Discurso durante a 45ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Reflexões sobre a construção da usina hidrelétrica de Belo Monte, no Pará, destacando manifestação do Governo brasileiro e a nota elaborada pela Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional sobre a recomendação da OEA, por considerá-la injustificada.

Autor
Mozarildo Cavalcanti (PTB - Partido Trabalhista Brasileiro/RR)
Nome completo: Francisco Mozarildo de Melo Cavalcanti
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA EXTERNA. POLITICA ENERGETICA.:
  • Reflexões sobre a construção da usina hidrelétrica de Belo Monte, no Pará, destacando manifestação do Governo brasileiro e a nota elaborada pela Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional sobre a recomendação da OEA, por considerá-la injustificada.
Aparteantes
Blairo Maggi.
Publicação
Publicação no DSF de 09/04/2011 - Página 10804
Assunto
Outros > POLITICA EXTERNA. POLITICA ENERGETICA.
Indexação
  • PROTESTO, INTERFERENCIA, ORGANIZAÇÃO DOS ESTADOS AMERICANOS (OEA), CONSTRUÇÃO, USINA HIDROELETRICA, ESTADO DO PARA (PA), APOIO, MANIFESTAÇÃO, GOVERNO BRASILEIRO, NOTA, COMISSÃO DE RELAÇÕES EXTERIORES (CRE), SENADO, DEFESA, SOBERANIA NACIONAL.
  • DEFESA, PROJETO DE DECRETO LEGISLATIVO, AUTORIA, ORADOR, ASSUNTO, AUTORIZAÇÃO, GOVERNO FEDERAL, CONSTRUÇÃO, USINA HIDROELETRICA, ESTADO DE RORAIMA (RR).

                          SENADO FEDERAL SF -

            SECRETARIA-GERAL DA MESA

            SUBSECRETARIA DE TAQUIGRAFIA 


            O SR. MOZARILDO CAVALCANTI (PTB - RR. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente Geovani Borges, do Amapá, é uma honra falar tendo V. Exª presidindo esta sessão, nós, que fomos Colegas como Deputados Federais, como Constituintes, trabalhamos pela transformação do Amapá e de Roraima em Estados, e hoje nos encontramos aqui, neste Senado, e nesta sessão de sexta-feira, que é uma sessão, para muitos, desimportante, mas, na verdade, é uma sessão que considero muito importante, porque é a oportunidade que temos de abordar, com calma, já que não há reuniões de comissões, não há deliberações na Casa, temas que são importantes para os nossos Estados, para as nossas regiões e para o País.

            Hoje, por exemplo, quero abordar um tema que é muito importante para a Amazônia, pela praticidade, mas também pelo simbolismo que tem, e para o Brasil.

            Refiro-me, Senador Geovani, à construção da usina de Belo Monte, no Pará. Esta usina mostra como os interesses internacionais na Amazônia estão tão atuais quanto em 1947, quando havia projeto que contava com o apoio da Unesco propondo a criação do Instituto Internacional da Hilea Amazônica - internacional, na verdade, sob o comando dos Estados Unidos. A ideia principal deste instituto era fazer um grande lago na Amazônia, o chamado Lago de Hudson, que iria alagar quase um terço da Amazônia. Não havia problema de eles fazerem isso na Amazônia, que era uma forma de engessá-la.

            Como isso não prosperou - vou abordar com mais detalhes essa questão -, sucessivamente, está havendo movimentos, é lógico, muito mais modernos, mais sofisticados de potências internacionais - e aí, quero dizer que, lamentavelmente, envolve, geralmente, grandes figuras internacionais famosas. Vimos, lá atrás, na Constituinte, o cantor Sting vir aqui, em 1988, defender os interesses das comunidades indígenas do Brasil. O Sting, que mora na Inglaterra, aliás, tem residência em vários países, veio aqui cuidar disso e, obviamente, chamar o foco da imprensa nacional e mundial sobre o tema.

            Agora, na questão da demarcação da reserva Raposa Serra do Sol, também vimos a OEA ir à ONU, mandar um observador e fazer declarações sobre a questão da demarcação.

