Discurso durante a 36ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Leitura de artigo do Sr. Wladimir Pomar acerca das perspectivas das relações entre os Estados Unidos e o Brasil e críticas à revista de Ministros de Estado brasileiros, que teria sido realizada pela segurança norte-americana, durante a visita do Presidente Barack Obama ao Brasil.

Autor
Roberto Requião (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/PR)
Nome completo: Roberto Requião de Mello e Silva
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA EXTERNA.:
  • Leitura de artigo do Sr. Wladimir Pomar acerca das perspectivas das relações entre os Estados Unidos e o Brasil e críticas à revista de Ministros de Estado brasileiros, que teria sido realizada pela segurança norte-americana, durante a visita do Presidente Barack Obama ao Brasil.
Publicação
Publicação no DSF de 26/03/2011 - Página 8343
Assunto
Outros > POLITICA EXTERNA.
Indexação
  • LEITURA, ARTIGO DE IMPRENSA, INTERNET, CRITICA, PRESIDENTE DE REPUBLICA ESTRANGEIRA, PAIS ESTRANGEIRO, ESTADOS UNIDOS DA AMERICA (EUA), VISITA, BRASIL.

                          SENADO FEDERAL SF -

            SECRETARIA-GERAL DA MESA

            SUBSECRETARIA DE TAQUIGRAFIA 


            O SR. ROBERTO REQUIÃO (Bloco/PMDB - PR. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Senador Paim, Srs. Senadores, alguém me disse outro dia que criticar o Governo é tão bom que não deveria ser monopólio da Oposição. E nós, da base do Governo, podemos e devemos, em determinadas oportunidades, exercitar a crítica construtiva.

            Fiquei pasmo com as notícias de que, na vinda do Presidente Obama ao Brasil, a segurança norte-americana submeteu nossos Ministros a uma revista absolutamente vexatória e, segundo a mídia e os blogs, incluiu até mesmo a retirada dos sapatos, o que cria um categoria nova de Ministros que se submeteram a esse tratamento.

            Seria, Senador Paim, de uma forma irônica, a categoria dos Ministros “Recoletos Descalços”. Recoletos, dos mosteiros dos recolhidos, e descalços porque se submeteram a isso. Evidente que não podemos atribuir isso ao Presidente norte-americano, mas aos desvios da sua segurança e à absurda tolerância por parte da nossa gente. Fica aqui, então, a minha crítica: é preciso que brasileiros se comportem com mais galhardia. Não representavam, nesse momento, pessoas físicas que poderiam ser revistadas na visita de um Presidente americano, representavam o Governo brasileiro.

            Como disse, eu pretendia fazer um discurso sobre a vinda do Presidente Obama ao Brasil, mas, de repente, recebo no meu gabinete via e-mail, um artigo sobre a visita de Mr. Obama, escrito pelo Wladimir Pomar, datado de 21/3/2011. Precioso o artigo.

            Substituo o discurso que pretendia fazer, então, pela leitura desse pertinente e adequado artigo do Wladimir:

“O Sr. Obama aterrissou no Brasil cheio de simpatia. Afinal, boa parte da população brasileira ainda não está informada de que o eleitorado norte-americano foi vítima de um embuste e a grande imprensa fez tudo a seu alcance para promover a simpatia do casal e o charme da Srª Michele.”

            Eu, particularmente, Senador Paim, me regozijei com a eleição do negro Obama para a Presidência dos Estados Unidos da América do Norte. Eu nunca esperei mudanças radicais, absolutas ou mesmo consistentes na política externa americana, mas vi na eleição do Obama uma conciliação dos Estados Unidos consigo mesmos - os Estados Unidos do “Mississipi em Chamas”, os Estados Unidos do racismo, refletindo e se conciliando num avanço considerável na sua história e no seu processo civilizatório. Que fique claro isso.

            Mas continuo a leitura do artigo do Wladimir:

A grande mídia não mediu esforços para encobrir a grave crise econômica e social que assola aquele grande país, omitir a manutenção da mesma política externa que levou os Estados Unidos ao atoleiro do Afeganistão e do Iraque e encobrir o apoio do governo norte-americano aos governos ditatoriais da África do Norte e da Arábia.

Em resumo, fez de tudo para dourar a pílula do que deseja realmente Mr. Obama em sua viagem ao Brasil. E tem sido incapaz de mostrar sua afronta ao Brasil, tipo Bush Filho, ao ordenar o bombardeamento da Líbia em seu primeiro dia de visita ao governo brasileiro.

Apesar de falar em paz e cooperação, Sr. Obama demonstrou que pratica guerra e imposição. Embora tenha dito ter apreço à pretensão brasileira de participar do Conselho de Segurança da ONU, não avançou um til sequer na promessa vaga de continuar trabalhando com todos pela reforma daquele órgão multilateral. E não deu qualquer sinal de que afrouxará as barreiras à entrada dos produtos brasileiros no mercado estadunidense.

Em outras palavras, o Sr. Obama esbanjou simpatia, tanto a própria quanto a fabricada, mas não se mostrou disposto a pagar nem um cafezinho. Isso não acontece por acaso. Já antes da catástrofe que assola o Japão, os Estados Unidos enfrentavam uma crescente dificuldade para colocar seus bônus do Tesouro, indispensáveis para financiar seus diferentes déficits e para salvar seus bancos da bancarrota.

O Japão interrompera a aquisição daqueles títulos, a China procurava outras formas de aplicar seus excedentes financeiros, os países árabes produtores de petróleo se resguardavam diante dos levantes populares e até a Grã-Bretanha, fiel aliada dos EUA, se via obrigada a direcionar seus recursos financeiros para pagar a dívida pública. Diante desses movimentos, o FED já se via constrangido a comprar mais de 70% das emissões dos bônus de seu próprio Tesouro.

