Pronunciamento de Mozarildo Cavalcanti em 20/05/2011
Discurso durante a 78ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal
Apelo ao governo federal para que sejam tomadas providências a fim de reduzir as desigualdades regionais.
- Autor
- Mozarildo Cavalcanti (PTB - Partido Trabalhista Brasileiro/RR)
- Nome completo: Francisco Mozarildo de Melo Cavalcanti
- Casa
- Senado Federal
- Tipo
- Discurso
- Resumo por assunto
-
DESENVOLVIMENTO REGIONAL.:
- Apelo ao governo federal para que sejam tomadas providências a fim de reduzir as desigualdades regionais.
- Publicação
- Publicação no DSF de 21/05/2011 - Página 17693
- Assunto
- Outros > DESENVOLVIMENTO REGIONAL.
- Indexação
-
- ANALISE, DESEQUILIBRIO, ESTADOS, BRASIL, DESRESPEITO, CONSTITUIÇÃO FEDERAL, DEFINIÇÃO, PRIORIDADE, REDUÇÃO, DESIGUALDADE REGIONAL, COBRANÇA, GOVERNO FEDERAL, AUMENTO, INVESTIMENTO, REGIÃO NORTE.
SENADO FEDERAL SF -
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O SR. MOZARILDO CAVALCANTI (PTB - RR. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente Paulo Paim, Srs. Senadores, Srªs Senadoras, se existe um objetivo nacional que ainda não conseguimos alcançar, apesar dos esforços de alguns setores do Governo Federal, de várias instâncias do Poder Legislativo e de setores bastante representativos da sociedade, esse objetivo seguramente é o da redução das desigualdades regionais.
Em 1988, a nossa Constituição já previu, como objetivo da República, a eliminação das desigualdades regionais. Não se trata, Sr. Presidente, de um objetivo qualquer. Na verdade, estamos falando aqui de uma disposição plasmada no importantíssimo Título I da nossa Constituição Federal. Título, sempre é bom lembrar, é o que estabelece os fundamentos e objetivos essenciais da República Federativa do Brasil, além de elencar os poderes da União e os princípios pelos quais o nosso País deve pautar suas relações internacionais.
Está lá, Srªs e Srs. Senadores, no inciso III do art. 3º:
Art 3º Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil:
III - erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais.
Pois bem, ainda assim, ainda que a Constituição determine expressamente que devemos reduzir as desigualdades sociais e regionais, o que se observa na prática é a hegemonia de determinadas regiões sobre outras regiões, de determinados Estados sobre outros Estados.
Falo aqui, Senador Paim, sem nenhum tipo de preconceito ou de rancor. Sendo eu um Senador da região Norte, aliás, do Estado menos populoso da região Norte, não tenho nenhum rancor e até tenho orgulho de que São Paulo, Rio, Minas sejam Estados pujantes. É um orgulho realmente para o Brasil.
Essa hegemonia, todos sabemos, é muito difícil de ser combatida porque baseada em dois níveis de poder especialmente fortes: o poder econômico e o poder político.
Se confrontarmos, Sr. Presidente, o Produto Interno Bruto de cada região de nosso País com a população nela residente, as discrepâncias saltam aos olhos. A região Sudeste, por exemplo, onde vivem 43% dos brasileiros, responde por mais de 56% do Produto Interno Bruto nacional, já o Nordeste, com 28% da população total do País, participa com somente 13% do Produto Interno Bruto.
Então, vejam bem: 43% dos brasileiros produzem 56% do PIB nacional; já o Nordeste, com 28% dos brasileiros, participa com 13%. Será que é por que os nordestinos não trabalham? Não, não é. Com certeza, não é. O que falta realmente é investimento, de fato, nessas regiões.
E a nossa região Norte, Senador Paim, com a baixa densidade demográfica que a faz responsável por meros 8% da população do Brasil, tem um Produto Interno Bruto que representa 5% do Produto nacional. Portanto, 8% da população respondem por 5% do Produto Interno, ou seja, nossa participação percentual, em termos econômicos, consegue ser ainda menor que aquela registrada em termos populacionais.
Quando as comparações são feitas não entre regiões, mas entre Unidades da Federação, os resultados são igualmente impressionantes. Cito apenas um exemplo, que julgo bastante elucidativo: o PIB per capita do Distrito Federal - vejam só - é quase o dobro do PIB per capita do Estado de São Paulo. Então, o Distrito Federal tem um Produto Interno Bruto per capita superior ao do Estado de São Paulo, que, por sua vez, é mais de duas vezes maior que o de Roraima. Devo dizer, a bem da verdade, que o Produto Interno Bruto per capita do meu Estado não se situa entre os mais baixos do País. Alguns Estados, como o Piauí, por exemplo, tem o PIB per capita duas vezes menor que o do Estado de Roraima e, portanto, dez vezes menor que o do Distrito Federal, Sr. Presidente.
