Discurso durante a 86ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Defesa para que o Congresso Nacional reabilite o instituto das Comissões Parlamentares de Inquérito (CPIs), para que possam cumprir o dever de investigar, de fiscalizar, de denunciar e exigir responsabilização civil e criminal de atos ilícitos praticados.

Autor
Alvaro Dias (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/PR)
Nome completo: Alvaro Fernandes Dias
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
COMISSÃO PARLAMENTAR DE INQUERITO (CPI), FUTEBOL.:
  • Defesa para que o Congresso Nacional reabilite o instituto das Comissões Parlamentares de Inquérito (CPIs), para que possam cumprir o dever de investigar, de fiscalizar, de denunciar e exigir responsabilização civil e criminal de atos ilícitos praticados.
Aparteantes
Ataídes Oliveira.
Publicação
Publicação no DSF de 31/05/2011 - Página 19768
Assunto
Outros > COMISSÃO PARLAMENTAR DE INQUERITO (CPI), FUTEBOL.
Indexação
  • LEITURA, TRECHO, RELATORIO, COMISSÃO PARLAMENTAR DE INQUERITO (CPI), FUTEBOL, RESPOSTA, BANCO CENTRAL DO BRASIL (BACEN), ENCAMINHAMENTO, MINISTERIO PUBLICO FEDERAL, SUSPEIÇÃO, CORRUPÇÃO, PRESIDENTE, CONFEDERAÇÃO BRASILEIRA DE FUTEBOL (CBF).

                          SENADO FEDERAL SF -

            SECRETARIA-GERAL DA MESA

            SUBSECRETARIA DE TAQUIGRAFIA 


            O SR. ALVARO DIAS (Bloco/PSDB - PR. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, neste Congresso há uma tentativa de se viabilizar CPI para investigar denúncias que envolvem o Ministro Palocci. Os indícios são consistentes. Há inquérito já proposto pela Procuradoria-Geral da República, no Distrito Federal, e, obviamente, o Congresso não pode se omitir.

            Quando há sugestão de CPI, há sempre a alegação de que CPI termina em pizza; que todas elas terminam em pizza. Isto não é verdade. Há CPIs que produziram resultados ímpares, inúmeras CPIs. Não pretendo me reportar a todas elas hoje, mas, especificamente, a uma delas. Refiro-me à CPI que viabilizei no Senado Federal, e que presidi, tendo como Relator o ex-Senador Geraldo Althoff: a CPI do Futebol.

            A imprensa internacional destaca um grande escândalo no mundo do futebol. A BBC de Londres, uma das emissoras de maior respeitabilidade internacional, denuncia que Ricardo Teixeira, o Presidente da CBF, foi obrigado a devolver dinheiro de propina. A própria emissora relata que uma investigação no Senado brasileiro, em 2001, concluiu que Teixeira tinha uma relação muito próxima com a empresa Sanud. O inquérito descobriu que fundos da Sanud haviam sido secretamente desviados para Teixeira por meio de uma de suas companhias.

            Portanto, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, o que a imprensa internacional denuncia hoje, a CPI do Futebol denunciou aqui em 2001.

            Essa denuncia surgiu exatamente das investigações da CPI do Futebol e, provavelmente, o seu relatório final é que motivou a abertura de inquérito, na Suíça, para as investigações, que acabaram levando o Sr. Ricardo Teixeira a devolver dinheiro de propina, conforme anunciou o programa da BBC.

            Essa emissora revela que a FIFA está impedindo a divulgação de um documento que revela a identidade de dois dirigentes que foram forçados a devolver dinheiro de propinas em um acordo para encerrar uma investigação criminal na Suíça no ano passado. E essa emissora acabou revelando o nome de Ricardo Teixeira.

            Segundo a BBC, a empresa Sanud recebeu um total de US$9.5 milhões.

            Vou fazer a leitura de parte do Relatório final da CPI do Futebol, Relatório que foi elaborado pelo ex-Senador Geraldo Althoff, de Santa Catarina, no capítulo que diz respeito a esse fato. Portanto, o relatório, que foi encaminhado ao Ministério Público com pedido de indiciamento de dirigentes do desporto nacional, incluiu esse capítulo.

