Pronunciamento de Ana Amélia em 30/06/2011
Discurso durante a 111ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal
Críticas ao anúncio de que o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) participará, na condição de sócio, da fusão dos grupos Carrefour e Pão de Açúcar, e, enquanto isso, os produtores de arroz não conseguem preço mínimo para a safra.
- Autor
- Ana Amélia (PP - Progressistas/RS)
- Nome completo: Ana Amélia de Lemos
- Casa
- Senado Federal
- Tipo
- Discurso
- Resumo por assunto
-
ECONOMIA POPULAR.
POLITICA AGRICOLA.:
- Críticas ao anúncio de que o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) participará, na condição de sócio, da fusão dos grupos Carrefour e Pão de Açúcar, e, enquanto isso, os produtores de arroz não conseguem preço mínimo para a safra.
- Aparteantes
- Ataídes Oliveira, Ivo Cassol, Pedro Taques.
- Publicação
- Publicação no DSF de 01/07/2011 - Página 26555
- Assunto
- Outros > ECONOMIA POPULAR. POLITICA AGRICOLA.
- Indexação
-
- SOLICITAÇÃO, TRANSCRIÇÃO, ANAIS DO SENADO, ARTIGO DE IMPRENSA, JORNAL, FOLHA DE S.PAULO, ESTADO DE SÃO PAULO (SP), CRITICA, ANUNCIO, PARTICIPAÇÃO, BANCO NACIONAL DO DESENVOLVIMENTO ECONOMICO E SOCIAL (BNDES), FUSÃO, EMPRESA DE COMERCIO VAREJISTA, CRIAÇÃO, MONOPOLIO, PREJUIZO, CONSUMIDOR.
- QUESTIONAMENTO, CONDUTA, GOVERNO FEDERAL, AUTORIZAÇÃO, BANCO NACIONAL DO DESENVOLVIMENTO ECONOMICO E SOCIAL (BNDES), SUPERIORIDADE, EMPRESTIMO, EMPRESA DE COMERCIO VAREJISTA, CONTRADIÇÃO, RESISTENCIA, PAGAMENTO, PREÇO MINIMO, ARROZ, PEQUENO AGRICULTOR, ESTADO DE SANTA CATARINA (SC), ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL (RS).
SENADO FEDERAL SF -
SECRETARIA-GERAL DA MESA SUBSECRETARIA DE TAQUIGRAFIA |
A SRª ANA AMÉLIA (Bloco/PP - RS. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão da oradora.) - Srª Presidenta Marta Suplicy, Srs. Senadores, nossos telespectadores da TV Senado, nossos ouvintes da Rádio Senado, no mesmo dia em que o Senado Federal afirmou que não ia adotar novas medidas aos produtores de arroz do meu Estado e também de Santa Catarina para uma garantia dos preços mínimos fixados pelo próprio Governo em R$25,80, numa estimativa de gasto de R$600 milhões - vou repetir: R$600 milhões - o BNDES anunciou uma participação na condição de sócio de um negócio privado, aportando até R$4,5 bilhões na operação da fusão do Carrefour com o Pão de Açúcar. Uma operação que, pelas disputas societárias com o grupo francês Casino, representa um futuro juridicamente incerto. Quem é que vai pagar esse risco?
Enquanto 30 mil famílias de produtores de arroz em 200 Municípios do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina não conseguem que o Governo pague o preço mínimo pelo produto, para ao menos cobrir os custos de produção, o BNDES aporta recursos públicos para promover a concentração de aproximadamente um terço do varejo brasileiro nas mãos de um único dono! E isso agrava, sem dúvida nenhuma, os problemas dos produtores rurais e também dos próprios consumidores. Só no caso do arroz, vale lembrar que houve uma estimada transferência de renda do setor produtivo para a rede do setor dos supermercados em um bilhão e meio de reais. O preço ao produtor cai violentamente. Para os consumidores nenhuma alteração dos preços que ficam inalterados.
Srªs e Srs. Senadores, setenta por cento dos alimentos que chegam à mesa dos brasileiros provém do esforço do agricultor familiar. Grande parte dessas famílias são produtoras de arroz e de outros produtos alimentícios e estão passando por graves dificuldades financeiras por serem obrigadas a vender uma saca de arroz, que custa em média R$29,00, por apenas R$19,00. Um prejuízo de R$10,00 por saca de arroz assumido por famílias que se dedicam dia e noite ao trabalho de fornecer comida aos brasileiros.
