Discurso durante a 46ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Registro de debate, amanhã, na Comissão de Infraestrutura, a fim de discutir os Estudos de Viabilidade Técnica, Econômica e Ambiental (Evtea) referentes à implantação do trem de alta velocidade entre a cidade de Campinas e o Rio de Janeiro; e outro assunto.

Autor
Ricardo Ferraço (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/ES)
Nome completo: Ricardo de Rezende Ferraço
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA DE TRANSPORTES. POLITICA FUNDIARIA.:
  • Registro de debate, amanhã, na Comissão de Infraestrutura, a fim de discutir os Estudos de Viabilidade Técnica, Econômica e Ambiental (Evtea) referentes à implantação do trem de alta velocidade entre a cidade de Campinas e o Rio de Janeiro; e outro assunto.
Aparteantes
Mozarildo Cavalcanti.
Publicação
Publicação no DSF de 12/04/2011 - Página 10972
Assunto
Outros > POLITICA DE TRANSPORTES. POLITICA FUNDIARIA.
Indexação
  • ANUNCIO, AUDIENCIA PUBLICA, COMISSÃO, INFRAESTRUTURA, DEBATE, ESTUDO, VIABILIDADE, IMPLANTAÇÃO, TREM DE ALTA VELOCIDADE (TAV), REGISTRO, IMPORTANCIA, INVESTIMENTO.
  • CRITICA, COBRANÇA, TAXAS, MORADOR, TERRENO DE MARINHA, REGISTRO, OBSOLESCENCIA, DEMARCAÇÃO, DESRESPEITO, POPULAÇÃO, EXPECTATIVA, DISCUSSÃO, PROBLEMA, COMISSÃO DE CONSTITUIÇÃO JUSTIÇA E CIDADANIA.

                          SENADO FEDERAL SF -

            SECRETARIA-GERAL DA MESA

            SUBSECRETARIA DE TAQUIGRAFIA 


            O SR. RICARDO FERRAÇO (Bloco/PMDB - ES. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente desta sessão, Senador Wilson Santiago; Srªs e Srs. Senadores; brasileiros que nos acompanham por meio da TV Senado, ocupo a tribuna para convidar o conjunto dos Senadores a estar, amanhã, na Comissão de Infraestrutura.

            Nesta semana, uma medida provisória está trancando a nossa pauta. Temos de votar até quinta-feira essa medida provisória, que, julgo, merece muito a nossa atenção, o nosso cuidado. Trata-se da medida provisória que estrutura a empresa pública brasileira para implantar o trem de alta velocidade. Constitui-se em uma tentativa do Governo Federal de implantar o trem de alta velocidade entre a cidade de Campinas e a cidade do Rio de Janeiro.

            Esse é um tema bastante polêmico, com muitas incertezas. Amanhã, na Comissão de Infraestrutura, teremos a oportunidade de contarmos com a presença do Dr. Bernardo Figueiredo, Presidente da Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT), e também do Dr. Marcos Pontes, consultor desta Casa, entre outros especialistas. Essa será uma belíssima oportunidade para fazermos uma discussão técnica, uma discussão em que se consideram os Estudos de Viabilidade Técnica, Econômica e Ambiental (Evtea) sobre esse que é o maior empreendimento, o maior investimento que o Governo Federal pretende fazer no campo da infraestrutura. Sr. Presidente, o trem de alta velocidade significa um investimento superior, em dobro, ao que foi investido no conjunto da malha ferroviária brasileira nos últimos dez anos. Ou mais, significa dez vezes mais do que foi investido nos aeroportos brasileiros.

            Então, trata-se de tema relevante. Amanhã, teremos a oportunidade, na Comissão de Infraestrutura, de fazermos um debate técnico qualificado, de fazermos não apenas um enfrentamento político, mas também um enfrentamento técnico acerca desse projeto, sobre o qual o Plenário terá de se pronunciar até quinta-feira desta semana, para podermos desobstruir a nossa pauta e os nossos trabalhos no plenário.

            Trata-se, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, brasileiros, de investimento superior a R$35 bilhões. É um investimento complexo, pesado, um desafio muito grande, porque pelo menos 30% dessa ferrovia serão construídos sob túnel. Então, temos de avaliar isso com muito cuidado e com muita atenção.

            Teremos oportunidade, amanhã, então, na Comissão de Infraestrutura, de aprofundarmos o debate, para que, chegando a matéria ao plenário da Casa, possamos fazer o debate político e todo o esclarecimento com relação a essa proposta.

