Discurso durante a 33ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Comentários sobre entrevista concedida à revista Veja, em sua versão eletrônica, pelo ex-Governador do Distrito Federal José Roberto Arruda.

Autor
Randolfe Rodrigues (PSOL - Partido Socialismo e Liberdade/AP)
Nome completo: Randolph Frederich Rodrigues Alves
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
GOVERNO DO DISTRITO FEDERAL (GDF). REFORMA POLITICA.:
  • Comentários sobre entrevista concedida à revista Veja, em sua versão eletrônica, pelo ex-Governador do Distrito Federal José Roberto Arruda.
Publicação
Publicação no DSF de 23/03/2011 - Página 7707
Assunto
Outros > GOVERNO DO DISTRITO FEDERAL (GDF). REFORMA POLITICA.
Indexação
  • REGISTRO, ARTIGO DE IMPRENSA, PERIODICO, VEJA, ESTADO DE SÃO PAULO (SP), ENTREVISTA, JOSE ROBERTO ARRUDA, EX GOVERNADOR, DISTRITO FEDERAL (DF).
  • ANUNCIO, LANÇAMENTO, GRUPO PARLAMENTAR, PARTICIPAÇÃO, POPULAÇÃO, REFORMA POLITICA, PROPOSTA, GRUPO, APOIO, COMISSÃO, SENADO, CAMARA DOS DEPUTADOS.
  • NECESSIDADE, PROIBIÇÃO, INICIATIVA PRIVADA, FINANCIAMENTO, CAMPANHA ELEITORAL, COMBATE, CORRUPÇÃO, FAVORECIMENTO, INTERESSE, EMPRESARIO.

                          SENADO FEDERAL SF -

            SECRETARIA-GERAL DA MESA

            SUBSECRETARIA DE TAQUIGRAFIA 


            O SR. RANDOLFE RODRIGUES (PSOL - AP. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, a revista Veja publicou, na semana passada, na sua versão eletrônica, uma entrevista com o ex-senador e ex-governador daqui do Distrito Federal, José Roberto Arruda.

            Segundo a própria revista e vários articulistas, a entrevista teria sido concedida em meados do ano passado, antes do processo eleitoral.

            Essa é a primeira observação que faço aqui da tribuna. Por que uma entrevista concedida em setembro do ano passado só foi veiculada agora, após o processo eleitoral? Quais as razões que levaram a revista a veicular tão fortes revelações, tão fortes depoimentos por parte do Sr. José Roberto Arruda somente agora?

            Além disso - e creio que esse não é o ponto central -, o que me chama a atenção são aspectos da declaração do ex-governador. E mais do que a questão da credibilidade do depoente, credibilidade esta questionável pelos notórios acontecimentos, que são do conhecimento de toda a sociedade brasileira, há um aspecto do depoimento do Sr. José Roberto Arruda que chama particular atenção. Em um trecho, o entrevistado diz textualmente:

Infelizmente, joguei o jogo da política brasileira. As empresas e os lobistas ajudam nas campanhas para terem retorno por meio de facilidades na obtenção de contratos com o governo ou outros negócios vantajosos. Ninguém se elege pela força de suas ideias, mas pelo tamanho do bolso. [grifo esta parte.] É preciso de muito dinheiro para aparecer bem no programa de TV. E as campanhas se reduziram a isso.

            Devo reconhecer que essa declaração que acabo de ler, do Sr. Arruda, tem um poder de síntese sobre a lamentável podridão do modelo privado do financiamento de campanha. As campanhas custam muito, especialmente os programas de televisão, que, de gratuito, só possuem a veiculação. Os candidatos vão atrás de financiamento privado. Os empresários (ou seus representantes) decidem em que políticos e partidos desejam investir.

            O termo “investir” é utilizado neste pronunciamento de maneira proposital. O que ocorre não são apoios eleitorais, ou seja, não existem manifestações desinteressadas de apoio financeiro, pelo contrário, para o empresariado, o repasse de recursos na campanha eleitoral representa uma oportunidade de investimento e, como em todo bom investimento, são calculadas as taxas de retorno, a lucratividade do empreendimento e a margem de risco.

