Discurso durante a 42ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Expectativa pela aprovação, amanhã, de requerimento de autoria de S.Exa., solicitando voto de louvor ao Ministro Garibaldi Alves Filho; e outros assuntos. (como Líder)

Autor
Randolfe Rodrigues (PSOL - Partido Socialismo e Liberdade/AP)
Nome completo: Randolph Frederich Rodrigues Alves
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
PREVIDENCIA SOCIAL. CALAMIDADE PUBLICA. ESTADO DEMOCRATICO.:
  • Expectativa pela aprovação, amanhã, de requerimento de autoria de S.Exa., solicitando voto de louvor ao Ministro Garibaldi Alves Filho; e outros assuntos. (como Líder)
Aparteantes
João Pedro, Pedro Taques.
Publicação
Publicação no DSF de 06/04/2011 - Página 9673
Assunto
Outros > PREVIDENCIA SOCIAL. CALAMIDADE PUBLICA. ESTADO DEMOCRATICO.
Indexação
  • ELOGIO, MINISTERIO DA PREVIDENCIA SOCIAL (MPS), INICIATIVA, AMPLIAÇÃO, ACESSO, PREVIDENCIA SOCIAL, INTERIOR, BRASIL.
  • SOLICITAÇÃO, AGILIZAÇÃO, AUXILIO, PREFEITURA, MUNICIPIO, CALÇOENE (AP), ESTADO DO AMAPA (AP), REFERENCIA, RECUPERAÇÃO, INUNDAÇÃO.
  • COMENTARIO, ARTIGO DE IMPRENSA, PERIODICO, CARTA CAPITAL, ESTADO DE SÃO PAULO (SP), REGISTRO, SOLENIDADE, COMANDO MILITAR, REGIÃO NORDESTE, SAUDAÇÃO, INICIO, DITADURA, REPUDIO, ORADOR, INICIATIVA, MILITAR.

                          SENADO FEDERAL SF -

            SECRETARIA-GERAL DA MESA

            SUBSECRETARIA DE TAQUIGRAFIA 


            O SR. RANDOLFE RODRIGUES (PSOL - AP. Pela Liderança. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Senador João Pedro, quero utilizar o tempo regimental, rapidamente, porque assumi compromisso ainda há pouco com o Senador Flexa Ribeiro, porém, quero tratar de três assuntos.

            Em primeiro lugar, aprovamos e encaminhamos (deveremos aprovar amanhã) voto de louvor, de nossa autoria, ao Ministério da Previdência Social, notadamente ao Ministro Garibaldi Alves. Considero muito importante a ação do Ministério da Previdência Social em interiorizar a Previdência. Estive com o Ministro, no último domingo, no Município de Porto Grande, no interior do Amapá, e destaco a importância dessa ação, consagrando um direito social básico, de segunda geração, que é o direito à previdência pública.

            Entretanto, falei na solenidade sobre isso, mas há outro tema a debatermos. Ainda na questão da Previdência Social, uma questão que novamente tem voltado a ser colocada, que é a questão do déficit da Previdência. Lembrei-me, nessa solenidade, que, em que pesem as argumentações de que a Previdência é deficitária, lembremos que a Seguridade Social, onde está incluída a Previdência, que foi a grande conquista da Constituição de 1988, é superavitária. Mas esse é um debate que, com certeza, iremos travar aqui no Plenário do Senado e na Câmara dos Deputados em breve.

            O segundo assunto, Sr. Presidente, tive a notícia e a informação agora de uma contínua chuva que está ocorrendo no norte do Estado do Amapá, no Município de Calçoene, na região entre os rios Oiapoque e Calçoene. Lembro que essa região tem a maior precipitação pluviométrica do País, Calçoene é a cidade do País em que mais chove. A precipitação pluviométrica em Calçoene é de 4.165mm. Então, este Município chove há 24 horas e esta chuva tem trazido um conjunto de transtornos para a população desse Município. A Prefeita do Município estará em breve aqui em Brasília. É importante - e quero pedir - a agilização das solicitações da Prefeitura junto ao Ministério das Cidades e que já foram protocoladas desde o ano passado.

            Agora, Presidente, por fim, chamou-me a atenção a capa da revista Carta Capital desta semana, que trazia uma matéria especial com o título “O Fantasma Fardado. Confesso que me assustei com o teor da matéria, com o título “Os Saudosistas”. A matéria inicia-se com um convite do Comando Militar do Nordeste. É um convite datado da semana passada. Esse convite diz: “O Comandante Militar do Nordeste tem a honra de convidar V. Sª e digníssima família para a solenidade militar alusiva à Revolução Democrática de 31 de março de 1964, a realizar-se no Quartel General do Comando Militar do Nordeste”. Diz que é preciso traje esporte fino; as demais forças com uniforme correspondente... Senador Paulo Paim, fiquei, particularmente, assustado ao ver esses fantasmas surgirem do fundo do baú.

