Discurso durante a 100ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Comentários acerca da carência de médicos no Brasil, defendendo a proposta de criação da carreira de Estado para os profissionais de saúde.

Autor
Mozarildo Cavalcanti (PTB - Partido Trabalhista Brasileiro/RR)
Nome completo: Francisco Mozarildo de Melo Cavalcanti
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
LEGISLAÇÃO TRABALHISTA. SAUDE.:
  • Comentários acerca da carência de médicos no Brasil, defendendo a proposta de criação da carreira de Estado para os profissionais de saúde.
Aparteantes
Paulo Davim.
Publicação
Publicação no DSF de 16/06/2011 - Página 23777
Assunto
Outros > LEGISLAÇÃO TRABALHISTA. SAUDE.
Indexação
  • JUSTIFICAÇÃO, PROPOSTA, EMENDA CONSTITUCIONAL, CRIAÇÃO, CARREIRA, MEDICO, ESTADO, ESTABELECIMENTO, DIRETRIZ, ORGANIZAÇÃO, ATIVIDADE PROFISSIONAL, IMPORTANCIA, INICIATIVA, MELHORIA, DISTRIBUIÇÃO, INCENTIVO, ATENDIMENTO, DIVERSIDADE, REGIÃO, BRASIL.

                          SENADO FEDERAL SF -

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            SUBSECRETARIA DE TAQUIGRAFIA 


            O SR. MOZARILDO CAVALCANTI (PTB - RR. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Srª Presidente, Senadora Marta Suplicy, Srªs e Srs. Senadores, há um tema recorrente em toda a discussão, a questão da quantidade de médicos que existem no Brasil, nos Municípios e nos Estados.

            A nossa Constituição de 1988, a decantada “Constituição Cidadã”, inclusive ressaltada nas palavras do saudoso Ulisses Guimarães, promoveu avanços significativos nos direitos e garantias de todos os brasileiros.

            Quero inclusive dizer que tive a oportunidade e a honra de ser constituinte e esse foi um dos temas - até por ser médico - que nós debatemos em profundidade.

            Além de assegurar aqueles destinados a proteger o indivíduo, tradicionalmente conhecidos como direitos humanos de primeira geração, a Constituição Federal garantiu aos brasileiros os chamados direitos sociais, ou seja, aqueles destinados a proteger não apenas o indivíduo, como apregoava o pensamento liberal, mas a dar abrigo às necessidades que permitem às pessoas se integrarem de maneira mais concreta à sociedade.

            É, por exemplo, o direito à saúde, previsto no § 6º do art. 196, que determina que “a saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação”.

            Assim reza a Constituição.

            A inclusão do direito à saúde na Constituição de 1988 revela-se um fato impressionante se considerarmos que em um país como os Estados Unidos, sem sombra de dúvida muito mais desenvolvido e rico do que o Brasil, ainda se discute a implantação de um sistema de saúde universal, ou seja, que atenda a todos os cidadãos e cidadãs.

            Evidentemente, conseguimos construir um arcabouço constitucional-legal de dar inveja a outros países. No entanto, parece claro que ainda existem diversos pontos em que é preciso haver uma melhoria significativa, especialmente porque ainda é muito precário o atendimento de saúde aos brasileiros. Volta e meia somos brindados com imagens de hospitais públicos abarrotados de pessoas, com poucas condições de oferecer atendimento decente. Faltam remédios, instalações e médicos.

            Em relação à carência de médicos, o Conselho Federal de Medicina, em seminário realizado no último mês de abril, defendeu a criação da carreira nacional para médicos e outros profissionais de saúde no âmbito do Sistema Único de Saúde - SUS.

            Para o Conselho, a criação da carreira resolveria a carência de médicos e demais profissionais da saúde nas áreas mais remotas e mais desassistidas do nosso País. Mas aqui é bom dizer que, até mesmo em São Paulo, existem Municípios em que não há médicos e há carência de outros profissionais da saúde. Esse não é só, vamos dizer assim, um triste privilégio de Roraima, do Amapá ou de Estados mais distantes.

