Discurso durante a 115ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Comentários acerca de denúncia de perseguição ideológica na Universidade de Brasília, citada pela revista Veja, em reportagem intitulada "Madraçal no Planalto" anunciando que apresentará amanhã, na Comissão de Educação, requerimento para ouvir os envolvidos nesse caso. (como Líder)

Autor
Demóstenes Torres (DEM - Democratas/GO)
Nome completo: Demóstenes Lazaro Xavier Torres
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
ENSINO SUPERIOR.:
  • Comentários acerca de denúncia de perseguição ideológica na Universidade de Brasília, citada pela revista Veja, em reportagem intitulada "Madraçal no Planalto" anunciando que apresentará amanhã, na Comissão de Educação, requerimento para ouvir os envolvidos nesse caso. (como Líder)
Publicação
Publicação no DSF de 06/07/2011 - Página 27074
Assunto
Outros > ENSINO SUPERIOR.
Indexação
  • ANALISE, ARTIGO DE IMPRENSA, PERIODICO, VEJA, ESTADO DE SÃO PAULO (SP), DENUNCIA, CONDUTA, AUTORIDADE, UNIVERSIDADE DE BRASILIA (UNB), REPRESSÃO, IDEOLOGIA, ANUNCIO, APRESENTAÇÃO, REQUERIMENTO, COMISSÃO DE EDUCAÇÃO, SOLICITAÇÃO, ESCLARECIMENTOS, REITOR, PROFESSOR, VITIMA, PERSEGUIÇÃO.

                          SENADO FEDERAL SF -

            SECRETARIA-GERAL DA MESA

            SUBSECRETARIA DE TAQUIGRAFIA 


            O SR. DEMÓSTENES TORRES (Bloco/DEM - GO. Como Líder. Sem revisão do orador.) - Srª Presidente, Srªs e Srs. Senadores, a autonomia universitária, a independência universitária são prerrogativas inatacáveis em qualquer país do mundo, porque é ali que se forma a inteligência, é ali que nasce a pesquisa, é dali que florescem os valores.

            Todos os grandes homens públicos ou, vamos dizer, a maioria dos homens públicos acabam passando pelos bancos das universidades. Os grandes cientistas têm ali o desenvolvimento das suas ideias. Enfim, a universidade é um florescer. A universidade faz com que haja a evolução do conhecimento. A razão maior disso é que há uma tolerância muito saudável entre as divergências.

            V. Exª tem um pensamento diferente do meu, assim como eu tenho pensamento diferente daquele do Senador Randolfe Rodrigues, que, por sua vez, pensa diferente do Senador Agripino, do Senador Eunício, do Senador Pedro Taques, do Senador Walter Pinheiro. Isso é magnífico, porque nos respeitamos dentro das nossas diferenças. Muitas vezes, há uma confluência de valores e não há qualquer retaliação. Usamos isso no Parlamento. Isso, no mundo universitário, é ainda mais sentido. Todos que participamos da vida universitária, que tivemos oportunidade de sentar nos bancos universitários e alguns, como eu, que tiveram oportunidade de também lecionar sabem a importância que é essa multiplicidade de valores.

            A revista Veja traz nesta semana um artigo extremamente preocupante. Chama-se Madraçal no Planalto, falando justamente da deterioração de convivência e, portanto, da piora acadêmica de uma das universidades símbolo do Brasil, a Universidade de Brasília, que se situa, como o nome diz, aqui no Distrito Federal.

            Muito bem. O que estaria acontecendo de tão grave na UnB, a UnB que, na época da ditadura militar, sofreu ataques, seus alunos foram assassinados, professores foram cassados, foram perseguidos ideologicamente? E a perseguição ideológica, ela é mortal, porque o homem tem direito de expressar as suas convicções, o homem tem direito de dizer o que o outro não quer ouvir. Muitas vezes, isso é até asqueroso para nós, nós estamos ouvindo uma opinião que nos enoja, mas a pessoa tem direito de proferir as suas palavras.

