Discurso durante a 113ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Voto de pesar, minuto de silêncio e levantamento da Sessão pelo falecimento do Senador Itamar Franco.

Autor
Pedro Simon (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/RS)
Nome completo: Pedro Jorge Simon
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
HOMENAGEM.:
  • Voto de pesar, minuto de silêncio e levantamento da Sessão pelo falecimento do Senador Itamar Franco.
Publicação
Publicação no DSF de 05/07/2011 - Página 26851
Assunto
Outros > HOMENAGEM.
Indexação
  • HOMENAGEM POSTUMA, ITAMAR FRANCO, SENADOR, ESTADO DE MINAS GERAIS (MG), EX PRESIDENTE DA REPUBLICA, ELOGIO, VIDA PUBLICA, LANÇAMENTO, PLANO, REAL, COMPROMISSO, ATUAÇÃO PARLAMENTAR.

                          SENADO FEDERAL SF -

            SECRETARIA-GERAL DA MESA

            SUBSECRETARIA DE TAQUIGRAFIA 


            O SR. PEDRO SIMON (Bloco/PMDB - RS. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srs. Senadores, quem via, há pouco tempo, o Itamar falando aqui, da tribuna, e ali da sua cadeira não imaginaria que era um homem de 80 anos, como eu, de uma biografia extraordinária, na qual estava a Presidência da República. Parecia um jovem que estava iniciando.

            Preocupado em ver que o Senado não era mais aquele que tinha deixado, há 18 anos, quando passou aqui; preocupado com o esvaziamento desta Casa, porque o Regimento não deixava praticamente nada para que os Parlamentares pudessem avançar. Ele parecia que estava iniciando uma movimentação para dar vida a esta Casa. Esse era o Itamar.

            Presidente da República, criador do Plano Real; na missão em que ele estava, ele fazia sua parte. Não imaginava que estaríamos aqui, neste momento, lamentando a sua morte.

            A imprensa publicava, outro dia, uma biografia de perguntas e respostas feitas ao Itamar com relação a ele e o Plano Real, ele e o seu Governo. Ele dizia: “Eu não tenho mais nenhuma dúvida: talvez depois de morto alguém encontre alguma coisa naquilo que eu fiz”.

            Eu quero dizer a esta Casa: na minha vida pública e na minha vida de Professor universitário, quarenta e tantos anos, eu não conheci um político no Brasil com a seriedade, com a dignidade, com a correção, com a decência do Itamar Franco. Fui seu líder nesta Casa. Mais do que líder, fui o irmão, companheiro de todas as horas. Não fiquei em Ministério. Fiquei nesta Casa, porque a confusão do impeachment e a tentativa de construir o entendimento tornavam a posição mais importante ou pelo menos mais complexa esta de ficar aqui.

            Fizemos muita coisa. Não me lembro se o Alvaro Dias estava aqui ou se era Governador... Não. Estava aqui. O Plano Real. O Plano Real foi feito nesta Casa e, quando foi feito, ninguém pensava que precisasse ter maioria, que era preciso maioria. Não demos um cargo a ninguém, não tinha emenda alguma.

            O PT foi contra, porque achava que o Plano Real dando certo inviabilizava a perspectiva que eles tinham de ganhar a eleição, porque o Lula tinha perdido para o Collor, o Collor tinha levado o impeachment; e o PT queria que as coisas fossem não digo de ruim a pior, mas mais ou menos, para eles poderem avançar. Pois o Itamar lançou e aprovou o Plano Real. Ele, com sua categoria, com a sua força, com o seu prestígio e com a sua credibilidade.

            Olha, se quem seguiu o Itamar tivesse seguido o seu prumo! Houve uma convocação para o Dr. Hargreaves, Chefe da Casa Civil, vir depor numa CPI. Não é que nem hoje: “Não, não vai depor, por amor de Deus! Não deixa depor. Vamos tirar a maioria para que não apóie”. Vai, mas renuncia à Casa Civil. Veio depor como um simples cidadão. E quando terminou o depoimento, foi aplaudido de pé. Então, voltou para a Casa Civil. Esse era o Itamar.

            O Plano Real não foi imposto a esta Casa. Nós fizemos emenda, modificamos, alteramos, e se discutiu a morrer. E o PT contra, boicotando. Mas, mesmo assim, emenda por emenda, votação por votação, modificação por modificação, o plano foi votado nesta Casa. Esse era o Itamar, um homem que governou com todos.