            Pode ser que o retorno seja dentro da legislação, por exemplo, tendo parlamentares que defendam os interesses econômicos dos financiadores. Mesmo dentro da legislação, não havendo fraude em processo licitatório, esses compromissos quase nunca são esclarecidos para os eleitores.

            Mas a entrevista do Sr. Arruda, Sr. Presidente, Srªs Senadoras e Srs. Senadores, aponta também para uma outra postura que seria majoritária nesse tipo de financiamento. As empresas querem favores governamentais. E uma relação de favor sempre está vinculada a tratamento diferenciado, que prejudicará o preceito constitucional da transparência na escolha de fornecedores, por exemplo, no direcionamento de licitações, em fraudes e em outros delitos.

            Certamente esta é a dança vigente em nosso baile político, e é por isso que chegou a hora de mudarmos a música desse baile.

            Essa entrevista deve servir, e reitero, embora questionada a credibilidade do denunciante - o primeiro governador preso da história desta República -, dessa entrevista devemos tomar ensinamentos. Ela deve servir para uma profunda reflexão para que todos nós, Senadoras e Senadores, mais especialmente aqueles encarregados de discutir a reforma política, aqui nesta Casa e também na Câmara dos Deputados, reflitamos sobre o peso das declarações dadas.

            Não é possível aceitar que se continue tendo como pressuposto para a disputa eleitoral o financiamento privado de campanha. Temos uma posição clara sobre isso: é necessário financiamento público de campanha, combinado com maior rigor na punição dos crimes do caixa dois em nosso País.

            O que leva um político a burlar a lei e aceitar recursos ilegais em troca de favores ao financiador, também ilegais? A vontade de cometer um crime é proporcional à expectativa de que o mesmo não será descoberto. Temos, então, um círculo vicioso: a impunidade, que leva ao cometimento do crime; o cometimento do crime, que leva à alimentação do sistema privado de financiamento das eleições; e o sistema privado, que leva aos delitos dos parlamentares, dos políticos, no exercício de seus mandatos.

            É necessário, portanto, de imediato, proibir o financiamento privado de campanha, tornando tal prática crime. Mais do que isso: é necessário que o financiador perceba que terá enormes prejuízos caso insista no aliciamento político. E que o político saiba que perderá seus direitos de disputar eleições com a mais absoluta certeza.

            Tivemos e temos avanços na nossa legislação no sentido de dar cabo a um princípio que considero central, constante no nosso Texto Constitucional. Diz lá, no art. 14 da Constituição, no seu §9º, da necessidade de os candidatos cumprirem condições de probidade.

            Aliás, Sr. Presidente, Srªs Senadoras, Srs. Senadores, probidade é um pré-requisito básico, inclusive expresso na própria condição de candidato. Candidato é uma palavra que vem do latim: candido, que, para os romanos antigos, era aquele que é limpo, aquele que é puro. Portanto, a própria definição de candidato implica dizer que ele, por excelência, necessita ter como pré-requisito um passado puro, um passado limpo.

            Certamente, essa não tem sido a lógica do nosso sistema político, e isso é o mais importante do que foi revelado pelo ex-governador Arruda. E é verdade que esse fato seja esclarecido, que as verdades desse fato apareçam, porque eu reitero: eu reputo que pessoas de bem foram atingidas, inclusive no depoimento desse senhor. E é por isso que consideramos fundamental o esclarecimento do que ele disse. Mas, tão importante quanto isso ou mais importante é que nós modifiquemos as estruturas do nosso sistema político.

            A entrevista do Sr. José Roberto Arruda é esclarecedora, ela é didática, ela deve servir para nós como ensinamento, como aula de que o sistema privado de eleições não deve perdurar, não deve persistir. Nós temos, na Comissão de Reforma Política aqui do Senado e na Comissão de Reforma Política da Câmara, que aprovar com urgência a instituição do financiamento público de campanha.

