Discurso durante a 34ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Manifestação contrária ao posicionamento do Supremo Tribunal Federal com relação à Lei da Ficha-Limpa.

Autor
Marinor Brito (PSOL - Partido Socialismo e Liberdade/PA)
Nome completo: Marinor Jorge Brito
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
JUDICIARIO. POLITICA NACIONAL. ATUAÇÃO PARLAMENTAR.:
  • Manifestação contrária ao posicionamento do Supremo Tribunal Federal com relação à Lei da Ficha-Limpa.
Aparteantes
Cristovam Buarque, Inácio Arruda, João Pedro, Paulo Davim, Paulo Paim, Pedro Taques, Randolfe Rodrigues, Wellington Dias.
Publicação
Publicação no DSF de 24/03/2011 - Página 8007
Assunto
Outros > JUDICIARIO. POLITICA NACIONAL. ATUAÇÃO PARLAMENTAR.
Indexação
  • CRITICA, DECISÃO, SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL (STF), AUSENCIA, VALIDADE, LEGISLAÇÃO, INELEGIBILIDADE, REU, CORRUPÇÃO, ATUALIDADE, ELEIÇÕES.
  • REPUDIO, CORRUPÇÃO, POLITICA NACIONAL, DEFESA, IMPLEMENTAÇÃO, REFORMA POLITICA.
  • REGISTRO, COMPROMISSO, ORADOR, DEFESA, INTERESSE, POPULAÇÃO, DEMOCRACIA, TRANSPARENCIA ADMINISTRATIVA, COMBATE, DISCRIMINAÇÃO.

                          SENADO FEDERAL SF -

            SECRETARIA-GERAL DA MESA

            SUBSECRETARIA DE TAQUIGRAFIA 


            A SRª MARINOR BRITO (PSOL - PA. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão da oradora.) - Sr. Presidente, Srs. Senadores, Srªs Senadoras, funcionários da Casa, imprensa presente, acompanhando a TV Senado e a Rádio Senado, ouvintes da Rádio Senado, o Brasil inteiro, há quatro anos, através dos movimentos sociais, dos que lutam contra a corrupção neste País, dos que têm feito movimentos por justiça e liberdade, se reúne para enfrentar o Congresso Nacional, para enfrentar o Judiciário brasileiro e dizer que era preciso restabelecer um direito constitucional do povo brasileiro: participar das decisões políticas no nosso País. Essas decisões políticas propiciariam ao povo brasileiro tomar decisões para enfrentar o que o Congresso Nacional e o Judiciário brasileiro não conseguiram enfrentar nas últimas décadas no nosso País - o combate à corrupção, o combate ao uso do poder econômico, que tem definido os rumos da política brasileira. Retomamos, através de um movimento cívico nacional, coletando assinaturas, Senador Cristovam, debatendo durante quatro anos, meu companheiro Jean Wyllys, meu companheiro Deputado Chico Alencar, que se encontram aqui neste momento, juntando energias e mobilização, de ponta a ponta deste País, para trazer ao Congresso Nacional a Lei da Ficha Limpa.

            A Lei da Ficha Limpa é para barrar corruptos, para barrar desonestos, para barrar os que historicamente têm deixado o povo no abandono, para barrar politicamente os que têm representado a fome, a miséria, a prostituição infanto-juvenil, os que têm respondido pelo trabalho escravo - a cada ano, 15 mil pessoas entram no trabalho escravo no nosso País -, os que respondem pela macroeconomia, pela visão de desenvolvimento macroeconômico neste País, que tem deixado o povo da minha região e o povo brasileiro na mais desesperadora situação.

            Eu falava ontem, na Comissão de Direitos Humanos, no Estado do Pará, que foi saqueado historicamente por essa elite podre, sórdida, que atua em rede, que tem um braço do Estado contribuindo cotidianamente nos processos eleitorais, facilitando, através do uso da máquina pública, a perpetuação de figuras tão sórdidas e que o povo repudiou agora, na eleição de 2010. Repudiou, porque mais de 70% dos candidatos que participaram do processo eleitoral e que foram enquadrados na Lei da Ficha Limpa foram barrados nas urnas. Apenas 30% deles, as raposas da política, os mais eficazes na roubalheira, os mais eficazes na corrupção, na utilização do Congresso Nacional e das estruturas de poder nos Estados, conseguiram mais uma vez driblar a vontade do povo e alcançaram um percentual razoável de votos - com o mesmo abuso do poder econômico, com a mesma utilização da máquina pública - e recorreram à Justiça brasileira.