            Ainda bem que agiu rápido o Ministro Nelson Jobim, que desautorizou qualquer celebração do fatídico 31 de março, embora tenha alguns setores que não tiveram o mesmo comedimento. O Clube Militar do Rio de Janeiro fez a celebração dessa data. E o que chama a atenção - o que é de preocupar - é que, se fosse um ato vindo à tona por alguns militares quase da reserva, indo para a reserva, não nos preocuparia tanto, mas o ato do Clube Militar do Rio de Janeiro, essa semana, teve a presença de nomes da intelectualidade brasileira, que destacaram o papel da “Gloriosa Revolução de 1964”. Por isso, propus um voto de censura ao Clube Militar do Rio de Janeiro.

            Não é possível, mais de 20 anos depois da Constituição de 1988, com o restabelecimento do Estado democrático de direito no Brasil, assistirmos passivamente a episódios dessa natureza. Episódios dessa natureza só realçam a necessidade, Senador Paim, que temos em concluir o processo de transição democrática no Brasil e, nesse sentido, instalarmos a comissão da verdade. Temos tido vários argumentos, por conta dos que são opositores a essas ideias, contrários à instalação da comissão da verdade. Continuam com a argumentação antiga de que esse fato, a instalação da comissão, não contribuirá para a paz.

            Semana passada fizemos aqui a lembrança, como forma de reflexão, do fatídico 31 de março, como forma de reflexão para que não mais aconteça. E ao fazermos, ao contrário da celebração feita no Rio de Janeiro, que foi uma celebração para comemorar, ao contrário do que dizem, “o que passou, passou”, queremos continuar afirmando que a data 31 de março, ao contrário de ser celebrada, deve ser lembrada para que não se repita. Não pode ser aceita em nossa democracia a celebração de um golpe de Estado contra o Estado democrático de direito, contra uma ordem constitucional vigente.

            O Sr. João Pedro (Bloco/PT - AM) - V. Exª me permite um aparte?

            O SR. RANDOLFE RODRIGUES (PSOL - AP) - Senador João Pedro, é com muito prazer que ouço o seu aparte.

            O Sr. João Pedro (Bloco/PT - AM) - Senador Randolfe, primeiro, quero prestar a minha solidariedade ao povo do Estado do Amapá, que vem sofrendo com uma chuva de mais de 24 horas. As chuvas lá na nossa região, a Amazônia, são diferenciadas. Imagino as dificuldades que a população vive com chuvas intensas. Então a minha solidariedade ao povo do Amapá. Segundo, quero me associar ao pronunciamento de V. Exª no que diz respeito a essa postura inadequada de militares em comemorar. Comemorar o quê? Essa triste memória da construção da democracia em nosso País? É Inaceitável. Veja que não quero olhar pelo retrovisor. Quero tocar para a frente, olhar para a frente com as instituições, com o Estado brasileiro, inclusive com os militares que queiram construir uma Nação independente, soberana, democrática, mas lembrar, comemorar a passagem de 64 não tem o nosso reconhecimento, o nosso apoio. Não tem e não pode ter. Não podemos conceber, por pior que seja o governo eleito, que possamos corrigir os defeitos de um Presidente eleito, de um Congresso eleito, a partir da prisão, do cerceamento das liberdades políticas, das liberdades democráticas, das liberdades de imprensa, marcadas pelo Golpe de 1964. Então, é inaceitável essa lembrança! Precisamos olhar para a frente, lembrar sempre do que passou não só o Brasil, mas a América Latina, o golpe no Uruguai, na Argentina, que triste memória! No Chile... Então, precisamos olhar para a frente e aperfeiçoar os instrumentos democráticos de um Estado de direito. Agora, lembrar o golpe militar, os assassinatos, as prisões, a ilegalidade, a brutalidade, o Congresso cercado, lideranças que foram cerceadas, presas, assassinadas... É inaceitável esse momento da triste história recente do nosso País. Parabéns pela lembrança, pela crítica e, ao mesmo tempo, pela censura a esse.... Não é censura, mas uma reflexão de que precisamos fazer como amantes da democracia, como homens públicos em defesa dos direitos da sociedade civil, da liberdade. Então, V. Exª está correto em fazer essa crítica à postura de alguns militares que tentam exaltar essa passagem triste da história do Brasil.

