Discurso durante a 33ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Considerações sobre a divulgação do Índice Geral de Cursos, que trata da qualidade dos cursos de graduação e pós-graduação, pedindo maior atenção do Ministério da Educação para assegurar a qualidade das instituições de educação superior do País.

Autor
Mozarildo Cavalcanti (PTB - Partido Trabalhista Brasileiro/RR)
Nome completo: Francisco Mozarildo de Melo Cavalcanti
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
ENSINO SUPERIOR. ESTADO DE RORAIMA (RR), GOVERNO ESTADUAL.:
  • Considerações sobre a divulgação do Índice Geral de Cursos, que trata da qualidade dos cursos de graduação e pós-graduação, pedindo maior atenção do Ministério da Educação para assegurar a qualidade das instituições de educação superior do País.
Publicação
Publicação no DSF de 23/03/2011 - Página 7688
Assunto
Outros > ENSINO SUPERIOR. ESTADO DE RORAIMA (RR), GOVERNO ESTADUAL.
Indexação
  • REGISTRO, PESQUISA, MINISTERIO DA EDUCAÇÃO (MEC), QUALIDADE, CURSOS, ENSINO SUPERIOR, APREENSÃO, RESULTADO, SUPERIORIDADE, QUANTIDADE, UNIVERSIDADE, SETOR PRIVADO, SETOR PUBLICO, REPROVAÇÃO POR AVALIAÇÃO.
  • CRITICA, FALTA, INFRAESTRUTURA, UNIVERSIDADE ESTADUAL, ESTADO DE RORAIMA (RR), DENUNCIA, NEGLIGENCIA, INVESTIMENTO PUBLICO, GOVERNO ESTADUAL.

                          SENADO FEDERAL SF -

            SECRETARIA-GERAL DA MESA

            SUBSECRETARIA DE TAQUIGRAFIA 


            O SR. MOZARILDO CAVALCANTI (PTB - RR. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente Acir, é uma honra falar tendo V. Exª presidindo a sessão, já que somos da Amazônia, V. Exª de Rondônia e eu, de Roraima.

            Eu quero hoje abordar, Sr. Presidente, um tema que sei que é caro a toda a população brasileira. Todo mundo, todo pai de família, todo jovem se preocupa com ele, que é justamente a educação. A divulgação do Índice Geral de Cursos, o chamado IGC, pelo Ministério da Educação, acontecido em meados de janeiro deste ano, traz à baila, novamente, o tema da qualidade da educação oferecida ao brasileiro.

            Nesse caso específico, trata-se da avaliação das instituições que oferecem ensino de nível superior, englobando universidades, centros universitários e faculdades de todo o País, tanto do setor público quanto do setor privado.

            Existe aqui a preocupação do Ministério da Educação em avaliar não apenas os cursos que as instituições oferecem, mas as entidades como um todo: cursos, docentes, projeto pedagógico e infraestrutura.

            É desnecessário entrar, neste momento, nas polêmicas em torno da metodologia utilizada. Lógico que há boas faculdades que reclamam da metodologia, porque no final foram mal avaliadas. Qualquer que seja a metodologia escolhida, existem instituições que podem aparecer fora da posição a que se atribuem, merecida ou imerecidamente. Entretanto, como um indicador nacional, o IGC tem credibilidade por nos apontar tendências de longo prazo.

            Lembramos, ademais, que a metodologia de cálculo inclui dados dos últimos três anos de acompanhamento, de forma que a última divulgação diz respeito ao ano base de 2009, com dados agregados de 2009, 2008 e 2007.

            Logo de cara, é de assustar a informação de que o MEC reprovou, por assim dizer, 699 instituições de ensino superior, correspondentes a 39% do total de entidades avaliadas.

            O número é maior que as 588 instituições de ensino superior mal avaliadas no ano de 2008.

