Discurso durante a 73ª Sessão Especial, no Senado Federal

Comemoração ao centésimo vigésimo aniversário do Jornal do Brasil.

Autor
Randolfe Rodrigues (PSOL - Partido Socialismo e Liberdade/AP)
Nome completo: Randolph Frederich Rodrigues Alves
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
HOMENAGEM.:
  • Comemoração ao centésimo vigésimo aniversário do Jornal do Brasil.
Publicação
Publicação no DSF de 17/05/2011 - Página 16317
Assunto
Outros > HOMENAGEM.
Indexação
  • HOMENAGEM, SESSÃO ESPECIAL, COMEMORAÇÃO, ANIVERSARIO DE FUNDAÇÃO, JORNAL, JORNAL DO BRASIL, ESTADO DO RIO DE JANEIRO (RJ), COMENTARIO, HISTORIA, ATUAÇÃO, ORGÃO, IMPRENSA, PAIS.

                          SENADO FEDERAL SF -

            SECRETARIA-GERAL DA MESA

            SUBSECRETARIA DE TAQUIGRAFIA 


            O SR. RANDOLFE RODRIGUES (PSOL - AP. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Senador Wilson Santiago, Vice-Presidente da Mesa do Senado Federal, Exmº Senador Marcelo Crivella, meu caro colega, a quem cumprimento pela belíssima iniciativa desta sessão solene, Srª Ângela Moreira, Presidente do Jornal do Brasil, como já foi dito há pouco pelo Senador Simon e pelos que me antecederam, neste momento de matriarcado, quando temos as mulheres assumindo presidências, seja a da República, seja de um jornal com a importância histórico como o Jornal do Brasil, Sr. Reinaldo Paes Barreto, Diretor do Jornal do Brasil, Sr. Marcelo Migliaccio, Editor Executivo do Jornal do Brasil, Sr. Humberto Tanure, jornalista Mauro Santayana, meu caro amigo jornalista Leandro Mazzini, que, em particular, reforçou e, permita-me, me intimou a estar presente aqui, e aqui estou com muita honra, pela importância deste jornal para o nosso País, Lindbergh me advertiu: é uma dificuldade falar depois de Simon. O Senador Pedro Simon disse-me quando estava chegando aqui que ele é um soldado a minha disposição, mas ele que é o nosso general, nós somos recrutas do seu exército. Por isso nos inspiramos na história, na história que eu estava a pesquisar há pouco.

            Permitam-me, Srs. Diretores, repórteres, jornalistas do Jornal do Brasil, eu estava em Macapá. Nessa madrugada, no voo para cá, enquanto era permitido, fiquei, como historiador que sou, a pesquisar o arquivo histórico do Jornal do Brasil, resultado da iniciativa do Jornal do Brasil com o Google. Não tenho dúvida esse é um dos mais ricos acervos de todos os jornais impressos do mundo, disponíveis na Internet, que mostra a riqueza destes 120 anos do jornal para o nosso País.

            Senador Simon, em alguma das manchetes em que procurava - V. Exª falou do meu apetite de historiador -, encontrei V. Exª e aí vi a sua importância. Por isso cada vez mais me orgulha estar no Senado da República ao seu lado de, aprendendo, ouvindo com atenção, porque em vários momentos da história do nosso País, registrado no acervo histórico digitalizado do Jornal do Brasil, encontrei V. Exª presente.

            Um jornal, para ter 120 anos de existência, em qualquer uma das democracias ocidentais, é uma exceção. Poderia ser dito que não há nenhum outro com história do Jornal do Brasil em nosso País, mas um jornal, um veículo de comunicação não se distingue pelos anos de existência. Como naquele célebre trecho do drama de Shakespeare, em que ele diz: “Experiência tem mais a ver não com quantos anos você completou, mas com quanta maturidade adquiriu”.

            Um jornal cinge-se, forja-se não nos momentos de tranquilidade da vida civil de um País, mas nos momentos difíceis.

