Discurso durante a 53ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Referência a fatos que marcaram a data de 21 de abril. Balanço dos 51 anos da inauguração de Brasília.

Autor
Rodrigo Rollemberg (PSB - Partido Socialista Brasileiro/DF)
Nome completo: Rodrigo Sobral Rollemberg
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
HOMENAGEM.:
  • Referência a fatos que marcaram a data de 21 de abril. Balanço dos 51 anos da inauguração de Brasília.
Publicação
Publicação no DSF de 20/04/2011 - Página 11891
Assunto
Outros > HOMENAGEM.
Indexação
  • HOMENAGEM, ANIVERSARIO DE FUNDAÇÃO, BRASILIA (DF), ANIVERSARIO DE MORTE, TANCREDO NEVES, EX-CONGRESSISTA, VULTO HISTORICO, ESTADO DE MINAS GERAIS (MG), LIDER, LUTA, INDEPENDENCIA, BRASIL.

                          SENADO FEDERAL SF -

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            O SR. RODRIGO ROLLEMBERG (Bloco/PSB - DF. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, o 21 de abril remete-nos às três dimensões do tempo: passado, presente e futuro.

            Nesse dia, em 1792, chegava ao fim a trajetória de vida de Joaquim José da Silva Xavier, o Tiradentes, herói nacional e protomártir de nossa independência. Morto o homem, quedado pela força do autoritarismo metropolitano, vivo manteve-se seu ideal. Ninguém mais do que ele povoa o imaginário da nacionalidade como símbolo máximo da liberdade em nossa Pátria.

            De igual modo, a data faz com que lembremos outro mineiro extraordinário, fiel vocação de político liberal e de compromisso com a democracia representativa. Ao morrer, em 21 de abril de 1985, Tancredo Neves deixava um legado de coerência entre pensamento e ação, além de ter desempenhado o decisivo papel - que somente ele poderia exercer naquele contexto histórico - de condutor final do processo de transição do regime militar ao poder civil.

            Por fim, mas não menos importante, há 51 anos, precisamente em 21 de abril de 1960, o sonho de outro grande mineiro, o inesquecível Juscelino Kubitschek, se materializava festivamente com a inauguração de Brasília.

            A cidade que brotava da terra vermelha do interior de Goiás, construída em tempo recorde, para desgosto profundo de pessimistas militantes, era bem mais que a nova Capital do Brasil. Para além do seu inovador traçado urbanístico, único e arrojado em sua simplicidade; para além da arquitetura revolucionariamente bela e de intrigante leveza, Brasília simbolizava a generosa utopia de um Brasil novo, moderno e feliz.

            Não por acaso, Sr. Presidente, a cidade que desabrochava em meio às retorcidas árvores do cerrado seria chamada “Capital da Esperança”. A decisão de transferir a sede político-administrativa do País para o interior de há muito havia sido tomada, presente mesmo na Constituição de 1891, a primeira da República. Torná-la realidade, todavia, era tarefa que só mesmo um empreendedor fora do comum, uma pessoa disposta a reinventar o Brasil seria capaz de fazer. JK o fez!

            Juscelino, porém, jamais esteve sozinho na gigantesca empreitada. Pôde ele contar com a competência e a firmeza de gente da estirpe do engenheiro Israel Pinheiro no comando do monumental canteiro de obras, traduzindo em concreto a inspiração de Lúcio Costa e Oscar Niemeyer. Outros ilustres pioneiros o acompanharam na certeza de que, a despeito das enormes dificuldades e do desafio descomunal, Brasília passaria do sonho à realidade.

            Acima de tudo, porém, a construção de Brasília foi possível por ter contado com milhares de brasileiros, simples e anônimos, que para cá acorreram, atendendo à convocação do Presidente “Bossa Nova”. Foram esses brasileiros, os imortais candangos, que, com a força dos braços e a leveza dos sentimentos, intuíram estar fazendo história ao erguer, praticamente do nada, a majestosa cidade que anunciava um novo tempo para o País.

            A epopeia da construção de Brasília, em que pese toda a dificuldade existente, reuniu autêntica constelação de gente talentosa. Do mais humilde peão ao doutor mais celebrado, talento é que não faltou a esses bandeirantes modernos, artífices da saga brasiliense. A todos e a cada um deles, nossa eterna gratidão.

