Discurso durante a 50ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Registro das dificuldades existentes no processo de doação de órgãos.

Autor
Geovani Borges (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/AP)
Nome completo: Geovani Pinheiro Borges
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
SAUDE.:
  • Registro das dificuldades existentes no processo de doação de órgãos.
Publicação
Publicação no DSF de 16/04/2011 - Página 11579
Assunto
Outros > SAUDE.
Indexação
  • COMENTARIO, DIFICULDADE, BUROCRACIA, AUSENCIA, INFRAESTRUTURA, RELAÇÃO, PROCESSO, DOAÇÃO, ORGÃO, PAIS.
  • CONGRATULAÇÕES, DEPUTADO ESTADUAL, ESTADO DO AMAPA (AP), RELAÇÃO, RECONDUÇÃO, CARGO PROVISORIO, PRESIDENTE, COMISSÃO DE RELAÇÕES EXTERIORES (CRE), ASSEMBLEIA LEGISLATIVA.

                          SENADO FEDERAL SF -

            SECRETARIA-GERAL DA MESA

            SUBSECRETARIA DE TAQUIGRAFIA 


            O SR. GEOVANI BORGES (Bloco/PMDB - AP. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, o que me move hoje, nesta sexta-feira, a esta tribuna é a noticia de uma fatalidade lamentavelmente comum em nossos dias, aliada a uma insuficiência cuja existência é também de se lamentar.

            Refiro-me ao desejo de uma jovem precocemente morta em um acidente de carro. Uma jovem de dezoito anos, que, desde cedo, manifestou aos pais um desejo: se algo de grave lhe acontecesse, queria ela doar os órgãos de seu corpo.

            A história triste é da jovem Isabela Almeida, vitimada há poucos dias num acidente de carro que lhe ceifou a vida, em uma cidade próxima a Cocalzinho, a cerca de cem quilômetros de Brasília, capital do Distrito Federal.

            Conta o pai da jovem que Isabela Almeida adorava fazer promessas. A mais importante de todas, nos dezoito anos que viveu, foi ser doadora de órgãos. Gravemente ferida, a jovem foi internada em Anápolis. Passados sete dias, teve morte cerebral constatada. A família fez de tudo para que ela permanecesse em condições de doar todos os órgãos aproveitáveis.

            Goiânia foi descartada para a retirada dos órgãos, porque a burocracia aumentaria em dois dias a espera para velar a jovem. Optou-se pela volta para casa. Mas em Brasília a frustração: apenas os rins e as córneas de Isabela foram retiradas. Estamos falando da Capital do Pais, e isso finalmente nos faz pensar. Se é assim aqui, como é nas demais localidades?

            Dados do Ministério da Saúde apontam para novo recorde de doações de órgãos no Brasil. O número de doadores efetivos cresceu 14% em apenas um ano. Em 2010, foram registrados 1.896 doadores contra 1.658 no ano anterior. Com esse desempenho, o Brasil atingiu a marca histórica de 9,9 doadores por milhão de pessoas.

            Os números, porém, ainda estampam as imensas disparidades regionais no que diz respeito aos transplantes. São Paulo é responsável por 47% dos transplantes realizados no País: 9.900. A marca é quase cinco vezes maior do que a apresentada por Minas Gerais, o segundo colocado.

            Tocantins, Roraima e o meu Estado, o Amapá, não realizaram nenhuma cirurgia do tipo.

            Isso tudo nos coloca diante de uma verdade: a decepção dos familiares de Isabela é produto de um cenário que o Distrito Federal e o Brasil terão de lutar para reverter.

            A Capital federal realiza apenas três modalidades de transplantes: coração, córneas e rins. Desde 2008, o Distrito Federal está descredenciado pelo Ministério da Saúde para realizar transplantes de fígado. Numa situação em que a tristeza e dor extremas se misturam a um ato de solidariedade para com quem ainda tem chance de viver, as esperanças são sepultadas junto com os doadores de órgãos.

            A burocracia e a falta de infraestrutura e logística ameaçam o aproveitamento de órgãos que podem salvar vidas. .E vai além: dificulta a situação de quem quer doar os órgãos, como os familiares de Isabela.

            O Ministério da Saúde adota um protocolo de confirmação de morte cerebral, que consiste na realização de dois exames clínicos, sendo um necessariamente feito por neurologista e um de imagem.