            Eu estava querendo achar, confesso que procurei no arquivo histórico, desde a fundação do jornal, algum deslize nos momentos difíceis. Não encontrei!

            Primeiro, o jornal poderia ser distinto pelos diferentes nomes que passaram pelo JB e que já foram citados aqui: o JB de Joaquim Nabuco, de Barbosa Lima Sobrinho, de Drummond; o JB também do Barão do Rio Branco, de José Maria Paranhos; o JB Eça de Queiroz; o JB que teve como redator-chefe o Patrono do Senado da República, o grande Rui Barbosa; o JB também de Alceu Amoroso Lima. O conjunto de personalidades do JB, das páginas da literatura brasileira e das páginas do jornalismo brasileiro poderia ser o bastante para distinguir a importância desse jornal para o nosso País.

            Mas quero reiterar que o que distingue e destaca o jornal é a presença dele nos momentos difíceis, nos momentos em que imperava no País o Estado de exceção; nos momentos em que era difícil até a cidadania levantar-se; nos momentos em que imperava o arbítrio, pois, já no nascimento do jornal, na República, durante a ditadura de Floriano Peixoto, o Jornal do Brasil, já no seu nascedouro, no primeiro ano do seu nascimento, lá se levantava. Foi o único jornal a publicar o manifesto de Custódio de Melo, o Manifesto da Revolta da Armada. E foi por conta dessa publicação, de 6 de novembro 1893, que o ditador de então, o segundo da nossa história de ditaduras, o Sr. Floriano Peixoto, mandou cassar Rui Barbosa, vivo ou morto, diga-se de passagem, na sentença presidencial de então.

            O Jornal do Brasil foi fechado por conta daquilo, reabriu depois e não mudou o seu desígnio de afirmar-se, de colocar-se como frente de resistência nos momentos difíceis. Foi assim durante a ditadura do Estado Novo, sempre relatando a verdade e foi assim, só quero aqui citar, no último período de exceção que nós vivemos.

            Eu estive a procurar o conjunto das manchetes do Jornal do Brasil de 1964 até a consolidação da abertura democrática em 1985. Esse jornal teve um compromisso em todas essas manchetes: o compromisso com a verdade. Enquanto alguns meios de comunicação distorciam o que tinha sido o Comício das Reformas da Central do Brasil em 13 de março de 1964, o Jornal do Brasil, imparcial, relatou simplesmente as medidas do Presidente João Goulart naquele momento, anunciadas no Comício da Central do Brasil. Anunciou que, naquele momento, João Goulart proclamava a necessidade que o Brasil tinha de fazer reforma agrária e convocava o povo a fazer reformas constitucionais.

            Enquanto alguns meios de comunicação de todo o Brasil eram entusiásticos com a medida de ruptura da ordem democrática de 1º de abril de 1964, enquanto no dia 2 de abril o conjunto dos jornais brasileiros já dizia que existia um novo governo no Brasil, o Jornal do Brasil saiu com a seguinte manchete: “Goulart resiste no Sul e o Congresso empossa Mazzilli”, destacando que o que estava ocorrendo naquele momento era concretamente um golpe militar e civil. O Congresso Nacional, com a presença do Presidente da República em Território Nacional, no uso de suas atribuições legais, mesmo assim, havia declarado vaga a Presidência da República. Foi o Jornal do Brasil o único a veicular a verdade naquele 2 de abril de 1964.

            E, no momento mais difícil e mais duro, o golpe do golpe, o 13 de dezembro de 1968, quando a censura em definitivo se impunha, quando era impossível se levantar contra o regime que estava se consolidando, o Jornal do Brasil põe os fatos: “Governo baixa Ato Institucional e coloca o Congresso em recesso por tempo ilimitado”.