            A revista Veja faz um relato devastador da Universidade de Brasília. Segundo a revista e alguns professores, o que está acontecendo hoje na UnB? Por quê? “Professores, estudantes e funcionários da Universidade de Brasília têm sido alvo de perseguição da diretoria e de agressões pelo único crime de não pensarem de acordo com a ideologia dominante”. Está escrito aqui com todas as letras.

            E isso aconteceu, especialmente, a partir do ano de 2008, quando se tornou reitor da Universidade de Brasília o Sr. José Geraldo de Sousa Junior. O que aconteceu, primeiro, para que ele fosse eleito?

            Houve um golpe em relação à Lei de Diretrizes e Bases da Educação, porque lá está dito que os professores têm direito a um peso de 70% na votação. Mas fizeram um acordo, com o aval do Ministério da Justiça, e fizeram uma média ponderada para que os professores tivessem apenas 40% desses votos, e com isso se “elegeu”, entre aspas, o Sr. José Geraldo, que, na realidade, foi colocado lá ao arrepio da lei.

            Em qualquer universidade do mundo, é óbvio que os alunos são ouvidos, os funcionários também são ouvidos, Senador Agripino, mas quem diz, na realidade, quem vai assumir o comando universitário são os professores, porque são cientistas, porque detêm o conhecimento, porque não podem se calar, há movimentos demagógicos que vez por outra acontecem.

            Pois a Universidade de Brasília hoje chegou a esse nível, definida pela revista Veja como um “madraçal esquerdista em que a doutrinação substituiu as atividades acadêmicas essenciais”.

            Uma procuradora daqui do Distrito Federal, a Drª Roberta Kaufmann, muito conhecida, mostra o que ela sofreu por pensar de forma diferente do pensamento dominante da UnB. Segundo ela, foi convidada para um debate sobre cotas raciais - e ela é contra cotas raciais - e, nesse debate, digo ipsis litteris:

             

sobre a adoção de cotas raciais pelas universidades públicas, ela - que é contrária ao projeto - não conseguiu falar. Quando lhe foi dada a palavra, um grupo liderado por professores [um grupo liderado por professores] promoveu um alarido ensurdecedor. Ela foi chamada de racista, ouviu ofensas impublicáveis e só pôde deixar a universidade horas depois, acuada, com medo de que algo pior acontecesse. Seu carro foi vandalizado. Nas portas, foi pichada a frase “Loira filha da p...”.

            “A UnB se tornou palco das piores cenas de intolerância”, diz a nossa procuradora Roberta Kaufmann. “Não há espaço para o diálogo. Ou você compartilha do pensamento dominante ou será perseguido e humilhado”.

            Há manifestações constantes de intolerância. Ou você é um esquerdista ou você está fora dos planos da UnB. E, como eu disse, a partir de 2008, com a ascensão do reitor José Geraldo de Sousa Junior, isso se tornou uma tragédia. Primeiro, houve a manipulação e, depois, a perseguição.

            Um dos adversários do Dr. José Geraldo, o professor Márcio Pimentel, foi alvo de retaliação, ele e a esposa, professores universitários. O professor Márcio Pimentel e a sua esposa, Concepta McManus, desconfiaram, segundo a revista Veja, “que o trabalho de pesquisa de ambos começou a sofrer boicotes”. E isso, Senador Agripino, da forma mais humilhante possível.

            No laboratório, serviços básicos como a limpeza das instalações e a compra de material foram simplesmente interrompidos.

A carga horária de aulas também foi ampliada de maneira claramente exagerada, para que não lhes sobrasse tempo para o trabalho de pesquisa. “Chegou um momento em que uma disciplina ministrada por um colega com metade das turmas que eu tinha foi passada a mim. Não sobrava tempo para o laboratório”, disse Concepta McManus [...]

            Um professor ouvido que pediu para ficar no anonimato disse que essa perseguição forçou Pimentel a pedir transferência para a Universidade Federal do Rio Grande do Sul. E fizeram um grande deboche quando o Sr. José Geraldo liberou a transferência. O que ele fez? Ele disse que lamentava perder um docente da envergadura de Pimentel. É algo realmente deplorável. O professor de bioquímica Marcelo Hermes-Lima testemunhou a hostilidade oficial ao casal de professores. O geólogo Márcio Pimentel se limitou a dizer: “A UnB é uma página virada. Não faz mais parte da minha vida”.

