Discurso durante a 115ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Homenagens de pesar pelo falecimento do ex-Presidente e Senador Itamar Franco, registrando a apresentação, por S.Exa. e outros Srs. Senadores, de requerimento solicitando realização de sessão especial a ele dedicada.

Autor
Fernando Collor (PTB - Partido Trabalhista Brasileiro/AL)
Nome completo: Fernando Affonso Collor de Mello
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
HOMENAGEM.:
  • Homenagens de pesar pelo falecimento do ex-Presidente e Senador Itamar Franco, registrando a apresentação, por S.Exa. e outros Srs. Senadores, de requerimento solicitando realização de sessão especial a ele dedicada.
Publicação
Publicação no DSF de 06/07/2011 - Página 27025
Assunto
Outros > HOMENAGEM.
Indexação
  • REGISTRO, APRESENTAÇÃO, REQUERIMENTO, SOLICITAÇÃO, HOMENAGEM POSTUMA, ITAMAR FRANCO, EX PRESIDENTE DA REPUBLICA, EX SENADOR, ESTADO DE MINAS GERAIS (MG).

                          SENADO FEDERAL SF -

            SECRETARIA-GERAL DA MESA

            SUBSECRETARIA DE TAQUIGRAFIA 


            O SR. FERNANDO COLLOR (PTB - AL. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Srª Presidenta desta sessão, Senadora Marta Suplicy, Srªs e Srs. Senadores, apresentei ontem, segunda-feira, requerimento para realização, no Senado Federal, de sessão especial em homenagem ao Presidente e Senador Itamar Franco, falecido no último dia 02 de Julho. Subscreveram o documento comigo o Presidente José Sarney, o Senador e Ministro Francisco Dornelles, os Senadores Romero Jucá, Renan Calheiros, José Agripino, Gim Argello, Ana Amélia, Jorge Viana, Eduardo Suplicy e Wilson Santiago.

            Apesar de a merecida sessão de homenagem estar marcada para o dia 10 de agosto próximo, não poderia deixar de expressar-me, ainda nesses primeiro dias, sobre o homem público e o momento de consternação por que passa o Senado Federal com a perda de uma personalidade da estatura moral e da envergadura política de Itamar Franco.

            O Presidente Itamar Franco exercia, na atual legislatura, o cargo de Senador da República pela terceira vez, nesta Casa. Aqui, vim buscá-lo para, na qualidade de meu candidato a Vice-Presidente, concorrer à sucessão do Presidente José Sarney, em 1989, nas primeiras eleições diretas para Presidente da República após o fim do regime militar.

            Entre 1992 e 1994, ele completou o mandato presidencial para o qual foi eleito - interrompido pelo processo de impeachment -, dando prosseguimento não só ao plano de privatizações e de abertura econômica do mercado, mas principalmente à integral e definitiva consolidação democrática do País, um cenário que, hoje, duas décadas depois, impõe-se com um valor ainda maior diante da constatação da plena estabilidade política e institucional de que atualmente desfrutamos.

            Por isso, não há dúvida de que, na trajetória da nossa história recente, o papel desempenhado pelo Presidente Itamar Franco, com aguçada visão social e indelével determinação política, mais do que relevante, foi imprescindível.

            Vale dizer, Srª Presidenta, que, numa análise mais apurada, mais profunda da história política brasileira das últimas décadas do século passado, a transição para o regime democrático, a bem da verdade, começou a esboçar-se com o resultado das eleições legislativas de 1974. Naquele pleito, a oposição, representada pelo então MDB - Movimento Democrático Brasileiro - conseguiu, além da maioria das cadeiras, uma qualitativa bancada nesta Casa, fato que a transformou em um verdadeiro foco de resistência ao regime militar vigente à época.

            E um dos quadros de maior expressão, a partir de 1975, foi o então Senador Itamar Franco, eleito pelo segundo maior colégio eleitoral do País. Juntamente com figuras do porte de Paulo Brossard, Marcos Freire e Franco Montoro, ele desempenhou um autêntico papel de opositor ao governo, chegando, inclusive, à Vice-Liderança do partido nos anos de 1976 e 1977.

            Por duas legislaturas consecutivas, até o início de 1990, Itamar Franco exerceu, sempre com o mesmo espírito democrático, o mandato de Senador da República, numa época de exceção às mais fundamentais regras da democracia, a começar pela plena liberdade de expressão. A missão que lhe foi outorgada na ocasião pelo povo mineiro permitiu-lhe participar, mais de perto e com grande liderança, da campanha das Diretas Já, em 1984, cujo objetivo era o de aprovar a Proposta de Emenda à Constituição Dante de Oliveira, que restabeleceria as eleições diretas para Presidente da República.