            Sabendo do esforço que o Governo Federal tem feito para expansão do ensino superior, inclusive com a criação do Programa Universidade para Todos, o ProUni, preocupa-nos a possibilidade de as bolsas estarem ajudando a sustentar significativa quantidade de faculdades de qualidade duvidosa. Isso é uma coisa perigosíssima para o jovem e para o futuro, porque o jovem entra para uma universidade crente que terá um bom curso e, ao final, conclui um curso superior de péssima qualidade, o que, portanto, vai ter desdobramento amanhã, na oportunidade de trabalho e no exercício da sua profissão.

            O MEC anunciou, de imediato, a punição de quatro universidades e onze centros universitários que receberam baixa avaliação nos últimos três anos, que passarão a ser inspecionados de forma mais minuciosa e estão arriscadas até mesmo a perder seu registro ou serem rebaixadas de categoria, caso não cumpram as determinações de correção em tempo hábil. Entretanto, o Ministério não tem demonstrado muita força para conseguir o fechamento definitivo nem de cursos nem de instituições, a julgar pelas reiteradas vezes que determinados nomes vêm sendo citados como sinônimos de mau ensino nos últimos anos.

            Houve um discreto aumento na quantidade de matrículas em cursos superiores, que passou de pouco mais de 5,1 milhões de estudantes em cursos presenciais.

            Segundo análises técnicas realizadas por consultoria legislativa do Senado, a meu pedido, por exemplo, o meu Estado de Roraima tem uma situação aparentemente privilegiada em relação ao resto do Brasil. Os estudantes universitários representam 2,58% da população brasileira - 2,58% -, enquanto em Roraima chega a 3,92% da população do Estado. Isso se deve tanto a características demográficas específicas - no meu Estado, 60% da população está concentrada em Boa Vista, capital, onde está a maior parte da oferta de vagas - como também ao crescimento das vagas oferecidas pelo Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia, que sucedeu, em linha direta, a antiga Escola Técnica Federal, bem como também a oferta da Universidade Federal de Roraima.

            Portanto, é evidente que, em um Estado com pouca população, com muita oferta de vagas, nós tenhamos uma situação privilegiada. Mas, por exemplo, eu não posso dizer a mesma coisa com relação à Universidade Estadual, que foi criada com o objetivo, pelo ex-Governador Ottomar, de interiorizar o ensino. No entanto, além de não interiorizar adequadamente, Senador Mário Couto, tenho recebido reiteradas reclamações de alunos e professores sobre as péssimas condições em que se encontram tanto o professor para dar aula, as estruturas físicas, quanto a questão dos laboratórios, equipamentos e bibliotecas.

            Então, a Universidade Estadual de Roraima precisa ser olhada pelo MEC, porque não podemos também, como eu disse, fazer de conta que estamos formando bons profissionais e, amanhã, essas pessoas serem vítimas disso.

            Nos cursos de bacharelado, incluindo Medicina e Engenharias, existem, no Brasil, 3,5 alunos nas instituições privadas - vejam bem, 3,5 alunos - para cada aluno ocupando vaga pública. Quer dizer, as instituições privadas oferecem quase quatro vezes mais vagas do que as instituições públicas. Então, é uma inversão de realidade, porque o que deveria acontecer era o Governo, tanto o Federal, o Estadual, quanto o Municipal, oferecer maior oportunidade de estudo, apesar desse contorno feito pelo ProUni.

            Já em Roraima, essa proporção cai para aproximadamente 1,7 aluno na instituição privada para 1 na pública, porque temos 3 instituições públicas no meu Estado: a Universidade Federal, o Ifet e também a Universidade Estadual, apesar dos seus percalços.

            Nos cursos de licenciatura no Brasil, a proporção é aproximadamente igual entre alunos de instituições privadas e públicas, enquanto, em Roraima, encontramos 3,4 alunos em vagas públicas para cada 1 em faculdade privada. A educação superior roraimense, portanto, tem, provavelmente, uma das maiores presenças de investimento público em todo o País, mas, quero deixar claro, investimento feito pelo Governo Federal, na Universidade Federal e no Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia, porque, a Universidade Estadual, ao contrário, está sendo sucateada, pois o Governo do Estado não tem investido na Universidade. Então, é importante que o MEC esteja atento a isso, porque senão quem vai ser vítima é o Estado, mas, principalmente, os jovens que lá se formam.