            Nós, trabalhadores e trabalhadoras, homens e mulheres honestos, que batemos no peito e nos orgulhamos de estar na política por sermos honestos e éticos, ocupamos espaços no Parlamento brasileiro - como Ivan Valente; Chico Alencar; recentemente Jean Wyllys; o companheiro que acaba de chegar junto comigo, Randolfe Rodrigues, do Amapá; como Heloísa Helena; como o Senador José Neri - para contribuir para o avanço da consciência de classes na luta do povo brasileiro, para ajudar a organizar o povo, a mobilizar a sociedade civil, como estamos tentando fazer agora por intermédio da Comissão Mista que está discutindo a reforma política.

            Nós não queremos o povo brasileiro subserviente, nós não queremos organizar uma reforma política que fortaleça laços muito sólidos e, de certa maneira, interligados com a Justiça brasileira que permitirão que se perpetuem corruptos no poder, como querem vários Senadores e vários Deputados, que, de uma forma ou de outra, estão tentando tirar a voz, tirar o direito dos Parlamentares dos partidos menores, dos interlocutores de setores importantes da sociedade civil, que querem impedi-los de debater o que é melhor para o povo brasileiro, o que é melhor para o Brasil. Nós queremos ver fortalecida a democracia direta neste País, nós queremos ter um Judiciário transparente, nós queremos ver - e talvez vejamos agora, meu companheiro Jean - varridos da política brasileira os corruptos como Jader Barbalho. Queremos ver varridos da política brasileira os Roriz da vida, os Malufs da vida e muitos outros que contribuíram para matar o sonho de milhares e milhares de crianças alguns anos atrás, muitas das quais estão hoje entre os 580 mil presos neste Brasil que têm entre 18 a 25 anos e são, em sua maioria, negros.

            Nós queremos ver essas mazelas sociais curadas. Vamos construir passo a passo esse sonho, ocupando este espaço, ocupando o espaço da Câmara, das câmeras municipais, das assembleias legislativas, das associações de moradores, dos conselhos tutelares, das associações de combate à homofobia, à intolerância religiosa, onde quer que o povo consiga ter vez e voz, ainda que com muita dificuldade, com muito sacrifício.

            Quem chegou neste Senado Federal com R$ 53 mil? Quem aqui mora num Estado de quase seis milhões de pessoas, sem transporte coletivo, que não tem nenhuma facilidade para se deslocar num Estado tão extenso e conseguiu ter voto nos 144 municípios desse Estado? Queria ver o Sr. Jader Barbalho, sem a concessão pública dada por este governo para a sua emissora de rádio e de televisão, fazer autopropaganda diuturnamente. Queria ver onde estariam essas raposas da política sem as benesses do governo, sem as facilitações das estruturas públicas, sem o aporte financeiro de quem cobra a conta na hora da votação. Será que eles estariam com algum percentual de voto? Eles teriam a possibilidade de fazer essa disputa no Judiciário?

            Senadores, meus queridos Deputados, Deputado Ivan, aqui presentes neste momento para demonstrar a solidariedade que é peculiar aos lutadores socialistas, nós não vamos arredar um único pé da luta; nós não vamos deixar um único dia, como jamais deixamos na nossa vida, no Estado do Pará ou em qualquer lugar onde estivermos, de lutar por democracia, por justiça, por ética, por uma vida digna para os homens e mulheres de bem. Custe o que custar, querendo ou não a Justiça, as nossas vozes não se calarão.

            O Sr. João Pedro (Bloco/PT - AM) - V. Exª me concede um aparte?

            A SRª MARINOR BRITO (PSOL - PA) - Só um minuto.

            Querendo ou não a Justiça, o povo brasileiro vai continuar tentando varrer os corruptos da política. Ainda não foi concluído o julgamento, mas, lamentavelmente, o voto tão esperado pelo Brasil, de um advogado de carreira, de um juiz cuja carreira jurídica não foi questionada quando foi indicado para ser Ministro do Supremo, não conseguiu trazer novidades, não conseguiu acompanhar o raciocínio e a vontade do povo brasileiro e atuar em nome das famílias, como ele disse no Supremo.

            As famílias brasileiras estão clamando por justiça, estão clamando por socorro, como estão os filhos do povo do Pará lá em Barcarena, uma comunidade em que todas as pessoas não têm mais dentes, Deputado Chico Alencar, uma população inteira de desdentados, que têm a pele soltando por conta da poluição, da força que tem o capital, que tem explorado as nossas riquezas com a conivência do Estado brasileiro, com a conivência desses políticos corruptos e que, agora, viram as costas para eles.