Por falar nisso, ontem, na Comissão de Agricultura e Reforma Agrária, uma audiência pública tratou aqui das questões relacionadas com a segurança alimentar e também ao abastecimento interno brasileiro. E foi provado por representantes do próprio Governo que a concentração representa, sim, risco não só à segurança alimentar, mas ao próprio abastecimento interno de comida.
Além de impor aos produtores de alimentos uma carga tributária muito superior à carga imposta, por exemplo, aos produtores argentinos e uruguaios, o Governo ainda importa arroz desses dois países sem levar em conta a autossuficiência do nosso País na produção de arroz. Os produtores brasileiros não têm como competir com os uruguaios e argentinos no mercado internacional por causa da carga tributária e ainda precisam enfrentar a competição dentro do próprio Mercosul.
Srªs e Srs. Senadores, a constante desvalorização do arroz no mercado levou as famílias a se endividarem sem conseguir cumprir os compromissos com o Governo. Neste ano, muitos produtores inadimplentes tiveram que financiar a sua produção em bancos privados pagando juros de mercado.
No entanto, o poderoso Grupo Pão de Açúcar, consagrada rede varejista do País consegue obter do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social, surpreendentemente, um sócio de peso e R$2,5 bilhões a juros subsidiados. Isso se agrava ainda mais se levarmos em conta que, para aportar recursos do BNDES, o Tesouro Nacional repassa recursos que são captados no mercado financeiro pagando juros da taxa Selic, que hoje é de 12,25%, emprestados ao BNDES à TJLP, à Taxa de Juros de Longo Prazo, de 6%,
Com muita alegria, concedo o aparte ao Senador Pedro Taques.
O Sr. Pedro Taques (Bloco/PDT - MT) - Sim, Senadora. Eu gostaria de cumprimentá-la pelo vosso pronunciamento e vou ser bem rápido para que o Brasil não perca a fala de V. Exª. Primeiro ponto, nós temos o vezo de debater a questão do BNDES, nos últimos cinco anos, por meio de medida provisória. Esse foi o primeiro ponto. Retira-se a discussão deste Congresso, retira-se a discussão com a sociedade sobre os investimentos do BNDES. Segundo ponto: o BNDES tem investido 67% nos grandes grupos econômicos - 63% - e só 27% nas empresas médias e pequenas, o que faz com que, Srª Senadora, nós tenhamos um Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social de alguns, não daqueles que mais necessitam. E um outro dado: a maior parte dos investimentos do BNDES se encontra nas regiões Sul e Sudeste, deixando aqueles Estados das regiões menos desenvolvidas com menor índice de investimentos, o que descumpre a Constituição, que busca aparar as desigualdades regionais. Aí nós estamos socializando o prejuízo e capitalizando o lucro. Isso não é digno de um Estado democrático de direito. Parabéns pelo vosso pronunciamento.
A SRª ANA AMÉLIA (Bloco/PP - RS) - Agradeço imensamente a valiosa contribuição que V. Exª dá, especialmente no campo jurídico e institucional, a respeito desse tema tão relevante.
Também concedo aparte ao meu companheiro de partido, Ivo Cassol.
O Sr. Ivo Cassol (Bloco/PP - RO) - Obrigado, Senadora Ana Amélia. É uma alegria e uma satisfação ver e acompanhar como a senhora defende os produtores do Rio Grande do Sul, de Santa Catarina e deste País afora. A situação do preço mínimo não é diferente no nosso Estado de Rondônia, quando, há poucos dias, os nossos produtores tinham que vender o feijão para o atravessador, perdendo em torno de 25 a 30 reais a saca. Ao mesmo tempo, deixa a gente triste quando a gente assiste ao BNDES sendo sócio de uma rede de supermercados. Já temos vários segmentos que ficaram monopolizados, fechados. Sempre digo o seguinte: o dinheiro do BNDES para pequenos produtores, comerciantes e empresários deste Brasil é igual a perna de cobra. Todo mundo diz que o BNDES tem dinheiro para esses pequenos empresários, mas é conversa para boi dormir, é igual a perna de cobra: todo mundo sabe que tem, mas ninguém vê, porque nunca ninguém conseguiu pegar. Eu fico abismado. Nós não podemos aceitar isso nesta Casa. Vamos fazer um requerimento na próxima reunião que tivermos da CAE para que o Presidente, os diretores do BNDES venham na Comissão explicar de que maneira e por que estão se associando. E aí faço uma pergunta: esses diretores que estão aprovando esse dinheiro para esse consórcio de milionários e bilionários nacionais e internacionais, que pouco tempo atrás eram quebrados, estão fazendo isso de graça? Com certeza não é. Com certeza estão levando vantagem em algum paraíso fiscal por aí. Então, nós não podemos aceitar. Esta Casa tem que repudiar e tem que punir porque os diretores passam pelo Senado para que a gente possa convalidar as ações deles. Portanto, é inadmissível. No meu Estado, há pequenos frigoríficos, como o de Ji-Paraná, um frigorífico que precisa de 20 milhões, que emprega quinhentas pessoas e que está com dificuldade. O patrimônio dele é de 45 milhões. O frigorífico do Zé Neto, na cidade de Ji-Paraná, de 45 milhões, tem um débito de 20 milhões precisa de um aporte de capital. Nem o Basa nem o BNDES dão o dinheiro para eles. Se eles fossem uma empresa multinacional ligada a outros lugares e tivessem algum acordo nos corredores, com certeza, eles seriam beneficiados. Então, o pequeno, infelizmente, está morrendo - nadando, nadando e morrendo na praia. Então, temos de combater isso aqui. Conta comigo. E o preço mínimo tem de chegar a tempo e não ao final, como tem chegado, muitas vezes, em safras no nosso País afora. Obrigado.