            Sr. Presidente, ocupo também a tribuna da Casa na condição de relator na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania de matéria relativa a um dos maiores absurdos que identificarmos no sistema público brasileiro. Trata-se de uma dessas coisas que não conseguimos entender, cujo sentido não conseguimos compreender. Mas conseguimos entender suas consequências. Estou falando do famigerado instituto de terreno de marinha, presente não apenas em meu Estado, onde alcança pelo menos 80 mil capixabas, mas também em todo o Brasil. Mais de 500 mil brasileiros, todos os anos, são alcançados por este absurdo chamado terreno de marinha. Evidentemente, já consideramos, de per si, antecipadamente, um completo e abusivo anacronismo a existência e a manutenção de terreno de marinha, que não existe, Sr. Presidente, em nenhum lugar do mundo. Trata-se, portanto, de uma jabuticaba, porque só o encontramos na legislação brasileira.

            Evidentemente, a consequência desse instituto não tem outro sentido a não ser a compulsão, por parte do Governo, em tributar os contribuintes brasileiros. Como se não bastassem os quase 36% de tributação sobre o Produto Interno Bruto (PIB), o brasileiro é obrigado a conviver com taxas, com cobranças, com foros, com laudêmios que não fazem sentido. Essa não é uma cobrança que atinge um segmento social especificamente, ela atinge todos, os mais pobres, os mais humildes, o trabalhador, o empresário.

            Os terrenos de marinha são, naturalmente, propriedades da União e são aqueles terrenos alcançados pela influência das marés, situados numa faixa de 33 metros da linha de preamar, pela legislação de 1831. Sr. Presidente, vou repetir: o marco da legislação de terreno de marinha, que delimita o que é terreno de marinha, que é situado numa faixa de 33 metros da linha de preamar, é de 1831. Naquele tempo, Sr. Presidente, um tiro de canhão atingia aproximadamente 33 metros. Isso ficou configurado como o limite de uma bala de canhão. Digo isso, para analisarmos o quanto isso é anacrônico na nossa legislação brasileira. Na época, obviamente, os portugueses implantaram isso com o sentimento de prevenir de ataques não só a nossa costa, mas também as margens de rios e de oceanos. O império português, portanto, determinou que nada poderia ser construído nessa faixa de terra. Era, então, uma questão de segurança, o que, obviamente, não faz mais sentido em nossa conjuntura, nos dias atuais, Senador Mozarildo Cavalcanti.

            A concessão dos terrenos de marinha data de 1868. Em 1946, a legislação incorporou os acrescidos de marinha, ou seja, os aterros realizados em seguimento aos terrenos de marinha, em função do aprofundamento do adensamento populacional, sobretudo nas megas e grandes cidades que estão na costa brasileira.

            As consequências dessa figura jurídica completamente obsoleta são as piores possíveis, Sr. Presidente, a começar pelo agravamento da já delicada questão fundiária em nosso Pais.

            Terrenos de marinha ocupam grande parte da extensão territorial de muitos Municípios em nosso País. São mais de 500 mil brasileiros alcançados por esse instituto, inclusive em áreas densamente povoadas, o que dificulta a promoção de políticas de planejamento e desenvolvimento urbano por parte da administração pública local.

            Problema grave é também a cobrança de taxas anuais por parte da Secretaria de Patrimônio da União (SPU). No caso de foro, em que a União transfere grande parte da propriedade, a taxa é de 0,6% sobre o valor do terreno. No caso de ocupação, em que não há transferência de propriedade, a taxa varia de 2% a 5% do valor do terreno. Em qualquer situação, é preciso recolher também o laudêmio, correspondente a 5% do valor atualizado do domínio pleno e das benfeitorias. Ocorre que a cobrança de laudêmio sobre as benfeitorias é inconstitucional, porque a terra é, de fato, da União, por imperativo constitucional. Ou seja, o laudêmio cobrado sobre as benfeitorias que são edificadas sobre esse terreno transforma-se em apropriação indevida. As benfeitorias são fruto exclusivo do investimento de quem ocupa a propriedade. A cobrança de laudêmio sobre elas fere, portanto, os princípios constitucionais da razoabilidade e da vedação ao enriquecimento sem causa do Estado.

            Mais: como a maior parte dos aforamentos em terrenos de marinha foi constituída há várias décadas, muitas vezes o valor de tais áreas já foi revertido aos cofres públicos, eminente Senador Aloysio Nunes Ferreira, por meio do pagamento de taxas que se arrastam ao longo de dezenas e dezenas de anos.

