Discurso durante a 115ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Homenagem à memória do Senador e ex-Presidente da República Itamar Franco.

Autor
Eduardo Suplicy (PT - Partido dos Trabalhadores/SP)
Nome completo: Eduardo Matarazzo Suplicy
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
HOMENAGEM.:
  • Homenagem à memória do Senador e ex-Presidente da República Itamar Franco.
Publicação
Publicação no DSF de 06/07/2011 - Página 27044
Assunto
Outros > HOMENAGEM.
Indexação
  • HOMENAGEM POSTUMA, ITAMAR FRANCO, EX PRESIDENTE DA REPUBLICA, SENADOR, ESTADO DE MINAS GERAIS (MG), ELOGIO, VIDA PUBLICA.

                          SENADO FEDERAL SF -

            SECRETARIA-GERAL DA MESA

            SUBSECRETARIA DE TAQUIGRAFIA 


            O SR. EDUARDO SUPLICY (Bloco/PT - SP. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Srª Presidenta, Senadora Marta Suplicy, Srªs e Srs. Senadores, também me sinto na responsabilidade, como uma pessoa que com ele interagiu e porque sempre tive pelo Senador, Presidente e Governador Itamar Franco uma relação de crescente respeito, cooperação e construção, de dedicar-lhe, como outros colegas, meu pronunciamento de hoje.

            A ética está de luto. Morreu, nesse final de semana, aos 81 anos, o Senador e ex-Presidente da República Itamar Augusto Cautiero Franco.

            Itamar foi um político respeitado por aliados e opositores. Ele foi exemplo de político sério, honesto e responsável. Foi com seriedade, hombridade e honradez que exerceu seus mandatos políticos, sem privilegiar quem quer que fosse, por mais que privasse de sua intimidade. Também era polêmico, de temperamento forte; muitas vezes, a imprensa o chamou de teimoso e birrento.

            O Brasil deve muito a Itamar Franco. Ao assumir a Presidência da República, o País atravessava uma enorme crise política, fruto do impeachment de Fernando Collor e, ao mesmo tempo, vivia um delicado momento econômico, com a inflação acima de 3% ao dia. 

            A democracia brasileira retomava seus primeiros passos, e Itamar, com espírito público ímpar, convocou todos os presidentes dos partidos políticos existentes e perguntou-lhes se queriam que fosse convocada nova eleição, já que restavam dois anos de mandato (1992-1994). Ficou em silêncio por alguns minutos e, frente à concordância exposta pelo silêncio de todos, assumiu o cargo de Presidente da República. Num momento de crise, Itamar Franco fez uma transição democrática sem turbulências.

            Pai do Plano Real, sofreu objeção nossa, do PT, mas - faz-se necessário reconhecer - trouxe a estabilização de nossa moeda, depois de um longo período de alta inflação e de planos não bem-sucedidos, o que propiciou também, até hoje, avanços na área social, o aumento da renda do trabalhador e a diminuição das desigualdades sociais entre os brasileiros. Itamar Franco foi “O fiador do Real”, como escreveu no domingo, 3 de julho, o jornal O Estado de S. Paulo.

            Com mão firme, sustentou a equipe econômica que concebeu o Plano Real e o implementou, resgatando, assim, a dignidade do País destroçado pela inflação galopante. Só quem viveu esse período de altíssima inflação sabe o que significa chegar ao mercado pela manhã e comprar um quilo de arroz por um valor, e, à tarde, o quilo do mesmo arroz estar custando muito mais. São coisas que não se consegue explicar para os jovens de hoje. Foi a firmeza de propósito de Itamar que permitiu à economia deslanchar, até atingirmos a posição que atualmente o Brasil desfruta no mundo.

            Como representante do Estado de Minas Gerais no Senado Federal, Itamar teve participação exemplar e decisiva. Em 1978, o então Presidente Ernesto Geisel, com base em levantamento da Eletrobrás, resolveu aumentar a produção de energia elétrica, tendo como matriz a fusão nuclear. Foi, então, negociado um acordo com a Alemanha, o qual foi encaminhado ao Congresso, prevendo-se a construção de oito usinas nucleares e a transferência tecnológica a partir da quarta. O acordo foi aprovado pelo Congresso.

            Entretanto, pouco tempo depois, a revista alemã Der Spiegel, publicou uma série de matérias - que foram reproduzidas pela imprensa brasileira -, trazendo acusações de desvio dos recursos liberados na construção da primeira das oito usinas acordadas. O líder do MDB, Paulo Brossard, requereu a instalação de uma CPI para investigar a concepção do acordo nuclear Brasil-Alemanha.

            Em outubro de 1978, a CPI elegeu o seu presidente, o Senador Itamar Franco. Como era sua característica, Itamar conduziu a Comissão de Inquérito com firmeza e objetividade, conseguindo, àquela época, rasgar o véu de mistério que cercava o acordo com a Alemanha.

            É de autoria de Itamar Franco, o engenheiro que se tornou político, a legislação que dispõe sobre a seleção de locais, a construção, o licenciamento, a operação, a fiscalização, os custos, a indenização e a responsabilidade civil e as garantias referentes aos depósitos de rejeitos radioativos.