            O SR. RANDOLFE RODRIGUES (PSOL - AP) - Senador João Pedro, incorporo no todo ao meu pronunciamento o aparte de V. Exª, concordando plenamente com V. Exª. Sei que essa posição não é do conjunto das Forças Armadas, sei que essa posição não é do oficialato. Inclusive, destaquei que a manifestação do Clube Militar do Rio de Janeiro contou com a participação de membros civis, de intelectuais, que foram fazer a celebração, Senador Pedro Taques, dessa fatídica data para a democracia brasileira. Sei que essa não é a posição das Forças Armadas brasileiras, não é a posição do Ministério da Defesa. E aí me congratulo com o Ministro Jobim por ter desautorizado os comandos militares que pretendiam fazer lembrança comemorativa dessa data.

            Quero dizer, Senador João Pedro, que temos de concluir esse capítulo da nossa história. Por isso, é cada vez mais importante a instalação da Comissão da Verdade.

            No último dia 30 de março, o Programa Conexão Repórter, apresentado pelo premiado Roberto Cabrini, realizou uma matéria especial sobre os 47 anos do golpe e entrevistou três figuras emblemáticas: o ex-senador Jarbas Passarinho, o Sr. Sebastião Rodrigues de Moura, o conhecido Curió, e o Sr. João Lucena Leal, que é tido como um dos mais conhecidos torturadores do período militar. O Sr. Curió trouxe uma revelação importantíssima, feita no dia 21 de junho de 2009, no Estado de S. Paulo. Ele disse o seguinte: em vez de 25 guerrilheiros que haviam morrido na Guerrilha do Araguaia, como havia sido noticiado até então, teriam sido na verdade executados 41 guerrilheiros.

            Mais adiante, esse Sr. João Lucena - e é bom refrescar a memória sobre quem é ele - também concedeu entrevista à revista Veja de 9 de dezembro de 1998. É importante suscitar o que o Sr. João Lucena disse naquele momento:

(...) e preso não tem resistência. Vai resistir para quê? Para morrer? Eu dava dez, quinze socos, mas não na cara, pois arrebenta o maxilar, quebra os dentes. Eu batia na barriga, no peito. Não deixava marca, hematoma, nada. Aí eles davam a informação. Eu sempre procurei prender vivo. Assim a gente podia desenvolver a investigação e avançar no trabalho. Pratiquei muita ação psicológica. Levava o cara para a estrada e parava o carro. Aí dizia: “Vamos matar”. Ele sabia que matava. (...) Quando colocava a mão em um terrorista, levava para um descampado, à noite, e dizia: “Ou você confessa, ou está rachado. Vamos te matar agora”. (...) E a ordem era baixar o pau. Então, eu baixava o pau. (...) Dizer que ninguém morreu ou foi espancado é negar a própria história.

            Essas são as palavras de um dos mais conhecidos torturadores do regime militar. Então, episódios como esses têm que ser passados a limpo.

            Quatrocentos e setenta e nove pessoas foram eliminadas durante a ditadura; 163 dessas 479 se tornaram desaparecidos políticos. Nós não podemos - e tenho aqui a condição de historiador também e conhecendo a história como um processo - admitir que o passado não faça parte do presente. Nós temos que concluir esse triste capítulo da nossa história.

            Eu quero lembrar, Senador Pedro Taques, antes de conceder o aparte a V. Exª, com muita honra, que nas sociedades antigas, Senador Paim, quando os generais levavam seus exércitos para as batalhas, ao final, havia um espaço de trégua para que cada um pudesse recolher os seus mortos e celebrar o luto.

            Vejam só, quase 200 famílias brasileiras não tiveram ainda esse direito de celebrar o luto, de ter a informação sobre o seu desaparecido político, de saber o que aconteceu com ele. Essa informação precisa, necessita ser resgatada.

            Concedo um aparte, com muito prazer, ao meu querido amigo Senador Pedro Taques.

