Discurso durante a 33ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Importância da audiência pública realizada hoje pelas Comissões de Ciência, Tecnologia, Inovação, Comunicação e Informática; de Meio Ambiente, Defesa do Consumidor e Fiscalização e Controle; e de serviços de Infraestrutura, sobre a questão da matriz energética brasileira.

Autor
Walter Pinheiro (PT - Partido dos Trabalhadores/BA)
Nome completo: Walter de Freitas Pinheiro
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA ENERGETICA. TRIBUTOS. POLITICA EXTERNA.:
  • Importância da audiência pública realizada hoje pelas Comissões de Ciência, Tecnologia, Inovação, Comunicação e Informática; de Meio Ambiente, Defesa do Consumidor e Fiscalização e Controle; e de serviços de Infraestrutura, sobre a questão da matriz energética brasileira.
Aparteantes
Eduardo Suplicy, Flexa Ribeiro.
Publicação
Publicação no DSF de 23/03/2011 - Página 8026
Assunto
Outros > POLITICA ENERGETICA. TRIBUTOS. POLITICA EXTERNA.
Indexação
  • COMENTARIO, AUDIENCIA PUBLICA, COMISSÃO DE CIENCIA E TECNOLOGIA, COMISSÃO, MEIO AMBIENTE, INFRAESTRUTURA, DEBATE, SEGURANÇA, USINA NUCLEAR, UTILIZAÇÃO, FONTE ALTERNATIVA DE ENERGIA.
  • REGISTRO, INICIATIVA, GOVERNO ESTADUAL, ESTADO DA BAHIA (BA), IMPLANTAÇÃO, SISTEMA, ENERGIA EOLICA, USINA TERMOELETRICA, REGIÃO.
  • APREENSÃO, FRAUDE, COMERCIO, INTERNET, AUSENCIA, ARRECADAÇÃO, IMPOSTOS, COMENTARIO, ARTIGO DE IMPRENSA, JORNAL, FOLHA DE S.PAULO, ESTADO DE SÃO PAULO (SP), PROVIDENCIA, GOVERNADOR, ESTADO DA BAHIA (BA), COMBATE, IRREGULARIDADE, DEFESA, ORADOR, IMPLANTAÇÃO, REFORMA TRIBUTARIA.
  • ANALISE, RELEVANCIA, VISITA OFICIAL, BRASIL, PRESIDENTE, PAIS ESTRANGEIRO, ESTADOS UNIDOS DA AMERICA (EUA).

O SR. WALTER PINHEIRO (Bloco/PT - BA. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, eu caro Senador Paulo Paim, e Srªs e Srs. Senadores, hoje foi um dia de importantes debates nas Comissões de Ciência e Tecnologia, de Meio Ambiente e de Infraestrutura, já que promovemos uma audiência pública em conjunto. Essa audiência

nos permitiu, inclusive, fazer um bom debate sobre a questão da matriz energética, o que abre, de uma vez por todas, de forma consistente, o debate sobre a opção de utilização da energia nuclear, que é fundamental.

Lamentavelmente, fizemos isso a partir da tragédia ocorrida no Japão. Um ditado meu pai sempre repetia: “Quando a barba do vizinho arde, colocamos a nossa de molho”.

Portanto, creio que foi muito importante esse debate ocorrido no dia de hoje, o qual abre uma série de questionamentos, como os que o Senador Lindbergh Farias, o Senador João Pedro e eu fizemos, reivindicando o debate sobre a Amazônia. Isso serviu para entendermos que é possível construir outras fontes de energia, não com a satanização da energia nuclear.

Não se trata disso, não estamos satanizando uma fonte de energia, mas precisamos discutir a partir das respostas que não temos. Ali isso ficou muito evidente.

Conheço os riscos da energia nuclear apresentados hoje, mas não conheço os riscos, meu caro Senador Paulo Paim, decorrentes da ausência de um plano de contingência e de uma cultura de segurança nuclear, a qual não conseguimos estabelecer no País.

E há reflexos de problemas diversos, que nos podem apresentar resultados completamente conflitantes.

Não estamos falando de algo que, quando acontece, seu efeito é controlável. Estamos falando de vidas e de processos que se arrastam por anos a fio para se obter uma solução.

