Discurso durante a 62ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Preocupação com a saúde pública no Brasil, destacando artigos publicados pelos jornais O Globo, Valor Econômico e Correio Braziliense a respeito do tema.

Autor
Mozarildo Cavalcanti (PTB - Partido Trabalhista Brasileiro/RR)
Nome completo: Francisco Mozarildo de Melo Cavalcanti
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
SAUDE.:
  • Preocupação com a saúde pública no Brasil, destacando artigos publicados pelos jornais O Globo, Valor Econômico e Correio Braziliense a respeito do tema.
Publicação
Publicação no DSF de 03/05/2011 - Página 13450
Assunto
Outros > SAUDE.
Indexação
  • ANALISE, SITUAÇÃO, SAUDE PUBLICA, CRITICA, DADOS, ATUAÇÃO, SISTEMA UNICO DE SAUDE (SUS), FUNDAÇÃO NACIONAL DE SAUDE, CARENCIA, MELHORIA, ADMINISTRAÇÃO, FISCALIZAÇÃO, RECURSOS, NECESSIDADE, ESFORÇO, UNIÃO, PODER, LEGISLATIVO, EXECUTIVO, EFEITO, GARANTIA, QUALIDADE, ATENDIMENTO, POPULAÇÃO, BRASIL.
  • SOLICITAÇÃO, TRANSCRIÇÃO, ANAIS DO SENADO, ARTIGO DE IMPRENSA, JORNAL, O GLOBO, ESTADO DO RIO DE JANEIRO (RJ), CORREIO BRAZILIENSE, DISTRITO FEDERAL (DF), VALOR ECONOMICO, ESTADO DE SÃO PAULO (SP), RELAÇÃO, PRECARIEDADE, SITUAÇÃO, OCORRENCIA, CORRUPÇÃO, SAUDE PUBLICA, BRASIL.

                          SENADO FEDERAL SF -

            SECRETARIA-GERAL DA MESA

            SUBSECRETARIA DE TAQUIGRAFIA 


            O SR. MOZARILDO CAVALCANTI (PTB - RR. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Senador Eduardo Suplicy, nesta tarde, quero me ocupar de um assunto com o qual tenho tudo a ver: saúde. Sou médico. Tenho preocupação, como cidadão e como Senador, com uma coisa que até pela pesquisa recentemente feita pelo Ibope, em nível nacional, é a maior preocupação das pessoas no País, que é justamente a saúde.

            Li, recentemente, três artigos. Um, publicado no jornal O Globo, cujo título era o seguinte: “O SUS tem jeito?”, de autoria da pesquisadora Lígia Bahia; outro, publicado no jornal O Valor, diz: “Saúde deve mostrar serviço com verba que tem”, escrito pelo jornalista Raimundo Costa. E o terceiro, publicado no Correio Braziliense, que diz: “Rigor maior na saúde”, da lavra da Alice Maciel.

            Ora, Sr. Presidente, a saúde pública é um tema de tamanha importância e representa indiscutível consenso suprapartidário. Não há quem não a defenda. Não conheço ninguém que, em campanha ou durante o mandato ou fora da campanha, não defenda a saúde. Nos palanques, então, a saúde é colocada como coisa prioritária, e, depois, lamentavelmente, não é a prática o que se prega nos comícios, no horário eleitoral.

            Eu, que fui Constituinte, quando discutimos o Sistema Único de Saúde, realmente, entristeço-me muito, quando vejo que um sistema tão bem concebido esteja tão mal administrado e esteja produzindo péssimos resultados no que tange ao objetivo desse plano, que é justamente atender ao cidadão e à cidadã, como manda a Constituição.

            Aliás, como eu disse, é um tema suprapartidário, e a Constituição Federal, em seu art. 196, estabelece que a saúde é um direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doenças e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e aos serviços para sua promoção, proteção e recuperação.

