Discurso durante a 62ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Comentários sobre relatório emitido pela Comissão de Reforma Política, defendendo a lista fechada com alternância de gênero para garantir uma participação feminina mais efetiva na vida política brasileira e discordando da possibilidade de se impedir a reeleição para cargos executivos.

Autor
Anibal Diniz (PT - Partido dos Trabalhadores/AC)
Nome completo: Anibal Diniz
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
REFORMA POLITICA.:
  • Comentários sobre relatório emitido pela Comissão de Reforma Política, defendendo a lista fechada com alternância de gênero para garantir uma participação feminina mais efetiva na vida política brasileira e discordando da possibilidade de se impedir a reeleição para cargos executivos.
Publicação
Publicação no DSF de 03/05/2011 - Página 13539
Assunto
Outros > REFORMA POLITICA.
Indexação
  • CRITICA, PROPOSIÇÃO, RELATORIO, COMISSÃO, REFORMA POLITICA, RELAÇÃO, POSSIBILIDADE, IMPEDIMENTO, REELEIÇÃO, CARGO, EXECUTIVO, DEFESA, LISTA DE ESCOLHA, PARTIDO POLITICO, ELEIÇÃO, CANDIDATO, MULHER, VIDA PUBLICA.

                          SENADO FEDERAL SF -

            SECRETARIA-GERAL DA MESA

            SUBSECRETARIA DE TAQUIGRAFIA 


            O SR. ANIBAL DINIZ (Bloco/PT - AC. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srs. Senadores, Srªs Senadoras, telespectadores da TV Senado, ouvintes da Rádio Senado, cidadãos e cidadãs brasileiras que nos acompanham pelos sistemas de Internet, trabalhadores do Sistema de Comunicação do Senado, venho, hoje, à tribuna para emitir minha modesta opinião sobre o relatório da Comissão de Reforma Política no Senado Federal.

            Com relação aos vários assuntos tratados pela Comissão de Reforma Política, quero apresentar uma discordância e quero apresentar uma concordância.

            A discordância que trago é com relação à possibilidade de colocarmos fim à reeleição para os cargos executivos. Minha opinião é de que o Brasil é caracterizado por uma constante instabilidade nos seus sistemas. Como nós vivemos uma experiência de 16 anos de vigência da reeleição para presidente, governadores e prefeitos, acredito que esse período seja muito pouco tempo para chegarmos à opinião de que esse sistema não é mais válido.

            Vivemos, nos últimos 16 anos, oito anos de mandato do Presidente Fernando Henrique e oito anos de mandato do Presidente Lula. Estamos vivendo, agora, o início do mandato da Presidenta Dilma. Então, chegarmos a um entendimento tão rápido de que a reeleição não faz bem para o País é algo que me preocupa.

            Acho que nós, Senadores, quando esse relatório vier à discussão no plenário, vamos ter de aprofundar muito essa questão, porque minha opinião - acredito que esta é a opinião do povo brasileiro - é de que o Brasil ganhou muita estabilidade e muita segurança quando tivemos a possibilidade de planos a longo prazo, quando os executivos puderam planejar-se não só para quatro anos, mas também para oito anos.

            Ao mesmo tempo, apresentou-se um desafio importante para os gestores, no sentido de buscar fazer o melhor e de fazer justiça ao direito de reivindicar um segundo mandato.

            Acredito que, se houver alteração agora nesse processo, vamos viver sempre aquela insegurança de que, a cada mandato, cada um vai buscar reunir forças para mudar a regra do jogo, para fazer valer do seu jeito.

            Digo isso não como quem defendeu a instituição da reeleição, porque, na época em que houve o movimento, a partir do Presidente Fernando Henrique, para a instituição da reeleição, houve muita contestação a esse respeito. Mas, hoje, faço o mea-culpa, porque fui contra à época. E devo reconhecer que fez muito bem ao Brasil aquela posição dar a possibilidade de o governante, no Executivo, viver uma experiência mais prolongada e poder planejar as suas ações a longo prazo.

            Então, essa é a minha discordância nesse primeiro ponto do relatório apresentado pela Comissão de Reforma Política do Senado. Sei que esse assunto vai ter muita, mas muita discussão, com diversas opiniões e vários enfrentamentos aqui no nosso plenário e também no da Câmara dos Deputados.

            Ao mesmo tempo, apresento a minha concordância com a Comissão de Reforma Política, que aprovou medidas inovadoras, como a mudança no nosso sistema eleitoral, para que tenhamos, a partir das próximas eleições, caso seja aprovado, aqui no Plenário do Senado e no do Congresso, o sistema de voto em lista fechada.

            Para que a lista fechada, preordenada garanta maior representatividade feminina, a orientação é que a alternância de gênero seja definida em lei. É o que propõe o relatório da Comissão, que aprovou, no final da semana passada, dentre outras mudanças, a adoção do sistema proporcional de listas fechadas com alternância de gênero, e que será, agora, encaminhado à apreciação da Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania.

