Discurso durante a 37ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Denúncia da existência de casos de corrupção em vários setores da vida pública, destacando o da saúde pública nacional; e outros assuntos.

Autor
Alvaro Dias (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/PR)
Nome completo: Alvaro Fernandes Dias
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
SAUDE.:
  • Denúncia da existência de casos de corrupção em vários setores da vida pública, destacando o da saúde pública nacional; e outros assuntos.
Aparteantes
Marinor Brito, Marisa Serrano.
Publicação
Publicação no DSF de 29/03/2011 - Página 8589
Assunto
Outros > SAUDE.
Indexação
  • DENUNCIA, CORRUPÇÃO, SETOR, SAUDE PUBLICA, DESVIO, FUNDOS PUBLICOS, CRITICA, INCOMPETENCIA, GESTÃO, EFEITO, PREJUIZO, PRESTAÇÃO DE SERVIÇO.
  • CRITICA, PRETENSÃO, GOVERNO FEDERAL, RETOMADA, COBRANÇA, CONTRIBUIÇÃO PROVISORIA SOBRE A MOVIMENTAÇÃO FINANCEIRA (CPMF).
  • APOIO, PROPOSIÇÃO, TRAMITAÇÃO, CAMARA DOS DEPUTADOS, FIXAÇÃO, RESPONSABILIDADE, UNIÃO FEDERAL, REPASSE, PERCENTAGEM, ORÇAMENTO, DESTINAÇÃO, SAUDE.

                          SENADO FEDERAL SF -

            SECRETARIA-GERAL DA MESA

            SUBSECRETARIA DE TAQUIGRAFIA 


            O SR. ALVARO DIAS (Bloco/PSDB - PR. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador) - Srª Presidente Ana Amelia, Srªs e Srs. Senadores, fica a impressão de que há uma fábrica de escândalos no Brasil. Se olharmos para o que se divulgou no último fim de semana, vamos verificar que há uma produção inesgotável de corrupção na atividade pública brasileira.

            Começo citando a denúncia de corrupção, revelada pelo jornal O Globo, na área da saúde pública do País. Justamente nesse setor. Está escrito na Secretaria de Saúde do Paraná, em Curitiba, uma frase: “A saúde do povo é a suprema lei.” Deveria ser: “No Brasil, a saúde do povo é o caos, é a tragédia administrativa, é a consagração da incompetência.”

            Saúde pública deveria ser o debate da década. No entanto, o único debate que se anuncia, que se insinua, que se ensaia é o debate sobre o restabelecimento da CPMF para financiamento do serviço de saúde pública do País. Lastimável!

            O que nós verificamos, nesses dias, com mais esta denúncia, é que o Banco Mundial tinha razão, quando concluiu estudos afirmando que a questão da saúde pública no Brasil não é dinheiro, é desorganização, falta de planejamento, incompetência de gerenciamento e corrupção.

            Há poucos dias, a denúncia de que roubam na Farmácia Popular. A Farmácia Popular, que se constitui em esperança na camada mais pobre da população para atender as suas necessidades de medicamentos, tornou-se também porta aberta à corrupção. A denúncia está nos jornais dos últimos dias.

            Agora, nesse fim de semana, a revelação de que R$600 milhões foram desviados em dois anos. No ano de 2007 e 2008, R$662 milhões foram para o ralo. Mas o prejuízo deve ser bem maior, pois somente 2,5,% das chamadas transferências fundo a fundo são fiscalizadas, de acordo com a Controladoria Geral da União.

            Eu considero que quem rouba dinheiro da saúde se torna ladrão, mas também assassino, porque, certamente, o roubo é a causa para a morte de milhares de brasileiros desassistidos, muitos morrendo em filas de hospitais, não apenas no interior do País, mas a partir da própria capital.

            Aqui em Brasília, no ano passado, eu fui procurado por pessoas desesperadas que queriam salvar a vida de dois de seus familiares. Um caso, um acidente na Bahia, a transferência para o Hospital de Base em Brasília, a necessidade da amputação da perna e uma fila enorme. O doente foi transferido para o Hospital Regional em Cascavel, no Paraná. Vejam a distância. Um outro, depois de muita insistência, de muita persistência, acabou sendo atendido com muito atraso. E as consequências são inevitáveis.

            Portanto, saúde pública no Brasil é caos, da capital ao interior, do interior à capital. E a única alternativa que encontram é discutir a hipótese do retorno da CPMF, quando há, na Câmara dos Deputados, uma proposta que seria a solução, com a fixação da responsabilidade da União de repassar 10% do Orçamento para o atendimento da saúde pública no País. Mas o que se constata é que há corrupção, há incompetência, há desorganização, há ausência de planejamento.

            A Srª Marinor Brito (PSOL - PA) - Concede-me V. Exª um aparte?

            O SR. ALVARO DIAS (Bloco/PSDB - PR) - Não é a oposição no Brasil que faz a constatação; é o próprio Banco Mundial, que tem equipe técnica qualificada para investigar a realidade.

            E é por isso que propusemos, Senadora Marisa Serrano, há algum tempo, que o debate sobre saúde pública no Brasil pudesse se transformar no debate da década.