            Agora temos a OEA se intrometendo na questão da construção da usina de Belo Monte. Mas já tivemos ações prévias. Vimos a atriz e o produtor do filme Avatar virem aqui fazer mobilização contra a construção da usina de Belo Monte. Recentemente houve um encontro em Manaus, em que estiveram presentes o ex-Presidente Bill Clinton, o ex-Governador da Califórnia, e vários atores e produtores cinematográficos, com uma preocupação de dar emoção com relação às comunidades indígenas, pela preservação da Amazônia.

            Quando eu era criança, ouvia meu pai dizer que “quando a esmola é grande o santo desconfia”. Ora, por que essa tão decantada, tão enfaticamente colocada “preocupação” com a Amazônia?

            Ontem, na Comissão de Relações Exteriores, da qual sou membro, tivemos a oportunidade, Senador Geovani, de aprovar moção, de iniciativa do Presidente da Comissão, o ex-Presidente Fernando Collor, contestando a atitude da Organização dos Estados Americanos (OEA) sobre Belo Monte. Inclusive a Comissão aprovou esse voto de solidariedade ao Governo brasileiro em função da manifestação feita pelo Ministro das Relações Exteriores, contestando e não aceitando a ingerência da OEA em assuntos que o Governo brasileiro tratou com muito cuidado.

            Aliás, isso o Presidente Lula disse uma vez, que não são os gringos que vêm dar lição como é que o Brasil deve cuidar dos índios ou de suas florestas. Ora, basta ler a história dos Estados Unidos, a história de todos os países da Europa para ver como eles não cuidaram dos seus nativos, daqueles que estavam lá quando os poderosos chegaram. Eles não cuidaram de suas florestas. Pelo contrário, devastaram-nas.

            Recentemente, em uma reunião de grandes fazendeiros dos Estados Unidos, eles cunharam a frase que, para nós, da Amazônia, para nós, do Brasil, é emblemática. Em resumo, eles disseram o seguinte, Senador Geovani: “Florestas lá”, isto é, aqui, tinham de manter florestas aqui, e, lá, fazendas; fazendas lá, e florestas aqui.

            Então, essa preocupação com uma usina que é limpa, que não corre o risco de ter o desastre que aconteceu em Chernobyl, em Three Miles Island ou agora no Japão, um usina que vai fazer o Brasil se tornar completamente independente de qualquer energia poluente, é combatida de maneira, primeiro, como disse, cinematográfica, com a presença de cineastas, de atores, de atrizes, de ex-presidentes dos Estados Unidos, de ex-governadores de estados americanos, como é o caso da Califórnia, do ator Schwarzenegger. Ficamos pensando: afinal de contas, eles têm moral para dizer como é que temos que nos comportar em relação a nossa Amazônia e com relação aos nosso índios? Nenhuma moral. É só olhar o que eles fizeram. Nós, ao contrário, 511 anos depois do Descobrimento do Brasil, ainda temos Mata Atlântica, embora tenhamos perdido muito, mas temos a Amazônia praticamente intocada, porque a Amazônia durou esse tempo todinho e apenas 19% de sua área foi utilizada para criar cidades, rodovias, vilas, vilarejos e, obviamente, para a atividade agrícola e pecuária. Mas, quero, antes de prosseguir, ouvir, com muito prazer, o Senador Blairo Maggi.