            Esse povo está sem condição de reagir, mas nós vamos ajudá-lo, vamos continuar construindo a reação.

            Concedo a palavra a V. Exª, Senador João Pedro, que me pediu o aparte.

             O Sr. João Pedro (Bloco/PT - AM) - Minha querida companheira, Senadora do Pará, Senadora da Amazônia, sei que V. Exª reflete o andamento da decisão do Supremo, que está discutindo uma iniciativa popular, como bem lembrou V. Exª. Essa iniciativa que chegou aqui no Congresso, e o Congresso, com todas as suas diferenças e contradições, soube acatar a voz, a exigência das ruas. O que tem de novo nesses últimos anos do ponto de vista da nossa legislação eleitoral é a lei da Ficha Limpa. Minha companheira de Amazônia, V.Exª, que vem dos movimentos populares, V. Exª, que é professora, sabe que este é um momento importante. Nós já perdemos muito nessa caminhada, mas já ganhamos também.

O saldo é positivo. E quero concordar com essa última parte do discurso que faz. As nossas vozes, comprometidas com os pequenos, com os índios, com os trabalhadores, com os sem terra, com os sem teto, com os discriminados... Nós vamos continuar, eu não tenho nenhuma dúvida, com as nossas lutas, as articulações. Saí há pouco daqui para o ato de comemoração de 89 anos do PCdoB - e 70% do tempo do PCdoB foi na ilegalidade -, para participar do lançamento de um livro de um paraense, um livro editado sobre o Deputado João Amazonas, que foi Constituinte, um homem valente, um homem nacional que passou pelo Congresso brasileiro, lá da Amazônia. Então, eu quero dizer que V. Exª, por conta da decisão, se perder o mandado, perde o mandato, mas não vai perder a voz, a voz que veio para cá do Pará, de uma mulher da Amazônia, de uma cidade em que tive a felicidade de morar por sete anos, que é Alenquer. V. Exª é filha e é mulher daquele grupo intrépido do Pará que não se cala. V. Exª, nestes poucos dias que passou aqui, nestes dias da Legislatura nova, de 2011, mostrou, primeiro, os compromissos populares, o compromisso socialista, o compromisso pela liberdade, uma visão internacional. O mais importante é a voz, é o legado de V. Exª. Fique tranquila, V. Exª pode sair daqui, mas vamos continuar lutando por um Brasil melhor, por um Brasil verdadeiramente democrático. V. Exª passa pelo Senado honrando o seu partido, honrando as mulheres do Brasil, honrando o povo do Pará. A luta continua, minha companheira! Muito obrigado.

            A SRª MARINOR BRITO (PSOL - PA) - Obrigada.

            Tem o aparte V. Exª.

            O Sr. Paulo Davim (Bloco/PV - RN) - Senadora Marinor, o seu pronunciamento hoje, neste Senado, retrata mais do que uma indignação, mas, com precisão, a expectativa de toda a sociedade. Todos nós, políticos ou não, somos cidadãos e cidadãs brasileiras, que amamos este País, queremos bem a esta terra, e gostaríamos muito - e tenho certeza de que este dia vai chegar - de ver um País diferente, com práticas políticas austeras, onde o político seja, sobretudo, respeitado pela sociedade que ele representa. Entendo a tristeza e a indignação de V. Exª, mas não posso...

            A SRª MARINOR BRITO (PSOL - PA) - Mais indignação do que tristeza, Excelência. Quero deixar bem claro.

            O SR. PRESIDENTE (Mozarildo Cavalcanti. PTB - RR) - Senador Paulo Davim.

            O Sr. Paulo Davim (Bloco/PV - RN) - Mas não posso, Senadora, deixar de ressaltar as qualidades que em tão pouco tempo descobri em V. Exª, que tem uma história que orgulha qualquer político. V. Exª, como milhares de brasileiros...

            O SR. PRESIDENTE (Mozarildo Cavalcanti. PTB - RR. Fazendo soar a campainha.) - Senador Paulo Davim, V. Exª me permite interromper só para prorrogar a sessão pelo tempo necessário a fim de que possamos ouvir os oradores inscritos.

            A SRª MARINOR BRITO (PSOL - PA) - Agradeço.