            No Brasil, o Sistema Único de Saúde, o famoso e conhecido SUS, é o responsável pela condução da saúde pública, dando concretude às diretrizes inscritas em nossa Constituição Federal. O SUS, no entanto, apresenta problemas que merecem nossa reflexão e nosso esforço conjunto, para que sejam superados em favor do cidadão.

            No artigo que mencionei, “O SUS tem jeito?”, publicado na edição de O Globo de 7 de março de 2011, a Professora Lígia Bahia sublinha que o SUS irá melhorar na medida em que conseguir fazer mais e melhor com menos, muito embora o sistema exija o aumento de recursos nele investidos.

            Aqui, quero fazer um comentário. Temos um exemplo de hospital público que faz mais com menos, que faz uma saúde pública, porque ninguém paga lá e é de excelente qualidade. Refiro-me à rede Sarah de hospitais, o Sarah Kubitschek, que é dedicado ao aparelho locomotor e já tem um instituto de neurociência. Basta visitar uma unidade do Sarah Kubitschek para ver como é possível, sim, fazer saúde pública gastando dinheiro de maneira correta. Agora, como é feito no Brasil...

            Vou dar aqui o exemplo do meu Estado. Agora, numa operação desencadeada pela Polícia Federal, resultante da investigação do Ministério Público Estadual, do Ministério Público Federal e do Tribunal de Contas do Estado, constatou-se, preliminarmente, um roubo no valor de R$30 milhões. Roubo, roubo mesmo! Não tem negócio de malversação, de desvio. É roubo mesmo! E mais do que isto: agora, frequentemente, no mandato do atual governador, que assumiu em 2007, permanentemente as cirurgias são suspensas porque não há material.

            Li aqui, na sexta-feira, notícia do jornal de Roraima de que não havia seringa para fazer os procedimentos mínimos. E eu disse até que vou pedir intervenção federal, porque é realmente genocídio o que se está praticando no meu Estado. Se fosse só meu Estado, dar-se-ia um jeito. Dar-se-ia um jeito porque é um Estado pequeno, com 500 mil pessoas. Dar-se-ia um jeito. Mas é no Brasil todo.

            Aliás, a Rede Globo tem feito um trabalho magnífico, mostrando que isso ocorre em todo lugar: nas pequenas cidades, nas grandes cidades, nas médias cidades. Temos que acabar com isso.

            E diz a professora Lígia:

Necessitamos de mais recursos para a saúde pública, sejam advindos do aumento da arrecadação, da redução das cotas de sacrifício ao superávit primário e pagamento das dívidas públicas das áreas sociais, sejam provenientes do redirecionamento de isenções e deduções fiscais e, no futuro, da regulamentação do fundo social do pré-sal.

            Já que se falou em pré-sal, se não acabar a roubalheira, se não houver fiscalização, se não houver uma auditoria permanente, será o mesmo que jogar sal em carne podre! Não vai resolver, porque o mal da nossa saúde não é a falta de dinheiro, mas a falta de vergonha na cara quanto à aplicação do dinheiro. Em outras palavras, é roubo mesmo o que se faz com dinheiro público. Dinheiro público, vamos traduzir, o dinheiro que o povo paga de imposto, o dinheiro que paga de imposto o pobre quando compra um quilo de feijão ou um quilo de arroz.

            Mas, Srs. Senadores e Srªs Senadoras, a necessidade de se incrementar o atendimento no SUS é objeto da preocupação dos Parlamentares brasileiros e levou o Congresso Nacional a discutir a criação do Projeto de Lei de Responsabilidade Sanitária, atualmente em tramitação na Câmara dos Deputados. A lei em discussão prevê que os administradores municipais poderão vir a ser punidos nas vezes em que não as segurarem o percentual mínimo de investimento de 15% do total das transferências da União para os Municípios.