            Ao analisarmos a proporção de entradas no nível superior em relação aos concluintes do ensino médio do ano anterior, o que representaria uma espécie de índice de democratização do acesso, concluiremos que Roraima também aparece com bons indicadores. No nível nacional, esse número é de 78,2%, sendo 17,1% em vagas públicas. Isso também é alarmante; é impressionante que isso aconteça. No meu Estado, seriam 78,6%, mas com 36% em vagas públicas. Portanto, existe muito mais oferta de vaga pública do que a média do Brasil, porque é verdade que, apesar do esforço, nos últimos anos, de abrir mais faculdades, de abrir institutos de educação tecnológica, realmente, a proliferação de instituições privadas tem sido muito grande no País.

            Porém, uma análise mais acurada revela uma situação não tanto favorável. Se considerarmos apenas os concluintes de ensino médio regular, a quantidade total de concluintes, 3.784, é inferior ao ingresso no nível superior, que chega aos 4.820, dos quais 2.261 em vagas ofertadas por entidades públicas. Isso não mostra um atendimento à demanda reprimida. É mais provável que quase um quinto das vagas pode estar sendo ocupado por alunos egressos de outras unidades da Federação - isso no caso do meu Estado. Quer dizer, então, que quem conclui o ensino médio não está tendo a mesma proporção de ingresso no curso superior. Isso deve se repetir pelo Brasil afora. É importante que estejamos atentos a esses fatos, porque a questão da universidade reflete muito bem a questão do ensino fundamental, do ensino médio.

            Se considerarmos a proporção de concluintes em relação à população total, que, no Brasil, representa 0,43% - veja que insignificância! -, encontraremos em Roraima a situação pior, abaixo da média nacional. A situação se inverte. Quer dizer, quem conclui o curso está em menor quantidade do que os egressos, significando que temos problemas de produtividade no ensino superior.

            Nos indicadores de qualidade atualizados do Sistema Nacional de Avaliação da Educação, que geram conceitos na faixa entre um e cinco pontos, as maiores entidades públicas avaliadas apresentaram média entre 2,4 - a Universidade federal e o Instituto federal - e 1,8 - a Universidade estadual, respectivamente. Esses valores caracterizam entidades oscilando entre regulares - as federais - e fracas - a estadual, no caso específico do Estado de Roraima. Repito, portanto: lamento que a Universidade estadual, que foi criada com o objetivo de complementar a atuação da federal, esteja nesse quadro.

            Esse último indicador nos dá uma ideia aproximada da qualidade do aluno egresso do ensino superior, ou seja, do profissional que estamos colocando no mercado de trabalho, Senador Mário Couto. Esta é a grande preocupação que nós devemos ter: que jovens nós estamos colocando no mercado de trabalho? E o que é pior: quem sofre mais com isso? O jovem que vai ter dificuldade na atuação, vai ter dificuldade em conquistar espaço e destaque.

            Continuamos a ter distorções fortes no ensino superior em nosso País. A mercantilização do ensino, que aparece na forma do crescimento desordenado da quantidade de cursos e instituições, deve ser observada por um acompanhamento cada vez mais criterioso, que leve em conta essa questão da qualidade e não da quantidade.

            Não adianta termos oportunidade de ingresso nas universidades e não termos qualidade na saída dessas universidades - durante e principalmente na saída. Imagine o risco que está correndo um brasileiro que contrata, por exemplo, um profissional de saúde ou de engenharia recém-egresso de uma instituição que não consegue, por anos a fio, sair da faixa inferior dessa avaliação.