A SRª ANA AMÉLIA (Bloco/PP - RS) - Obrigada, Senador Ivo Cassol. Eu subscrevo também esse requerimento para convocação ou convite ou o que for, para que os dirigentes do Banco Nacional de Desenvolvimento e do BNDESPar estejam presentes para explicar aos Senadores os níveis e a natureza dessa operação que é incompreensível para o cidadão contribuinte brasileiro. Então, subscrevo esse requerimento com muito prazer.
Concedo um aparte ao Senador Ataídes.
O Sr. Ataídes Oliveira (Bloco/PSDB - TO) - Minha notável Senadora, ontem, vimos aqui mais uma barbaridade: a aprovação dessa medida em que o Governo empresta ao BNDES R$55 bilhões a juros de 6% e, depois, ele retoma esse dinheiro a 12,5%. Aqui, tudo acaba sendo aprovado a modo do Governo. Interessante, Senadora, que, infelizmente, o nosso povo não tem essas informações, esse conhecimento. É uma pena que não tenha essa informação. Tenho aqui, em mãos, um levantamento da Consultoria Price que mostra que, entre 2009 e 2010, o banco esteve por trás de pelo menos 64 operações de fusão e aquisição no Brasil, seis vezes mais que no biênio anterior, quando foram contabilizados apenas 10. O interessante é que, em 2010, o ativo total da subsidiária atingiu R$125,8 bilhões, sendo pouco mais de 80% referentes à carteira de ações de mais de 150 empresas de fundo de investimento, tais como Petrobras, Vale, OI, Eletrobrás e tantas outras que a senhora acabou de colocar aí, de uma forma extraordinária. Isso aqui me deixa indignado, Srª Senadora e minha Presidente. Muito obrigado.
A SRª ANA AMÉLIA (Bloco/PP - RS) - Obrigado pelo seu aparte e pela sua colaboração a este debate. A Casa precisa se debruçar sobre ele.
(A Srª Presidente faz soar a campainha.)
A SRª ANA AMÉLIA (Bloco/PP - RS) - Peço à Presidenta Marta Suplicy a condescendência dada a importância que temos...
O Regimento Interno é importante para disciplinamento dos nossos trabalhos, mas, no momento como este em que o País acompanha, a que a mídia brasileira dá uma atenção especial, inclusive com repercussão internacional, penso que o senado tenha que abrir um pouco mais espaço para essa questão.
Aliás, como disse o Senador Pedro Taques, de acordo com dados do próprio Ipea, que é um órgão oficial do Governo, e da Plataforma BNDES, o prejuízo operacional provocado chegou a R$21 bilhões em 2010, 38% maior do que o Governo gastou com o Bolsa Família em 2009, que foi um total de R$13 bilhões. Enquanto isso, o Pão de Açúcar toma recursos subsidiados no BNDES para emprestar ao Governo, investindo em Notas do Tesouro Nacional e recebendo os mesmos 12,25% da Taxa Selic.
Srªs e Srs. Senadores...
(Interrupção do som.)