            O intervalo entre cada procedimento deve ser de seis horas. O protocolo fechado é o início do processo de captação de órgãos. Quanto mais rápido o laudo é concluído, maiores são as chances de o transplante ser bem sucedido.

            No caso de Isabela, problemas de infraestrutura do hospital adiaram o fechamento do protocolo.

            Os exames clínicos foram feitos em um intervalo de 14 horas. O laudo do exame de imagem que confirmou a morte cerebral só foi concluído, também, muitas horas depois. E esse é um cenário que não permite a lentidão de procedimentos.

            A família tentou, sem sucesso, trazer Isabela via helicóptero do Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (Samu) do Distrito Federal.

            Quando finalmente conseguiram que a moça fosse transportada e reinternada, receberam a notícia de que apenas os rins e as córneas foram retirados.

            A sensação da família, descrita pela imprensa, relata que a luta foi em vão. “Isabela era uma menina saudável, poderia ter ajudado muitas pessoas”, desabafa o pai.

            O coração não foi aproveitado por não existirem doadores compatíveis no Distrito Federal. Mas fica a pergunta: por que os outros órgãos não foram retirados e levados para outros Estados? Foi um problema de estrutura ou um erro pontual?

            O Brasil registrou, no ano passado, 21.040 transplantes - um número recorde - contra 20.053 realizados em 2009. O aumento mais expressivo ocorreu nas cirurgias para transplantes dos chamados órgãos sólidos (coração, fígado, pulmão, rins e pâncreas), com elevação de 7% em relação ao ano anterior.

            Transplantes de medula óssea, por sua vez, registraram um aumento de 10% no período: de 1.531 para 1.695.

            Ou seja, estamos caminhando para uma cultura de incentivo e estímulo à doação de órgãos. E esse anseio não pode ser punido com a falta de estrutura para que a ação humanitária se consolide.

            Eu falava das desigualdades regionais. Pois muito bem, para tentar reduzir essas desigualdades, o Governo quer lançar um projeto de incentivo para Estados em que o serviço é inexistente ou apresenta deficiências.

            A idéia é fazer investimento em toda a rede, com atenção especial a Estados que têm mais deficiências. De acordo com o Ministério da Saúde, é possível aumentar, de forma expressiva, o número de transplantes no País.

            Mas não é necessário que todos os Estados tenham centros responsáveis pela cirurgia. A proposta é criar polos transplantadores, que ficarão encarregados do atendimento de pacientes de determinada região.

            Para reunir as informações (nome, endereço, resultados de exames, características genéticas) de pessoas que se dispõem a doar a medula para o transplante, foi criado, em 2000, o Registro Brasileiro de Doadores de Medula Óssea (Redome), instalado no Instituto Nacional de Câncer.

            Dessa forma, com as informações do receptor que não disponha de doador aparentado, busca-se no Redome um doador cadastrado que seja compatível com ele, e, se encontrado, articula-se a doação.

            Sonhamos com o dia em que, por exemplo, os nossos doentes possam realizar seus transplantes no próprio Estado do Amapá, ainda tão insipiente nessa modalidade de socorro médico.

            São sonhos, como eram os de Isabela e de sua família - como foi da minha irmã Nilda, que também morreu de acidente de carro e que queria doar órgãos, e não foi possível aproveitá-los. São esperanças lançadas num solo que pode e precisa produzir frutos. A doação de órgãos precisa ser encarada como uma vitória da bondade sobre a fatalidade.

            Para concluir, Sr. Presidente, o meu pronunciamento, quero aproveitar a oportunidade para parabenizar o Deputado Paulo José, que foi reconduzido, por unanimidade das lideranças daquela Casa de leis, a Presidente da Comissão de Relações Exteriores da Assembléia Legislativa. Tivemos oportunidade de atuar juntos aqui, no Itamaraty, pela briga da nossa área fronteiriça do Oiapoque, acompanhado da Deputada Roseli Matos, a sua Primeira Vice-Presidente. Quero saudá-lo da tribuna e desejar-lhe êxito e sucesso, ao dar continuidade a esse trabalho que desempenha com tanta maestria e com tanta competência.

            Era o tinha a dizer, Sr. Presidente. Como tenho de deslocar-me para o aeroporto, concluo o meu pronunciamento.

            Muito obrigado.


Modelo1 5/2/2410:27



Este texto não substitui o publicado no DSF de 16/04/2011 - Página 11579