Discurso durante a 94ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Crítica a livros didáticos adotados pelo Ministério da Educação que criticam o Governo do Presidente Fernando Henrique Cardoso e enaltecem o Governo do Presidente Lula e aos que defendem uma suposta supremacia da linguagem oral sobre a escrita.

Autor
Cyro Miranda (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/GO)
Nome completo: Cyro Miranda Gifford Júnior
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
EDUCAÇÃO.:
  • Crítica a livros didáticos adotados pelo Ministério da Educação que criticam o Governo do Presidente Fernando Henrique Cardoso e enaltecem o Governo do Presidente Lula e aos que defendem uma suposta supremacia da linguagem oral sobre a escrita.
Publicação
Publicação no DSF de 09/06/2011 - Página 22720
Assunto
Outros > EDUCAÇÃO.
Indexação
  • CRITICA, DISTRIBUIÇÃO, MINISTERIO DA EDUCAÇÃO (MEC), GOVERNO FEDERAL, LIVRO DIDATICO, ALUNO, ENSINO PUBLICO, RELAÇÃO, TRANSFORMAÇÃO, MATERIAL ESCOLAR, INSTRUMENTO, DOUTRINA, POLITICA.

                          SENADO FEDERAL SF -

            SECRETARIA-GERAL DA MESA

            SUBSECRETARIA DE TAQUIGRAFIA 


           O SR. CYRO MIRANDA (Bloco/PSDB - GO. Sem apanhamento taquigráfico.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, há uma célebre frase proferida por Winston Churchill, nos idos de 1916, que nos diz:

           “Em tempo de guerra, a verdade é tão preciosa que ela precisa ser guarnecida por uma escolta de mentiras”.

           Nós não estamos em guerra no Brasil. Não temos que nos guarnecer contra um inimigo externo, a ponto de pensarmos até em mentir para dissuadi-lo por meio da contrainformação e preservar a verdade e a crença de nosso povo nos valores edificantes de nossa sociedade.

           Nós não estamos, tampouco, num contexto de luta interna, como a travada contra a ditadura opressora e tirânica, quando muitos se viram nos porões do DOI-CODI, torturados a tal ponto que a mentira era a única maneira para garantir a sobrevivência.

           Nada, Srªs e Srs. Senadores, pode justificar a forma maniqueísta e tendenciosa como são tratados os Governos FHC e Lula, em livros didáticos distribuídos pelo MEC aos estudantes da rede pública.

           A luta que se trava hoje no Brasil é de caráter ideológico e político, sob a égide do Estado Democrático de Direito.

           É a luta entre propostas que, com características específicas, têm tentado se colocar como alternativa de poder para a sociedade brasileira.

           As propostas do PT e do PSDB são decerto diferentes, mas não seria justo dizer que uma ou outra carregaria em si a condição de estar mais certa ou mais errada, mais próxima ou mais distante da verdade. 

           Narrar a história, sobretudo a contemporânea, por uma lente distorcida que pretenda fazer verdadeira dominação cultural de nossos estudantes chega a ser um crime, um atentado contra a instituição do conhecimento universalista e aberto.

           Valho-me a esse respeito de um pensamento de Mário Covas, que nos ensinava:

E para que me credencie a defender a minha verdade, começo por manifestar a humildade de saber que existem outras verdades e que elas são tão sustentáveis quanto às minhas e que a única razão pela qual um homem, um democrata passa a ter o direito de defender a sua verdade é exatamente o respeito que ele manifesta pela alheia.

           Nós não podemos concordar, em absoluto, com a forma claramente tendenciosa como os livros didáticos adotados pelo MEC, em 97% das escolas públicas, tem tratado o Governo do Presidente FHC e o Governo Lula, como se este representasse Deus e aquele o Diabo.

           Os livros, salvo melhor juízo, transformaram-se em instrumentos de doutrinação política, como bem denunciam os jornalistas Luiza Bandeira e Rodrigo Vizeu, do jornal Folha de S. Paulo, em matéria sob o título “Livros aprovados pelo MEC criticam FHC e elogiam Lula”.

           O curioso, Sr. Presidente, é que uma das condições para os livros serem adotados pelo MEC é a inexistência de doutrinação política.

           Existe mesmo uma Comissão no âmbito do Programa Nacional do Livro Didático, com princípios e critérios para a avaliação de obras didáticas.

           Mas, como bem observam os jornalistas, o livro “História e Vida Integrada”, por exemplo, enumera problemas do governo FHC, de 1995 a 2002, como crise cambial e apagão, e traz críticas às privatizações.

           Já o item “Tudo pela Reeleição” cita denúncias de compra de votos no Congresso para a aprovação da emenda que permitiu a recondução de Fernando Henrique à Presidência.

           O fim da gestão FHC aparece no tópico “Um Projeto não Concluído”, que lista dados negativos do governo tucano. Por fim, diz que “um aspecto pode ser levantado como positivo”, citando melhorias na educação e a Lei de Responsabilidade Fiscal.