            A primeira coisa que fez ao assumir o Palácio foi se reunir com os presidentes de todos os partidos. De todos os partidos! Colocou o ministério sentado ali como se fosse aluno, e os presidentes dos partidos do lado de cá. E ele dizendo: “Primeiro, se vocês acharem que o melhor é eu renunciar e convocar uma nova eleição, renuncio”. Não teve um presidente de partido que concordasse. “Então, vamos fazer um pacto: qualquer presidente de partido que está aqui no meu governo ao enfrentar um problema, uma dificuldade, mesmo se for um presidente de partido, peça e nos reuniremos aqui para debater a questão. E eu peço licença para os senhores: qualquer crise que enfrentar, eu não resolverei em hipótese nenhuma sem antes consultar vocês, que estão aqui”. Esse foi o Itamar.

            Nomeou a Ministra dos Transportes. Uma senhora brilhante, inteligente, competente.

            Quatro dias depois, ficou sabendo que o marido dela era advogado da empresa concessionária do pedágio da Ponte Rio/Niterói. Demitiu por telefone. “A senhora devia ter me dito”. Demitiu por telefone. Esse era o Itamar. A imprensa que está aí, inclusive hoje um pouco jocosa, lembrando e fazendo questão de lembrar o topete e não sei mais o quê, ...

(Interrupção do som.)

(O Sr. Presidente faz soar a campainha.)

            O SR. PEDRO SIMON (Bloco/PMDB - RS) - ...eu desafio. Que digam aqui qual foi o ato, a crise, a imoralidade feita no Governo Itamar que não teve o seu protesto.

            Eu me lembro, Sr. Presidente, quando disse desta tribuna. Itamar me chama .... Ontem, lá no velório, tive ocasião de beijar as suas duas filhas. Olha, são duas filhas, uma morando nos Estados Unidos, casada com americano, com dois filhos, que ela fez questão de dizer que têm nacionalidade brasileira, a outra morando em Juiz de Fora. Olhando para elas, Presidente, pareciam filhas do Itamar prefeito de Juiz de Fora e não do Presidente da República e tudo mais na sua simplicidade, na sua singeleza. Esse era o Itamar.

            Ele tem um irmão, o mais velho, que pagou a universidade dele. O irmão mais velho, médico, e ele, órfão, a mãe fazia quitanda para fora para poder sustentar a família, e esse irmão dele se formou médico e pagou a universidade dele; teve um filho.

            Itamar Presidente me chama: “Simon, tu és líder do Governo, eu quero que tu coloques o meu sobrinho no seu gabinete”. Aí eu disse para ele: “Itamar, eu sou líder do Governo, mas eu não criei - o líder de partido e o líder de governo têm direito a dois gabinetes, o dele e o da liderança. Eu fui líder do governo, mas não criei o gabinete da liderança, só fiquei com o meu. Eu disse: “Mas, eu não tenho, Itamar”. “Mas tu não tens um gabinete da liderança?” “Não.” “Mas, por quê?” “Porque não criei, Itamar”. “Está bom.”

(Interrupção do som.)

(O Sr. Presidente faz soar a campainha.)

            O SR. PEDRO SIMON (Bloco/PMDB - RS. Fora do microfone) - O guri morreu, filho do irmão a quem devia tudo, sem ser nomeado nada. Sem ser nomeado nada! Não só no Governo dele, mas em qualquer empresa, em qualquer lugar que o Presidente da República pedisse e poderia ser. Esse era o Itamar. Às vezes sentava com ele, ele fazia as contas, ele Presidente da República, e telefonava para o Ministro da Saúde porque as dificuldades que ele tinha com a família com doenças eram tantas e os remédios estavam aumentando... Nunca ouvi falar em cartão corporativo nem em quem pagasse a conta dois. Ele pagava com o dinheiro dele. Esse era o Itamar.

            Olhe, eu tenho que dizer, Sr. Presidente, o senhor vai entender: eu nunca vi uma pessoa que nem o Itamar. Eu nunca vi. O Fernando Henrique um dia vai parar para pensar. E ele que agora viu os jornais dizendo que a candidatura dele, o êxito do Plano Real ele deve muito ao Itamar - eu tenho que rir. Não fora o Itamar, ele era candidato a Deputado Federal e não sei se ganharia, porque tinha fechado com o Collor. O Collor estava em vésperas de se recompor, estava fechando com o PSDB. Fernando Henrique e Serra queriam fechar. Serra, Ministro do Planejamento, e Fernando Henrique, Ministro das Relações Exteriores. Mas, aí, o Covas não deixou. E não saiu. E o Fernando Henrique ficou queimado. Estava pensando em ser candidato a Deputado Federal, achando se valia a pena. E ele mesmo dizia.

            Mas, o Itamar era assim. Itamar não foi para a televisão anunciar o Plano Real. Ele era o Presidente. O Sarney foi o Sarney. O Collor foi o Collor. Qualquer um foi. Ninguém fala em plano de quem quer que seja. O Plano Sarney, embora o então Ministro da Fazenda, espetacular, do Plano Cruzado, fosse o grande herói.