            Amanhã, nós daremos um passo importante nesse sentido. Nós teremos, no Auditório Nereu Ramos, da Câmara dos Deputados, às 14h, o lançamento da Frente Parlamentar pela Reforma Política com Participação Popular.

            Nesta semana, Senador Rodrigo Rollemberg, um dos companheiros que tenho a honra de ter comigo na Frente Parlamentar tão bem dirigida pela Deputada Luiza Erundina... O interessante, Senador Rodrigo, é que se trata de uma Frente composta não somente por parlamentares; lá estão as entidades da sociedade civil. E é por isso que ela refletirá e buscará mobilizar a sociedade civil para interferir nos debates que estão ocorrendo aqui nesta Casa, que estão ocorrendo na Câmara dos Deputados em relação à Reforma Política. E é por isso que tenho convicção - e já disse aqui anteriormente - de que uma Reforma Política sem a participação do povo e sem ampliar os instrumentos do protagonismo popular não trará nada de novo.

            Então, amanhã, teremos o lançamento da Frente Parlamentar por uma Reforma Política com Participação Popular.

            Já convidamos o Sr. Presidente do Congresso Nacional e do Senado, Senador José Sarney, para estar presente amanhã. Fizemos o convite, na semana passada, também ao Deputado Marco Maia para que se fizesse presente.

            A ideia dessa Frente não é a de que ela atrapalhe as comissões já instaladas no Senado e na Câmara. Ao contrário, eu diria que ela caminhará junto e trará para cá o clamor das necessidades do povo e o que povo brasileiro espera concretamente da Reforma Política.

            Compreendo - e, mais uma vez, digo que a entrevista veiculada na edição eletrônica da Veja do último final de semana, é didática - que precisamos no sistema político brasileiro de uma reforma estrutural, a reforma de suas instituições; precisamos, entre outras medidas, adotar o financiamento exclusivamente público de campanha, instituir a pluralidade político-partidária, ampliar os mecanismos de protagonismo popular, manter e sustentar a fidelidade partidária, diminuir a exigência de projetos de lei de iniciativa popular que tramitem nesta Casa e na Câmara dos Deputados; que esta Casa seja mais suscetível e acessível à vontade emanada das ruas por projetos de iniciativa popular, como os que já foram aprovados aqui no Congresso Nacional: a Lei nº 9.084 e a Lei Complementar nº 135, de 2010, que são iniciativas que provam que reformas das instituições políticas ocorrem quando essas reformas emanam da vontade do povo.

            Portanto, nesse sentido, considero central que a Reforma Política também, volto a dizer isso, inclua outros mecanismos de modificação das estruturas políticas brasileiras.

            Assinei, junto com o Senador Eduardo Suplicy, um requerimento que desarquiva a Proposta de Emenda à Constituição nº 73, de 2005, instituindo a possibilidade da revogabilidade popular de mandatos, ampliando os mecanismos de democracia, de exercício da soberania popular presentes no art. 14 da Constituição da República.

            E eu quero reafirmar essa convicção de que a reforma deve ser uma reforma das estruturas políticas brasileiras. Por exemplo - e falo isso para concluir, Sr. Presidente -, a Reforma Política tem que consagrar, tem que adiantar, tem que incorporar aqui o projeto da Comissão da Verdade. Não há reforma política que não conclua o ciclo de redemocratização iniciado em 1985; não há reforma política que não passe a limpo o triste passado de ditadura da história brasileira.

            Por conta disso, eu considero que é pré-requisito para a Reforma Política nós termos a convicção e termos a coragem de mudar as estruturas do lamentavelmente apodrecido sistema político brasileiro.

            Se há alguma coisa que deve ser aproveitada da entrevista do Sr. Arruda, deve-se aproveitar que o sistema político brasileiro está corroído. Sou daqueles políticos que, ao contrário do que disse o Sr. Arruda, acredita na força das ideias, na força dos ideais, e não na força do dinheiro para comprar consciências e para comprar os processos eleitorais.


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Este texto não substitui o publicado no DSF de 23/03/2011 - Página 7707