Discurso durante a 116ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Considerações sobre o equilíbrio financeiro dos estados e municípios; e outro assunto.

Autor
Ana Amélia (PP - Progressistas/RS)
Nome completo: Ana Amélia de Lemos
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
DIVIDA PUBLICA.:
  • Considerações sobre o equilíbrio financeiro dos estados e municípios; e outro assunto.
Publicação
Publicação no DSF de 07/07/2011 - Página 27371
Assunto
Outros > DIVIDA PUBLICA.
Indexação
  • COMENTARIO, NECESSIDADE, CONGRESSO NACIONAL, REALIZAÇÃO, REVISÃO, PACTO, FEDERAÇÃO, IMPORTANCIA, RENEGOCIAÇÃO, DIVIDA, PRECATORIO, ESTADOS, MUNICIPIOS, RELAÇÃO, UNIÃO FEDERAL.

                          SENADO FEDERAL SF -

            SECRETARIA-GERAL DA MESA

            SUBSECRETARIA DE TAQUIGRAFIA 


            A SRª ANA AMÉLIA (Bloco/PP - RS. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão da oradora.) - Srª Presidenta Marta Suplicy, Senadores, Senadoras, nossos telespectadores da TV Senado, visitantes que orgulham o Senado da República - cumprimentos pela mobilização da categoria -, venho à tribuna hoje à tarde, mais uma vez, para dar seguimento a um tema que considero uma das discussões que fundamentam a existência desta Casa: o equilíbrio financeiro de Estados e Municípios.

            Já abordei, em vários pronunciamentos, desde que aqui cheguei, no dia 1º de fevereiro, a necessidade de se realizar a revisão do pacto federativo e de se renegociarem as dívidas dos Estados com a União e também as dos Municípios.

            Pois hoje gostaria, Srª Presidente, de falar sobre a terceira face desse mesmo problema: a questão dos precatórios. Isso porque a concentração de recursos nos cofres da União e o consequente endividamento dos Estados e dos Municípios geraram um passivo acumulado de precatórios - nos Estados, especialmente - superior a R$100 bilhões. Ou seja, ao reservar para a União a maior fatia do bolo tributário ou das receitas, o ordenamento institucional brasileiro enfraquece os Estados, fazendo com que esses se tornem devedores perante a União e também perante os cidadãos.

            Precatórios são emitidos como forma de pagamento utilizada pelo Poder Público quando este perde, definitivamente, um processo na Justiça, quer seja para pagar funcionários ou fornecedores, quer seja por questões tributárias ou mesmo por indenizações.

            Os Tribunais consolidam todos os valores recebidos até 1º de julho de cada ano e o remetem para o devedor incluir em seu orçamento do ano seguinte. Como o orçamento do ano seguinte finda em 31 de dezembro, os governos estaduais já dispõem de um prazo regular de 18 meses para o pagamento dos precatórios, além dos anos que são necessários para que um processo tramite “célere” na Justiça brasileira.

            Mesmo com prazos extensos para o pagamento dos precatórios, os governos estaduais desenvolveram a cultura do “calote”, verdadeiramente um calote contra os contribuintes, sobretudo aqueles que têm dinheiro a receber do Estado. E esse calote é no pagamento dos direitos devidos, sobretudo às pessoas físicas, mas também às pessoas jurídicas. Essa prática acabou por gerar um mercado paralelo de comércio desses papéis, os precatórios, em que o credor, que muitas vezes não tem sequer a perspectiva de recebimento em vida, dada a demora nos pagamentos, comercializa os seus direitos com deságio na intenção de diminuir o seu prejuízo.

            Srªs e Srs. Senadores, esse problema foi acentuado com a promulgação da Emenda Constitucional nº 62, de 2009, que “constitucionalizou, lamentavelmente, o calote”. A emenda determina que as prefeituras e os Estados reservem, no mínimo, 1% a 2% de suas receitas para honrar dívidas públicas em um prazo de até 15 anos. Como as dívidas são amplamente superiores a esse percentual de receitas, a Emenda Constitucional nº 62 terminou por legalizar o acúmulo de precatórios não pagos por Estados e Municípios, que ultrapassa o valor já mencionado hoje de R$100 bilhões.