           Ao explicar a eleição de FHC, o livro “História em Documento” afirma que foi resultado do sucesso do Plano Real e acrescenta: “Mas decorreu também da aliança do presidente com políticos conservadores das elites”.

           Um quadro explica o papel dos aliados do tucano na sustentação da ditadura militar!

           O que é isso, companheiro?!

           Mas, em relação ao Governo Lula de 2003 a 2010, o livro cita a “festa popular” da posse e diz que o petista “inovou no estilo de governar ao criar o Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social”.

           O escândalo do mensalão é citado ao lado de uma série de dados positivos. Ao apresentar o Governo Lula, a autora inicia com a luta contra a ditadura e apenas cita que o partido fez “concessões nas alianças com partidos adversários”.

           Ora, Sr. Presidente, está nítida a parcialidade dessas obras ao tratar de assuntos que pertencem à atualidade da história brasileira e sobre os quais não temos o devido distanciamento crítico para analisá-los, até porque somos atores do próprio processo relatado.

           Por isso, o mínimo que se poderia fazer seria apresentar dados de cada um dos governos sem avaliações, que nos parecem tendenciosas.

           Esse tipo de atitude revela-se como dominação cultural, que afasta do aluno dados relevantes e fundamentais para que este possa avaliar cada governo e formar a própria opinião.

           E como se não bastasse, parece-nos que tanto as editoras quanto o MEC querem lavar as mãos sobre o assunto, como se nem um nem outro tivessem responsabilidade sobre a seleção das obras didáticas.

           Nessa mesma linha de raciocínio, quero salientar a questão de outro livro distribuído pelo Programa Nacional do Livro Didático a 485 mil estudantes jovens e adultos.

           O livro “Por uma Vida Melhor” defende a suposta supremacia da linguagem oral sobre a escrita e admite a troca dos conceitos “certo e errado” por “adequado e inadequado”.

           A partir dessa nova percepção, frases com erros de português como “nós pega o peixe” poderiam ser consideradas corretas em certos contextos.

           Nesse sentido, o mesmo livro pergunta: “Posso falar os livro?” E responde: “Claro que pode, mas dependendo da situação, a pessoa pode ser vítima de preconceito linguístico”.

           O argumento em favor dessa postura didática seria “a defesa de um ensino bastante plural, com diferentes gêneros textuais, com diferentes práticas de comunicação para que a desenvoltura aconteça”.

           Ora, Srªs e Srs. Senadores, não se trata aqui de ignorar a existência de diferentes maneiras de falar no Brasil, nem mesmo a questão de um verdadeiro bilinguismo, que, muitas vezes, impedem o diálogo entre os professores e os alunos de determinados segmentos sociais.

           Mas não me parece razoável, sob qualquer pretexto, negar ao aluno o conhecimento da modalidade culta da língua. Digo culta, não erudita.

           A língua portuguesa, como qualquer outra língua, tem um sistema gramatical que precisa ser respeitado, porque é o sistema convalidado e revalidado ao longo da existência da própria língua.

           A escola deve levar o aluno a compreender de forma mais aprofundada as regras do idioma pátrio, como meio de acesso ao conhecimento e de exercício da cidadania.

           Mas, se convalida erros crassos e ainda reforça a ideia de preconceito linguístico, acaba por retirar do aluno uma oportunidade singular de acesso ao domínio do português.

           No meu entendimento, já passou a hora de se debater com o Governo Federal, o Congresso Nacional e a sociedade um política do livro didático, para definir melhor o que se deseja ensinar às nossas crianças.

           Se essa moda pega, a de distorcer os fatos da história e a de ensinar “nós vai ou nós fica”, parece-me que estaríamos nos afastando dos limites da razoabilidade, do plausível.

           Sei, Sr. Presidente, que não existe a ideia de conhecimento neutro, porque o historiador é um ser humano e um cidadão que tem escolhas e preferências, mas isso não pode significar distorcer os fatos, de forma tendenciosa e contrária ao limite do bom senso.

           Não existe, tampouco, um português único, um bloco monolítico da língua portuguesa, mas é preciso cautela no que se deseja ensinar em nossas escolas.

           Entendo que o mínimo a ser feito é uma representação ao Ministério Público solicitando a recolhimento dessas obras, como já decidiram o PSDB e o DEM.

           Decerto, são livros que prestam um desserviço ao Brasil e não deveriam fazer parte da bibliografia adotada nas escolas brasileiras, sobretudo quando são comprados com o dinheiro do erário.

           Recolhê-los não é promover a censura, como disse o Ministro Haddad. Recolhê-los é o mínimo que se pode fazer em favor do equilíbrio na narrativa histórica.

           Muito obrigado!


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Este texto não substitui o publicado no DSF de 09/06/2011 - Página 22720