Discurso durante a 34ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Necessidade de renegociação dos contratos que regem as dívidas dos Estados e Municípios.

Autor
Ricardo Ferraço (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/ES)
Nome completo: Ricardo de Rezende Ferraço
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA FISCAL.:
  • Necessidade de renegociação dos contratos que regem as dívidas dos Estados e Municípios.
Publicação
Publicação no DSF de 24/03/2011 - Página 7955
Assunto
Outros > POLITICA FISCAL.
Indexação
  • ANALISE, RELEVANCIA, LEGISLAÇÃO, RESPONSABILIDADE, NATUREZA FISCAL.
  • JUSTIFICAÇÃO, PROPOSIÇÃO, RENEGOCIAÇÃO, CONTRATO, DIVIDA, ESTADOS, MUNICIPIOS.

                          SENADO FEDERAL SF -

            SECRETARIA-GERAL DA MESA

            SUBSECRETARIA DE TAQUIGRAFIA 


            O SR. RICARDO FERRAÇO (Bloco/PMDB - ES. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Srª Presidente desta sessão e Vice-Presidente do Senado da República, Senadora Marta Suplicy, Srªs e Srs. Senadores, brasileiras e brasileiros que nos acompanham pela TV Senado, não tenho, e acho que nenhum brasileiro tenha qualquer dúvida de que a Lei de Responsabilidade Fiscal foi, é e continuará sendo fundamental para a manutenção do equilíbrio das contas públicas em nosso País, por tudo o que pode representar para a Nação brasileira, para os brasileiros mais humildes, aqueles que mais necessitam do bom funcionamento do Poder Público, o equilíbrio das contas públicas e a capacidade de investimento dos governos. Sem uma gestão transparente, com mecanismos de controle muito bem definidos, não teríamos assegurado a tão necessária estabilidade monetária, nem superado, de forma rápida, os efeitos da recente crise financeira que se abateu sobre os principais países e economias do mundo.

            Não teríamos, também, prosseguido no caminho do crescimento econômico.

            Ao estabelecer metas, limites e condições claras para a gestão das receitas e das despesas públicas, a Lei de Responsabilidade Fiscal tornou-se um dos maiores avanços institucionais, julgo eu, em nosso País, nos últimos tempos, um patrimônio público da população brasileira.

            Não podemos, em hipótese alguma, abrir mão de uma administração transparente, democrática, muito menos do controle de gastos públicos, essencial para a manutenção do ajuste fiscal, particularmente no momento em que a inflação volta a dar sinais de pressão sobre os preços em nosso País, por motivos da nossa economia, mas também por variáveis da economia global.

            Sabemos que um dos princípios fundamentais da Lei de Responsabilidade Fiscal é o controle do endividamento em todos os níveis de governo, de todos os nossos entes federados, e que foi exatamente para conter a pressão da dívida sobre as contas públicas que a Lei de Responsabilidade Fiscal vetou a possibilidade de o Governo Federal continuar refinanciando dívidas que foram contraídas por Estados e Municípios, um princípio absolutamente correto, a meu juízo.

            Sem as amarras da Lei de Responsabilidade Fiscal, Estados e Municípios certamente voltariam a se endividar de modo perigoso e até de modo irresponsável. É sempre bom lembrar que ainda convivemos com um déficit público muito elevado, o que reduz a nossa capacidade de poupança doméstica, interna.

            O grande problema, Srªs e Srs. Senadores, é que a dívida dos Estados e Municípios, renegociada pela última vez em 1997, no caso dos Estados, e, em 2001, no caso dos Municípios, é indexada pelo IGP-DI, índice apropriado na época em que câmbio era fixo.

            Com o câmbio flutuante, vigente em nossa economia, a referência de praticamente todos os contratos passou a ser o IPCA, o indicador? usado pelo Banco Central no sistema de metas de inflação.

            A insistência na indexação pelo IGP-DI tem tido um impacto brutal nas contas estaduais e nas contas municipais. É sempre bom lembrar que, de cada R$10,00 arrecadados em nosso País, de R$6,00 a R$7,00 são investidos pelos nossos Municípios e pelos nossos Estados. Basta dizermos aqui que, entre 1997 e 2010, o IGP-DI acumulou uma inflação de 229%, enquanto o IPCA acumulou uma inflação de 134%.