Nessa linha, tive oportunidade de falar recentemente da iniciativa do Governo da Bahia na questão da geração de energia eólica. Já há 34 usinas apontadas até 2014, com uma geração em torno de 997,4 MW/ano, o que daria para atender aproximadamente quatro milhões de baianos. Além dessa atitude importante em relação à geração de energia eólica, estamos vendo o desenrolar da instalação de quatro empresas para a fabricação de aerogeradores na Bahia. A Alstom, inclusive, no dia de hoje, firmou compromisso para concluir sua fábrica em setembro deste ano, na cidade de Camaçari. Isso pode, efetivamente, gerar algo em torno de 500 empregos diretos e investimento de R$50 milhões, garantindo, dessa forma, um nível de atendimento à demanda dessas novas usinas. De qualquer maneira, já estão contratadas a Alstom, a Gamesa e a GE, e uma quarta empresa está em tratativas com a nossa Secretaria de Indústria e Comércio. Aliás, hoje, tive a oportunidade de receber aqui a visita do nosso Secretário James Correia, que é também oriundo do setor de infraestrutura, do setor de energia. A partir desse esforço da Secretária de Indústria e Comércio, estamos assistindo a essa verdadeira revolução da fonte alternativa.

Hoje, na cidade de Salvador, no Estado da Bahia, o Governador Jaques Wagner inaugurou, meu caro Suplicy, a primeira usina termoelétrica de biogás do Nordeste. Isso ocorreu na cidade de Salvador. Foi uma iniciativa de uma empresa do grupo Vega, que trabalha com a questão ambiental. Essa primeira usina termoelétrica de biogás do Nordeste trabalhará com 2,5 milhões de toneladas de resíduos. São R$50 milhões de investimentos. Estamos falando de uma produção anual de aproximadamente 150 mil MW/ano, o que significaria, numa conta direta, um atendimento a 300 mil residências. Estou me referindo, com essa produção, ao atendimento em um ano. Portanto, é uma fonte alternativa. É uma alternativa viável. Muita gente dizia:“Ah, mas isso se dá numa escala muito reduzida, numa escala baixa”. Estou falando aqui de 150 mil MW/ano, de 300 mil residências atendidas, com um investimento de R$50 milhões, Senador Paulo Paim. Há risco? Em todas as coisas, há risco, mas esse risco é menor. E a matéria-prima que utilizamos é o lixo doméstico, que é recolhido, todos os dias, nas ruas das nossas cidades, sendo, portanto, matéria-prima capaz de ser utilizada com efeito prático e direto: além da contribuição para a geração de energia, também estamos contribuindo para o meio ambiente. A utilização dessa matéria-prima nos permitirá a adoção de medidas melhores que a manutenção de aterros, que terminam virando lixões nas grandes cidades, sem levar em consideração o aspecto do que isso traz para a saúde do nosso povo.

Portanto, é para essa iniciativa que eu queria chamar a atenção no dia de hoje. Ainda em relação às atitudes tomadas no stado da Bahia, quero aproveitar também para realçar uma das coisas que nos chamam a atenção no mundo da tecnologia: a burla. Os Secretários da Fazenda do País inteiro, meu caro Senador Paulo Paim, têm se mobilizado na direção de evitar que uso de tecnologia, a compra via Internet se configure como uma burla ao sistema de arrecadação de cada Estado. A Folha de S.Paulo noticiou, no dia de hoje, que o Governo da Bahia está apreendendo mercadorias adquiridas pela Internet, até que seja paga parte daquilo que se refere ao tributo do Estado. Em relação ao jeito como é feito o recolhimento do ICMS, argumenta, com justa razão, o nosso Secretário de Fazenda, que é aguerrido nessa área e que é Presidente do Confaz, o nosso Carlos Martins, que o Estado perde arrecadação. Portanto, é fundamental a atitude do Estado nesses episódios.

Eu diria até que, com isso, existe mais que uma guerra fiscal. Isso reforça a necessidade de retomarmos o debate aqui sobre a reforma tributária. Estamos basicamente no segundo mês desta Legislatura e, por enquanto, nós, tanto Deputados quanto Senadores, ainda não tivemos uma atitude firme no que diz respeito ao caminho para se alcançar essa reforma tributária.

Além disso, do ponto de vista do contribuinte, das empresas, dos Estados e Municípios, a reforma tributária, talvez, seja ainda mais urgente, e sua não realização impacta no bolso desse contribuinte. O resultado se dá na ponta.