Percorrendo as declarações de renda das empresas das quais Ricardo Teixeira é sócio (assunto tratado com profundidade em outro capítulo deste Relatório), notamos que a R.L.J. tomou diversos empréstimos da Sanud Etablissement, localizada no paraíso fiscal de Liechtenstein, a juros absurdamente abaixo dos praticados no mercado (lembrando que a Sanud é sócia majoritária da R.L.J.). Pois bem, se a Sanud empresta para a R.L.J., e esta para Ricardo Teixeira, parece-nos óbvio que, em última instância, Teixeira se beneficia de recurso da Sanud, oriundos de paraíso fiscal e de propriedade desconhecida.

Outra observação é que não foi encontrado nenhum documento ou registro em cartório que amparasse o empréstimo da R.L.J. a Teixeira.

De um lado a triangulação financeira, os juros irrisórios, os recursos oriundo de paraíso fiscal, a falta de registro do “empréstimo” em questão, e a omissão junto à Receita Federal; do outro lado uma enorme quantia gasta com a SBTR (R$31 milhões) sem a devida comprovação de despesas, aplicações da CBF, em que há discrepâncias entre o contabilizado e o verdadeiramente aplicado, conforme extrato do Banco Vega, e coincidências inexplicáveis com aplicações particulares do Sr. Ricardo Teixeira. Forma-se um quadro, pelo menos suspeito, em que o ambiente e cenário são perfeitos para um outro crime: o de lavagem de dinheiro.

A sociedade entre o Sr. Ricardo Teixeira e a Sanud, na empresa R.L.J. Participações Ldta., inexiste de fato, visto que a Sanud, como sócio-cotista, jamais integralizou a parte da sociedade que lhe cabia, inclusive na forma como demandava o contrato social desta empresa.

Os recursos pretensamente transferidos ao Brasil pela Sanud sofreram desvio quanto à sua finalidade de aplicação, já que originalmente destinados à integralização de parte do capital da R.L.J.

Ao que indicam dados colhidos junto ao Banco Central do Brasil, as pretensas relações financeiras, por empréstimos, entre Sanud e a R.L.J. jamais ocorreram de fato, vez que dos empréstimos que teriam sido concedidos pela primeira empresa à segunda nunca resultou pagamento de juros ou a amortização do principal das obrigações assim geradas.

Inexistente a Sanud desde 08 de janeiro de 1999, fato apurado pelo Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf), do Ministério da Fazenda, as pretensas relações financeiras entre a Sanud e a R.L.J. podem dar-se por inexistentes e, por isso, configurar simulação, com o fito de oferecer fachada à movimentação de vultosas somas de recursos entre as duas empresas.

Considerando o fato que um dos procuradores da Sanud no Brasil foi, e ainda pode ser, o Sr. Guilherme Teixeira, irmão do Sr. Ricardo Terra Teixeira, além do fato de que os recursos enviados pela Sanud ao Brasil sofreram desvio quanto à sua finalidade de aplicação, sem que o Sr. Ricardo Teixeira formalmente se opusesse a tal desvio de finalidade, deduziu-se que ambos, o Sr. Ricardo Terra Teixeira e o Sr. Guilherme Terra Teixeira, decidiram a destinação dos recursos da Sanud de comum acordo, configurando conluio para a indevida apropriação de recursos de terceira parte (Parte II, item 2.1);

- quanto às demais relações financeiras entabuladas pela R.L.J. Participações Ltda., todas elas em virtude de empréstimos tomados ou concedidos, verificou-se que, em pelo menos dois casos, da ACOC Administração e Participações Ltda. (credor) e do próprio Ricardo Teixeira (devedor), os créditos e débitos registrados na contabilidade da R.L.J. Participações Ltda. não são correspondidos pelas informações oficialmente declaradas pelas contrapartes à Fazenda Pública, caracterizando simulação destinada, uma vez mais, a oferecer fachada à movimentação de vultosas somos de recursos (Parte II, item 2.1); (...)