            Não poderia dizer muito mais do que isso. Era o aprofundamento do regime de exceção instalado quatro anos antes. Como bastião da democracia, o jornal, e com a inteligência e, me permitam, com a perspicácia característica dos cariocas, deu um jeito de emitir, naquela manchete de 14 de dezembro de 1968, a opinião do jornal. No cantinho da sua página estava lá: “Ontem foi o dia dos cegos”, emitindo, assim, claramente que a cidadania brasileira, o povo brasileiro, a sociedade brasileira, a democracia brasileira, naquele momento difícil, teria ali um front de resistência.

            E vejam que isso era o que deveria ser regra. Se tantos outros meios de comunicação, em vez de se calar, em vez de sucumbir, às vezes, em vez de cumpliciar, tivessem assumido posições como essa, talvez a democracia brasileira não tivesse sido durante tanto tempo intimidada. Mas assim, no front da resistência, o jornal continuou. Simon, foi no dia 16 de novembro de 1974, você, adiante daquela frente de oposição à ditadura, com tantos outros brasileiros, patriotas de fato, que o Jornal do Brasil, em primeira mão, noticiou no 16 de novembro de 74: “MDB vence na Guanabara, no Rio de Janeiro e em São Paulo.”

            O conjunto da imprensa se recusava a reconhecer, naquele momento, a vitória das oposições.

            Na cobertura ao atentado do Rio Centro - foi aqui já citado por Crivella -, foi o primeiro a noticiar a vitória de Brizola, em 1982. Era assim, em 16 de novembro de 82, a manchete: “Confirmada a vitória de Brizola no Rio de Janeiro”. Foi assim no dia 26 de janeiro de 84. Enquanto alguns meios de comunicação tentavam encobrir o movimento que surgia no Brasil, o movimento pela abertura política, o movimento que vinha da sociedade, o movimento que vinha do povo brasileiro; enquanto alguns não queiram reconhecer o que tinha sido o comício de 25 de janeiro de 1984, em São Paulo, o primeiro dos comícios das Diretas; enquanto alguns diziam inclusive que era uma comemoração pelo aniversário do Estado de São Paulo, o Jornal do Brasil estampou a manchete: “Comício pelas Diretas reúne multidão durante quatro horas em São Paulo”. E foi assim, estampando no dia 26 de abril o resultado da votação, aqui no Congresso Nacional, da emenda Dante de Oliveira. E foi assim, falando da redemocratização, da Constituinte, das primeiras eleições à Presidência da República, do retorno à vida democrática.

            Há três cumprimentos fundamentais a fazer aos senhores, às senhoras, aos dirigentes, repórteres, jornalistas e funcionários do Jornal do Brasil.

            Primeiro, pelo legado de importantes personalidades da História do Brasil, não somente jornalistas, que esse jornal tem prestado a todos nós. Segundo, pela posição política firme e decidida.

            Alguns falam, eu mesmo o fiz há pouco, de imparcialidade. Não. Há momentos em que não existe, não pode haver imparcialidade. Há momentos em que a neutralidade já é tomada de posição. Em momentos como estado de exceção, em momentos de ditadura, se algum jornal, se algum meio de comunicação se pretender neutro, já estará tomando posição: a posição pelo arbítrio, pela exceção. Essa posição não foi tomada pelo jornal dirigido pelos senhores e pelas senhoras, no jornal no qual trabalham. O JB tomou uma posição clara pela democracia. Não titubeou em relação a isso. Não ocupou a posição cômoda da “neutralidade”. Ancorou-se na democracia e, mais do que isso, ancorou-se na defesa da cidadania brasileira.

            Nesses 22 anos de estabilidade democrática, este é o momento mais cômodo, mais confortável para os jornais se posicionarem. O difícil é se posicionar durante os períodos de exceção, durante os períodos de arbítrio.

            O terceiro cumprimento - e fundamental - que faço a esse jornal é pelas posições que têm pautado sempre a favor do Brasil, sempre a favor da democracia. Tenho certeza, senhoras e senhores trabalhadores do JB e dirigentes do JB, de que o jornal que vocês integram faz jus ao nome. É um jornal que orgulha o Brasil. (Palmas.)


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Este texto não substitui o publicado no DSF de 17/05/2011 - Página 16317