Nesse caso em questão, as empresas chamadas de “ponto com” - é esse o título que damos a esse tipo de comércio eletrônico - vendem suas mercadorias por todos os cantos do País, mas fazem o recolhimento de imposto no Estado onde a sede da empresa está localizada. Para termos uma ideia, meu caro Senador Paulo Paim, quero dizer que, somente no ano de 2010, a Bahia perdeu R$85 milhões, fruto da evasão, fruto dessa manipulação na Internet no “ponto com”, o que nos causa grande prejuízo.

Na nossa opinião, não importa o destino ou o Estado por onde a mercadoria vai circular. Geralmente, os Estados de origem das mercadorias são os Estados centrais: Rio de Janeiro e São Paulo. E aí, meu caro Senador Marcelo Crivella, meu irmão em Cristo, não quero travar guerra alguma com o Rio. Apenas queremos que esse tipo de batalha seja estabelecido para favorecer os outros Estados. Assim, o que for comercializado no Rio será do Rio, o que for comercializado na Bahia será da Bahia, por aí afora. Portanto, essa atitude permite que a totalidade dos impostos recolhidos pelas lojas sejam aplicados nos locais onde

esses comércios se estabelecem. É fundamental que trabalhemos nisso.

Quero encerrar esse assunto, deixando claro o nosso posicionamento. Ao mesmo tempo em que reclamamos dessa prática, quero aqui dizer da falta de legislação. Inclusive, estamos elaborando um projeto, buscando ajustar essa questão no Parlamento, no que diz respeito a essas compras na Internet, para que fiquem totalmente no Estado os impostos arrecadados

onde há o comércio. Bahia, Piauí, Mato Grosso e Ceará já tributam em 10%. E, ontem, tivemos uma grande vitória no Estado da Bahia, ou melhor, isso ocorreu no dia 21: a publicação é de ontem, mas a decisão do Tribunal foi do dia 21, segunda-feira. O Tribunal concedeu o direito ao Estado da Bahia de recolher, nas vendas pela Internet, a cifra de 10%. Portanto, é uma batalha ganha. Esperamos, inclusive, a partir dessa decisão, consolidar a legislação aqui, aplicando-a em cada Estado, para evitar que coisas como essas que se processaram e das quais falei em relação à Bahia não aconteçam em outros lugares, provocando perda efetiva na arrecadação dos nossos Estados.

Para concluir, Sr. Presidente, nessa mesma linha, quero aproveitar e fazer esse gancho do debate comercial, das disputas intramuros, às quais eu me referi, para fazer a associação disso com outra batalha que travamos, inclusive, extramuros. Refiro-me à visita, nesse contexto, do Presidente Obama ao Brasil.

O Presidente Obama esteve aqui no último fim de semana. Se fizermos uma leitura de resultados práticos imediatos, diremos que não houve resultado algum. Isso não se mede dessa forma, Suplicy. Não é na base do resultímetro que vamos avaliar os efeitos positivos de uma visita como essa. Mas é um reconhecimento, eu diria, importante da independência do Brasil nessas relações, no que diz respeito a uma postura, ao longo dos anos, de subserviência, de um alinhamento automático.

Nesse particular, eu diria que a postura mudou muito nesses últimos oito anos. Aí poderemos enxergar a postura do chancelar Celso Amorim durante a gestão do nosso companheiro Luiz Inácio Lula da Silva, que passou a tratar os Estados Unidos com a mesma atenção dispensada a todos, sem qualquer tom grosso com a Bolívia ou com o Paraguai, nem tampouco num tom fino e manso com os Estados Unidos.

Agiu na regra, no limite, olho no olho, no mesmo patamar. É óbvio que não nos distanciamos de Cuba e da Venezuela. Defendemos a causa da Palestina, a criação de países, a reclamação com a desocupação dos territórios ocupados, o direito de o Irã desenvolver seus projetos. Tratamos, de forma veemente e firme, a questão do Consenso de Washington, inclusive rejeitando esse Consenso, falando de forma altiva sobre a questão das dificuldades financeiras e substituindo, de uma vez por todas, a questão da intervenção do FMI, do Banco Mundial, do Departamento do Tesouro ou coisa que o valha por uma ação contundente. Relacionamo-nos com todos eles, mas mantendo nossa altivez, mantendo nossa posição.