            E continua o artigo de Wladimir:

A tríplice catástrofe que se abateu sobre o povo japonês pressionará o governo do Japão a despejar seus recursos financeiros na reconstrução das regiões destruídas, na adoção de medidas radicais para substituir alimentos e outros bens contaminados pelas radiações nucleares, e na reativação da economia japonesa. Nessas condições, o Japão pode se transformar-se de grande comprador de bônus do Tesouro americano em vendedor desses bônus no mercado internacional. Combinada aos demais fatores que já afetavam o mercado desses títulos, a situação japonesa pode representar um golpe destruidor sobre o principal mecanismo utilizado pelos Estados Unidos para financiar a continuidade de sua economia.

Nessas condições, será muito difícil ao governo do Sr. Obama tratar adequadamente seus débitos internos e internacionais, manter suas taxas de juros no atual patamar próximo de zero, utilizar eficientemente a desvalorização do dólar como fator de elevação da competitividade de seus produtos e de reativação de sua economia, e resolver a favor dos Democratas a disputa fratricida que estão mantendo com os radicais republicanos. Na verdade, o We Can do Sr. Obama está se tornando, cada vez mais, em We Cannot. Afinal, não é preciso ser um analista arguto para notar que nenhum de seus compromissos eleitorais foi cumprido.

Para agravar o quadro geral da crise norte-americana, a decisão do governo Obama de estimular seus aliados sauditas e de outros países árabes a intervir no Bahrein e reprimir as manifestações populares dos povos árabes por melhores condições de vida, reformas democráticas e soberania nacional, já representavam medidas perigosas que podiam tornar ainda mais caótica a situação das regiões do norte da África e da Península Arábica, tanto do ponto de vista político, quanto social e econômico. O que, inevitavelmente, rebaterá desfavoravelmente sobre a crise norte-americana.

A decisão, em conjunto com a França, Inglaterra e Itália, de intervir nos negócios internos da Líbia, com pretextos idênticos aos utilizados no Afeganistão e no Iraque, pode agravar ainda mais, exponencialmente, todos os fatores de instabilidade e caos presentes no cenário mundial e no cenário interno norte-americano, a começar pelo potencial fator de elevação do preço do petróleo, a principal fonte energética da economia norte-americana.

Mas podemos agregar a tudo isso outros fatores de crise. Os preços das demais commodities minerais e agrícolas devem continuar se elevando. O Japão terá grandes dificuldades para continuar abastecendo o mercado mundial de componentes eletrônicos vitais para o funcionamento da economia global altamente informatizada. Haverá uma parada obrigatória, mesmo momentânea, para a revisão dos projetos de energia nuclear, agravando os problemas produtivos em países, como a França, que possuem fortes cadeias industriais voltadas para esse setor.

Talvez por isso, com a França tendo uma forte indústria bélica, o governo Sarkozi tenha se mostrado tão belicista em relação à Líbia. Supõe, como os antigos imperialistas, que a guerra pode ser um instrumento de reativação econômica. Nem se deu conta de que os custos astronômicos dos atuais equipamentos bélicos vão agravar ainda mais a crise financeira da zona do euro. E que os custos de reconstrução das áreas destruídas pesarão consideravelmente, seja sobre os orçamentos já em crise, seja sobre a posição política desses falcões.

Por tudo isso, talvez possamos afirmar que os Estados Unidos, assim como seus aliados europeus, não estão em condições de transformar simpatia em projetos positivos. Para comprovar isso, basta examinar a posição dos Estados Unidos diante da tríplice tragédia japonesa. Eles estão sem qualquer condição de contribuir com qualquer ajuda financeira ou com a abertura de seus mercados. Depois, vão reclamar da China, que, segundo muitos analistas, é a única que se acha em condições de oferecer uma ajuda financeira real ao Japão e abrir seu mercado para a recuperação das empresas e da economia japonesa.

O mesmo em relação ao Brasil. Mr. Obama quer maior abertura para os produtos norte-americanos sem reduzir em nada os entraves à entrada da carne, etanol, sucos, algodão e outros produtos brasileiros no mercado norte-americano. Também não quer equilibrar a balança comercial entre os dois países. Mas Mr. Obama ofereceu financiamentos de um bilhão de dólares como se estivesse ofertando a maior fortuna do mundo.

A presidenta Dilma poderia ter dito a ele que o Brasil está financiando os Estados Unidos em cerca de 8 bilhões de dóllares anuais, que é o saldo dos EUA no comércio com o Brasil. Também poderia ter dito que os chineses, apenas para a exploração do pré-sal, financiaram US$ 10 bilhões. Talvez não o tenha feito por educação e também porque, afinal, mesmo não pagando nem o cafezinho, a simpatia  do casal Obama é inegável.”

            Este artigo de Wladimir Pomar substitui meu discurso. Minha intenção, ao trazê-lo ao plenário do Senado e à TV Senado, é me contrapor a essa unanimidade da mídia ao fazer elogio do que não pode ser elogiado, essa pressão absoluta pela condução da opinião pública.

            Quando, Senador Pedro Simon, faço a crítica aos famosos Ministros Recoletos Descalços, que se submeteram a uma revista humilhante, quero fazer aqui também o elogio pela omissão da presença do ex-Presidente Lula no encontro com o presidente americano. Sem a menor sombra de dúvida, do ponto de vista da afirmação da nacionalidade, a ausência de Lula preencheu uma grande lacuna.

            Como disse Obama, talvez num momento de ironia, afirmo hoje aqui que cada vez mais no Brasil, Lula é o “cara”.

            Obrigado, Presidente.


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Este texto não substitui o publicado no DSF de 26/03/2011 - Página 8343