            O Sr. Paulo Davim (Bloco/PV - RN) - Obrigado, Sr. Presidente. V. Exª, como milhares de brasileiros, traz consigo um sonho e acalenta esse sonho. E muitos que acalentaram esse sonho foram importantes para a consolidação da democracia que hoje vivenciamos neste País. Mas a sua voz intrépida, corajosa, valorosa, não vai se calar. A sua voz, onde quer que ela esteja, vai ser ouvida e vai ser respeitada. Tenho a convicção e a absoluta certeza de que, mais cedo do que se imagina, teremos de novo a política, a brasileira valorosa, Marinor, nos plenários dos Legislativos brasileiros. Sou solidário a V. Exª. Também sonho com um País bonito, belo, com um País de democracia cristalina como água. Muito obrigado.

            A SRª MARINOR BRITO (PSOL - PA) - Agradeço a V. Exª.

            Senador Randolfe Rodrigues e, depois, o Senador Pedro Taques.

            O Sr. Randolfe Rodrigues (PSOL - AP) - Querida Marinor, tenho sempre esperança, então, não quero entrar no contexto do fatalismo de dizer que está tudo acabado, que está tudo encerrado, por várias razões: primeiro, porque é um julgamento; segundo, porque acredito que teremos julgamentos caso a caso. Aquele de que V. Exª é parte será analisado, dentre em pouco, pelo Supremo Tribunal Federal. Assim, não tenho essa perspectiva fatalista. Estou acreditando que teremos a sua companhia aqui no plenário do Senado da República, com a sua combatividade, fundamental para dar ânimo nestes tapetes azuis, fundamental para trazer a voz dos trabalhadores, como vimos, com muita ênfase, nas suas declarações na ocasião da votação do salário mínimo. Então, ainda não é hora e esse não pode ser um discurso de despedida...

            A SRª MARINOR BRITO (PSOL - PA) - De jeito nenhum. Não é isso que estou fazendo aqui.

            O Sr. Randolfe Rodrigues (PSOL - PA) - Portanto, quero recusar qualquer caráter fatalista. Temos várias batalhas jurídicas e políticas a travar. Foi-me pedido por um jornalista de O Globo que fizesse um depoimento sobre V. Exª. A parte que mais destaco do depoimento que fiz não foi da Marinor Senadora ou da Marinor militante, porque tenho o privilégio e a honra de conhecer uma outra Marinor, de conhecer uma Marinor além da militante que carrega, com convicção, a causa política mais bela da humanidade, a mais bela declaração de amor à humanidade, que é a declaração pelo socialismo. Tenho a honra e tenho o prazer de conhecer a Marinor amiga, aconchegante, carinhosa, que convive conosco, que é terna, que sabe como poucos fazer jus àquele belo trecho da mais conhecida frase de Che: “endurecer sem perder a ternura”. Você, Marinor, sabe ser dura contra os inimigos do povo e sabe ser terna e carinhosa com seus companheiros, sabe ser acolhedora como a bela mãe que você é, como você é mãe de Terena, com toda a solidariedade que externa a nós quando precisamos, quando somos acometidos de qualquer infelicidade. Essa solidariedade toda é nossa para você neste momento. Então, Marinor, não terminou a batalha jurídica, não terminou a batalha política e não é nenhum julgamento que vai terminar a sua bela trajetória. O povo do Pará tem orgulho de ter você como Senadora da República e, se tivesse que ser pronunciado no pretérito perfeito, ou seja, “ter tido”, o povo do Pará é que perderá a melhor Senadora da República que já teve em toda a sua história. Mas não quero acreditar nisso. O povo do Pará continuará a ter orgulho da Senadora que tem, com a combatividade que você tem. Estou falando aqui por Ivan, por Jean, por Chico, por Luiz Araujo, por Rodrigo, por Toninho, por todos seus companheiros e companheiras do Partido Socialismo e Liberdade, que a abraçam com muito carinho e têm certeza de que, com a sua força e a sua combatividade, saberá trazer vitórias novas, porque não tem nenhuma convicção melhor para um socialista do que acreditar que, ainda que não na sua geração, um dia será construído um mundo de igualdade, de justiça e de solidariedade.

            A SRª MARINOR BRITO (PSOL - PA) - Obrigada, querido Randolfe.

            Senador Pedro Taques, V. Exª tem a palavra para apartear. Depois, o Senador...