Foi por isso que o Brasil - e faço questão de dizer isto - recebeu, como um todo, de forma muito orgulhosa, digamos assim, a visita do Presidente Obama, quebrando uma regra, meu caro Senador Marcelo Crivella. A regra do Departamento de Estado americano é a de que quem se elege em outro país, Suplicy, primeiro, vai aos Estados Unidos, para, depois, o Presidente americano visitar esse país. O Presidente Obama visitou o Brasil já com a eleição da Presidenta Dilma, mas antes de a Presidenta ir aos Estados Unidos.

Portanto, é uma quebra de paradigma. Não estou tratando isso como birra ou como resposta, mas para mostrar a forma como atuamos nisso.

E a nossa Presidenta agiu de forma correta. Sem bravata, sem grossura, tocou nos pontos centrais, foi firme ao cobrar de Obama a questão do relaxamento, outro tratamento nas barreiras alfandegárias, que dificultam a entrada no mercado americano de produtos como o aço, a carne, o suco de laranja, o algodão, além de outros manufaturados. Acredito que, com esse discurso da nossa Presidenta, quando cobrou de Obama regras mais transparentes para as exportações, como as explícitas e aprovadas na Rodada de Doha, haverá um fortalecimento maior desses organismos multilaterais, como é o caso do G-20.

Sei que isso não será fácil, meu caro Suplicy. O próprio Presidente da Petrobras, meu conterrâneo, José Sérgio Gabrielli, disse que é mais fácil - ele usou essa expressão - negociar com a China do que com os Estados Unidos. Tive oportunidade de participar, como Deputado, das rodadas, na época de negociação do comércio eletrônico, no final dos anos 90, em 1998 e em 1999, e vi como as coisas se processavam na Organização Mundial do Comércio, particularmente o comércio eletrônico. Setenta por cento de todo o comércio eletrônico é coordenado, meu caro Senador Marcelo Crivella, pelos Estados Unidos. Que força brutal!

Portanto, as regras que eles querem são as regras estabelecidas pelo Parlamento americano, aplicadas ao mercado brasileiro, ao mercado argentino.

Então, sei que não será fácil uma batalha nesse sentido, mas acrescentaria dizendo que é mais fácil negociar com os Estados Unidos quando o país está sob uma administração democrata e quando os republicanos estão no poder. Portanto, a nossa democracia consolidada tem a capacidade de enfrentar o velho e conhecido império americano de forma altiva e pela linha da frente, como diz o nosso profeta Jeremias. A linha da frente, portanto, nessa visão.

Então, eu queria dizer que é interessante a gente afirmar que aqui no Brasil as relações, com referência às eleições presidenciais dos Estados Unidos, geralmente vão se movendo com muita gente dizendo que está do lado dos democratas, do ponto de vista político. E, às vezes, vamos nos esquecendo das questões comerciais, o que efetivamente interessa e, principalmente, o eixo da reciprocidade. É fundamental, meu caro Suplicy, um tratamento igualitário. Nós, que recebemos tão bem os turistas americanos - aliás, hoje, o que assistimos, em relação aos Estados Unidos, é a um desejo enorme de continuar recebendo turistas brasileiros -, precisamos ter um tratamento condizente com essa realidade. E é importante que façamos isso.

Darei o aparte a V. Exª, Senador Suplicy, mas queria salientar uma coisa que é fundamental. Ainda que não possamos soltar foguetes para comemorar a visita de Obama - não é essa a leitura -, quero dizer que, de certa maneira, a partir da firmeza da nossa Presidente, ele reiterou o interesse em ampliar as parcerias econômicas. Em que pese a saída pela tangente - “Deixarei com o Congresso americano para tratar essas questões” -, o Presidente Obama foi obrigado a reconhecer que é possível ampliar essas parcerias comerciais com o Brasil. Tanto o é que tivemos a Cúpula Empresarial Brasil-Estados Unidos, o que significou, de certa forma, uma expectativa de um tratamento similar ao dispensado a países como a China e a Índia.

Portanto, não resolvemos ainda a questão dos vistos, mas fechamos um acordo para facilitar o tráfego aéreo para as empresas entre os dois países.

Concedo um aparte ao Senador Suplicy.

 Na sequência, Sr. Presidente, vou encerrar meu pronunciamento na noite de hoje.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 23/03/2011 - Página 8026