            E continua o relatório. Não vou fazer a sua leitura. Quero ler apenas a parte de relatório que o Banco Central do Brasil me encaminhou recentemente, já que fiz essa solicitação para saber de providências decorrentes da CPI do Futebol. Em um de seus capítulos, esse relatório do Banco Central do Brasil diz o seguinte:

As recomendações ao Banco Central [pela CPI do Futebol] indicada nos itens I e III do Ofício 04/2002 foram também dirigidas ao Ministério Público Federal - MPF (...).

Os indícios da ocorrência de crime previsto no art. 21, parágrafo único, da Lei nº 7.492/86, nas operações de empréstimos contratadas pelo Sr. Ricardo Terra Teixeira (...).

            Portanto, o próprio Banco Central considerou a existência de indícios de crimes e encaminhou ao Ministério Público Federal, por solicitação da CPI do Futebol.

            Esse fato ressurgiu na imprensa internacional em razão das eleições que se travarão no próximo dia 1º de julho para a Presidência da FIFA. E parece-me que resta apenas como candidato o atual Presidente Blatter, que deve ser reeleito.

            A BBC, de Londres, investigou, pesquisou, solicitou esse relatório da CPI do Futebol e estabeleceu as relações entre os fatos agora denunciados e os fatos denunciados em 2001, na CPI do Futebol.

            E vejam a gravidade desse escândalo internacional, no momento em que o nosso País se prepara para a realização da Copa do Mundo de 2014. Atrasados em obras, atrasados em matéria de infraestrutura, aeroportos caóticos, estádios sequer começados, enfim, uma situação de preocupação em relação à eficiência daqueles que conduzem o projeto Copa 2014. Acima de tudo, esse fato depõe contra a imagem do nosso País.

            Vou reproduzir a opinião do jornalista da BBC, de Londres, que concedeu entrevista à ESPN Brasil:

Mas a FIFA [diz ele, num dos trechos da sua entrevista] está bloqueando o embargo judicial e os advogados de Ricardo Teixeira continuam lutando para que os documentos fiquem escondidos.

“Ele teve que admitir que ele foi subornado. A Polícia exigiu esse acordo. Então ele teve que admitir que foi subornado e teve que devolver o dinheiro. E o acordo era de total confidencialidade, sem nomes.”

            Estou reproduzindo na íntegra as declarações do jornalista da BBC, de Londres.

O jornalista acredita que isso é uma vergonha para o Brasil. [Diz ele] “Quando é que o Governo brasileiro vai dizer que basta? Sim, queremos a Copa do Mundo! Sim, nós adoramos ter uma seleção muito bem-sucedida! Mas nós não precisamos de Ricardo Teixeira. Se eu fosse brasileiro eu estaria muito bravo porque o dinheiro dos meus impostos não está sendo destinado ao combate à pobreza, para infraestrutura, para saúde. Está indo para os ladrões da FIFA. Eu não aceitaria. Vamos ver o Ricardo ir para a cadeia [diz o jornalista]. Isso seria justiça, não? Seria justiça para o povo brasileiro. Eles estão sendo roubados. Eu não estou sendo roubado. [diz o jornalista] Estou sendo roubado moralmente, mas não é no meu dinheiro que ele está pondo as mãos. É dinheiro de vocês.”

            Faço a reprodução das afirmações desse jornalista para demonstrar que essa é a imagem que o mundo passa a ter em razão da repercussão desse episódio, especialmente na Europa; a imagem que o mundo passa a ter daqueles que comandam o projeto Copa do Mundo 2014.

            Nenhuma palavra do Governo. Nenhuma palavra da Presidência da República. Nenhuma palavra do Ministro dos Esportes. A impunidade tem o Brasil como a sua morada preferida.

            Nós estamos cansados de noticiar escândalos no  
Brasil. Certamente os brasileiros não se surpreendem mais, mas evidentemente esse é um escândalo internacional. Não há como evitar que esse escândalo chegue, por meio da mídia especializada em futebol, a todos os países do mundo, que estão de olhos voltados para o Brasil em razão da Copa do Mundo de 2014.