            Contra a professora Inês Pires, a outra candidata, aconteceu coisa muito pior: ela perdeu chefia de um curso e sofreu devassa nos projetos de pesquisa que conduzia. Outro professor que também preferiu ficar no anonimato disse o seguinte: “Os analistas não requisitaram sequer a prestação de contas. Foi uma ação com o claro objetivo de tisnar a imagem de uma professora que não pertence ao grupo dominante”.

            Mas a UnB tinha um brilhante professor, Ibsen Noronha, professor voluntário do Departamento de Direito e um dos maiores especialistas em História do Direito Brasileiro, que deixou essa cadeira, essa cátedra por um motivo muito simples: como era matéria optativa, eles deixaram de oferecer essa matéria no currículo. A matéria foi simplesmente extinta e não foi colocada nenhuma outra matéria para substituir essa.

            E diz o professor e jurista Ibsen Noronha:

É a primeira vez em trinta anos que a disciplina, um diferencial do currículo da universidade, não foi oferecida. Eu fui aluno da UnB e tive essa aula. A justificativa que a faculdade apresentou é risível: disseram que a matéria foi suprimida por ser optativa. Mas não me foi apresentada nenhuma outra opção no lugar dela. É lamentável testemunhar a transformação da universidade em um instrumento de domínio ideológico”, afirma Noronha, [que deixou de ser professor da UnB e] que se tornou, em fevereiro, o primeiro brasileiro a lecionar na respeitada Universidade de Coimbra, em Portugal.

            Saiu daqui porque foi impedido de lecionar por problemas ideológicos.

            Esse embate é tão severo que serve para estopim de retaliações.

A Professora Tânia Montoro, da Faculdade de Comunicação, [segundo a revista Veja] conta que foi punida por ter criticado as extravagantes concessões que a atual reitoria faz aos alunos, como a permissão de festas nos prédios onde as aulas são ministradas - que transformaram as salas em território livre para consumo de drogas.

            Está aqui a foto dos alunos da UnB utilizando livremente drogas na sala de aula.

            Então é isso, por uma concepção de ideologia, e a professora foi punida.

            Diz a revista:

No ano passado, a professora e duas de suas alunas foram escolhidas como palestrantes em um seminário realizado em Bogotá. [Vejam essa!] A UnB autorizou o pagamento da viagem das alunas, mas não da professora. Depois de duas negativas, Tânia reclamou, mas seu pedido só foi deferido quando não havia mais tempo para o embarque. “Eu tenho uma história de trinta anos nesta universidade, e sou uma pesquisadora produtiva. Não merecia passar por essa vergonha”, diz a professora.

            Isso porque ela não queria que os alunos fumassem maconha e usassem drogas dentro da sala de aula, nas festas que são liberadas.

            É para isso que a Universidade de Brasília ganhou autonomia? Foi para isso que os professores combateram tão veementemente a ditadura militar, que alunos foram mortos, professores foram cassados, para que houvesse essa intolerância hoje, com viés ideológico da pior espécie?

O urbanista Frederico Flósculo, há dezenove anos professor da UnB, acusa a atual direção de persegui-lo e agir para que seus projetos de pesquisa sejam sistematicamente rejeitados. Diz [o professor] Flósculo: “Eu fui um opositor ferrenho da gestão passada. Quando José Geraldo assumiu, levou para reitoria a sua corriola. Nos últimos anos, os meus projetos de pesquisa têm sido sistematicamente rejeitados. O propósito da universidade deveria ser a busca da excelência. Isso foi substituído pela partidarização do ensino”. O Decano da Faculdade de Direito, Ronaldo Poletti, resume o problema: “A universidade foi tomada por um patrulhamento ideológico tácito, orquestrado para funcionar sem ser notado. Quem pensa diferente é relegado ao limbo. Em trinta anos de cátedra, nunca vi a universidade tão distante da sua proposta original.

