Discurso durante a 83ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Comemoração ao Dia Nacional da Defensoria Pública.

Autor
Eduardo Suplicy (PT - Partido dos Trabalhadores/SP)
Nome completo: Eduardo Matarazzo Suplicy
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
HOMENAGEM.:
  • Comemoração ao Dia Nacional da Defensoria Pública.
Publicação
Publicação no DSF de 27/05/2011 - Página 18827
Assunto
Outros > HOMENAGEM.
Indexação
  • HOMENAGEM, COMEMORAÇÃO, DIA NACIONAL, DEFENSORIA PUBLICA.
  • SOLICITAÇÃO, TRANSCRIÇÃO, ANAIS DO SENADO, ENTREVISTA, AUTORIA, SACERDOTE, IGREJA CATOLICA, RELAÇÃO, ACUSAÇÃO, CRIME, ABUSO, EXPLORAÇÃO SEXUAL, CRIANÇA.

                          SENADO FEDERAL SF -

            SECRETARIA-GERAL DA MESA

            SUBSECRETARIA DE TAQUIGRAFIA 


            O SR. EDUARDO SUPLICY (Bloco/PT - SP. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Senador Wilson Santiago; Sr. Defensor Público Federal Haman Tabosa de Moraes Córdova, representando o Defensor Público-Geral Federal; Srª Francilene Gomes de Brito Bessa, Presidente do Conselho Nacional de Defensores Públicos-Gerais; Sr. Leonardo Cardoso de Magalhães, Vice-Presidente da Associação Nacional dos Defensores Públicos Federais. Também quero cumprimentar o Senador Antonio Carlos Valadares e seus apoiadores pela iniciativa de requerer a comemoração, aqui no Senado, do Dia Nacional da Defensoria Pública, celebrado a cada dia 19 de maio, por força da Lei nº 10.448, de 2002.

            A data de 19 de maio lembra o falecimento, em 1303, na França, de Santo Ivo de Kemartin, doutor em Teologia, Letras e Filosofia e padroeiro dos advogados, que se notabilizou pela defesa dos pobres e indigentes.

            Quando as sociedades latino-americanas passaram por transições de ditaduras para governos civis, permaneceram campos negativos marcados pela sobrevivência de um autoritarismo socialmente implantado, efeito de prolongados períodos de concentração de renda e de desigualdade social e racial, dos preconceitos e dos microdespotismos.

            Para enfrentar essa situação, é necessário que haja um reconhecimento geral em nosso País de que a palavra “todos” seja interpretada em seu sentido inclusivo, como ensina John Rawls ao tecer sua análise sobre o direito de igualdade. Nesse sentido, o acesso à Justiça é um direito fundamental de toda pessoa. Mas, como a Justiça é uma mercadoria cara, quando se fala nesse direito, a questão fica centrada em tornar a Justiça mais acessível aos pobres e marginalizados.

            No Brasil, por iniciativa do constituinte originário de 1988, a orientação jurídica e a defesa integral e gratuita, em todos os graus, dos necessitados, ou seja, daqueles que comprovarem insuficiência de recursos, passou a ser atribuição de uma nova instituição: a Defensoria Pública.

            Em 1994, por força da Lei Complementar nº 80, foi organizada a Defensoria Pública da União, do Distrito Federal e dos Territórios e foram prescritas as normas gerais para sua organização nos Estados. Em boa hora, as funções institucionais da Defensoria Pública foram ampliadas pela Lei Complementar nº 132, de 2009.

            Entre suas importantes atribuições, que os senhores conhecem tão bem, destaco: promover a difusão e a conscientização dos direitos humanos, da cidadania e do ordenamento jurídico; representar aos sistemas internacionais de proteção dos direitos humanos, postulando perante seus órgãos; promover ação civil pública e todas as espécies de ações capazes de propiciar a adequada tutela dos direitos difusos, coletivos ou individuais homogêneos quando o resultado da demanda puder beneficiar grupo de pessoas hipossuficientes; exercer a defesa dos direitos e interesses individuais, difusos, coletivos e individuais homogêneos e dos direitos do consumidor, na forma do inciso 74 do art. 5º da Constituição Federal; promover a mais ampla defesa dos direitos fundamentais dos necessitados, abrangendo seus direitos individuais, coletivos, sociais, econômicos, culturais e ambientais, sendo admissíveis todas as espécies de ações capazes de propiciar sua adequada e efetiva tutela; exercer a defesa dos interesses individuais e coletivos da criança e do adolescente, do idoso, da pessoa portadora de necessidades especiais, da mulher vítima de violência doméstica e familiar e de outros grupos sociais vulneráveis que mereçam proteção especial do Estado; e muitas outras atribuições, que peço para serem consideradas, na íntegra, no meu pronunciamento.

            As atribuições do defensor público são, como se vê, das mais necessárias e importantes missões que um operador do Direito pode desempenhar. Todos os alunos do curso de Direito deveriam estagiar nas Defensorias Públicas espalhadas pelo País e, os mais vocacionados, altruístas e abnegados para com os mais necessitados deveriam ser estimulados a ingressar nos quadros da Defensoria Pública.

            Hoje, a existência da Defensoria Pública na Constituição da República e, principalmente, o trabalho consolidado pelos defensores em todo o País - de que sou testemunha mais de perto nas instituições penitenciárias e delegacias de polícia no Estado de São Paulo - são motivo de orgulho para todos nós, brasileiros. A instituição Defensoria Pública garante, de forma efetiva, o direito de igualdade e fortalece, sem sombra de dúvidas, a democracia em nossa sociedade. A democracia somente encontra um campo fértil quando as minorais, os mais humildes podem fazer valer os seus direitos.