            Ora, Senador Suplicy, aqui, de novo, vem a inversão das coisas: vai-se cobrar do prefeitinho! Mas a CGU, Controladoria-Geral da União, que é um órgão do Governo Federal, constatou que, nos últimos cinco anos, roubaram R$500 milhões da Funasa. Só da Funasa! Ora, e quem é a Funasa? É o Governo Federal, é o órgão diretamente ligado ao Ministro da Saúde. Então, não venhamos com sofismas de querer cobrar do prefeitinho, que não consegue aplicar os 15% e deixar aqui em cima roubando à vontade.

            Pela nova Lei de Responsabilidade Sanitária, o tempo de espera nas filas em postos de saúde será tomado como indicador de qualidade de todo o sistema. Consta do projeto de lei um plano de metas para a redução de filas, bem como algumas punições a Municípios que não conseguirem a diminuição da espera por atendimento em hospitais e postos de saúde. Além dessas medidas, os Municípios terão que estabelecer um plano anual de trabalho, com previsão de todas as ações a serem implementadas pelo gestor do SUS, inclusive os avanços do Programa de Saúde da Família.

            Ora, aqui, de novo, é preciso estabelecer planos de metas. É mais ou menos assim: o médico tem que atender vinte pessoas por dia, como se fosse uma questão de mercadoria. O médico é obrigado atender vinte, para ter produtividade.

            Doente não é como uma pessoa que vai ali comprar um pão, um ingresso de cinema. Doente é um ser humano fragilizado, que precisa de atenção.

            E, de novo, volto ao Sarah Kubitschek. Vá ver se lá, no Sarah, o médico é obrigado a atender tantos pacientes por dia.

            Ele é obrigado a atender pacientes em número que ele possa atender bem, que ele possa realmente dizer: este paciente mereceu toda a minha atenção. Não se pode tratar paciente como se fosse, sei lá, uma mercadoria qualquer, um consumidor qualquer. Ele não é um consumidor qualquer.

            Mas, Srªs e Srs. Senadores, em recente entrevista no jornal Valor Econômico, que mencionei, o Sr. Alexandre Padilha, nosso atual Ministro, reiterou que, antes de reivindicar mais dinheiro para a saúde, o Ministério irá melhorar a qualidade do gasto das verbas já existentes.

            Está certo o Ministro. É isso mesmo. Não adianta ficar agora dizendo que falta dinheiro. Falta dinheiro porque estão roubando. Falta dinheiro porque estão aplicando mal. Falta dinheiro porque realmente não estão encarando a saúde como um bem fundamental do ser humano.

            O Ministro também anunciou uma ampla revolução a caminho, que incluirá um novo modelo de construção de unidades de saúde, a mudança na forma de remuneração dos hospitais, a ampliação dos controles, a definição mais clara de prioridades e a cobrança de compensação dos planos de saúde por parte dos segurados atendidos na rede SUS.

            Aqui há outro detalhe interessante. Por exemplo, um senador que tem um plano de saúde, não podendo ser atendido pelo plano, é encaminhado a um hospital do SUS. Já para quem não tem plano de saúde, é muito mais difícil e mais complicado.

            Para o Sr. Alexandre Padilha, a prioridade do SUS deve ser a gestão, isto é, a administração correta do dinheiro, o que implica criar instrumentos mais sólidos no contrato entre União, Estados e Municípios. Seria necessário também regionalizar a saúde, mediante a boa gestão das redes no espaço territorial com vistas a se melhorar a qualidade da saúde brasileira.

            Para tanto, faz-se necessário estabelecer contratos entre os Estados e Municípios a partir de realidades regionais, com objetivos e metas claras a serem cumpridas. É verdade.

            Aqui é outra coisa. Em Brasília, a política estabelecida por tecnocratas não observa a diversidade e as peculiaridades das regiões, inclusive as doenças. Alguém do Rio Grande Sul já viu um caso de malária? Se algum portador de malária for da Amazônia para o Rio Grande do Sul é capaz de morrer, porque lá não se faz o diagnóstico. É preciso que se dê prioridade para as peculiaridades de cada região e também para preparar o médico para qualquer eventualidade.