            O Sr. Pedro Taques (Bloco/PDT - MT) - Senador Randolfe, quero parabenizar V. Exª por sua fala e dizer que apoio integralmente a constituição da Comissão da Verdade, porque não há paz sem que nós tenhamos justiça. Não é isso? Nós precisamos revelar os fatos que ocorreram sem revanchismo, mas a sociedade brasileira precisa encontrar esse ponto. Nós todos conhecemos que os Estados latino-americanos que passaram também por esse processo de autoritarismo - todos - fizeram ou estão fazendo essa justiça de transição. E a República Federativa do Brasil, que se diz ao menos formalmente um Estado Democrático de Direito, está a dever à sociedade, não só à sociedade brasileira. Um Estado que quer se inserir no contexto das nações que se dizem civilizadas está a dever a revelação dos fatos que efetivamente ocorreram nesse período escuro da nossa história. Quero, com isso, me somar a V. Exª nessa luta pela Comissão da Verdade. Nós temos também que refletir um pouco a respeito da consequência ou das consequências da não revelação dessa verdade. O aparelho policial brasileiro é absolutamente violento ou corrupto. Isso decorre de quê? Qual é a causa disso? É a falta de revelação da verdade sobre aquele momento histórico. As próprias Forças Armadas, penso eu, devem ter interesse também em demonstrar o que ali ocorreu. Com isso, quero parabenizar V. Exª e também, Sr. Presidente, registrar a presença aqui do Procurador da República Marlon Alberto, que foi um dos Procuradores da República que participou das investigações a respeito daqueles desaparecidos ou mortos na Guerrilha do Araguaia, junto com outros colegas, e que é, dentro do Ministério Público Federal, um daqueles que defendem a constituição e a formação da Comissão da Verdade, que fará com que, efetivamente, possamos atingir a paz, mas com justiça.

            O SR. RANDOLFE RODRIGUES (PSOL - AP) - Senador Pedro Taques, quero incorporar também, no todo, o aparte de V. Exª. V. Exª vem de uma instituição que orgulha o Estado Democrático de Direito, que é o Ministério Público. E o Ministério Público tem sido incansável na defesa desses valores da nossa democracia. Nós temos que concluir esse processo de transição democrática. E só o concluiremos quando fizermos, Sr. Presidente, o mesmo processo que fizeram outros países vizinhos e irmãos nossos. O Uruguai instalou a sua comissão de conciliação, assim como a Argentina, que, cortando na própria carne, ajustou as contas com aqueles que cometeram crimes durante o arbítrio. Até o Chile, que teve a mais sanguinária ditadura do continente, fez o acerto com seu passado.

            E quando digo acerto, concordo com V. Exª, Senador Pedro Taques, não é revanchismo. Tenho certeza, tenho convicção de que as Forças Armadas brasileiras, leais ao Estado Democrático de Direito, leais à Constituição, leais ao mandamento da submissão do poder militar ao poder civil, hão de concordar que temos que, em definitivo, virar essa página da história brasileira.

            Alguns tentam, como chantagem, dizer: “Não, mas tem que apurar dos dois lados”. Tem que apurar tudo que ocorreu no passado. Embora, Srs. Senadores, muitos militantes de um lado já tenham pago, ou com a prisão, ou com o exílio, ou com o cemitério. Então, na verdade, não foi uma guerra. É inadequada a argumentação de que ocorreu uma guerra. Ocorreu um massacre contra brasileiros. Não pode haver eufemismos, como pretendem as interpretações de alguns setores mais atrasados ou desse propalado clube do Rio de Janeiro. Não existe versão mais amena para a quebra da ordem democrática em 1964. Não pode existir versão mais amena para os vinte anos de arbítrio que instalaram no Brasil.

            Lembremos, Sr. Presidente, que aqui no Congresso Nacional, há 22 anos, o Presidente da Assembleia Constituinte, Deputado Ulysses Guimarães, em seu pronunciamento de conclusão dos trabalhos da Assembleia Constituinte, disse uma frase, uma expressão - estava ouvindo há pouco tempo - que remete ao espírito do nosso processo de redemocratização: foi a sociedade que abriu as portas para a democracia. A sociedade, dizia Ulysses Guimarães, era o povo nas ruas pedindo Diretas Já. O Estado eram os facínoras que mataram Rubens Paiva e tantos outros.

            Em memória de tantos, em memória daqueles que lutaram e por uma questão de justiça, o Estado brasileiro precisa concluir o processo de transição democrática. E só o fará, o quanto antes, agilizarmos o projeto da Comissão da Verdade, que está na Câmara. O projeto tramitará na Câmara, virá ao Senado, nós o aprovaremos e, dessa forma, nós passaremos a limpo e realizaremos a conciliação nacional. Só se realiza a conciliação nacional em nosso País quando soubermos o destino de centenas de brasileiros e pudermos acalentar famílias que querem saber o paradeiro de seus entes queridos.

            Esse processo é fundamental e indispensável para nossa conciliação nacional.


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Este texto não substitui o publicado no DSF de 06/04/2011 - Página 9673