            Mas há um caminho longo ainda a percorrer.

            Em entrevista ao Jornal do Brasil, de 21 de maio, o Dr. André Luís Machado de Castro, presidente da Associação Nacional dos Defensores Públicos, lamenta contabilizar apenas 5.200 defensores públicos em todo o País, com presença somente em 43% das comarcas brasileiras. Para se ter uma ideia, o número de defensores públicos federais não passa de 489 para defender, no mínimo, uma população-alvo abaixo da linha da pobreza, apresentada pelo IBGE em 16,270 milhões de brasileiros.

            Dessa forma, considero que, apesar de o nosso País já ter dado, nesses últimos anos, passos largos no caminho para assegurar o acesso à Justiça aos mais pobres, sendo exemplo para outras nações das América Latina, devemos agora unir nossos esforços na ampliação do número de defensores públicos, nos níveis federal e estadual, estabelecendo defensorias nos Estados que ainda não as possuem, nomeando os candidatos já aprovados em concurso e criando mais vagas de defensores públicos em todo o País.

            A democratização efetiva requer uma Defensoria Pública forte e por isso aqui estou também apoiando, como meus colegas que me antecederam, o apelo da Defensoria Pública da União para que os concursados possam logo ser considerados como defensores públicos pelo Governo.

            Quero, Sr. Presidente, ainda dizer hoje uma palavra de solidariedade ao Padre Júlio Lancelotti, que há tantos anos trabalha na Pastoral do Menor, da Arquidiocese de São Paulo, desde os tempos em que foi criada pelo querido cardeal Dom Paulo Evaristo Arns, em colaboração com Dom Luciano Mendes de Almeida, que também foi presidente da CNBB.

            Sempre acompanhei de perto o trabalho do padre Júlio Lancellotti, sobretudo junto à comunidade do povo da rua da cidade de São Paulo, assim como na casa de Oração do Povo da Rua, no bairro de Bom Retiro, criada por Dom Paulo. Ali, normalmente, todos os primeiros sábados do mês, reúnem-se em assembleia os que vivem nas ruas da cidade para falarem de seus problemas. São essas pessoas que, ao longo dos oito anos do Governo do Presidente Lula, se reuniram com ele, no dia 23 de dezembro de cada ano, para comemorar o Natal do Povo da Rua, sempre com a participação do Padre Júlio Lancellotti e, no último dia 23 de dezembro, inclusive com a então Presidente eleita, que logo iria assumir, Dilma Rousseff.

            Sempre confiei no caráter, na sinceridade de propósitos e na dedicação tão forte do Padre Júlio junto aos excluídos. Foi, portanto, com muita dor e preocupação que acompanhamos os episódios que levaram o Padre Júlio a ser vítima de acusação caluniosa e de extorsão que finalmente agora se torna inteiramente esclarecida pela Justiça paulista.

            Na última terça-feira, a Justiça paulista condenou Anderson Batista, 30, e Conceição Eletério, 45, acusados de tentar extorquir o Padre Júlio Renato Lancellotti. O casal, que havia sido inocentado em 2007 por insuficiência de provas, dessa vez foi condenado a sete anos e três meses de prisão.

            Em agosto de 2007, Padre Júlio procurou a Polícia e acusou o casal Anderson Marcos Batista e Conceição Eletério de extorqui-lo há pelo menos três anos. Segundo o religioso, ele seria acusado de pedofilia, caso não repassasse o dinheiro ao casal. Imagens da época que registraram Anderson cercando o padre na porta de sua casa - e que agora vieram ao conhecimento da Justiça - serviram de base para a condenação do casal. Assim, a Justiça de meu Estado confirma o que todos que conhecem Padre Júlio já sabiam: a sua total inocência.

            Padre Júlio Renato Lancellotti nasceu em 1948 e é sacerdote católico há 22 anos. Pároco da pequena Igreja São Miguel Arcanjo, na Mooca, zona leste de São Paulo, Padre Júlio sempre soube acolher os mais pobres, principalmente da Mooca e Belenzinho, com amor e carinho. Nessa Capela jamais existiu grade que impedisse a entrada de qualquer ser humano.

            Padre Júlio é um semeador de esperança para os excluídos e para todos nós que o conhecemos, um homem que não se cansa de lutar contra a injustiça.

            Ainda que, com demora, é muito importante que agora a Justiça tenha esclarecido inteiramente o caso que causou tanto sofrimento ao Padre Júlio, à sua mãe, que ficou doente e faleceu há cinco meses, e à comunidade de seus amigos.

            Solicito a transcrição nos Anais do Senado Federal da íntegra da entrevista do Padre Júlio Lancellotti à Folha de S.Paulo, em 25 de maio de 2011.

            Assim, Sr. Presidente, peço a compreensão dos defensores públicos, por, nesta oportunidade, expressar aqui a minha solidariedade a alguém que foi, infelizmente, injustamente acusado. E é muito importante que todos aqueles que trabalham na Advocacia, na Defensoria, na Procuradoria estejam sempre atentos a situações como essa, para que injustiças não sejam cometidas, porque, às vezes, têm repercussões por longos anos na família da pessoa.

            Então, meus cumprimentos a todos os defensores públicos.

            Muito obrigado. (Palmas.)

 

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DOCUMENTO A QUE SE REFERE O SR. SENADOR EDUARDO SUPLICY EM SEU PRONUNCIAMENTO.

(Inserido nos termos do art. 210, inciso I e § 2º, do Regimento Interno.)

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Matéria referida:

- Entrevista do padre Júlio Lancellotti à Folha de S.Paulo, em 25 de maio de 2011.


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Este texto não substitui o publicado no DSF de 27/05/2011 - Página 18827