            Ninguém fala naquela Ministra bonita, da Fazenda, que lançou o Plano Collor. Fala-se do Collor. Mas o Itamar não foi lançar plano, não falou. Na sua singeleza, ele se resguardava. O que menos ele pensava era em aparecer. Esse foi o Itamar. Bonito gesto da Presidência. Aliás, bonito, não, obrigação, de oferecer o Palácio para fazer as exéquias do Presidente. Ele trocou o Palácio pela Prefeitura de Juiz de Fora, pela Câmara de Vereadores de Juiz de Fora.

            Esse era o Itamar, na sua singeleza e na sua humildade.

            Espero que a imprensa, Sr. Presidente, faça, passado o tempo, a biografia exata de quem foi o Presidente Itamar; que a imprensa, que foi tão apaixonada por alguns, mas levada por detalhes às vezes ridículos por outros, faça a justiça que merece o Presidente Itamar.

(Interrupção do som.)

            O SR. PEDRO SIMON (Bloco/PMDB - RS) - Digo aqui, como seu irmão [fora do microfone], meu amigo Itamar: você foi um grande homem. Um senhor ranzinza, exageradamente rígido, inflexível, mas você foi um grande homem, Itamar. Você não se dobrou jamais.

            Quando Fernando Henrique me telefonou: “Simon, tu, que és uma das poucas pessoas que o Itamar escuta, pede para ele, que ele tem de receber o Presidente da Globo. Está aqui no meu gabinete. Nós marcamos um almoço. O Itamar não quer”. E não almoçou. Esse era o Itamar. Não com um jornalistazinho, mas com o homem mais poderoso, sob qualquer aspecto, naquela época, no Brasil - o chefe da Globo.

            Esse era o Itamar.

(Interrupção do som.)

            O SR. PEDRO SIMON (Bloco/PMDB - RS. Fora do microfone.) - Por isso, Sr. Presidente, hoje é um dia triste. Um bonito dia. Está aí o Presidente Collor, como Senador desta Casa, fazendo um requerimento, pedindo para se marcar uma sessão solene, em homenagem à memória do Itamar. Respeito o Presidente Collor, mas respeito o Itamar, porque mostra que o Itamar não guardava ressentimento.

            Tenho de dizer mil vezes, Sr. Presidente: quando se fala em deposição de Presidente, a gente sabe que quem sempre está lá na porta é o Vice-Presidente. Quem liderou a derrubada do Dr. Getúlio foi o Café Filho. E assim foi na História do Brasil.

            Mas no impeachment, o Itamar não teve uma vírgula de participação. Não teve absolutamente nada que passasse pelo Itamar Vice-Presidente.

(Interrupção do som.)

            O SR. PEDRO SIMON (Bloco/PMDB - RS) - Ele ficou comigo [fora do microfone]. No lugar de V. Exª, na Presidência do Senado, estava o Presidente do Supremo, Sidney Sanches. Foi ele que presidiu o impeachment. E, na hora de decidir, era uma sexta-feira. Ele telefona, e vamos falar com o Itamar que ele deveria assumir naquele dia, e o Itamar manda dizer: “Não vou assumir na sexta-feira. Deixa para segunda ou terça”.

            Darcy Ribeiro, que estava ali, disse: “Mas isso é fantástico! Quando o Dr. João Goulart estava lá em Porto Alegre, e o Presidente do Senado decretava vaga a Presidência da República, porque o Presidente da República estava em lugar incerto e não sabido no exterior, o Dr. Tancredo berrava: ‘Mas é mentira, ele está em Porto Alegre na casa do Comandante do 3º Exército. Telefone agora, nos dê duas horas, e ele estará aqui’. Não nos deram. Agora o Itamar quer três dias para o Presidente ficar, inclusive da hora que quisesse, para que pudesse assumir”.

            Esse foi o Itamar, Sr. Presidente.

            Eu trago aqui, em nome de milhões de brasileiros, o meu carinho, o meu afeto, a minha amizade a Itamar Franco. Eu não tenho nenhuma dúvida de que a História relatará os fatos. E se a História conta a história dos vencedores, que os derrotados não têm chance, o Itamar foi um vencedor; um vencedor que nunca se preocupou em dar a sua versão, mas o tempo dará a versão.

            Vai em paz Itamar. O teu nome ficará, e o teu exemplo para nós servirá para sempre!

            Obrigado pela tolerância, querido Presidente.


Modelo1 5/18/242:55



Este texto não substitui o publicado no DSF de 05/07/2011 - Página 26851