            Olha, a produção do conhecimento é livre. Qualquer um tem direito, dentro das divergências, de apresentar a sua opinião e de produzir o seu conhecimento, mas isso não acontecido. O que tem acontecido é que tem o aval completo do MEC essa loucura universitária, vamos dizer assim.

A Secretária de Ensino Superior do MEC, Maria Paula Dallari [numa reportagem publicada no próprio site da UnB e hoje transcrita pelo jornalista Reinaldo Azevedo], avaliou ser um “grande alento” a presença do Professor José Geraldo à frente da instituição. O professor (José Geraldo) alia densidade histórica à capacidade de orientação para o futuro. A secretária (...) lembrou que José Geraldo foi seu professor e lhe ensinou a não apartar o exercício do Direito dos direitos humanos. [Ótimo. Isso aí tem que acontecer mesmo.] Ela contou que, em um congresso recente, citou o Programa Direito Achado na Rua, criado por José Geraldo, como um dos dez itens mais importantes para o exercício da advocacia.

            Então, eu vou dizer para os senhores o que é Direito Achado na Rua, também muito bem definido aqui pelo jornalista Reinaldo Azevedo. Nós temos o Direito achado nas ruas e temos o Direito achado nas leis. Qual é o Direito que nós fazemos aqui? Qual é o Direito que o Brasil inteiro pratica? O Direito achado nas leis! Porque, senão, o Congresso Nacional não tem validade nenhuma. Para que lei, se lei é uma referência e eu se eu posso até julgar contra as leis, porque as ruas são mais importantes que as leis? Esse é o Direito Achado na Rua, que hoje é ensinado doutrinariamente aos alunos da Faculdade de Direito da Universidade de Brasília. Então, é esse tipo de lixo ideológico que precisamos combater.

            Ouvido o professor, o que é que ele diz? Ninguém tem espaço sem esforço. É preciso analisar se não são os professores que, por falta de competência, perderam a visibilidade. A Universidade de Brasília nunca foi tão aberta”, afirma o tal reitor. Então, é isso o chamado lixo ideológico implantado dentro da UnB. Digo isso não com o viés disso ou daquilo, não, Sr. Presidente. Estou dizendo isso, Senador Petecão, porque cada um tem o direito de expor sua opinião.

            O sociólogo Demétrio Magnoli, um gênio brasileiro, diz, com todas as letras, resumindo a situação: “Um campus, por definição, deve ser uma praça de debates” - é isso -, “onde a diversidade de idéias é o maior valor”. A ideia única, a vertente única não deve existir em lugar algum.

            É preocupante quando a universidade adota uma posição ideológica. A UnB vive o processo típico de uma instituição que se tornou um aparelho em prol de uma causa. Não pode haver causa numa universidade, a não ser a do ensino, a não ser a do desenvolvimento intelectual, a não ser a da pesquisa, a não ser a da valorização do bom professor e do bom aluno.

            Então, Sr. Presidente, para concluir, digo o seguinte: amanhã, apresento à Comissão de Educação da Casa um requerimento, para que venham aqui, entre outros, o Sr. Reitor, para dar as devidas explicações, bem como aqueles que se dizem e evidentemente são perseguidos pela patrulha ideológica implantada na faculdade. Vamos chamar para o debate a Procuradora Roberta Kaufmann. Vamos chamar para o debate os professores Marco Antonio Villa, Márcio Pimentel e Inês Pires de Almeida.

            Vamos chamar também todos aqueles que colocaram os seus nomes aqui como críticos, como o Sr. Marcelo Hermes-Lima. Vamos chamar também o jurista Ibsen Noronha e a professora Tânia Montoro. Nós queremos discutir a Universidade de Brasília. Queremos chamar também o urbanista Frederico Flósculo e vamos convidar o nosso sociólogo Demétrio Magnoli. O que nós queremos fazer aqui é o que a universidade está se recusando a fazer, Sr. Presidente: debater.

            Muito obrigado a V. Exª.


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Este texto não substitui o publicado no DSF de 06/07/2011 - Página 27074