            O Sr. Pedro Taques (Bloco/PDT - MT) - Obrigado, Senadora. Sr. Presidente, Srªs Senadoras, Srs. Senadores, esse caso da ficha limpa, ou ficha suja, essa decisão que se avizinha me fez lembrar uma pergunta que minha filha me fez. Tenho uma filha de treze anos, e ela perguntou um dia para mim o seguinte: “Pai, por que nós somos corruptos?” Perguntou assim. Respondi a ela o seguinte. Nós não somos geneticamente corruptos, porque a biologia moderna, a nanomedicina ainda não chegou à conclusão de que, no momento em que o espermatozoide fecunda o óvulo criando o zigoto, no fenômeno da nidação, nesse instante, exista um gen que faça com que o brasileiro seja corrupto. Nós não somos geneticamente corruptos. Disse a ela que nós também não somos historicamente corruptos. Alguns defendem isso. Segundo consta, no período de nossa colonização, a partir de 1534, quando para cá vieram criminosos portugueses, essa seria a causa da corrupção que graça entre nós. Analisei os criminosos que para cá vieram, e eles eram menos criminosos do que os ingleses que foram enviados para a Austrália. E a Austrália, que era uma penitenciária, é bem menos corrupta do que a República Federativa do Brasil. Nós não somos geneticamente corruptos. Nós não somos historicamente corruptos. Nós somos culturalmente corruptos. Nós somos culturalmente corruptos, Srª Senadora, porque muitos de nós entendem que a coisa pública é coisa de ninguém, quando a coisa pública é coisa de todos nós. Aí aceitamos o que se denomina de relativismo ético, a ética consequencial de que os fins justificam os meios, e os fins não podem justificar os meios. Nós somos culturalmente corruptos. Por isso, aquele cidadão que chamamos de Zé, aquele cidadão simples, aceita a corrupção. Um Presidente da República, um Presidente do Senado, um Ministro do Supremo Tribunal Federal, não interessa qual seja, e não quero fulanizar a conversa, também é relativo no tocante à ética. Nós precisamos mudar isso. E não há outra forma de mudarmos essa nossa cultura, que é propícia à corrupção, a não ser através da educação. A educação é um instrumento que liberta. A educação é um instrumento que transforma o indivíduo em cidadão. Isso demora muito, é muito longo, mas temos que iniciar. E eu tenho a honra de estar ao lado do Senador Cristovam, que, de há muito, vem falando sobre isso. Essa decisão do Supremo Tribunal Federal... E não se diga que decisão judicial não se debate. Sim, decisão judicial se cumpre em um Estado democrático de direito. Agora, decisão judicial pode e deve ser debatida, porque tudo está sujeito à Constituição. O debate de uma decisão como essa, que tem repercussões em vários espaços da convivência do cidadão, deve ser debatida sim. E essa decisão reflete, espelha o relativismo ético. Essa ética consequencial precisa ser debatida entre nós. Eu quero me colocar ao lado de V. Exª nesta luta. V. Exª é de um partido diverso do meu, mas não interessam os nossos partidos, não interessam os nossos Estados, não interessam os nossos nomes, o que interessa é que defendemos a mesma causa.

            A SRª MARINOR BRITO (PSOL - PA) - Obrigada, Excelência. Ouço o Senador Cristovam e depois o Senador Paim.

            O Sr. Inácio Arruda (Bloco/PCdoB - CE) - Senadora Marinor...

            O Sr. Cristovam Buarque (Bloco/PDT - DF) - Senadora Marinor, não vou entrar na análise dos aspectos jurídicos que tratam da corrupção e tentam impedir a corrupção no comportamento dos políticos. Corrupção que, na verdade, deveria se chamar ladroagem. Nós pervertemos tanto este País, que até pervertemos o dicionário, o vocabulário. Os pobres...

            A SRª MARINOR BRITO (PSOL - PA) - Bem lembrado, Excelência: ladroagem!

            O Sr. Cristovam Buarque (Bloco/PDT - DF) - ...os necessitados, os que roubam são chamados de ladrões; os que se apropriam de recursos públicos são chamados de corruptos. E nem se diz que ele roubou, e sim que desviou recursos. Eu não vou entrar na discussão. Eu quero entrar é na falta que a senhora vai fazer nesta Casa, por causa de duas outras corrupções que estão escondidas por aí. Uma é a corrupção nas prioridades, e a outra é a corrupção ideológica. Corrupto não é só aquele que se apropria de dinheiro público. Corrupto é aquele que faz política sem uma causa, sem um objetivo, sem um propósito, sem uma ideologia por traz. Corrupto é aquele que, sem pôr um tostão no bolso, vota projetos cujas prioridades são desligadas das necessidades populares. Vota por palácios, por viadutos no lugar das escolas, da água, do esgoto de que o povo precisa. E aí a senhora vai fazer muita falta aqui, pela sua coerência ideológica e pelo seu compromisso com prioridades relacionadas ao povo brasileiro. Convivi muito pouco com a senhora aqui, mas, nesse pouco tempo em que convivemos, aprendi a admirá-la, não apenas pela sua postura, mas pela sua capacidade de articulação, pelo seu jeitinho calmo e discreto que convence a gente. Inclusive a mim, quando sabia em quem não votaria para presidente do Senado, mas não sabia em quem votaria. A senhora me convenceu a dar o meu voto ao Randolfe, o que fiz com muito orgulho. Esse seu jeito vai fazer falta aqui. Mas, para aqueles que têm ideologia, que têm prioridades isto aqui, é um tempo passageiro. Não vemos isto aqui como a razão de ser de nossas vidas.