            O problema da carência de médicos é gravíssimo, e há diversas propostas para resolvê-lo. Alguns defendem o serviço civil obrigatório ou facultativo; outros, o aumento de mais médicos; outros, ainda, advogam pela gestão em saúde feita por fundações públicas de direito privado ou, então, foco exclusivo nos programas de saúde da família.

            Um profissional respeitado, como o Dr. Adib Jatene, ex-Ministro da Saúde, defende que recém-formados devem atuar por dois anos em programas de saúde da família para que possam ingressar em programa de residência médica.

            Aliás, eu apresentei aqui um projeto exatamente nesta linha para que todos os recém-formados na área de saúde só tivessem o registro no Conselho Regional de Medicina respectivo após passarem dois anos, remunerados, fazendo atendimento nos locais onde não houvesse o atendimento ao requisito que a Organização Mundial de Saúde prega que é de um médico para mil habitantes.

            O Sr. Paulo Davim (Bloco/PV - RN) - Concede-me um aparte, Senador?

            O SR. MOZARILDO CAVALCANTI (PTB - RR) - Já lhe concederei um aparte, Senador Paulo Davim.

            O Conselho Federal, porém, contesta tal proposta, que, segundo ele, não resolveria o problema de fundo: a rotatividade continuaria a ser alta, e, vencido o tempo do contrato, o profissional deixaria o local onde estaria servindo.

            Discordo desse ponto, porque sai um grupo de dois anos e entra outro grupo de dois anos; a cada ano entra um novo grupo.

            O Conselho Federal de Medicina, é bom frisar, apresenta números interessantes em relação à quantidade de médicos no Brasil. Segundo o Conselho, ao contrário do que se pensa, não há insuficiência de profissionais médicos no País. Isso é verdade. No Brasil, como um todo, há mais médicos do que o número recomendado pela Organização Mundial de Saúde, que é de um para mil. Mas, se olharmos os Estados individualmente e os Municípios mais distantes, vamos ver a triste realidade: há poucos ou não há nenhum.

            Senador Paulo Davim, com muito prazer, ouço V. Exª.

            O Sr. Paulo Davim (Bloco/PV - RN) - Senador Mozarildo, quero parabenizá-lo pelo brilhante pronunciamento que o senhor faz na tarde de hoje, tocando neste assunto que é do interesse de todos: a saúde pública no Brasil. Quando se fala na carência de médicos, da presença ou da falta de médicos no interior do Brasil, existe sempre uma preocupação em aumentar o número de médicos no mercado. V. Exª já disse muito bem que o Brasil dispõe da proporcionalidade, de acordo com a Organização Mundial de Saúde, satisfeita. E, mais do que isso, o Brasil hoje é o segundo no ranking mundial em escolas médicas, com 181, só perdendo para a Índia, que tem seis vezes a nossa população e 242 escolas médicas. O Brasil tem mais escolas médicas do que a China, do que os Estados Unidos da América. Portanto, não vai ser oferecendo mais cursos médicos que nós vamos resolver o problema da saúde pública no Brasil. Nós precisamos, como V. Exª já abordou muito bem no seu pronunciamento, criar uma carreira de Estado para o médico e para os servidores da saúde, porque somente assim vamos conseguir interiorizar o médico no interior do Brasil, nos municípios que não dispõem de médicos, para atender a população. Não será, seguramente, com outros artifícios - serviço obrigatório, criação de escola médica etc. - que nós vamos resolver esse problema. De forma alguma. Precisamos dotar a saúde do Brasil de uma carreira de Estado para o servidor da saúde, com bons salários e condições adequadas para o atendimento. Aí, sim, nós vamos interiorizar a saúde pública no interior do Brasil. Parabéns pelo brilhante pronunciamento, Sr. Senador.