            Acrescente-se a isso, Srª Presidenta, a senhora que também governou a cidade de São Paulo, que, à época em que essas renegociações foram feitas, naquela conjuntura, as taxas de juros fixas entre 6% e 9% ao ano, compatíveis para a conjuntura daquele momento, durante os anos de 1997 a 2001.

            Resultado: por mais que Estados e Municípios façam o dever de casa, por mais que Estados e Municípios paguem essa dívida, ela, no tempo, só faz aumentar, diminuindo e criando mais dificuldades para que Estados e Municípios possam investir.

            É, portanto, mais do que justo e urgente renegociar os contratos que regem as dívidas dos Estados e Municípios. É esse, Srª Presidente, Srªs Senadoras, Srs. Senadores, o objetivo do projeto que estamos submetendo à análise desta Casa.

            Não se trata aqui, de forma alguma, de ferirmos os princípios do equilíbrio fiscal, revisando uma lei fundamental para a saúde financeira de todos os entes federados, sempre resgatando o papel do Senado da República como representante dos Estados, a Casa dos Estados, que promove o equilíbrio e a solidariedade federativa entre os nossos 27 Estados federados.

            É bom lembrar que o que estamos propondo é simplesmente o restabelecimento do equilíbrio econômico e financeiro de contratos firmados há mais de dez anos numa outra conjuntura. É bom lembrar também que, nesses casos, a repactuação é regra geral, sem nenhum tipo de impedimento por parte do Código de Defesa do Consumidor nas relações diárias do cidadão, do contribuinte.

            Quando você faz um contrato para aquisição de uma casa própria e esse contrato é de longo prazo, se a conjuntura se altera, é perfeitamente possível e adequado que você procure o seu agente bancário e financeiro para fazer um equilíbrio econômico e financeiro, renegociando esse contrato à luz da conjuntura que estamos vivendo.

            Por que o mesmo não funcionaria para os contratos estabelecidos entre a União e os demais entes federados?

            Ao proibir o refinanciamento de dívidas, ao proibir que fosse possível o reequilíbrio financeiro e econômico, a Lei de Responsabilidade Fiscal talvez tenha se excedido. Esse é o debate que queremos fazer aqui no Senado e no Congresso Nacional.

            É natural que tais contratos se tornem desequilibrados em economias como a brasileira, ainda sujeitas a fortes oscilações, Senador Paim, nos indicadores de inflação, na taxa real de juros e até mesmo na taxa de crescimento econômico, enfim, nos indicadores com que convivemos em nossa conjuntura.

            Para evitarmos tal distorção que penaliza Estados e Municípios, o que estamos sugerindo é abrir uma exceção à regra prevista no art. 35 da Lei de Responsabilidade Fiscal. Contratos com prazo de duração igual ou superior a vinte anos que foram firmados entre os entes da Federação antes da promulgação da Lei de Responsabilidade Fiscal poderiam ser repactuados com o exclusivo objetivo de restabelecer o equilíbrio financeiro entre esses contratos.

            E é bom frisar: o que estamos propondo não é a automática repactuação dos contratos com base em qualquer outro indicador, até porque tais contratos se constituem em atos jurídicos perfeitos que não podem ser prejudicados pela lei. Propomos, sim, a possibilidade para que as partes do contrato possam renegociá-lo de comum acordo.

            É preciso, então, levarmos em conta a preocupação, evidentemente, com a eventual queda no superávit primário provocada pela ampliação de gastos que poderia se seguir à repactuação da dívida de Estados e Municípios. Uma preocupação justa, já que a redução do superávit primário pode impactar de forma inevitável a pressão inflacionária.

            Quero chamar a atenção, no entanto, para o fato de que a União, Estados e Municípios podem perfeitamente renegociar os contratos da dívida sem reduzir de forma substancial - e já encerro, Srª Presidenta - os valores atualmente pagos a título de amortização a juros mensais. Bastaria, por exemplo, diminuir o prazo de quitação da dívida. Há certamente alternativas e soluções dentro de um ambiente de negociação e de pactuação que, seguramente, facilitará a conjuntura dos nossos Estados e dos nossos Municípios.

            É essa, Srª Presidenta, Srªs e Srs. Senadores, a contribuição que trazemos a debate nesta Casa, com certeza tramitando nas comissões permanentes e adequadas.

            Muito obrigado.


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Este texto não substitui o publicado no DSF de 24/03/2011 - Página 7955