            Os homens e as mulheres que construíram Brasília - os pioneiros que asseguraram a consolidação da nova cidade como a capital de todos os brasileiros - eram pessoas corajosas, capazes de trocar a segurança de uma vida já conhecida pela possibilidade de reconstruí-la em novas bases. Foi dessa gente laboriosa que veio o sopro de vitalidade que fez de Brasília uma cidade viva e humana, e tão cedo reconhecida como Patrimônio Cultural da Humanidade.

            Brasília foi a meta-síntese de JK. Primeiro Presidente da República a subordinar, de fato, as ações de Governo a um planejamento estratégico, o famoso Plano de Metas, Juscelino vislumbrou, na transferência da capital para o Planalto Central, a decolagem do País na direção da interiorização do desenvolvimento. Era decisão de fôlego, que revolvia o padrão vigente no Brasil desde o século XVI, com o início da colonização.

            A transferência da Capital iniciava outra etapa da história brasileira. Até então, a ocupação do território se fez basicamente nas franjas do litoral. Da extração do pau-brasil à atividade cafeeira, passando pela indústria açucareira, o Brasil protagonizou uma história essencialmente voltada para o Oceano Atlântico, dando as costas para a imensidão do Centro-Oeste e para a porção setentrional do País. A mineração do século XVIII, com o desbravamento dos sertões das Gerais e do Mato Grosso, não passou de breve e solitária exceção, a confirmar a regra geral.

            Afirmo convicto, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores: ainda que o projeto de Brasília tivesse fracassado quase que integralmente, o que evidentemente não ocorreu, ainda assim, um único êxito justificaria tudo. Esse êxito - uma vitória hoje por todos reconhecida - foi a efetiva incorporação do Norte e do Centro-Oeste ao processo de desenvolvimento nacional. Penso não errar quando aponto a construção da Rodovia Belém-Brasília como símbolo desse fascinante encontro do Brasil consigo mesmo, de voltar-se para dentro de si e, assim, se redescobrir como povo e território, a fazer da diversidade a construção da verdadeira identidade nacional.

            Brasília foi, também, a comprovação da nossa capacidade de pensar e fazer. Por isso mesmo, sua construção faz parte de um contexto histórico de enorme criatividade, de crença em nossas potencialidades e de confiança em relação ao futuro. Vencer o marasmo, superar o atraso, sepultar o peso de um passado asfixiante e modernizar o Brasil: eis o clima que embala a busca entusiasmada por um novo tempo, tão bem representado pela Bossa Nova, pelo Cinema Novo e, claro, pela Nova Capital! Um Brasil que elevava sua autoestima, que passava a acreditar em si mesmo e que podia até se dar ao luxo de afastar o histórico sentimento de inferioridade e comemorar, de cabeça erguida e sorriso escancarado, o primeiro título de uma Copa do Mundo de Futebol, em 1958, na Suécia!

            Passados 51 anos, Sr. Presidente, é tempo de se fazer uma espécie de inventário da trajetória vivida por nossa capital. Trazê-la para o presente e, quem sabe, conjecturar sobre o que o futuro pode nos reservar. Ao fazê-lo, percebemos que distorções acompanharam a passagem do tempo. Em certo sentido, Brasília tornou-se a representação extremada da realidade brasileira, com a agressiva desigualdade social insistindo em nela se fixar, como a apontar nossas mazelas históricas.

            Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, nossa querida Capital cresceu muito, a ponto de ser hoje uma das cinco maiores metrópoles do País. A imagem de uma cidade que chegaria, no máximo, a quinhentos mil habitantes esfumou-se no sonho dos que a imaginaram na prancheta. Desafortunadamente, porém, e seguindo, uma vez mais, a rota da industrialização e de urbanização percorrida pelo Brasil a partir da Era Vargas e da Segunda Guerra Mundial, Brasília cresceu desordenadamente.

            A Capital da Esperança, ao atrair brasileiros de todas as regiões, todos eles movidos pelo justo anseio de uma vida melhor, viu-se enredada em contradições, de modo que a realidade teimava em alterar os sonhos dos que a planejaram. Em certo sentido, repetia-se aqui, no entorno do Distrito Federal, o mesmo fenômeno que a antiga Capital, o Rio de Janeiro, conhecera na Baixada Fluminense, nos anos 1950 e 1960.

            Afirmo categoricamente: cabe ao Distrito Federal representar para sua vizinhança o mesmo papel que, há meio século, a nova capital representou para o Brasil. Assim, tal como a construção de Brasília foi decisiva para a incorporação do Centro-Oeste e da Amazônia ao processo de desenvolvimento modernizador do País, dela hoje se espera algo semelhante. Em ação coordenada com os Governos dos Estados com os quais se limita geograficamente, ela deverá tornar-se o centro de gravidade de um desenvolvimento não excludente, que incorpore de modo incisivo sua região metropolitana, que chamamos Entorno.