            A SRª MARINOR BRITO (PSOL - PA) - Com certeza.

            O Sr. Cristovam Buarque (Bloco/PDT - DF) - É como os espiritualistas que acham que a vida na terra é algo passageiro. Para nós, políticos de consciência, o Congresso é uma coisa passageira, o cargo é uma coisa passageira. Permanente é a nossa luta. E nessa luta, ninguém vai tirar o seu mandato. Nessa luta, a sua coerência e a sua história vão continuar determinando o que a senhora vai fazer e onde vai fazer. Por isso, a minha tristeza com a sua saída, mas a minha absoluta convicção de que sai daqui, deste tapete azul, mas continuamos juntos no tapete vermelho, na luta por um Brasil justo.

            A SRª MARINOR BRITO (PSOL - PA) - Obrigada, Senador.

            Senador Paim, por favor.

            O Sr. Paulo Paim (Bloco/PT - RS) - Senadora Marinor, aproveito para cumprimentar aqui, no plenário, os Deputados Federais Chico Alencar, Jean - que leva o mesmo nome do meu filho -, Ivan Valente e o nosso querido Senador Randolfe. Senadora Marinor, como disse aqui o Senador Randolfe, perdemos uma batalha, mas não perdemos a guerra ainda. Nós vamos até a última instância para garantir o seu direito de estar aqui conosco, por decisão do povo do seu Estado. Eu lamento muito a decisão de hoje. V. Exª fez um requerimento, e eu me senti na autoridade, como Presidente da Comissão de Direitos Humanos, de já a indicar como Presidente de uma das subcomissões mais importantes desta Casa, que é a subcomissão que vai tratar da criança, do adolescentes, da juventude e do idoso. V. Exª encaminhou o requerimento e, de pronto, concordou com a ideia de assumir a presidência dessa importante subcomissão. V. Exª fez um outro requerimento e já estávamos nos preparando para ir, numa diligência externa...

            A SRª MARINOR BRITO (PSOL - PA) - Não, nós iremos, Senador. Nós iremos a Belo Monte. Temos tempo para isso.

            O Sr. Paulo Paim (Bloco/PT - RS) - ...a Belo Monte, por orientação de V. Exª, com um grupo de Senadores. Estamos nos preparando e, com certeza, a subcomissão vai cumprir a sua parte. V. Exª, aqui neste plenário, com uma posição sempre muito firme e muito clara, respeitando aqueles que pensam de maneira diferente, defendeu as suas convicções com muita força, com muita coragem e com muito argumento. Eu aprendi a respeitar muito, muito V. Exª. Por isso, eu só posso, neste momento, dizer que estou solidário a V. Exª. Queira Deus que continuemos trabalhando juntos, por muitos e muitos anos. Um abraço.

            A SRª MARINOR BRITO (PSOL - PA) - Obrigada, Senador.

            Senador Inácio, um irmão de Amazônia.