            O Sr. Blairo Maggi (Bloco/PR - MT) - Senador Mozarildo, quero cumprimentar V. Exª pelo pronunciamento. Tivemos, ontem, a oportunidade, na Comissão de Relações Exteriores, de falar sobre este assunto: a questão da intromissão, vamos chamar assim, da OEA em assuntos internos nosso, o que considero uma forma muito deselegante de tratar o Brasil, uma vez que o nosso País tem primado por todas as questões relativas a direitos humanos, direitos trabalhistas e tudo o mais. Evoluímos muito nesses últimos anos e temos sido reconhecidos mundo afora pelo esforço que fizemos. Isso nos diz claramente que temos tido um respeito muito grande pelas comunidades indígenas. Alguns problemas ainda existem, e provavelmente existirão no futuro também, mas isso faz parte do processo de acomodamento, do processo de construção de um país. Agora, abrir mão da soberania, abrir mão de usarmos os recursos naturais que temos para a geração de energia ou de mineração, ou de qualquer outra coisa, é uma situação que o Brasil não pode levar em conta e tem que repudiar essa intromissão nas nossas políticas internas. Se o Brasil, o nosso País, tivesse simplesmente patrolando as coisas, não levando em consideração, não ouvindo as comunidades, não ouvindo os cientistas, aí tudo bem, nós teríamos que repensar ou fazer uma nova análise sobre a situação. Mas, no caso de Belo Monte, de forma alguma está sendo atropelado. Já faz mais de doze, quinze anos que os estudos estão acontecendo. Todos tiveram a possibilidade de se manifestar. O Governo foi muito complacente com todos, ouvindo e dando oportunidade para que todos se manifestassem, mas chega o ponto em que o Executivo tem que tomar uma decisão, e é um ônus do Executivo. Quem é do Executivo tem que executar. Escuta, ouve, mas há um momento em que ele tem que tomar a decisão. E o Governo tomou a decisão de fazer Belo Monte, que levará adiante e, com certeza, não dará ouvido a esse tipo de coisa. Agora, é lamentável, Senador Mozarildo, que fiquemos perdendo tempo dando ouvidos a essas - vamos chamar assim - personalidades que vêm de fora e usam da sua fama, por meio de artistas e coisas parecidas, para se intrometerem nos assuntos internos do Brasil. Oxalá os outros países mundo afora tivessem a mesma responsabilidade ambiental que o Brasil está tendo e teve até agora, porque se, no passado, também não tivesse cuidado, nós não estaríamos aqui para cuidar do que nós temos neste momento. Sempre defendi e fiz um grande trabalho no Estado do Mato Grosso no sentido de buscar entendimento entre a preservação e a produção. Não se pode deixar de produzir, sob hipótese alguma, porque nós temos que alimentar quase 200 milhões de habitantes, temos uma responsabilidade de alimentar milhões e milhões de pessoas fora do Brasil, fora do nosso País, mas também temos a responsabilidade de cuidar. E nós sabemos cuidar do que é nosso. Então, quero cumprimentar V. Exª pelo pronunciamento e me somar, mais uma vez, a essas vozes contrárias ao que está aí. A política interna do Brasil compete ao Brasil, e não aos outros de fora, que não compreendem e, muitas vezes, ouvem uma história sem verificar o que acontece, e ainda ficam propagando mundo afora como se aquilo fosse a única e a pura verdade sobre os fatos, quando, na verdade, não o é. Nessa questão de Belo Monte, ouvimos dizer que vai inundar a floresta. Ora, o sítio - vou chamar assim - onde será feita essa usina, perto do território, é absolutamente nada, é insignificante o território, mas, infelizmente, as pessoas que mexem nessa área ambiental sempre têm a mania de focar. Vão focando, focando, baixando e acham que o que acontece no metro quadrado é o que representa uma Amazônia, que é bem maior que toda a Europa. Parabéns ao seu pronunciamento. Não é fácil fazer infraestrutura neste País, até porque - a pesquisa já mostrou -apenas 1% dos brasileiros defende, entende que infraestrutura é necessário, só que todos querem luz em casa, querem asfalto em frente de casa, querem rodovias boas, querem linhas de transmissão, querem Internet, todos querem tudo, mas não pensam que tudo isso é infraestrutura, que precisa ser feito, e o Governo tem que levar adiante. Parabéns!

            O SR. MOZARILDO CAVALCANTI (PTB - RR) - Agradeço e fico muito honrado com o aparte de V. Exª, Senador Blairo Maggi, porque realmente nós, Senadores da Amazônia, principalmente, mas todos os Senadores dos outros Estados, todos os Senadores do Brasil, temos que nos posicionar.

            Felizmente o Governo brasileiro tomou uma posição muito altiva, porque não são, como disse o ex-Presidente Lula, eles, os gringos - como se diz - que vão dizer o que nós devemos fazer na Amazônia ou como fazer na Amazônia, ou como fazer no Brasil.

            Nós temos, pela questão do meio ambiente e das populações indígenas, um respeito que nenhum país tem - nenhum, nenhum país tem ou teve. Nos Estados Unidos, as reservas indígenas são todas no meio do país, Senador Geovani. Não há uma reserva indígena nas fronteiras. E no Brasil, nós temos quase a grande maioria das reservas indígenas nas linhas de fronteiras. Então, veja que até isso de levar em conta a soberania nacional, o risco para a integridade territorial, nós não temos seguido.