            Além de ser um sistema que fortalece os partidos e reduz o custo das eleições, é fato que os sistemas proporcionais com listas preordenadas favorecem mais a representação das mulheres e de outros segmentos sub-representados, permitindo operar mecanismos de ação positiva.

            A adoção do sistema proporcional de lista fechada pode ensejar a garantia de uma maior participação feminina no Parlamento, desde que seja determinada a alternância de gênero. É dizer: a lista partidária contemplará um candidato de cada sexo de forma alternada.

            Pesquisa do Cientista Político Jairo Nicolau revela uma média de 22,7% de representação feminina nos sistemas proporcionais; nos sistemas mistos, temos uma representação feminina aproximada de 12,7%; e nos sistemas majoritários ou distritais, esse percentual fica em torno de 11,7%.

O percentual de mulheres seria um bom indicador de abertura do sistema representativo para grupos sociais específicos. Por exemplo, a média percentual de mulheres representadas na Câmara dos Deputados em países que utilizam a representação proporcional é o dobro da média de países que utilizam a representação majoritária ou distrital. (Jairo Nicolau, Sistemas Eleitorais.)

            Diversos países adotaram essa forma em seu sistema eleitoral: Israel, Espanha, Portugal, Argentina, África do Sul, Itália, Finlândia, Suécia, Holanda, Suíça, Noruega, Dinamarca, Áustria. As razões podem ser as mais variadas: na Bélgica e na Suíça, a segmentação étnica e religiosa influenciou a adoção do sistema proporcional; na Dinamarca e na Suécia, prevaleceram os interesses dos partidos conservadores, temerosos de perderem influência em razão da adoção do sufrágio universal.

            A inserção das mulheres na política foi conquistada em momentos diferentes na história mundial, em diferentes pontos do planeta.

            Em 1788, os Estados Unidos tornaram-se pioneiros ao garantir o direito de as mulheres serem votadas. Entretanto, apenas em 1920 as norte-americanas conquistaram o direito de voto.

            Por outro lado, no primeiro país que adotou o voto feminino, a Nova Zelândia, em 1893, as mulheres só puderam candidatar-se em 1918. O primeiro país a assegurar simultaneamente os dois direitos às mulheres foi a Finlândia, em 1905. A partir desse momento, o processo de conquista e ampliação dos diretos políticos das mulheres prosseguiu ao longo do século XX.

            No Brasil, a participação feminina na política é recente, data de 1932, quando as mulheres conquistaram o direito de participar das eleições como eleitoras e candidatas. Mas só a Constituição de 1946 garantiu tratamento igualitário ao voto de homens e mulheres no Brasil. A partir de então, a ocupação de espaços nos postos de comando e de formação de opinião pelas mulheres veio num crescendo permanente.

            Em 1933, Carlota Pereira de Queirós tornou-se a primeira Deputada Federal; em 1979, Eunice Michiles foi eleita a primeira Senadora do Brasil; em 1981, tivemos uma rápida passagem pelo Senado da primeira Senadora negra, Laélia Alcântara, do Acre; depois tivemos, em 1985, duas mulheres negras aqui no Senado, que foram Marina Silva e Benedita da Silva, ambas eleitas pelo Partido dos Trabalhadores; entre 1982 e 1985, Esther de Figueiredo Ferraz ocupou a Pasta da Educação e Cultura e foi a primeira mulher Ministra no Brasil; em 1986, tivemos a primeira Governadora no Brasil, que também foi do Acre, a Governadora Iolanda Lima, seguida, depois, em 1995, pela Governadora Roseana Sarney; e, em 2010, o Brasil parou para assistir à eleição da primeira mulher Presidenta da República.

            É bom lembrar que os dados do último censo demográfico, realizado pelo IBGE, revela um forte crescimento da população feminina. Dentre os quase 191 milhões de brasileiros, hoje, mais de 50% são mulheres, ou seja, 51% da população total. Então, 97,3 milhões de brasileiros são do sexo feminino.

            O Brasil tem acompanhado essa mudança no perfil demográfico, fortalecendo e ampliando as políticas públicas para a igualdade de gêneros em diversas áreas. Entretanto, a representação das mulheres no Congresso Nacional brasileiro é, hoje, de apenas 13,6% no Senado Federal (apenas 11 Senadoras num total de 81 Senadores) e 9,2% na Câmara dos Deputados (47 Deputadas em um quadro de 513 Deputados). O percentual de mulheres no nosso Parlamento ainda está abaixo dos índices de países que adotam o sistema de lista fechada preordenada.