            O SR. MOZARILDO CAVALCANTI (PTB - RR) - Senador Paulo Davim, acolho com muito prazer o aparte de V. Exª. Até diria a V. Exª que apresentei projeto, alguns anos atrás, propondo que o recém-formado fosse para as localidades onde não há essa proporção de um para mil, ou em outras áreas da saúde, justamente porque, como se diz popularmente, no Nordeste e no Norte, é ir comendo pela beirada. Mas, na verdade, não há dúvida de que o remédio ideal mesmo é essa proposta de criação da carreira de Estado para os profissionais de saúde como um todo.

            Aliás, nesse sentido, em pronunciamento recente, o Senador Vital do Rêgo, médico e advogado, observou que “levantamento do Conselho Federal de Medicina, em 2010, revelou que existem atualmente 346 mil médicos, o que equivale a um médico para 578 habitantes.

            Portanto, muito melhor do que o recomendado pela Organização Mundial de Saúde. “No entanto, existem grandes disparidades na distribuição dos profissionais, que se concentram nas regiões Sul e Sudeste, no litoral e nas capitais dos Estados”. Ainda de acordo com o Senador Vital, em São Paulo a relação é de 1 médico para 239 habitantes, enquanto existem Estados em que essa proporção é de 1 para 10 mil habitantes. Mas, mesmo em São Paulo, eu já disse, existem locais onde não há médicos.

            Assim, com tais informações, é possível verificar que há um número grande de médicos, mas estão, de modo geral, mal distribuídos pelo país. Caberia, pois, ao Estado brasileiro estabelecer determinados mecanismos que incentivariam os profissionais de saúde a se instalarem nas áreas mais remotas ou mais vulneráveis.

            Há pelo menos duas propostas que merecem atenção. A PEC nº 34, de 2011, de autoria do Senador Vital do Rêgo, propõe a criação da carreira de médico do Estado, e a PEC nº 454, de 2009, em tramitação na Câmara dos Deputados, de autoria de Ronaldo Caiado e Eleuses Paiva, estabelece diretrizes para a organização da carreira de médico do Estado.

            Parece, pois, que o caminho para solucionar a carência de médicos em diversas regiões do Brasil passa necessariamente pela mudança na maneira como os médicos e outros profissionais da saúde são contratados. Atualmente, não há incentivos para que os profissionais de saúde permaneçam em determinadas localidades. Tal discrepância poderia ser superada pelo estabelecimento da carreira que garanta a fixação dos profissionais nas cidades, mesmo naquelas de menor porte ou mais afastadas dos grandes centros, se houver um patamar salarial que lhes garanta condições adequadas de sobrevivência.

            Hoje, os médicos, Senador Sarney, e demais profissionais de saúde, são obrigados a conviver com baixos salários,...

(Interrupção do som.)

            O SR. MOZARILDO CAVALCANTI (PTB - RR) - ...péssimas condições de trabalho e, sobretudo, falta de estímulo para se aprimorarem e, em especial, a dependência do capricho de governantes locais. A carreira de médico de Estado poderia resolver tais problemas e, de tal maneira, servir como meio para que as determinações da Constituição de 1988 fossem atendidas e, enfim, o sistema brasileiro de saúde tivesse qualidade e capacidade de atender de maneira digna e respeitosa todos os cidadãos.

            Espero, Senador Davim, que nós, que somos médicos - somos cinco médicos aqui -, assim como outros colegas, como o Senador Moka e o Senador Vital do Rêgo, possamos sensibilizar o Ministro Padilha que, aliás, tem um projeto que vai no rumo do proposto pelo Dr. Adib Jatene. Mas, repito, ainda é um paliativo. Temos que ir para o remédio que realmente resolve, que é a criação da carreira de Estado. Muito obrigado, Sr. Presidente.


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Este texto não substitui o publicado no DSF de 16/06/2011 - Página 23777