governos estaduais, para os governos municipais. Então, acho que temos de chamar a atenção desse tema com muita força.

            Senador Randolfe, bem aqui, nesta Casa, há um projeto muitíssimo importante, do Deputado Leonardo Mattos, que está nesta Casa, o PLC nº 40, de 2010, que fala de uma aposentadoria especial para a pessoa com deficiência. Não dá! Vamos falar sério: como falarmos em aposentadoria hoje para uma pessoa que tem Síndrome de Down se a expectativa de vida média é de 42 anos? Como falar de aposentadoria dessa forma?

            É um projeto fundamental, importantíssimo, que está nesta Casa, e vamos dar o nosso sangue e o nosso suor para que ele aprovado. O Governo diz que há uma brecha nesse projeto, porque ele não deixa claras as áreas de deficiência, o grau de deficiência para se ter direito a determinado tipo de aposentadoria. Mas isso se resolve na regulamentação. Devo dizer aqui, em alto e bom som, que não abrimos mão de que esse projeto seja aprovado por esta Casa, por este Senado. Inclusive, vou apresentar um requerimento para que ele venha à pauta. Ele já está, há algum tempo, na Mesa, parado. Nós vamos apresentar um requerimento para que o projeto venha à Casa.

            Senador Randolfe, encerro minha fala, neste dia que para mim foi muito emocionante. Hoje, foi muito bacana ter estado na Câmara dos Deputados. Estou confiante nesse trabalho: nós vamos para cima, vamos tentar ajudar tanta gente! São tantas mães guerreiras por este País afora, lutando, fazendo de tudo, com problemas enormes, com dificuldades de locomoção, mas fazendo tudo pelos seus filhos. Temos de entrar em campo, para ajudar. Aliás, não é ajudar, porque esse é um direito dessas pessoas.

            Falei hoje que o Romário será um grande Deputado, porque acho que ele está com uma boa causa no coração. E há uma coisa: o Romário foi um herói popular neste País, como jogador de futebol, ele pode ajudar muito nesta nossa causa de mobilizar as pessoas. Hoje, fiquei encantado: já existe uma identidade. São pessoas que não nos conhecem, Senador Randolfe. São pessoas que não me conhecem, que não conhecem o senhor, porque não estão ligadas na política; que não sabem o nome de nenhum Senador, de ninguém. Mas como ligaram o Romário à causa delas!

            Ontem, foi bacana, engraçada a nossa passeata. As famílias todas na passeata. A minha Beatriz esteve lá. Foi uma caminhada linda. Vejo como há crianças estimuladas, espertas, magras - um dos problemas é a luta contra a obesidade também, por várias questões. E achei interessante, porque a Fernanda, a repórter Down, que hoje apresentou - veja o que significa o Romário nisso -, ela ontem disse: “Inclusão, sim. Contra o preconceito. Agora, nós podemos, porque Romário está do nosso lado”.

            Achei muito bacana, o Romário é um símbolo. E nós temos de tratar essa liderança, esse espaço dele no meio do povo, com muito carinho. O Romário pode dar-nos uma grande contribuição. Quero parabenizá-los muito - ele, sua esposa e sua filha - por terem assumido isso, por terem abraçado essa causa. Vamos conseguir fazer aqui um belo trabalho, Senador Randolfe.

            Hoje, foi um dia muito emocionante, e acabo de citar que está neste plenário meu tio Leidson, da Paraíba, com meu primo paraibano, o Taney, de Campina Grande. São figuras muito especiais. É o irmão do meu pai, que faleceu em 1996 e que foi uma pessoa importantíssima na minha vida. Quero só dizer que a presença do meu tio Leidson é o coroamento final deste dia repleto de emoções, mas que, amanhã, voltamos para a luta, para a batalha, fazendo aqui os nossos discursos duros.

            Muito obrigado, Senador Randolfe.


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Este texto não substitui o publicado no DSF de 22/03/2011 - Página 7674