É claro, Srs. Senadores, que o poderio industrial nos Estados mais desenvolvidos faz com que eles, de certa maneira, sufoquem os Estados mais pobres, primeiro, porque praticamente os obrigam a consumir seus produtos, já que não há investimento por prioridade regional; segundo, exercendo uma influência que chega a extrapolar o campo econômico, vai se manifestar, inclusive, no comportamento social e nos costumes.
Como se tudo isso não bastasse, como se todo esse poder econômico não fosse suficiente para fazer valer os seus interesses, os Estados mais ricos contam também com uma força política bem maior. Eu sei, Sr. Presidente, que a nossa Constituição Federal prevê mecanismos de defesa e afirmação dos Estados mais fracos. A nossa Casa, o Senado Federal, tem a nobre missão de assegurar o equilíbrio federativo, na medida em que cada Estado participa aqui com o mesmo número de representantes, independentemente do número de habitantes e da pujança do seu Produto Interno Bruto.
Ademais, na Câmara dos Deputados, a proporcionalidade em relação ao número de habitantes é condicionada pela exigência de que Estados tenham um mínimo de oito e o máximo de setenta representantes. Não fosse isso, valesse o que se quer, cada eleitor um voto e, portanto, proporcionalmente valesse isso para ter um número equivalente, nós teríamos São Paulo, portanto, pulando para mais de cem Deputados Federais. Hoje, São Paulo sozinho tem mais Deputados Federais do que a região Norte toda, o que é um desequilíbrio político muito violento.
Mesmo assim, Srªs e Srs. Senadores, mesmo que essas disposições constitucionais atuem no sentido da diminuição das desigualdades, também nesse caso o que se observa na prática é a prevalência dos Estados mais fortes. Vou aqui até fazer um parêntese para dar um exemplo atual: nós aprovamos aqui uma medida provisória autorizando a implantação do trem bala no trecho São Paulo-Rio. Necessário? Sim, é necessário. Agora será que não haveria outras prioridades a serem atendidas na região Norte, Nordeste e Centro-Oeste que pudessem minimizar essa diferença?
Um outro caso recente, aliás, denunciado ontem pela Senadora Vanessa Grazziotin, é que o Governo Federal pretende dar uma série de incentivos fiscais para a instalação de uma fábrica chinesa em São Paulo, dando isenções que vão desde o PIS e a Cofins, redução do IPI, etc. Enquanto que, por exemplo, essa fábrica poderia ser instalada no polo industrial de Manaus, promovendo um equilíbrio regional adequado, ou numa outra cidade, num outro Estado do Norte do País.
Não deixa de ser natural, por exemplo, que Estados como São Paulo, com 70 Deputados Federais, Minas Gerais, com 53, e Rio de Janeiro, com 46 - só aí, Senador Paim, nós podemos dizer que é praticamente a metade da Câmara dos Deputados - exerçam um lobby muito mais efetivo em prol dos seus interesses, tanto no Executivo como no Legislativo, pelos Estados detentores de apenas oito cadeiras na Câmara, como é o caso do Estado de Roraima.
Só para ilustrar também o que afirmo aqui, Senador Paim, está na Câmara, há muito tempo, um projeto de lei autorizativo - portanto um projeto de lei que nem obriga a data que o Governo Federal tem que fazer -, instituindo um colégio militar em Boa Vista, capital de Roraima, e em Rio Branco, Estado do Acre, hoje governado pelo ex-Senador Tião Viana, que foi o Relator do projeto. E eu apresentei o projeto instituindo o colégio militar em Boa Vista; o Senador Tião Viana, como Relator, fez uma emenda acrescentando também um no Acre. Geopoliticamente falando, geoestrategicamente falando, é perfeitamente justificável. E não se vota até hoje na Câmara. Por quê? Porque realmente não há essa visão constitucional, diria assim, de eliminar desigualdades regionais, sequer no que tange à geoestratégia do País na questão da formação dos militares.
Outro projeto meu, um decreto legislativo também dando a autorização para uma construção de uma usina hidrelétrica na região do Cotingo, no meu Estado, também até hoje não aprovado, com sucessivas manobras e postergações na Câmara dos Deputados. E soma-se a isso o poder dos lobbies dos grandes Estados do Brasil junto ao Poder Executivo, que manobra a sua maioria e não aprova os projetos que são do interesse das regiões mais pobres.
A conseqüência é obvia: menos recursos públicos, menos investimentos governamentais são direcionados para as Unidades da Federação, que, ao menos em tese, seriam as mais necessitadas desse tipo de apoio.