            Que credibilidade tem esse dirigente? Que autoridade moral tem ele para movimentar bilhões necessários à execução desse projeto? Que irresponsabilidade é essa? O Governo tem responsabilidade ao admitir que alguém com esse currículo e com essa imagem internacional seja o condutor de projeto de tamanha relevância para o Brasil? Qual o legado da Copa do Mundo 2014? Qual será a herança dessa gestão comprometida eticamente? Essas são perguntas que devem ser formuladas à Presidência da República e ao Ministério dos Esportes.

            Eu não pretendo, hoje, fazer um relatório de outros pontos que demonstram a eficiência dessa CPI do futebol. Mas é preciso que as pessoas do Brasil entendam, coloquem sob suspeita as afirmações de que CPI não produz. Essa CPI do futebol devolveu aos cofres públicos do Brasil milhões de reais. Apenas na Receita Federal foram R$129 milhões recuperados. E o Banco Central nos encaminhou também um relatório demonstrando a recuperação de recursos sobre os quais voltarei a esta tribuna para falar.

            O importante, Sr. Presidente e Srs. Senadores, é que o Congresso Nacional reabilite esse instituto fundamental da Comissão Parlamentar de Inquérito para que possamos cumprir o nosso dever de investigar, de fiscalizar, de denunciar e de exigir responsabilização civil e criminal quando os ilícitos são praticados, porque o Brasil não pode continuar sendo o paraíso da impunidade.

            Concedo ao meu querido amigo e Senador que ilustra a nossa Bancada, Senador Ataídes, do Tocantins, com muito prazer, o aparte que solicita.

            O Sr. Ataídes Oliveira (Bloco/PSDB - TO) - Meu ilustre Senador Alvaro Dias, fiquei muito atento até agora às suas belíssimas palavras, à sua real preocupação com esse compromisso tão sério que o nosso País assumiu diante do mundo em relação à nossa Copa de 2014. Um dos nossos segmentos é construção civil, e construção civil demanda tempo, muito tempo. Os compromissos ora assumidos, percebo que não se fazem do dia para a noite. Para essa parte de logística, para essas reformas dos estádios, para a segurança e tantos outros compromissos assumidos, vejo que esse tempo será insuficiente. Eu só queria deixar um registro aqui, meu ilustre Senador. Não sou pessimista, mas, diante desse quadro que se demonstra pela frente, só chego a uma conclusão - tomara que os vencedores dessa Copa não sejam as grandes construtoras que hoje temos no Brasil e os bolsos de alguns poucos.

(Interrupção do som.)

            O Sr. Ataídes Oliveira (Bloco/PSDB - TO. Fora do microfone) - É só isso que eu espero, meu caro e ilustre Senador. E muito obrigado pelo aparte que me foi concedido.

            O SR. ALVARO DIAS (Bloco/PSDB - PR) - Obrigado, Senador Ataídes. V. Exª coloca muito bem: nós não sabemos quem ganhará a Copa do Mundo nos campos onde os jogos serão disputados, mas já sabemos, antecipadamente, que as grandes empreiteiras de obras públicas são as maiores ganhadoras. Já ganharam. Ganharam por antecedência. São campeãs mundiais. Nossas grandes empreiteiras são as campeãs mundiais em relação ao projeto Copa do Mundo 2014. É uma lástima!

            Nós estamos verificando que a Grécia vive profunda crise econômica, e especialistas afirmam que uma das causas centrais da crise econômica da Grécia tem origem na realização das Olimpíadas. Os gastos exorbitantes legaram ao país uma herança maldita. E nós não queremos que o Brasil seja a próxima vítima a receber uma herança maldita resultante da incompetência de gerenciamento e da desonestidade, porque escândalos como esse certamente não nos autorizam a afirmar que somos os campeões da honestidade neste País.


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Este texto não substitui o publicado no DSF de 31/05/2011 - Página 19768