            Neste ano de 2011, aqui, como Senador, Itamar Franco, mais uma vez, apresentou um projeto na área de energia nuclear, dispondo sobre a localização no território nacional de usinas que operam com reatores nucleares. Em homenagem a ele, será importante que o Presidente da Comissão de Constituição e Justiça, Senador Eunício Oliveira, designe o relator do PLS nº 139, de 2011, de autoria de Itamar Franco, para que se dê andamento ao debate e à votação da matéria.

            Itamar, um estudioso na área de energia, após extenso e delicado trabalho, demonstrou ao Senado que o Brasil precisa examinar com atenção o problema nuclear. Em um de seus últimos pronunciamentos, ele lembrou a importância que tem o Congresso Nacional na autorização para a instalação de usinas nucleares. Lembrou à Presidenta Dilma Rousseff que iria exigir o cumprimento do art. 225, § 6º, da Constituição, que estabelece: “As usinas que operam com reator nuclear deverão ter suas localizações definidas em lei federal, sem o que não poderão ser instaladas”.

            Itamar, como presidente, mudou o paradigma da política social brasileira, concretizou grande parte da ordem social prevista na Constituição de 1988, na saúde, na assistência social e na reforma agrária. Além disso, foi ele quem primeiro elegeu como prioridade o combate à fome e inaugurou a participação da sociedade civil, de forma inédita e efetiva, na gestão e na formulação das políticas públicas.

            A gestação do que veio depois, do que veio de melhor nas políticas sociais, tanto com Fernando Henrique, quanto com Lula e agora com Dilma, deve-se ao breve e grande governo do Presidente Itamar.

            Sinto-me feliz de ter contribuído para uma articulação, ainda em janeiro de 1993, com o Senador Pedro Simon - então líder do governo Itamar Franco -, que possibilitou o encontro de Lula e Itamar - encontro que foi a força-motriz da política de combate à fome, reunião da qual participei no gabinete presidencial. Depois de ter havido a reunião em meu gabinete entre o Presidente Itamar Franco e entre o Presidente Lula - então Presidente do Partido dos Trabalhadores -, o Senador Líder, Pedro Simon e comigo próprio, fomos ao Presidente Itamar Franco

            Lula entregou a Itamar um documento elaborado pelo Governo Paralelo do PT sobre Segurança Alimentar, coordenado por José Graziano da Silva, atual Diretor-Geral da FAO, no qual já se definia um conjunto de diretrizes, de ações para uma política de segurança alimentar, inexistente no País, e onde já se previa a criação do Conselho Nacional de Segurança Alimentar. Tal Conselho foi instalado em 13 de maio de 1993, com a presença de Dom Helder Câmara, numa histórica reunião em que todos os matizes políticos e vertentes ideológicas do Governo e da sociedade se irmanaram para a erradicação da fome no Brasil.

            O Conselho se estruturou com participação majoritária da sociedade civil - sendo que 21 membros foram indicados pelo Movimento da Ética na Política; isso me foi recordado por Dom Mauro Morelli ontem - e oito ministros, inclusive os da área econômica. Notáveis brasileiros lá estiveram, com autonomia, participação crítica e corresponsabilidade sob a presidência do Bispo de Caxias, Dom Mauro Morelli, que hoje é o coordenador do Conselho Estadual de Segurança Alimentar do Governo de Minas Gerais.

            Em 24 de junho de 1993, o País se surpreende vendo, pela primeira vez, representantes da sociedade civil - Dom Mauro Morelli e Betinho - ocuparem a rede de rádio e TV para convocar a sociedade brasileira para o engajamento na Ação da Cidadania Contra a Fome, a Miséria e pela Vida. Este Movimento, liderado pelo saudoso Betinho, que também integrava o Consea, tinha forte liderança na interlocução do governo com a sociedade e com o Congresso. No funeral de ontem, Dom Mauro Morelli recordou esses episódios comigo.

            A aproximação do PT com o governo Itamar na implementação do combate à fome foi decisiva para um clima de paz e de harmonia num momento difícil, onde a governabilidade foi assegurada. Mais uma vez, o Presidente Itamar foi capaz de ouvir e aceitar sugestões, inclusive de seus opositores, consolidando de uma vez a democracia em nosso País.

            Acompanhei o trabalho do Consea, integrei a Frente Parlamentar para o Combate à Fome, coordenada pelo Deputado Miro Teixeira. Tive a felicidade de, em junho de 1994, participar da 1ª Conferência de Segurança Alimentar que então aprovou o Programa de Renda Mínima.

            Itamar Franco terminou seu mandato com grande índice de popularidade, prova disso foi seu bem-sucedido apoio a Fernando Henrique Cardoso na sucessão presidencial.

            Foi um homem que nunca se dobrou frente ao poder, para receber benefícios pessoais e particulares; pelo contrário, sempre se colocou, soberanamente, em favor dos interesses do Brasil. Um exemplo notável para todos nós, brasileiros e brasileiras.

            Srª Presidenta, encaminho à Mesa requerimento, como outros Senadores que já apresentaram ontem, mas também faço questão de apresentar o requerimento de pesar, para condolências à família do Presidente Itamar Franco.


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Este texto não substitui o publicado no DSF de 06/07/2011 - Página 27044