A SRª ANA AMÉLIA (Bloco/PP - RS) - ..., ontem, esta Casa aprovou a Medida Provisória nº 526, que autorizou a emissão de títulos da dívida pública para que se aportem recursos de R$55 bilhões ao BNDES. Esse é o sexto repasse de recursos ao Banco em dois anos, totalizando o aumento do endividamento brasileiro em mais de R$240 bilhões.
Segundo dados do próprio BNDES, 66,4% dos recursos do Banco são destinados às grandes empresas. E, contraditoriamente, ontem, lá na Câmara dos Deputados - eu estava presente, assim como os Senadores José Pimentel e Armando Monteiro -, discutimos alternativas para reformular a Lei Geral da Micro e Pequena Empresa, para conceder alguma facilidade aos 40 milhões de brasileiros que retiram seu sustento trabalhando em pequenos negócios.
A Reforma da Lei Geral tramita há dois anos no Congresso Nacional, e não obteve o apoio do Governo, que teme perder pequena parcela de sua arrecadação. Mas a medida provisória que endivida o Brasil em favor de um banco que apoia grandes empresas foi aprovada em poucas horas de discussão.
O Governo Federal e sua base de apoio no Congresso Nacional precisam rever alguns conceitos.
A política de financiamento do BNDES promove a concentração de renda, contribuindo para aumentar as diferenças sociais em nosso País.
A fusão entre o Pão de Açúcar e o Carrefour concentrará um terço do comércio varejista brasileiro nas mãos de um único dono, talvez três, porque agora um outro disputante também está na jogada.
A concentração do mercado, no caso do comércio, é prejudicial para a economia nacional, pois significa a imediata redução da concorrência.
Reduzindo a concorrência, postos de trabalho serão extintos, por economia logística. Afinal de contas, não fará sentido ter dois supermercados de um mesmo dono em um mesmo bairro.
Reduzindo a concorrência, os consumidores sairão perdendo. Sem concorrência, os grandes grupos comerciais irão aumentar os preços com vistas ao aumento da margem de lucro.
Reduzindo a concorrência, pequenos fornecedores, como as famílias produtoras de arroz e de tantos outros produtos, serão pressionados a reduzirem seus preços e, em muitos casos, irão à falência. Isso pode levar ao desabastecimento e criar riscos sérios à segurança alimentar.
A diminuição dos preços pagos ao produtor não se reflete nas gôndolas dos supermercados, Srª Presidenta. Pelo contrário: estudos da Esalq demonstram que o preço do arroz pago aos produtores caiu 22,79%, nesta safra, enquanto os preços nas prateleiras dos supermercados subiu ao consumidor 10%.
Enquanto o Governo solicita, por meio de uma medida provisória, mais R$55 bilhões para o financiamento de grandes empreendimentos, a saúde pública no Brasil agoniza, por falta de recursos, à espera da regulamentação da Emenda 29.
Nós aqui... O argumento do BNDES é que a fusão será positiva para a promoção dos produtos brasileiros no exterior. Esse argumento é falho, Srª Presidente. Incentivos à produção brasileira devem ser realizados por meio do apoio aos pequenos negócios...
(Interrupção do som.)
A SRª ANA AMÉLIA (Bloco/PP - RS) - ..., aos pequenos produtores, aos pequenos empreendedores.
Incentivos à produção brasileira se fazem com a diminuição do custo Brasil, dos impostos, da burocracia; o incentivo à produção brasileira se faz com investimento em logística, tecnologia e formação de mão de obra especializada. O Brasil precisa repensar, e, certamente, comprar empresas estrangeiras com dinheiro público não é o melhor caminho.
Eu gostaria, Srª Presidente, de solicitar a transcrição, nos Anais desta Casa, do artigo, do jornalista Janio de Freitas, intitulado “O Cofre e os Negócios”, deste 30 de junho de 2011, que se refere à integração do Pão de Açúcar com o Carrefour e suas consequências. Ele diz que:
O Governo brasileiro faz [...] mais do que [...] [favorecer] o Pão de Açúcar: desfavorece os consumidores e o já comprometido equilíbrio na oferta e na concorrência dos supermercados. A formação do crescente oligopólio, encabeçada pelo Pão de Açúcar, sairá muito fortalecida do novo negócio.
Obrigada, Srª Presidente.
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DOCUMENTO A QUE SE REFERE A SRª SENADORA ANA AMÉLIA EM SEU PRONUNCIAMENTO.
(Inserido nos termos do art. 210, inciso II e § 1º, do Regimento Interno.)
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Matéria referida:
- O Cofre e os Negócios, Folha de S.Paulo.
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