Como diz aquela música: os pobres vão ficando cada vez mais pobres, os ricos ficando cada vez mais ricos, porque, se há investimento cada vez maior nos Estados já ricos e, cada vez menor nos Estados mais pobres, essa equação não se inverterá nunca. E o que é pior, é uma miopia política, Senador Paim, porque se investe mais nos Estados ricos, que teoricamente exercem sobre as populações pobres, os Estados pobres, o atrativo para irem para lá. Então, há uma migração maciça do Norte, do Nordeste, do Centro-Oeste, até de profissionais de nível superior para trabalharem naquelas regiões. Com isso, as demandas sociais nessas regiões são maiores. Daí as mazelas a que assistimos nos grandes Estados da Federação.
Por tudo isso, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, faço um apelo à Presidente Dilma Rousseff, que tanta sensibilidade tem demonstrado no exercício de sua elevada função, para que olhe com redobrado carinho os elos mais fracos da Federação. É realmente lamentável que isso ainda continue.
Eu fui constituinte, fomos constituintes, e na Constituição de 88, que nós elaboramos e foi promulgada, além de consagrar entre seus princípios fundamentais, no Título I, o objetivo de reduzir as desigualdades regionais, volta ao tema mais à frente, ao tratar dos orçamentos da União.
Dispõe o art. 165, em seu § 7º, que o orçamento fiscal referente aos poderes da União, seus fundos, órgãos e entidades da administração direta e indireta, inclusive fundações instituídas e mantidas pelo Poder Público, diz textualmente, terá entre suas funções a de reduzir desigualdades interregionais.
Então o Governo Federal vem descumprindo dispositivos constitucionais.
Eu até acho que este pronunciamento que faço hoje, depois de algum tempo no Legislativo, nos leva a pensar: temos, então, que judicializar essa questão também, porque não é possível que o Governo Federal não cumpra a Constituição e o Poder Legislativo seja conivente e até haja no sentido de não cumprir e essas desigualdades continuem.
Diz mais o § 7º do art. 165, estende essa função de reduzir as desigualdades interregionais ao orçamento de investimentos das empresas em que a União, direta ou indiretamente, detenha maioria do capital social com direito a voto.
Não conheço, Senador Paim, nenhuma dessas empresas que tenham dado preferência a investimentos na Região Norte, por exemplo.
Portanto, Srªs e Srs. Senadores, temos à mão os instrumentos necessários. A própria Constituição, ao mesmo tempo em que nos coloca uma obrigação, a de reduzir as desigualdades regionais, indica também os mecanismos por meio dos quais poderemos cumpri-la.
Se todos sonhamos, muito apropriadamente, com um Brasil mais justo, mais equânime, mais equilibrado, se todos sonhamos com uma pátria que ofereça a cada um de seus cidadãos e cidadãs as mesmas garantias básicas e as mesmas oportunidades, esse resultado somente será obtido se reduzirmos, com a urgência que se faz necessária, as brutais diferenças entre as regiões mais ricas e as regiões mais pobres do País, entre os Estados econômica e politicamente mais fortes e aqueles que ainda lutam por um lugar ao sol.
Quero deixar este pronunciamento, nesta manhã de sexta-feira, para a reflexão do Senado Federal primeira e primordialmente, porque aqui representamos os Estados, somos responsáveis pelo equilíbrio da Federação, e para a Presidente Dilma, que começa um Governo em que estabelece como prioridade justamente erradicar a miséria.
Ora, Senador Paim, erradicar a miséria aonde? No Brasil todo? E miséria no sentido amplo passa pela eliminação das desigualdades regionais, senão, em imensas regiões como Norte e Nordeste, a miséria será apenas minimizada, já que não há investimento na geração de empregos, na qualificação da mão-de-obra.
Infelizmente, citei aqui o exemplo do trem-bala e da fábrica de tablets chinesa que deve ser instalada em São Paulo, mas inúmeros outros investimentos de grande porte são feitos nessas regiões mais ricas, notadamente nestes três Estados: São Paulo, Rio de Janeiro e Minas, pelo poder econômico e pelo poder político que têm.
Se não olharmos para os mais fracos elos da Federação, não teremos uma Federação equilibrada. E cabe ao Senado realmente zelar por isso, porque na Câmara, embora estranhemos, é compreensível que Deputados dos Estados mais ricos lutem para ter mais apoio e investimentos, como de fato vêm tendo.
Eu espero realmente que a Presidente Dilma possa reverter essa questão e que o Congresso Nacional, traduzindo claramente, a Câmara e o Senado, mude de postura.
Vou promover uma conversa entre os Senadores do Norte, do Nordeste e do Centro-Oeste para que nós possamos ter uma postura mais pró-ativa em defesa dessas regiões mais pobres do Brasil.
Quero agradecer, Senador Paim, o tempo que me foi concedido.
Encerro o meu pronunciamento fazendo este apelo para a reflexão e providências a fim de eliminarmos as desigualdades regionais.
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