            O Ministro também manifestou vontade de criar um indicador de satisfação do usuário do SUS, um grande indicador nacional que tenha, também, expressão regional e estadual e que sirva de critério para a melhora do atendimento de saúde, da área a que diz respeito, a partir de estratégias definidas pelos Municípios e pelos Estados. Aí está correto, porque não é o técnico aqui no Ministério da Saúde que vai saber a estratégia correta para região Amazônica, para a região Nordeste, para região Centro-Oeste, para as regiões Sul e Sudeste.

            Alexandre Padilha também assinala as virtudes do SUS como fato de sermos o País com o maior número de transplantes e de termos a maior rede de hemodiálise totalmente pública.

            O Governo atual elegeu como prioridade, de outra parte,a adoção de um Cartão Nacional de Saúde, que poderá beneficiar, no mínimo, um total aproximado de 100 milhões de pessoas já cadastradas com registro no SUS.

            Na qualidade de médico e de Professor de Medicina da Universidade Federal de Roraima, ex-Secretário de Saúde daquele Estado, ex-Presidente do Conselho Regional de Medicina, gostaríamos de externar nossa especial preocupação com os rumos da saúde no País, especialmente no que diz respeito aos SUS.

            Esperamos que os esforços conjuntos dos Poderes Legislativo e Executivo, como os que descrevemos na nossa fala, nos garanta a maximização da qualidade de atendimento da saúde pública, que deve atender ao cidadão brasileiro com o uso mais racional possível dos recursos disponíveis.

            No Senado da República, tenho tido pela saúde uma especial atenção, dando mesmo, Senador Suplicy, prioridade máxima, até porque, depois da vida que nos é dada por Deus, o maior dom que o ser humano pode ter é a saúde. Sem a saúde, que qualidade de vida nós teremos?

            Quero aqui cumprimentar o Ministro Padilha e pedir que ele insista nesse ponto: o que precisa para a saúde é vergonha na cara na aplicação do dinheiro público. É preciso, portanto, que ele de fato faça um raio X desse modelo, que faça uma auditoria permanente e que não deixe continuar o roubo como está acontecendo no meu Estado e no Brasil todo.

            Toda hora estamos vendo nos jornais, na televisão, a imoralidade, o crime hediondo de roubar da saúde, porque roubar da saúde é como tirar a vida da pessoa, é como proibir que a pessoa possa ter saúde. É, enfim, atingir algo de mais sagrado para quem está vivo, porque saúde só interessa a quem está vivo.

            Gostaria de pedir, portanto, ao Ministro Alexandre Padilha, que dê realmente prioridade ao saneamento da saúde, trate das mazelas que ela tem, que são, sobretudo, a corrupção, as mazelas da politização medíocre, porque a politização, quando elevada, é nota dez. Como a do Ministro Alexandre Padilha, um médico, um político que tem ideal, o de transformar aquela área de saúde num exemplo; mas se é um político que vai aproveitar do cargo para roubar - como o que vem acontecendo com a Funasa em Brasil todo -, aí realmente passaremos algumas gerações até alcançarmos saúde com qualidade.

            Agradeço a V. Exª e peço a transcrição dos três artigos que mencionei como parte do meu pronunciamento.

 

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DOCUMENTOS A QUE SE REFERE O SR. SENADOR MOZARILDO CAVALCANTI EM SEU PRONUNCIAMENTO.

(Inseridos nos termos do inciso I, § 2º, art. 210 do Regimento Interno)

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            Matérias referidas:

            - O SUS tem jeito?

            - Saúde deve mostrar serviço com verba que tem.

            - Rigor maior na saúde.


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Este texto não substitui o publicado no DSF de 03/05/2011 - Página 13450