            Também é verdade que a experiência política pela qual nossa capital passou foi marcada por avanços e retrocessos, solavancos e sobressaltos. Logo em seus primeiros anos de vida, a cidade assistiu ao golpe de Estado que derrubou o Governo constitucional do saudoso João Goulart e instituiu o regime autoritário, mantido por vinte e um anos. A capital sofreu na pele, diretamente, os efeitos danosos da ação ditatorial.

            Em primeiro lugar, Brasília perdeu toda e qualquer expressão de autonomia política, o que representou inequívoco retrocesso em relação à realidade vivida pelo Rio de Janeiro, a antiga capital. Seus governantes passaram a ser escolhidos pelos generais de plantão na Presidência da República. Além disso, é impossível não lembrar as mãos de chumbo que caíram sobre a Universidade de Brasília, a filha dileta do grande Darcy Ribeiro, a querida UnB, onde passei anos fundamentais para a minha formação acadêmica, pessoal e política. As duas invasões do campus foram a demonstração cabal da brutalidade que imperava no País naqueles tempos sombrios.

(O Sr. Presidente faz soar a campainha.)

            O SR. RODRIGO ROLLEMBERG (Bloco/PSB - DF) - Foi linda, no entanto, a luta da cidadania pela autonomia política de Brasília, simultaneamente ao esforço coletivo pela volta da democracia no Brasil. Obtida essa vitória, com o Distrito Federal podendo escolher, pelo voto, seus governantes e parlamentares, resta estendê-la, consolidando-a por inteiro. Nesse sentido, defendo ardorosamente as eleições diretas para a escolha dos administradores regionais. Penso que essa conquista que mais dia menos dia há de vir será o coroamento da longa travessia que empreendemos para a conquista da plena cidadania.

            Com o olhar fixamente voltado para o porvir, vislumbro o que Brasília poderá vir a ser, algo em que sinceramente eu acredito. Nascida de um sonho modernizante, nossa jovem capital haverá de se preparar para a Economia do Conhecimento que a cada dia, com maior velocidade, se consolida. Da mesma forma que o Brasil se prepara para se transformar em protagonista de realce no cenário global, Brasília tem todas as credenciais para se constituir em ponta de lança desse processo.

            Aquela que foi considerada há cinquenta e um anos a Capital da Esperança há de preparar para ser da capital do Mercosul, na antevisão de uma América do Sul crescentemente unida em propósitos desenvolvimentistas e de equidade social. Indo além, é preciso pensar alto, não se render a coisas miúdas e preparar Brasília para ser a grande referência mundial do Hemisfério Sul.

            É imperioso que aqueles que se dedicam à vida pública em nossa cidade tenham em mente as inúmeras oportunidades que estão a bater em nossa porta: Jogos Olímpicos, Copa de Mundo de Futebol e grandes eventos artísticos são alguns de atividades que nos convidam a assumir posição de liderança, a expor nossa vocação empreendedora. É imperioso estar atento para as circunstâncias suscitadas por um mundo que, dia após dia, dilui as fronteiras físicas, expande os negócios, multiplica o fluxo de turistas e investe maciçamente em ciência, tecnologia e inovação. É para essa nova ordem global que nossa cidade precisa estar preparada.

            Ao encerrar este pronunciamento, uma modesta, porém sincera forma de homenagem a nossa cidade, estendo um forte abraço a todos os que, tendo ou não nascido nesta Brasília tão querida, dela fizeram seu chão, seu lar. Conclamo todos esses brasilienses, por nascimento ou por adoção, a nos unirmos em torno do grande ideal que inspirou a construção da nossa capital. O generoso projeto que se materializou há 51 anos não se perderá.

            Há um pouco de Brasília dentro de cada brasileiro que acredita na possibilidade de se viver em paz. Há um pouco de Brasília dentro de cada brasileiro que acredita na possibilidade de se viver em paz. Há um pouco de Brasília dentro de cada brasileiro que não se deixa apequenar e sonha o melhor para todos. Há um pouco de Brasília dentro de cada brasileiro que faz da liberdade um caminho para a conquista da felicidade. Há um pouco de Brasília dentro de cada brasileiro que busca construir o futuro com trabalho e criatividade.

            Parabéns, Brasília!

            Muito obrigado.


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Este texto não substitui o publicado no DSF de 20/04/2011 - Página 11891