Discurso durante a 65ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Comemoração dos 185 anos de instalação do Senado Federal.

Autor
Randolfe Rodrigues (PSOL - Partido Socialismo e Liberdade/AP)
Nome completo: Randolph Frederich Rodrigues Alves
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
HOMENAGEM. SENADO.:
  • Comemoração dos 185 anos de instalação do Senado Federal.
Publicação
Publicação no DSF de 06/05/2011 - Página 14254
Assunto
Outros > HOMENAGEM. SENADO.
Indexação
  • HOMENAGEM, ANIVERSARIO DE FUNDAÇÃO, SENADO, DETALHAMENTO, HISTORIA, GARANTIA, EQUIDADE, ESTADOS, NECESSIDADE, REFORÇO, DEBATE, FUNDO DE PARTICIPAÇÃO DOS ESTADOS E DO DISTRITO FEDERAL (FPE).

                          SENADO FEDERAL SF -

            SECRETARIA-GERAL DA MESA

            SUBSECRETARIA DE TAQUIGRAFIA 


            O SR. RANDOLFE RODRIGUES (PSOL - AP. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente José Sarney, Presidente do Senado Federal, Presidente do Congresso Nacional, Srª Vice-Presidente, Senadora Marta Suplicy, Senadora Vanessa, Srs. Senadores, Srªs Senadoras, autoridades aqui presentes, saúdo também meu querido amigo Maximilien, permita-me assim chamá-lo, Embaixador da República Bolivariana da Venezuela, que também prestigia esta sessão. Sr. Presidente sempre lhe destaco a minha condição de historiador, mas não estarei aqui à altura da perfeição e da riqueza de detalhes do relato histórico que V. Exª fez sobre o Senado desde a sua instituição.

            Quero aqui só acrescentar ao que já foi dito pelo conjunto de colegas Senadores sobre estes 185 anos de instalação do Senado; lembrar que esta Casa foi instituída logo após a Independência. É uma das primeiras instituições a surgir em nosso País após a Independência, e vejam o caráter singular que trouxemos ao mundo ao instituirmos o Senado.

            Ao instituirmos o Senado, em 1826 - queria aqui, Presidente, cumprimentar V. Exª pela publicação do documento histórico relevante, da mais alta importância para nós a publicação do primeiro Regimento Interno do Senado e do primeiro Regimento Interno da então Assembleia Geral do Império, de 1827, que é a antecessora histórica da nossa Câmara dos Deputados. Documentos como esses são um brinde para aqueles que necessitam se deleitar sobre a pesquisa histórica. Mas dizia: a nossa instituição Senado foi sob a égide de um Estado unitário. Vejam que, sob a égide de um Estado unitário, não é característico desses a existência do bicameralismo. O bicameralismo é uma invenção, é uma criação e, muito já foi ressaltado aqui, a partir do advento da primeira República Federativa moderna que é a República dos Estados Unidos da América. E muito aqui se falou, o Presidente aqui citou os pais fundadores, founding fathers, da República americana. Aqui se citou Jefferson, aqui se citou Madison, aqui nós podemos citar Washington e o conjunto dos pais fundadores da primeira experiência de República Federativa que temos conhecimento no mundo.

            Lá se justificou o surgimento do Senado para garantir a Unidade Federativa após o advento da Independência para que aquelas antigas colônias inglesas que se levantaram sob o jugo inglês continuassem unidas sob o status de uma Federação; uma instituição em que o conjunto dessas antigas colônias abria mão de sua soberania, mas mantinha a sua autonomia.

            Foi nesse desenho arquitetônico, foi nessa arquitetura norte-americana, que surgiu a necessidade da instituição do Senado. Na nossa Independência, em 1822, surgimos como uma Monarquia constitucional hereditária. Não tivemos a constituição de Estados Federados, mas, sim, de províncias. Tínhamos, então, o estabelecimento de um Estado unitário.

            Não havia, em tese, a necessidade de uma Casa para o equilíbrio federativo como outrora havia surgido na independência dos Estados Unidos da América. Mas compreenderam, da mesma forma, os fundadores do nosso País que necessitávamos de ter uma Casa que apurasse - e esta é a primeira característica de surgimento do nosso Senado - o debate legislativo.

            Nesta Casa, completando hoje 185 anos, passaram por aqui - e vou cometer injustiça, porque não citarei todos os nomes das inúmeras personalidades, da nossa experiência como Nação independente, que passaram pelas cadeiras do Senado, seja no Império, seja no Senado da República - Joaquim Nabuco, o Marquês de Queluz, Barão de Cairu, Machado de Assis, Mauá, Rui Barbosa ou mais contemporaneamente, sob a República, Teotonio, Tancredo Neves e Marcos Freire.

            Esta Casa conseguiu, ao longo desse tempo, passar pelas diferentes experiências - e aqui me permita os nossos colegas da Câmara dos Deputados, nós, do Senado, temos uma tradição histórica mais longeva que a deles. Lembremos que nós já surgimos como Senado em 1826 e lembremos que a Câmara dos Deputados só surge como tal a partir do advento da República em 1891. Antes, estava sob o instituto de Assembleia Geral.