            Eu repito que não são eles, não é a OEA que resolve fazer uma resolução, desrespeitando a nossa Constituição, porque a nossa Constituição diz que é, sim, possível fazer hidrelétrica em área indígena - que não é o caso de Belo Monte, que está apenas próxima -, desde que haja autorização do Congresso Nacional; que é permitido explorar minerais, desde que haja autorização do Congresso Nacional. E no caso não há discussão.

            Agora, eu quero aqui ler, até porque desejo aplaudir a posição do Governo da Presidente Dilma nessa questão, a declaração do Governo brasileiro:

            “O Governo brasileiro tomou conhecimento, com perplexidade, das medidas que a Comissão Interamericana de Direitos Humanos[...]”. E aqui eu quero falar de direitos humanos. Direitos humanos de quem? Dos humanos de lá ou dos humanos daqui? Porque essa declaração da OEA é a favor dos humanos de lá, dos interesses econômicos dos humanos de lá.

            E continua a nota do Governo:

[...] que a Comissão Internacional de Direitos Humanos [da OEA] solicita sejam adotadas [medidas] para “garantir a vida e a integridade pessoal dos membros dos povos indígenas” supostamente ameaçados pela construção da Usina Hidrelétrica de Belo Monte.

O Governo brasileiro, sem minimizar a relevância do papel que desempenham os sistemas internacionais de proteção dos direitos humanos, recorda que o caráter de tais sistemas é subsidiário ou complementar, razão pela qual sua atuação somente se legitima na hipótese de falha dos recursos da jurisdição interna. [Isto é, nós não estamos descumprindo lei nenhuma do Brasil, nem a Constituição nem qualquer lei abaixo da Constituição.]

A autorização para implementação do Aproveitamento Hidrelétrico de Belo Monte foi concedida pelo Congresso Nacional [de acordo com a Constituição] por meio do Decreto Legislativo nº 788, de 2005 [portanto, desde 2005 o Congresso Nacional brasileiro autorizou a construção de Belo Monte], que ressalvou como condição da autorização a realização de estudos de viabilidade técnica, econômica e ambiental, em especial “estudo de natureza antropológica, atinente às comunidades indígenas localizadas na área sob influência do empreendimento”, com a devida consulta a essas comunidades. Coube aos órgãos competentes para tanto, Ibama e Funai, a concretização dos estudos de impacto ambiental e de consulta às comunidades em questão, em atendimento ao que prevê o parágrafo 3º do artigo 231 da Constituição Federal.

O Governo brasileiro está ciente dos desafios socioambientais que projetos como o da Usina Hidrelétrica de Belo Monte podem acarretar. Por essa razão, estão observadas, com rigor absoluto, as normas cabíveis para que a construção leve em conta todos os aspectos sociais e ambientais envolvidos. O Governo brasileiro tem atuado de forma efetiva e diligente para responder às demandas existentes.

[Por fim], o Governo brasileiro considera as solicitações da Comissão Interamericana de Direitos Humanos da OEA precipitadas e injustificadas.

            Ora, é até elegante a Nota do Governo brasileiro, porque caberia - e eu quero dizer com palavras minhas: eles deveriam cuidar muito mais de países onde direitos humanos elementares não estão sendo observados. E aí não dá para excluir nenhum dos chamados países ricos.

            E quero retornar dizendo a questão da nossa decisão também. O Governo brasileiro tomou uma postura altiva. E o Congresso Nacional, por sua Comissão de Relações Exteriores, também não só fez uma Nota de Repúdio à recomendação da Organização dos Estados Americanos (OEA), como se solidarizou com a íntegra da posição adotada pelo Governo brasileiro.

            E mais, Senador Blairo Maggi: essa questão de a OEA falar de comunidades indígenas, por que ela não disse, por exemplo, que o Brasil é o único país em que as comunidades indígenas estão tendo um crescimento, quer dizer, estão aumentando a sua população numa média maior que a população não indígena do País? É preciso ver que isso demonstra que o Governo tem políticas de atendimento às comunidades indígenas, seja o Governo Federal, sejam governos estaduais ou municipais de onde existem as comunidades indígenas.