            Em educação, assim como na saúde, Senador Acir, não podemos sacrificar qualidade para mostrar números bonitos nas estatísticas internacionais - que, aliás, são péssimas para o Brasil. O Brasil está bem atrás e não aparece entre as mais de cem universidades avaliadas nos países emergentes. Isso é muito ruim. Também é ilusão acreditar que o mercado sozinho consegue separar o joio do trigo, os profissionais de boa formação daqueles que só têm um papel colorido, que dizem que em qualquer momento frequentaram o curso superior.

            A ação do MEC deve ser enérgica. Quem sabe não seria interessante uma agência - já que há tantas agências no Brasil - para cuidar da qualidade da educação? O mais grave é saber que o estudante de recursos menores, egresso majoritariamente do ensino básico público, é a principal vítima.

            Em relação ao meu Estado de Roraima, cabe aqui uma cobrança mais intensa por parte das autoridades federais, já que o investimento na educação também é constitucional, no sentido de melhorar a qualidade e a diversidade do ensino básico ofertado, responsabilidade dos Estados e dos Municípios.

            É um grande desafio dar educação de qualidade a um contingente populacional ainda marcado por migrantes atraídos por trabalhos de baixa qualificação, como agropecuária e garimpo, e por forte presença de tradição indígena, que não valoriza necessariamente a educação formal.

            Estou falando do meu Estado, mas pode se aplicar a muitos Estados da Amazônia, como o seu.

            Se não formos capazes, em nosso Estado, de fazer frente a esse desafio, não vamos aproveitar a situação privilegiada que temos hoje em relação a vagas gratuitas no ensino superior. As vagas nos cursos mais nobres das entidades públicas continuarão a beneficiar apenas estudantes de famílias de maior poder aquisitivo, que sequer, amanhã, fixarão residência no Estado depois de formados.

            Mais atenção à qualidade do ensino em nosso País, seja básico, seja superior, é uma tarefa da qual jamais poderíamos descuidar.

            Senador Acir, quero somente fazer algumas considerações finais. Sou professor concursado pela Universidade Federal de Roraima. Estou licenciado para exercer o mandato de Senador, sou médico de formação. Duas coisas me preocupam. Eu sempre disse aos meus filhos que eles não pensassem em economizar com saúde, educação e alimentação. Agora, não viessem com preocupação de se vestirem bem ou de estarem bonitinhos, porque isso não levava ninguém para frente. E acho que é isto que toda a família brasileira quer: que o filho tenha educação, que filho tenha saúde, e, para ter saúde, precisa ter uma boa alimentação. Se o filho tiver saúde, boa alimentação, mas se não tiver boa educação, qual será o futuro desta geração que está hoje nos bancos escolares, tanto no ensino fundamental quanto no médio, e, pior, no ensino superior? Aí, realmente, é caso de ficarmos preocupadíssimos com esses jovens e com o futuro do nosso País, porque o futuro do nosso País está na mão desses jovens que estão nos bancos escolares das universidades.

            Quero, portanto, deixar este registro e dizer mesmo que, se nós não cuidarmos da educação neste País como prioridade, junto com a saúde, a alimentação e a segurança - este País que, segundo o Presidente Obama, não é mais o País do futuro, mas do presente -, eu acho que o nosso futuro não terá muita vantagem em relação ao que somos hoje.

            Não sou pessimista, pelo contrário, até como médico aprendi a não achar que alguém muito mal já está desenganado. Eu acho sempre que há, sim, remédios, há, sim, procedimentos. E basta que o Governo queira.

            Tenho certeza de que a Presidente Dilma vai dar prioridade à educação neste País, como ela já frisou. Aliás, o primeiro pronunciamento que ela fez à Nação enfatizava a educação.

            Esse é o caminho. Nenhum país se ergueu ou se soergueu, como é o caso de tantos países que foram vítimas na segunda Guerra Mundial, sem investir pesadamente na educação, mas na educação de qualidade. Não adianta formar gente com má qualificação.


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Este texto não substitui o publicado no DSF de 23/03/2011 - Página 7688