            Nesse mesmo ano, eu exercia o mandato de Deputado Federal e tive a oportunidade de votar favoravelmente à Emenda Dante. Infelizmente, para a grande frustração da esmagadora maioria da população brasileira, não obtivemos o número mínimo necessário para sua aprovação na Câmara dos Deputados. O fato é exemplo das dificuldades e resistências que os parlamentares de então enfrentavam para exercer seus mandatos em consonância com as aspirações da sociedade.

            Por isso, Srª Presidenta, Srªs e Srs. Senadores, o Presidente Itamar Franco foi reconhecido nacionalmente como uma liderança das lutas pela redemocratização do País. Ao passar a faixa presidencial ao seu sucessor em 1º de janeiro de 1995, num clima eleitoral de plena tranquilidade, Itamar deu curso à transição democrática e pôs fim, em definitivo, à sensação de que o Brasil, a partir de 1930, com o término da estabilidade política da República Velha, passara a viver sob um eterno regime autoritário, com breves intervalos de democracia.

            Da mesma forma, Itamar Franco teve sua imagem associada à de um autêntico nacionalista. Em suas primeiras passagens pelo Senado Federal, desempenhou um papel quase quixotesco contra a aprovação indiscriminada de projetos de resolução que autorizam a União, os Estados e os Municípios a contraírem empréstimos externos. Itamar Franco anteviu que essa política desenfreada de obtenção de empréstimos levaria o Brasil e seus entes federativos a sérios problemas econômicos, conforme demonstrou a história logo a seguir. Ou seja, ele tinha a plena consciência de que o endividamento acentuado colocaria o Brasil à mercê de credores e de organismos internacionais, como de fato veio a ocorrer logo após as eleições de 1982, com a ida do Brasil ao Fundo Monetário Internacional. Além disso, ele tinha a convicção de que as dificuldades geradas por esses excessos de dívidas representariam uma porta para a desnacionalização de setores estratégicos da economia.

            Contudo, sua principal obra se daria no exercício da Presidência da República, quando, por meio de uma engenharia política por ele desenvolvida, conseguiu estabelecer um governo de coalizão. O ambiente criado viabilizou as condições políticas e administrativas para que implantasse o plano de estabilização econômica - o Plano Real, que poria fim ao desenfreado processo inflacionário de que o Brasil era vítima há mais de uma década -, mas, principalmente, para que assumisse pessoalmente, com a coragem que lhe era peculiar, os riscos daquela empreitada. A magnitude e o significado de sua decisão, de seu desempenho e da determinação naquela oportunidade são bem aquilatados pelas benesses da estabilidade econômica de que o País e a população brasileira desfrutam até hoje.

            Srª Presidenta, Srªs e Srs. Senadores, Itamar Franco foi um amigo e um companheiro inexcedível nos momentos em que militamos juntos na política. Um homem digno, coerente e, acima de tudo, na inquietude positiva de seu temperamento, um defensor intransigente dos seus ideais.

            Sua vocação política refletiu-se principalmente no caráter articulador e na capacidade conciliadora e na capacidade conciliadora que demonstrou ao longo de mais de cinco décadas de vida pública, trajetória essa marcada pela equilibrada austeridade - porém, sem a perda da simplicidade - e pelo eterno compromisso com a ética na conduta política e nas administrações que exerceu.

            Depois de um longo período em que nossos destinos se afastaram, retomamos, neste ano, o convívio nesta Casa pelo exercício da senatória, no qual prevaleceram a admiração, a amizade e o respeito mútuo. Hoje, pertenço ao Partido Trabalhista Brasileiro, o PTB, primeira agremiação à qual o Presidente Itamar Franco se filiou no início de sua carreira política, ainda em 1954.

            Rendo, assim, as minhas mais sinceras homenagens ao homem público e à pessoa humana que foi Itamar Franco. À sua família e aos amigos mais próximos renovo os meus votos de paz e conforto.

            Por fim, como um gesto de reflexão e reconhecimento, repito aqui, Srª Presidenta, Srªs e Srs. Senadores, suas últimas palavras proferidas nesta Casa, nesta tribuna, em discurso em comemoração ao Dia Internacional dos Museus, tema cuja importância ele demonstrou, propondo, em 1987, a criação do Museu do Senado Federal.

            Nessa oportunidade, no dia 17 de maio deste ano, finalizou ele seu pronunciamento, resumindo profeticamente sua própria vida:

A preservação da memória de nossa História [...] é dever moral do qual não podemos fugir. É nosso compromisso com o Brasil e com a história de nossa gente!

            Portanto, Srª Presidenta, o que estamos fazendo, neste momento, é exatamente cumprir o que ele vislumbrava.

            Muito obrigado, Srª. Presidenta. Muito obrigado, Srªs e Srs. Senadores.

            Era o que tinha a dizer.


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Este texto não substitui o publicado no DSF de 06/07/2011 - Página 27025