            O Sr. Inácio Arruda (Bloco/PCdoB - CE) - Senadora Marinor, eu, Randolfe e João Pedro acabamos de vir do ato de comemoração dos 89 anos do Partido Comunista do Brasil. Quando vi V. Exª na tribuna, eu disse: preciso ir ali para apartear a Senadora Marinor, porque isso mexe imediatamente com a nossa memória, a memória da luta política do povo brasileiro. Luta para que se tenha uma legislação permanente, adequada, libertária, democrática, em que todos nós possamos dar nossas ideias, dar nossa contribuição. Aqui, cassaram o mandato do Carlos Prestes. Não o cassaram só no STF, não. Não foi só a Suprema Corte, não foi só o Tribunal Eleitoral. Ainda tiveram o desplante de mandar para o Congresso Nacional! Pois o Congresso Nacional cassou o mandato de todos da bancada do Partido Comunista, em 1946, para poder atender a interesses mesquinhos da época. Vejo esse processo político mais ou menos desta forma: nós, lutando para consolidar um País democrático, um País onde todas as ideias possam vicejar, e determinados setores, meio que, às vezes, na sombra, trabalhando com discurso de que a democracia é isso, mas impedindo que determinadas forças do campo democrático, popular e socialista, ampliem seu espaço no Congresso Nacional, porque, aqui, nós transmitimos. Aqui, nossa voz é ouvida, mesmo que não se transforme em grandes manchetes, nos jornais predominantes nos dias de hoje, mas V. Exª fala diretamente para o povo, para o povo do Pará, do Amazonas, do Brasil inteiro. Por isso, consideramos que é evidente. Não vamos entrar aqui no detalhe constitucional, jurídico, mas também poderíamos entrar, porque as Cortes não são livres do processo político. Não estão acima do bem e do mal. Fica parecendo que estão. Não estão, não! Existem determinadas decisões que são equivocadas, que estão erradas, e precisamos contestá-las. Quero ficar no terreno da nossa unidade da luta política, porque, às vezes, parece que estamos em campos muito opostos, mas estamos na unidade da luta política, de consolidar o processo democrático no Brasil. Não é batalha fácil. Agora mesmo, estamos discutindo uma reforma política; e discutindo uma reforma política que lida com a representação do seu partido, do meu e de todos do Congresso Nacional. E olhe: desde 1988 que se busca restringir o espaço político. Desde 1988. Você busca aprimorar, e gente busca restringir. Não é batalha simples. Por isso, V. Exª recebe nossa solidariedade, nosso apoio, do Partido Comunista do Brasil, porque temos consciência do que isso significa. Já tivemos suprimida a nossa bancada inteira. Em 1964, muitos democratas tiveram seus mandatos também retirados, naquele caso, à força, do Congresso Nacional. Portanto, V. Exª conte com nosso apoio, o apoio do PCdoB.

            A SRª MARINOR BRITO (PSOL - PA) - Agradeço as manifestações carinhosas, respeitosas dos Srs. Senadores. Sei que V. Exªs falam conscientes, até pelo papel que desempenham aqui. V. Exªs, não à toa, têm sido parceiros em várias batalhas, aqui mesmo, no Senado Federal, nas comissões onde estamos atuando. É óbvio que não posso deixar de dizer da minha emoção de ouvir essas palavras tão carinhosas, mas estou resguardando a energia da emoção para fazer o que precisamos fazer. Para refletir, de forma consciente, e saber em que etapa estamos; o que significa a decisão neste momento e que outras energias vamos precisar mobilizar nos próximos momentos.

            Mas, de antemão, quero deixar muito claro aqui meu compromisso com o processo iniciado pela Frente Parlamentar Mista...

(Interrupção do som.)

            A SRª MARINOR BRITO (PSOL - PA) - ... e Popular pela reforma política, a reforma política para o povo brasileiro; a reforma política para debater as questões econômicas e sociais, para debater o processo eleitoral, mas para debater a transparência do Judiciário, do Legislativo brasileiro, para debater a democratização, a criação de mecanismos de democratização da comunicação neste País, porque, sem isso, não avança a consciência de classes; porque, sem isso, o povo brasileiro ficará mais distante de um futuro feliz.

            Na condição de parlamentar ou de militante social, estarei ajudando, no meu Estado, Brasil afora, onde for necessário, a mobilizar o povo brasileiro para que essa reforma não seja a cara das elites, para que essa reforma não seja a cara dos que têm dado o comando nesse último período no nosso País e tem deixado o povo brasileiro na amargura.

            Quero, aqui, reafirmar meu compromisso político com o enfrentamento do projeto criminoso de Belo Monte; e quero, aqui, reafirmar o convite, porque, mesmo que a decisão se consolide daqui a pouco, no Supremo Tribunal Federal, ainda não estou fazendo despedida. Ainda vou ter um caminho pela frente para articular, para conseguir levar mais Senadores do que os que já se comprometeram com Belo Monte, para que sejam mostradas as análises científicas, os dados que comprovam que esse projeto ameaça o povo do meu Estado, seja do ponto de vista social, seja do ponto de vista ambiental.