            Sob a República, esta Casa viveu a experiência, num determinado momento, de ser extinta. Temos que aqui lembrar o terrível e dramático período do Estado Novo, da ditadura que vigorou entre 1937 e 1945, quando, na prática, nós nos restabelecemos, retornamos, retrocedemos ao status de Estado unitário, onde as atribuições do Senado foram extintas e a própria Casa foi extinta.

            Era essa a pretensão de uma ditadura, e essa pretensão de uma ditadura deixa bem claro o incômodo que é para as ditaduras a existência desta Casa. Para se ter ditadura, seja no período de 1937 a 1945, seja no período de 1964 e 1985, foi necessário ou, outrora, extinguir o Senado, ou, em outro momento, abafar o Senado,

            A todos esses momentos o Senado resistiu. O Senado foi reconstituído como Casa da Federação na Constituição de 1946.

            Sob o Senado, levantaram-se as vozes da oposição e da necessidade do restabelecimento da ordem democrática, principalmente a partir das eleições de 1974, quando - aqui já foi dito - a oposição alcançou maioria nesta Casa, antecipando em uma década o brado do conjunto da sociedade brasileira de redemocratizarmos, de restabelecermos o Estado Democrático de Direito.

            A arquitetura de Niemeyer deixou claro, cravado, sob os nossos olhares, o sentido que tem esta Casa. A Câmara dos Deputados, aberta para receber a vontade popular; o Senado, para absorver a vontade popular e encaminhá-la para fazer a lei. Esse é o sentido da arquitetura de Niemeyer, e é sob a arquitetura deste, o grande renome da arquitetura brasileira, que trago a necessidade do debate que temos que fazer hoje como Casa da Federação.

            Este é o papel que nos cumpre na República: sermos a Casa da Federação. Surgimos na República Federativa, inspiramo-nos no modelo americano de República Federativa quando surgimos como República, em 1891. Aqui nos constituímos com a representação igual de cada um dos 26 Entes da Federação brasileira. E assim fazemos para dizer que, enquanto a Câmara é a Casa do povo, aqui é a Casa para garantir a Unidade Federativa. Sr. Presidente, não tenho dúvida de que este é o nosso desafio no Senado: ampliar a nossa atribuição como Federação.

            Um debate que nós travaremos nesta Casa, no próximo ano, soa fundamental: o debate sobre um instrumento fundamental do pacto federativo - o Fundo de Participação dos Estados. Sobre esse debate nos debruçaremos nos próximos meses. Esse é um debate fundamental para restaurarmos um papel que a nossa Federação perdeu, principalmente com o advento de exceções ao Estado Democrático de Direito. Um Estado de Direito, uma democracia é avessa à ideia de federação. Uma ditadura é avessa à ideia de federação, porque uma ditadura é fã da ideia da concentração de poderes.

            Um País como o nosso, o quinto País em dimensão territorial do Planeta, um País como o nosso, uma das maiores economias do Planeta, um País como o nosso não pode ter outra forma de organização de Estado que não seja a forma federativa. Por isso, cumpre a esta Casa o papel central de manter a Federação, garantindo a cada Estado-membro as suas prerrogativas.

            Foi este o ideal que inspirou a fundação do Senado, sob a égide da República americana: que o Estado mais pobre não fosse menosprezado pelo Estado maior e pelo Estado mais rico. Este é o desafio colocado ao Senado hoje: que nenhum Estado tenha mais prerrogativas, mais direitos, mais privilégios na Federação; que o Estado mais rico não tenha mais privilégios que o Estado mais pobre.

            O princípio da Federação, meu querido Senador Pedro Taques - olho para V. Exª e me inspiro no art. 5º da nossa Constituição -, fala de igualdade positiva. O princípio da Federação é o mesmo. Não se pode, na Federação, tratar os iguais igualmente, porque, se tratá-los igualmente, se promoverá desigualdades. Deve-se tratar os iguais na medida das suas igualdades e os desiguais na medida das suas desigualdades, para realizarmos, de fato, a igualdade positiva, preceituada no art. 5º do texto da nossa Constituição Federal, e já pacificado pelo Supremo Tribunal Federal.

            A esse princípio deve recorrer a nossa instituição, como Federação. Somos uma Federação de Estados desiguais; somos uma Federação com a existência de Estados mais pobres que outros; somos uma Federação com Estados ricos, mas, para nos manter como Federação, é necessário que os Estados mais pobres sejam tratados na medida das suas desigualdades e conforme prevê o princípio da representação paritária e da igualdade que temos no Senado da República.

            Esta Federação, alguns Estados resolveram integrar, fazer parte dela, para, como brasileiros, reivindicar. O meu querido Estado do Amapá e o Estado do Acre são dois desses exemplos na Federação brasileira. Nós estamos no Brasil porque exigimos ficar no Brasil. Para isso, irmãos nossos deram o seu sangue, no Amapá, no século XIX e, no Acre, na virada do século XIX, para o século XX. Ambos derramaram o seu sangue para fazer parte da Federação brasileira e para serem tratados como iguais pelo Governo da Federação, pelo Governo da União.

            Permita-me, Presidente, para concluir. Há três princípios fundamentais consagrados na Constituição. É dever deste Senado honrá-los e defendê-los sempre, porque a Constituição os proclama como indissolúveis: a República, a Federação e o Estado democrático de direito. (Palmas.)


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Este texto não substitui o publicado no DSF de 06/05/2011 - Página 14254