            Então, quero registrar, nesta sexta-feira, o meu protesto, até porque, Senador Blairo Maggi e Senador Geovani, defendo a construção de uma usina hidrelétrica lá na região do Cotingo, no meu Estado, que está dentro de uma reserva indígena e que é uma hidrelétrica que parece que foi feita por Deus, porque já tem as duas paredes laterais, são duas montanhas, e basta fazer uma barragem na foz, na saída dessas duas montanhas onde passa o rio Cotingo, na Cachoeira do Tamanduá.

            Eu apresentei um projeto de decreto legislativo, que já foi aprovado pelo Senado, está na Câmara, e lá os movimentos dessas organizações transnacionais querem impedir a aprovação do projeto de decreto legislativo, que faz o quê? Autoriza o Governo brasileiro a construir. Quando vai construir? Quando o Governo tiver recursos, quando o Governo tiver reestudado o projeto que já existe e quando o Governo tiver consultado as comunidades indígenas, que vão se beneficiar da produção da energia de lá, e parte da receita, do dinheiro que vai ser ganho, com a geração da energia vai ser investida na comunidade indígena, como royalties.

            Encerro, Senador Geovani, pedindo a V. Exª a transcrição da Nota do Governo brasileiro que repudiou ou estranhou, pelo menos, a posição da OEA. Também peço que fique registrado que a Comissão de Relações Exteriores do Senado já se posicionou, repudiando a intromissão da OEA e solidarizando-se com o Governo brasileiro. Peço também a transcrição, porque não vou ler, é um pronunciamento relativamente longo, que fala, Senador Geovani, das iniciativas que começaram em 1947, com o apoio da Organização das Nações Unidas, por meio da Unesco, para criar o Instituto Internacional da Hileia Amazônica. E um dos projetos desse Instituto é criar o famoso lago chamado Lago de Hudson, que eles já haviam batizado inclusive, que ia alagar quase um terço da Amazônia.

            Ora, de há muito, essas ações internacionais sobre a Amazônia vêm sendo feitas, antigamente, de maneira mais escancarada, agora, de maneira mais aprimorada, sofisticada, através de organizações humanitárias, que estão preocupadas com as nossas árvores da Amazônia, preocupadas com os nossos animais da Amazônia, preocupadas com os nossos índios da Amazônia e despreocupadas com os 25 milhões de habitantes que moram na Amazônia, pegando doenças difíceis, como malária, febre amarela, dengue, oncocercose e outras que não vou aqui como médico enumerar, apesar de tomar conhecimento.

            Quero dizer que precisamos, sim, nos manter altivos e não ceder a pressões de quem quer que seja, porque vou, encerrar, inclusive, com a fala do Presidente Lula: “Não são eles, os gringos - dizem que foi assim que o Presidente Lula disse -, que vão nos dar receita de como é que devemos cuidar do meio ambiente ou dos nossos índios.” Somos um exemplo para eles terem remorso do que fizeram com o meio ambiente deles e com os índios que existiam lá.

            Muito obrigado a V. Exª.

 

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SEGUE, NA ÍNTEGRA PRONUNCIAMENTO DO SR. SENADOR MOZARILDO CAVALCANTI

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            O SR. MOZARILDO CAVALCANTI (Bloco PTB - RR. Sem apanhamento taquigráfico) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Parlamentares, a Amazônia, há muito tempo, vem sendo objeto de cobiça internacional. Para dar uma melhor idéia dessa atração, é preciso dizer que existiu um projeto que visava criar uma entidade denominada Instituto Internacional da Hiléia Amazônica (IIHA). Isso ocorreu em 1947, e o projeto contava com o apoio da Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura (UNESCO).

            Apesar de o Instituto não ter sido implantado à época, devido à polêmica gerada e à existência de uma corrente que defendia a soberania do Brasil sobre a região, a internacionalização da Amazônia tornou-se um tema recorrente, que, de tempos em tempos, volta à baila.

            Temos de estar atentos a uma idéia que vem sendo difundida, segundo a qual a Amazônia é um “patrimônio da humanidade”. Essa visão demonstra claramente o interesse em diminuir a autonomia e limitar a soberania dos países da região sobre o vasto território ainda intacto em grande parte.

            A idéia do IIHA foi apresentada por um cientista brasileiro, Paulo Estevam de Berredo Carneiro, que viveu entre 1901 e 1982. Na época, era o representante do Brasil na UNESCO. Propunha ele que o Instituto desenvolvesse pesquisas nas áreas de botânica, zoologia, geologia, meteorologia, medicina e antropologia. Além dos países da região (Brasil, Bolívia, Peru, Equador, Venezuela e Colômbia), o projeto previa a participação de outras nações interessadas, como França, Grã-Bretanha e Holanda.