            Concedo um aparte, primeiramente, à Senadora Marisa, que pediu antes, e depois à Senadora Marinor.

            A Srª Marisa Serrano (Bloco/PSDB - MS) - Senador Alvaro Dias, muito pertinente a sua fala hoje sobre o que as pesquisas todas indicam como o maior problema que o brasileiro sente hoje no País. Acima da violência, da falta de segurança pública, é a saúde a questão maior vivida pelo brasileiro. E tudo aquilo que V. Exª colocou nós estamos ouvindo de toda a população brasileira, não só dos nossos Estados. V. Exª está ouvindo da população do seu querido Paraná, mas eu estou ouvindo de Mato Grosso do Sul também. Tenho certeza que esse é um clamor nacional. E concordo com V. Exª que a questão de mais recursos colocados na saúde sem que haja seriedade, planejamento e consciência de que temos que tratar bem a questão da saúde, principalmente os recursos da saúde, é fundamental. Nós precisamos saber se temos médicos para irem para o interior, abrir caminhos para que eles possam realmente trabalhar no interior deste País. E eu falo isso porque inúmeras cidades de Mato Grosso do Sul que têm uma dificuldade imensa de conseguir um médico que possa atender a sua população. Então, a interiorização da medicina é fundamental. É fundamental que os nossos médicos ganhem o suficiente para não ficarem com quatro, cinco empregos, indo só uma hora em um, duas horas em outro, e fazer um acompanhamento efetivo nos postos de saúde, onde eles trabalham, sem ficar pulando de um lugar para outro sem atender bem à população. E depois nós não ouvimos, durante a campanha política, ninguém falar em ressuscitar impostos. Ninguém falou na volta da CPMF. Ninguém disse que os impostos voltariam no Brasil. Era justamente o contrário. Era desonerar o País, era melhorar a reforma tributária, fazer uma reforma tributária justamente para diminuir os impostos. E o que nós estamos vendo hoje? A discussão da volta da CPMF; o IOF está subindo em todo o País - quem está comprando no exterior sabe disso. Quer dizer, aos poucos, estão voltando os impostos neste País. Portanto, V. Exª tem toda razão. A corrupção está se tornando endêmica neste País, e nós temos que dar o exemplo, nós aqui desta Casa, mas também todos aqueles que governam e têm a obrigação de governar bem todos os munícipes deste País.

            O SR. ALVARO DIAS (Bloco/PSDB - PR) - Muito obrigado, Senadora Marisa. Veja, só em Franca, um relatório do próprio Ministério da Saúde que foi divulgado mostra o desvio de R$2,5 milhões da Farmácia Popular - só em Franca! Eu me referi a R$662 milhões, mas pode ser muito mais, já que, como eu disse, somente 2,5% das transferências são fiscalizadas. Portanto, esse valor pode ser infinitamente maior. E onde está a indignação? O que se consagra num fato como este é que a impunidade prevalece no Brasil como conseqüência da banalização da corrupção, que foi, talvez, o maior desserviço que se prestou à Nação nos últimos anos. A corrupção não provoca mais indignação.

            Em outros tempos, certamente, ao se anunciar que roubaram mais de R$600 milhões da saúde pública, nós teríamos uma reação compatível com a grandeza do assalto praticado. No entanto, hoje, não há reação compatível. A indignação não tem o tamanho do crime que se pratica no Brasil. Em nenhum momento se verifica uma correspondência em relação à proporção do crime praticado. Nesse caso, é crime hediondo, porque o ladrão é assassino, já que pessoas morrem como consequência da escassez de recursos para atender o serviço público de saúde no País.

            Eu concedo à Senadora Marinor o aparte que solicita.