            Dito isso, Senador Lindbergh, venho, aqui, manifestar essa posição de apoio à nossa Comissão de Reforma Política, que ousou encarar essa discussão no sentido de defender a lista fechada, preordenada e com alternância de sexo, como garantia plena de que a gente pode assegurar a participação muito mais efetiva da mulher na vida política brasileira. As pessoas podem questionar: “Mas não tem que ser uma luta só das mulheres?” “Não tem que ser só as mulheres a encamparem essa luta?” E aí temos que dar a resposta. Acho que temos de falar para além do nosso tempo e legislar também para além do nosso tempo.

            Acho que, no momento, para essa reforma política, se tem algo que a gente pode fazer é assegurar essa ampliação da participação da mulher na política dando às mulheres uma oportunidade que elas não teriam se não fosse por intermédio de uma lista fechada, preordenada, que favoreceria também o financiamento público de campanha. Aliás, são dois temas que caminham lado a lado e absolutamente interligados. Ou a gente tem lista fechada, preordenada com alternância de gênero e com o financiamento público de campanha ou, então, a gente vai ter a campanha do salve-se quem puder, em que quem tem as melhores condições, os maiores recursos sai sempre na frente levando vantagem e, nessa, os segmentos sub-representados vão continuar sub-representados, porque não terão condições de disputar em pé de igualdade com os demais segmentos.

            Nesse sentido, venho, hoje, à tribuna para manifestar apoio à posição da Comissão que tratou dessa proposta, que vai ser analisada ainda no Plenário e aprofundada no Congresso Nacional, na Câmara, no sentido de que a gente possa instituir para as próximas eleições o sistema proporcional em lista fechada, preordenada com alternância de gênero. Dessa maneira, a gente vai certamente reunir as condições para também discutir o financiamento público de campanha, de tal maneira que sejam estabelecidos tetos de despesas em formato de despesa. Quando a gente tem lista fechada, preordenada, a gente vai ter disputa de teses com o fortalecimento dos partidos. Porque, com os partidos fortalecidos, teremos maior observância da fidelidade partidária, que é outro aspecto que precisa ser fortalecido no nosso Brasil para que a democracia ganhe maior sentido e para que os partidos políticos sejam respeitados a partir do seu posicionamento e do seu diálogo franco e aberto com a sociedade brasileira.

            Conforme dados da União Interparlamentária, de 2003, as mulheres constituíam 40% da Câmara nos países nórdicos; 17% na média dos países americanos; 15% na Ásia e na Europa, excluída a Escandinávia; 13% na África sub-saariana; e 6% nos países árabes. O percentual brasileiro superava, portanto, apenas o dos países árabes.

            A comparação com o restante da América Latina tampouco nos é favorável. Não chegamos a mais de 13% das mulheres na representação na Câmara e no Senado. Hoje, há pouco mais de 9% na Câmara dos Deputados, contra 35% na Costa Rica, 30% na Argentina, 18% na Bolívia - nosso vizinho -, 17% no Peru, Equador e República Dominicana, 16% no México e 10% no Panamá. Superamos apenas o Paraguai, onde as mulheres são representadas no parlamento por apenas 2%.

            Parece evidente a relação entre sucesso na inclusão política das mulheres e sistema eleitoral. Costa Rica e Argentina operam com o voto proporcional com listas fechadas. A lei exige a presença dos dois sexos a cada três candidatos da lista. Dessa maneira, a cota incide não só sobre os candidatos, mas sobre os eleitos.

            À luz do exposto, parece claro que a presença de mulheres entre os eleitos aumentou no Brasil nos últimos anos; a política de cotas de candidaturas contribuiu para esse aumento; a eficácia desse mecanismo para a obtenção de novos ganhos parece duvidosa; e os avanços conseguidos não foram suficientes para retirar o Brasil de uma posição precária na comparação internacional.

            A título de sugestão de regras adicionais, podemos pensar em alguns aspectos: penalizar os partidos que não consigam completar os percentuais de candidatos que contemplem ambos os sexos; retomar a discussão da adoção do voto proporcional com lista fechada, posição que estamos defendendo neste momento.

            Precisamos fazer um aprofundamento dessa discussão com ampla participação de mulheres e homens, porque o equilíbrio de gênero no Parlamento só vai acontecer se tivermos uma mobilização aberta, franca, decidida das mulheres, mas também se houver disposição dos homens parlamentares no sentido de ajudá-las na conquista dessa equiparação. Isso é absolutamente justo num país como o Brasil, que tem maioria de mulheres.

            Nesse sentido, eu quero fazer coro com o esforço do Partido dos Trabalhadores, mas acho que não se trata de uma questão partidária. É uma questão de política maior, que deve envolver todos os partidos aqui representados.

            Acredito que, se somarmos esforços nesse sentido, teremos possibilidade de, se não aprovarmos integralmente, como foi estabelecido, o voto em lista fechada e preordenada com intercalação de sexo, avançarmos no sentido de conseguirmos algo melhor para garantir maior presença feminina no nosso Parlamento.

            Muito obrigado, Sr. Presidente.


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Este texto não substitui o publicado no DSF de 03/05/2011 - Página 13539