Discurso durante a 35ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Comemoração dos 20 anos do Mercado Comum do Sul - Mercosul.

Autor
Roberto Requião (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/PR)
Nome completo: Roberto Requião de Mello e Silva
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
HOMENAGEM. MERCADO COMUM DO SUL (MERCOSUL).:
  • Comemoração dos 20 anos do Mercado Comum do Sul - Mercosul.
Publicação
Publicação no DSF de 25/03/2011 - Página 8080
Assunto
Outros > HOMENAGEM. MERCADO COMUM DO SUL (MERCOSUL).
Indexação
  • COMEMORAÇÃO, HOMENAGEM, ANIVERSARIO DE FUNDAÇÃO, MERCADO COMUM DO SUL (MERCOSUL), ANALISE, PENSAMENTO, ECONOMISTA, PAIS ESTRANGEIRO, ARGENTINA, EX MINISTRO DE ESTADO, RELAÇÃO, ECONOMIA INTERNACIONAL, POLITICA EXTERNA, AMERICA DO SUL.

                          SENADO FEDERAL SF -

            SECRETARIA-GERAL DA MESA

            SUBSECRETARIA DE TAQUIGRAFIA 


            O SR. ROBERTO REQUIÃO (Bloco/PMDB - PR. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Vinte anos do tratado do Mercosul. Sr. Presidente, minha saudação inicial a V. Exª, principalmente pela iniciativa da organização da sessão.

           Saúdo as autoridades brasileiras na pessoa do meu amigo Samuel Pinheiro Guimarães e os Embaixadores, na pessoa de outro companheiro, Maximilien Arvelaiz, Embaixador da Venezuela.

            Há mais de 20 anos, nossa preocupação e ação política se dirigem para a consolidação de uma visão de cidadania sul-americana. E, nesse sentido, logo na sequência da crise financeira mundial, em 2008, promovi no Paraná um seminário internacional sobre a catástrofe, reunindo em Curitiba economistas de toda parte. Entre os conferencistas, quero destacar a presença e a participação do economista Aldo Ferrer, ex-Ministro de Economia da República Argentina.

            Com Raul Prebisch e o nosso genial Celso Furtado. Talvez possamos colocar Aldo Ferrer em uma tríade de brilhantes pensadores que mudaram a forma de a América Latina se enxergar, identificaram com precisão as origens do nosso subdesenvolvimento e apontaram um caminho seguro para a superação da miséria.

            Prebisch, Furtado e Ferrer certamente são a vanguarda de um pensamento econômico latino-americano que se opõe à obtusidade, tanto dos fisiocratas tardios, quanto dos dependentistas afoitos, além de exorcizar os sempre renitentes colonialistas.

            Já com mais de 80 anos, Ferrer não apenas preserva a antiga lucidez como ainda encanta por sua fé juvenil no desenvolvimento latino-americano, na integração latino-americana, na realização comum de destinos comuns.

            O que nos disse Ferrer? Antigas verdades.

            Que a crise do mundo do dinheiro, da especulação financeira faz com que voltemos a algumas ideias básicas sobre o desenvolvimento das nações, ideias que se sustentam na experiência histórica de nossos e de outros países.

            A ideia de que o desenvolvimento é e será sempre um processo endógeno, dentro de um espaço nacional, fundado nas próprias forças, com a participação solidária da sociedade, com a justa e adequada distribuição de benefícios, com pressupostos claros de justiça social.

            A ideia do Estado como organizador das sinergias e dos recursos, incentivador da iniciativa privada, estimulando pessoas, talentos e capacidades, favorecendo a geração e a distribuição de riquezas.

            A ideia de que a construção nacional não se dê apartada do mundo e, sim, integrada a ele, mantendo-se, no entanto, o firme comando do próprio destino.

            Antigas verdades, verdades novas e verdades atuais.

            Todas as reflexões sobre o pensamento latino-americano, dizia Aldo Ferrer, conduz-nos a entender que o desenvolvimento implica um processo de transformação da estrutura produtiva, incluindo aí a industrialização e a incorporação no tecido econômico das atividades portadoras do conhecimento, da ciência e da tecnologia. Em resumo: não há desenvolvimento sem transformação produtiva, sem ciência e sem tecnologia.