            O projeto do IIHA foi tema da dissertação de mestrado do historiador Rodrigo César da Silva Magalhães, em cujo texto, afirma: “Nos planos também estava a instalação de um conjunto de laboratórios voltados para a química vegetal e animal; para a geofísica, a fisiologia e a microbiologia.”

            A criação do IIHA foi objeto de discussão no Congresso Nacional, mas o surgimento de visões conflitantes, especialmente no que se referia à participação estrangeira, resultou no arquivamento do projeto, com a vitória da corrente nacionalista.

            As polêmicas pelo menos tiveram o condão de provocar a criação de dois importantes órgãos no início da década de 50 do século passado: o Instituto Nacional de Pesquisa da Amazônia (INPA) e a Superintendência do Plano de Valorização Econômica da Amazônia (SPVEA), que depois veio a transformar-se na Superintendência de Desenvolvimento da Amazônia (Sudam).

            Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, o Instituto Internacional da Hiléia Amazônica foi proposto pela primeira vez, por Paulo Berredo, em maio de 1946, época de reconstrução das relações internacionais, bastante sacrificadas pela Grande Guerra. Em maio de 1947, um ano depois, portanto, a UNESCO transformou essa idéia em uma das suas prioridades.

            Em agosto de 1947, em Belém do Pará, uma conferência científica estabeleceu as linhas mestras para o Instituto realizar um amplo programa de estudos sobre a Amazônia. Em abril de 1948, nova reunião em Iquitos, no Peru, dotou o IIHA de uma base jurídica e financeira; um comitê provisório, com uma presidente brasileira (Heloísa Alberto Torres, diretora do Museu Nacional) e um secretário-geral (Edred John Henry Corner, botânico inglês); e um escritório em Manaus, no Amazonas.

            Teve início, então, a polêmica, liderada pelo ex-Presidente da República Artur Bernardes, espalhando-se na imprensa, no Congresso Nacional e em outras instituições brasileiras. Artur Bernardes afirmava que o IIHA era a ponta de lança de uma intervenção colonial das grandes potências para tomar a Amazônia.

            Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, a Amazônia se tornou mais conhecida com o ciclo da borracha, mas já era visitada e estudada muito antes dessa importante etapa econômica.

            Em 1736, o cientista e explorador francês Charles-Marie de La Condamine visitou a região e descreveu o uso do “cautcho” (a borracha natural) pelos índios, e como eles o preparavam e utilizavam. Também estiveram na região outros estudiosos célebres, como Humboldt, Wallace, Bates, Agassiz e Darwin.

            O Imperador D. Pedro II, ciente de sua importância, já havia criado a Companhia de Navegação do Amazonas, em 1850, com o objetivo de explorar os recursos naturais e estimular a criação de núcleos urbanos.

            Ainda no século XIX, em 1866, Tavares Bastos publicava seu livro O Vale do Amazonas, em que defendia a livre navegação no rio Amazonas, concluindo que a prosperidade real da região começaria com sua “liberdade”.

            Portanto, não é recente a preocupação com o desenvolvimento da Amazônia e com o interesse de órgãos internacionais e outras nações sobre a região.

            Quando a UNESCO se propôs a patrocinar o projeto de Paulo Carneiro logo após a Segunda Guerra, visava exatamente dar impulso à cooperação científica internacional. Oficialmente, o projeto para a criação do Instituto Internacional para o Desenvolvimento da Amazônia foi apresentado na 1ª Conferência da UNESCO, em Paris, no ano de 1946.

            Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, pode-se dizer que o projeto de Paulo Carneiro, além de interessante, foi apresentado no momento certo. Os objetivos incluíam a produção de conhecimentos científicos em várias disciplinas, de interesse geral para o mundo tropical úmido. E o modo de desenvolvimento previsto se preocupava com a preservação da natureza e dos índios da Amazônia.

            A polêmica em torno do assunto cresceu quando a imprensa começou a noticiar a adoção do projeto pela UNESCO. De início, o Instituto deveria estudar a vida do homem da região, que, à época, contava com cerca de 200 mil índios.