            Quero, aqui, inclusive, a pedido do Senador Suplicy, já deixar uma data. Já estou trabalhando; ainda estou trabalhando. Em vez do dia 9, que a gente possa transferir para o dia 16, inclusive para oportunizar ao Senador Paim a se deslocar conosco, pois é um dos Senadores que se tinha colocado à disposição para analisar esses dados, para poder fazer juízo de valor sobre o debate.

            O Plano Nacional de Educação, a luta pelo enfrentamento da violência sexual contra crianças e adolescentes, a luta e o fortalecimento da frente contra a homofobia, pela cidadania LGVT... Queria aproveitar e deixar registrado, como deixei ontem na Comissão de Direitos Humanos...

(Interrupção do som)

            A SRª MARINOR BRITO (PSOL - PA) - ... nossa solidariedade ao companheiro, Deputado Jean Wyllys, pela ameaça que sofreu no Twitter esta semana por homofóbicos, por criminosos, que têm, numa movimentação perigosa, às vezes em cadeia, às vezes com o apoio do Estado brasileiro, ceifado vidas, Brasil afora, de cidadãos e cidadãs pela sua orientação sexual.

            Queria aqui deixar nosso abraço aos meus queridos militantes, assessores que estão aqui com a gente.

            Não vai mudar muita coisa na nossa vida, não, Senador Paim, porque nosso mandato não é cabide de emprego. Nosso mandato não é para favorecer interesse de parentes. Estão aqui valorosos militantes da luta socialista, que, neste momento...

(Interrupção do som.)

            A SRª MARINOR BRITO (PSOL - PA) - ... se ocupam dessa tarefa revolucionária de ajudar a comandar este mandato, mas que também, como eu, onde estiverem, vão continuar combatendo, defendendo as comunidades tradicionais, os indígenas, os quilombolas, os ribeirinhos, as mulheres, os deficientes, as pessoas que sofrem a discriminação e o preconceito neste País. Agradeço...

            V. Exª está pedindo um aparte?

            Concedo o aparte a V. Exª.

            O Sr. Wellington Dias (Bloco/PT - PI) - Agradeço, Senadora Marinor. Quero agradecer também o Presidente, pela abertura para esse importante debate. Primeiro, mais do que externar solidariedade, quero manifestar, também, a minha admiração, o meu carinho por essa sua capacidade de luta, de força. Dou meu testemunho da importância da presença do PSOL neste Parlamento, da presença de uma liderança como V. Exª...

(Interrupção do som.)

            O Sr. Wellington Dias (Bloco/PT - PI) - ... na defesa dos interesses daqueles que mais precisam. Pude testemunhar, nas diversas comissões e aqui no plenário, uma posição que busca ética, que busca correção, que busca dar voz para aqueles que, muitas vezes, muitos até se envergonham de defender. V. Exª, aqui, de cabeça erguida, de peito aberto, está fazendo essa defesa. Quero manifestar exatamente esse pensamento. Acho que na luta pela democratização, seja por uma reforma político-eleitoral participativa ou em outros campos, sempre, com certeza, V. Exª contará conosco, com o meu partido, enfim, com todos aqueles que, no Brasil inteiro, sabem da importância dessa sua luta e dessa sua participação. Que Deus lhe dê muita força neste momento. O PSOL é um partido que, sei, por sua força ideológica, não vive na dependência de um cargo. Sei a importância que tem essa luta que faz, na sociedade, para obter isso. Tenho certeza de que o povo do seu Estado tomou gosto por sua presença aqui e o que fez aqui foi bom, não só para o PSOL, não só para o Pará, como também para o Brasil. Muito obrigado.

            A SRª MARINOR BRITO (PSOL - PA) - Agradeço nos mesmos moldes dos agradecimentos anteriores.

            Espero, amanhã, manifestar-me sobre o conteúdo dos votos do Supremo Tribunal Federal. Acho importante que a gente possa trazer para cá essa discussão, já que esta Casa aprovou, por unanimidade, a Lei da Ficha Limpa, já que esta Casa tomou as providências devidas no sentido de garantir que o projeto não voltasse para a Câmara, exatamente para que ele fosse validado nas eleições de 2010. Inclusive contrariando a própria fala do Ministro Fux, que, quando esteve aqui, na sabatina, disse que a Justiça brasileira não poderia ficar de costas para a intencionalidade da lei.

            Quero poder avaliar com V. Exªs, amanhã, o conteúdo desse voto, que entristece, que assusta e que favorece os interesses dos fichas-sujas do nosso País.

            Muito obrigada.


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Este texto não substitui o publicado no DSF de 24/03/2011 - Página 8007