            A Srª Marinor Brito (PSOL - PA) - Eu acho que este tema é bastante pertinente. Eu estou preparando alguns dados da situação da saúde no meu Município, o que vem ao encontro da preocupação de V. Exª. Estamos preocupados com a situação da saúde no Brasil, que é grave sob vários aspectos: os recursos destinados são poucos, porque o pagamento da dívida pública continua tendo prioridade no Brasil, mas existe uma situação de acomodação por parte do Governo Federal, por parte das estruturas do Governo Federal, na perspectiva da fiscalização dos recursos. Na cidade de Belém, capital do Estado do Pará, só contra o Prefeito Duciomar Costa, que é ex-Senador desta Casa e atual Prefeito, só na área da saúde há dez ações, dez ações do Ministério Público Federal, entre ações criminais, ações civis públicas e ações de improbidade. Morte nas unidades de saúde, por falta de atendimento, por falta de médico, por falta de medicamento, por falta de um desfibrilador; isso é rotina. E o que assusta é exatamente a banalização do assunto. O que está me causando calafrio, porque são os filhos do povo que estão necessitando desse atendimento, é como os governos estão tratando disso, como o Governo Federal trata. Em cada processo de investigação por parte da Controladoria da União - que uma vez seleciona um Município para investigar, não tem uma rotina de investigação da aplicação dos recursos -, há novas denúncias. Esta semana, virou notícia no Estado do Pará a revolta da população de Curralinho, uma cidade incrustada no centro da Ilha de Marajó, onde a malária é o principal motivo de morte da população. E simplesmente foi detectado o desvio de dinheiro público. A Câmara Municipal daquela cidade tentou apurar o assunto e foi impedida de apurar. A população se revoltou, teve quebra-quebra, enfim. Agora, os trabalhadores, os lutadores, os que sofrem a consequência do desvio, do roubo de dinheiro público estão sendo perseguidos pela polícia, porque foram reclamar. Enquanto isso, qual é a atitude do Governo Federal? Como é que ele pensa em interferir para alterar essa situação do Sistema Único de Saúde? Propondo o aumento da CPMF. É a única saída, é a única coisa que tem a fazer? Nada mais tem o Governo Federal a fazer? Qual é o seu papel no acompanhamento das políticas públicas, na fiscalização? Contra o sistema de ambulâncias no Brasil, de urgência e de emergência, são poucas as cidades que não têm denúncia, são poucas as cidades brasileiras que não têm denúncia. E é um sistema controlado pela União. Urgência, emergência, renais crônicos, tudo que envolve recurso federal e controle da União está nessa situação. Eu pretendo pedir o apoio de V. Exªs, porque a situação no meu Estado é tão grave que os juízes federais estão saindo de lá. Não tem juiz federal para julgar essas dez ações contra o Prefeito Duciomar Costa. A minha cidade entrou no Cadin pela primeira vez na história, por conta de desvio de dinheiro público. Só está indo recurso da assistência, da educação e da saúde, porque são verbas carimbadas, são serviços essenciais. E ninguém faz nada! E ninguém faz nada! Então, nosso papel aqui é denunciar, mas é também pedir providências. E, nesta semana, em todas as esferas - estadual, municipal e federal -, em todo órgão público que possa atuar no enfrentamento dessa situação da saúde no meu Estado, eu estarei tomando providências. Na semana que vem, estarei dedicada a essa questão. Muito obrigada.

            O SR. ALVARO DIAS (Bloco/PSDB - PR) - Muito obrigado, Senadora Marinor. Faz muito bem V. Exª, terá sempre o nosso apoio.

            E veja, essa é uma revelação surpreendente, porque diz respeito apenas à investigação de 2,5% dos recursos transferidos. Em 2,5%, o montante do rombo é de R$662 milhões. Se nós fizermos aí a conta, se nós fizermos a média, certamente nós vamos chegar a um valor assustador de desvio na área de saúde pública no País. Apenas em Franca, na farmácia popular, R$2,4 milhões. E nós sabemos que não é só lá que ocorre o desvio.

            Mas eu tinha elencado aqui, e vejo que o meu tempo vai-se esgotando, 1, 2, 3, 4, 5, 6, 7 tópicos de irregularidades anunciadas nos últimos dias, e estou ainda na primeira. Portanto, nós não damos conta. Senadora Marisa, às vezes, nós somos cobrados: “Onde está a Oposição?”. A Oposição faz o que pode, numericamente fragilizada, numericamente em desvantagem acachapante. E são tantos os casos, são tantas as denúncias, a corrupção se tornou prática rotineira no Brasil, que nós não damos conta realmente. Como hoje pretendia falar sobre vários tópicos de irregularidade, e estou ainda no primeiro deles.

            O outro seria a denúncia do Fantástico, da Rede Globo, a respeito de um crime nas estradas, mostrando a venda aberta de drogas nas estradas brasileiras, inclusive com compra através de cartão de crédito. Veja a modernização do crime em nosso País: vende-se cocaína nos postos de gasolina, paga-se com cartão de crédito e nota fiscal do posto de combustível. Só que esse é outro combustível, as consequências desse combustível são outras. Mas compra-se com cartão de crédito e nota fiscal nas estradas brasileiras. É lamentável que a impunidade possa produzir tanto mal ao povo brasileiro.

            A outra denúncia - eu vou concluir atendendo aos apelos da Presidente - diz respeito à denúncia na Folha de S.Paulo sobre laranjas que seriam utilizados para concessão de emissoras de rádio e TV, incluindo políticos, alguns religiosos. Isso precisa ser investigado.

            O PSDB vai apresentar um requerimento na Comissão de Ciência e Tecnologia, subscrito pelo Senador Aloysio Nunes Pereira, para que, em audiência pública, o Governo possa prestar esclarecimentos sobre as denúncias que são da maior gravidade. O objetivo é ocultar movimentações financeiras, ludibriar a regra que impede que instituições como igrejas sejam donas de concessões. O artifício é velho e conhecido do Poder Público.

            Essa é uma denúncia que precisa ser apurada, é uma denúncia da maior gravidade, que envolve especuladores, políticos etc.

            Portanto, que essa audiência pública possa permitir o esclarecimento, ouvindo as autoridades responsáveis.

            Srª Presidente, muito obrigado. Lamentavelmente não foi possível falar sobre outras questões relevantes que havia anotado para, sobre elas, discorrer desta tribuna.

            Muito obrigado.


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Este texto não substitui o publicado no DSF de 29/03/2011 - Página 8589