            Reportando-se a Prebisch e ao seu modelo centro-periferia, Ferrer lembra que é impossível realizar esse processo de transformação, atendo-se tão somente à produção primária, às commodities. “É a condenação ao atraso”, insistia ele.

            Por sua vez, a economia interna e os recursos próprios são fontes fundadoras das transformações econômicas e sociais, lembrava Aldo. A contribuição externa, o crédito e os investimentos internacionais são complementares, jamais substitutivos da economia nacional.

            Não é à toa que os países com as maiores taxas de investimentos são os que exibem a maior participação da economia própria na acumulação da poupança interna, afirmava-nos Aldo Ferrer.

            Ferrer lamentava que os países latino-americanos tivessem se afastado desse pensamento, desses caminhos e praticado exatamente o oposto, aceitando que o mundo está globalizado, que o poder está centralizado em reduzido número de países e mercados, que a única saída seria adaptar-se a isso, já que não teríamos poder nacional, em virtude dessa concentração do poder mundial.

            Quer dizer, em um mundo assim, não haveria mais espaço para projetos e sonhos nacionais, apenas para a vil suserania. Consequência: a aceitação de um receituário que arruína os nossos países com privatizações indiscriminadas, desregulamentações criminosas, submissão à especulação financeira, contaminando toda a nossa economia aos vaivéns da jogatina nas bolsas.

            Acrescente-se a isso a sobrevalorização do câmbio, encarecendo e desestruturando a produção local, destruindo a rentabilidade e sufocando o crescimento.

            Enfim, com Ferrer deploramos a substituição de um pensamento tão rico, tão elaborado, tão generoso e tão solidário pelo consenso com os dominadores. Mediocridades, Embaixador Samuel, mediocridades de Esaús.

            O ex-ministro argentino lastimava que, a despeito do formidável potencial de recursos de nossos países, dois séculos depois da independência continuássemos economias subdesenvolvidas, com forte injustiça social e brutais desigualdades.

            Por fim, Aldo Ferrer apontava algumas respostas não apenas para o enfrentamento da crise advinda com a explosão da bolha financeira, mas também para a retomada dos projetos nacionais:

            Construir a identidade nacional em cada um de nossos países.

            Aprofundar a transformação industrial e tecnológica.

            Mobilizar os recursos próprios, a economia nacional e o talento de nossa gente.

            Estados nacionais transparentes, eficientes, democráticos, capazes de ordenar a economia com independência e visão social.

            Que o local mais rentável e seguro de se investirem as poupanças de nossos países seja sempre o nosso próprio País.

            Política de câmbio que privilegie a produção nacional.

            Ferrer ponderava ainda: se não podemos transformar o mundo, podemos ajudar com boas ideias a transformação de nossos países, situando-nos no mundo de maneira diferente. Não como subordinados, mas como nações desenvolvidas, socialmente justas, capazes de ter uma relação simétrica, intensa e profunda com o resto do Planeta. Nações no comando de seus destinos, sem jamais delegar decisões de caráter nacional.

            O ex-ministro ainda...

(Interrupção do som.)

            O SR. ROBERTO REQUIÃO (Bloco/PMDB - PR) - ...chamava a atenção para a necessidade capital (Fora do microfone) de se intensificarem as relações dos países latino-americanos para a consolidação do Mercosul.

            No entanto, advertia, essa iniciativa não pode ser deixada para as chamadas forças livres do mercado, porque em nossa região existem profundas assimetrias que geram desequilíbrios, desequilíbrios que só poderão ser enfrentados com políticas públicas compartilhadas.

            Ferrer cita ainda os setores de infraestrutura, de transporte e comunicação, de tecnologia e inovação como áreas para investimentos conjuntos. E acredita que Brasil e Argentina possam liderar uma cooperação financeira entre os países do continente.

            Enfim, conclui o parceiro de Raul Prebisch e Celso Furtado, “não podemos continuar perdendo tempo no início do terceiro século da independência de nossos países”.

            Srªs e Srs. Senadores, Embaixadores e autoridades que prestigiam esta nossa sessão, em resumo, foi essa a palestra de Aldo Ferrer que eu quis trazer para esta comemoração dos 20 anos do Mercosul. E, ao relembrá-la, reforçam-me as convicções de que estamos teimando em caminhar na contramão da história.

            Obrigado pela tolerância em relação ao tempo, Sr. Presidente.


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Este texto não substitui o publicado no DSF de 25/03/2011 - Página 8080