            Há inúmeros casos de pessoas que, no momento da compra de seus imóveis, não são sequer informadas de que se trata de terreno de marinha e que, de uma hora para outra, são surpreendidas com a cobrança das taxas. Elas nem podem contestar a cobrança, por não terem sido notificadas pessoalmente. É um completo desrespeito, uma desorganização na relação do Estado com o cidadão brasileiro.

            Como Vice-Governador do meu Estado, nós já vínhamos participando de uma militância e de um debate muito forte, porque o meu Estado, o Espírito Santo, assim como São Paulo, o Rio de Janeiro, Pernambuco e o Maranhão, é muito agravado por essa questão. Também na nossa Assembleia Legislativa, há comissões debatendo esse assunto. Inclusive, ações estão sendo propostas, para que possamos coibir que o braço do Estado se aproprie indevidamente daquilo que não lhe pertence. É uma briga longa, uma briga complexa, um combate ao qual precisamos dar um enfrentamento, que precisamos fazer. Tive a oportunidade de conversar, na semana passada, com um dos maiores especialistas desse tema em nosso País, o Procurador da República Carlos Fernando Mazzoco, que, há cinco anos, vem travando um permanente enfrentamento a respeito desse tema.

            Também vamos realizar, espero eu, audiências públicas no Congresso Nacional, para que possamos convidar não apenas as autoridades da Marinha, mas também representantes do Serviço do Patrimônio da União, para que possamos fazer perguntas, questionamentos, para podermos detalhar essa questão, que tem trazido grande preocupação e que tem angustiado não apenas os brasileiros da costa, mas também os brasileiros do interior do nosso País, porque também se cobra essa taxa de terreno de marinha da população que vive à margem dos rios.

            Então, na condição de relator, estamos aprofundando os estudos relacionados ao tema. Vamos voltar a esta tribuna mais vezes, para que, periodicamente, a cada semana, possamos trazer informações adicionais.

            O meu desejo é o de que, até o mês de junho, possamos relatar esse projeto na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania e possamos, quem sabe, a bem da justiça, contar com o apoio do Srs. Senadores, para que disciplinemos melhor essa relação abusiva do Estado com os contribuintes brasileiros.

            Muito obrigado, Sr. Presidente.

            O Sr. Mozarildo Cavalcanti (PTB - RR) - Senador Ferraço, eu estava aguardando a oportunidade de fazer um aparte a V. Exª.

            O SR. RICARDO FERRAÇO (Bloco/PMDB - ES) - Com alegria, ouço o Senador Mozarildo Cavalcanti.

            O Sr. Mozarildo Cavalcanti (PTB - RR) - Gostaria de corroborar o que V. Exª diz, porque, de repente, quando se fala em terreno de marinha, dá-se a ideia de que isso atinge só quem está à beira-mar. Mas isso atinge também quem está à beira dos rios, inclusive dos rios da Amazônia. Então, é importante que a gente, realmente, atualize essa legislação, que, como bem disse V. Exª, vem da época do Brasil colônia, do Brasil império, que tinha sua razão de ser naquela época, mas que hoje tem de ser, no mínimo, atualizada, levando-se em conta todos os argumentos que V. Exª utiliza muito bem. Não podemos, evidentemente, perder de vista alguns itens que têm a ver com a segurança da nossa fronteira marítima, como também não podemos perder de vista o que diz respeito à nossa fronteira terrestre. E aí é outro debate. A Constituição atual - inclusive, fui um dos constituintes que a elaborou - prevê uma faixa de fronteira de 150 quilômetros de largura. Hoje em dia, com as modernas tecnologias, com a possibilidade de segurança, sem precisar de faixa terrestre, essa faixa parece estar exagerada. Por exemplo, há um projeto do Senador Zambiasi que a reduz, o que permite, portanto, a instalação de atividades econômicas com mais facilidade. Quero me somar às ponderações de V. Exª e dizer que, realmente, essas legislações têm de ser atualizadas, principalmente reparando as injustiças que V. Exª mencionou muito bem.

            O SR. RICARDO FERRAÇO (Bloco/PMDB - ES) - Em 2010, o Governo Federal, com a Secretaria de Patrimônio da União, arrecadou R$700 milhões em todo o País. A arrecadação foi de R$700 milhões! São mais de 500 mil brasileiros que já pagam, há anos, anos e anos, essas taxas, esses foros, e, no caso de transferência, pagam também os laudêmios.

            É esse o debate e a contribuição que queremos trazer à atenção das Srªs Senadoras e dos Srs. Senadores.

            Muito obrigado.


Modelo1 4/28/247:06



Este texto não substitui o publicado no DSF de 12/04/2011 - Página 10972