            Entretanto, é necessário destacar que o projeto suscitava entendimentos diferentes. Moniz Aragão, que deu apoio ao IIHA na qualidade de embaixador do Brasil em Londres, tinha a seguinte explicação para o projeto: “O Brasil se beneficiará enormemente com a iniciativa, que transformará as maiores florestas virgens do mundo numa zona agrícola.” A controvérsia era indisfarçável.

            Artur Bernardes, no seu ardor nacionalista, conseguiu a adesão do Instituto Brasileiro de Geopolítica, cujo parecer sobre a convenção do IIHA foi extremamente duro na sua crítica à criação do instituto internacional. Além de questionar o poder de Paulo Carneiro para defender a criação de um instituto internacional de pesquisas para a Amazônia, entre outras coisas, podia-se ler, no texto do parecer, que essa entidade feriria os princípios da soberania brasileira, numa tentativa de colonização. Havia, ainda, a alegação de que “a concorrência estrangeira de séculos vem estudando e sugando nossas fontes de riqueza”. E mais: “Possuímos um império sem rotas oceânicas a separar a metrópole da colônia, que é o nosso interior despovoado que vamos colonizando aos poucos, conforme nossas necessidades. Não há razão alguma que indique a necessidade de superlotamento da escória da Europa dos nossos reservatórios de expansão futura.”

            O relatório buscava tornar transparente a existência de um jogo de poder sobre a região amazônica. E estávamos vivendo uma época de nacionalismo exacerbado, resultante dos efeitos da Segunda Guerra.

            Paulo Carneiro ainda tentou salvar a idéia do IIHA. Em 26 de abril de 1951, com o objetivo de ganhar a confiança do exército brasileiro, ele fez uma conferência na Escola Superior de Guerra, justificando a necessidade de criação do Instituto da Hiléia. Dirigia-se a militares que se haviam manifestado contra a sua criação por meio de diversas instituições: o Instituto Brasileiro de Geopolítica, a Comissão de Segurança Nacional da Câmara dos Deputados e o Clube Militar. Não conseguiu apoio, mas, em 1952, foi criado o Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (INPA).

            O fracasso do Instituto Internacional da Hiléia Amazônica tornou-se inevitável com a recusa brasileira para ratificar a Convenção de Iquitos e seu Protocolo adicional em 1950. A criação do INPA pode ser encarada como uma resposta nacionalista, no bojo do grande projeto de valorização da Amazônia do Governo Getúlio Vargas.

            Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, todos temos observado a fase de grande evolução que a Amazônia viveu no período posterior à tentativa de criação do IIHA. Sobreveio uma época de muita prosperidade e também de muitas contradições. Continuam constantes as denúncias de desmatamento para implantação de atividades que poderão prejudicar os ecossistemas da região, mas muito tem sido feito em seu benefício.

            Observamos a implantação da Zona Franca de Manaus e seu pólo industrial, e o desenvolvimento de atividades supervisionadas de exploração dos recursos naturais. Atualmente os habitantes da região são beneficiados por vários programas ou políticas de governo.

            A Amazônia constitui uma grande parte de nosso território e continua a merecer um olhar agudo e atento. Com a consciência do seu valor, estão sendo tomadas medidas importantes para manter a soberania brasileira na região, como a implantação dos dois importantes mecanismos representados no Sistema de Proteção da Amazônia (Sipam) e no Sistema de Vigilância da Amazônia (Sivam). 

            Dessa forma, o Estado brasileiro tem contribuído para o desenvolvimento salutar dessa imensa região, e adotado as medidas necessárias à manutenção da soberania e do controle de ações ilícitas a que ela está sujeita.

            Creio que todos estamos cientes do dever de zelar pelos interesses brasileiros no que se refere à Amazônia.

            Era o que tinha a dizer, Sr. Presidente.

            Muito obrigado.

 

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DOCUMENTOS A QUE SE REFERE O SR. SENADOR MOZARILDO CAVALCANTI EM SEU PRONUNCIAMENTO.

(Inseridos nos termos do art. 210, inciso I e o § 2º, do Regimento Interno.)

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Matérias referidas:

Organização dos Estados Americanos;

Solicitação da Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) da OEA.


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Este texto não substitui o publicado no DSF de 09/04/2011 - Página 10804