            Na prática, essa emenda legalizou uma situação onde “O Estado deve, não nega, mas também não paga.” E aí não adianta saber que deve sem cumprir com o seu dever perante o credor.

            Este é um grave problema social. O Estado, que deveria dar exemplo de honradez no cumprimento de seus compromissos junto aos cidadãos, omite-se de suas responsabilidades, simplesmente protelando o pagamento de suas dívidas por períodos superiores à própria expectativa de vida de seus credores.

            Milhares de cidadãos brasileiros já morreram, em meu Estado, no Brasil, e em vários Estados brasileiros, sem ter tido condições de desfrutar seus direitos em vida! Isso está acontecendo também em outros casos de aposentadoria, como é o caso Aerus, que tenho recorrentemente falado aqui.

            Mas, quem não se recorda do caso das senhoras que tricotavam uma enorme manta, que simbolizava a demora no pagamento de seus precatórios, e que morreram tragicamente no acidente do vôo 3054 da TAM, quando vinham de Porto Alegre à Brasília para realizar, mais uma vez, o seu protesto pacífico e silencioso? Quem não lembra das senhoras que tricotavam para protestar pelo seu direito, o direito de receber os precatórios?

            O grupo, conhecido como “Tricoteiras dos Precatórios”, perdeu sete integrantes naquele trágico acidente, quando viajavam para lutar no Movimento Nacional contra o Calote Público, nesta capital! Protestavam, justamente, contra a Emenda Constitucional 62.

            Muitas são as pessoas, Srªs Senadoras, Srs. Senadores, que, assim como as “Tricoteiras dos Precatórios”, faleceram como credoras do Estado.

            No meu Estado, o Rio Grande do Sul, a situação é uma das mais graves entre todos os Estados brasileiros, e por isso vou utilizá-lo como exemplo.

            O Rio Grande do Sul possui a terceira maior dívida em precatórios. São aproximadamente R$5 bilhões devidos aos gaúchos, em mais de 28 mil precatórios, de acordo com dados da própria Controladoria-Geral do Estado.

            Como a Emenda Constitucional 62 permite que os Estados utilizem um valor mínimo de suas receitas para o pagamento de precatórios, existem apenas R$383 milhões disponíveis, atualmente, para o pagamento de precatórios. Ou seja, hoje, o Rio Grande do Sul pode cumprir apenas 7,66% de seus compromissos, não chega a 10% de tudo que precisa pagar dos precatórios. Ainda assim, está pagando mais do que o previsto na própria lei do calote.

            A suspensão do pagamento de precatórios pode ser desumana quando desses recursos depende a vida do cidadão. Quando conhecemos alguns dos inúmeros casos que envolvem o pagamento de precatórios, é comum que nos deparemos com a mesma história: a história de trabalhadores que aguardam ansiosamente pelo cumprimento da justiça para assim ter um pouco mais de saúde e conforto no final da sua vida.

            É certo que a justiça, assim como as leis, foi feita para ser cumprida. Os precatórios são ordens judiciais de pagamento que fazem parte do ordenamento jurídico brasileiro e são fundamentais para a independência e a harmonia entre os Poderes. É um instrumento do Poder Judiciário utilizado para que o Poder Executivo honre seus compromissos com a sociedade, fazendo valer as leis que são elaboradas por este Poder, o Poder Legislativo.

            Para sanar esse problema, Srª Presidenta, a Emenda Constitucional nº62, de 2009, sabiamente introduziu o §16 no art.100 da Constituição Federal, que facultou à União a possibilidade de assumir os débitos oriundos de precatórios de Estados, Distrito Federal e Municípios, refinanciando-os diretamente. Este dispositivo constitucional é sábio, porque visa a resguardar o poder de um dos Poderes da República diante da impossibilidade financeira de os Estados cumprirem as referidas ordens judiciais.

            Em uma constituição como em qualquer lei, não há palavras inúteis, e se o citado §16 foi introduzido é porque já lá em 2009 o Congresso Nacional previu este perigoso enfraquecimento de um dos Poderes da República, no caso o Poder Legislativo.

            Como sabemos, a crise financeira que assola os Estados decorre de políticas econômicas formuladas e aplicadas pela União, que provocaram uma forte concentração das rendas públicas nas mãos do Governo Central, com 60% da renda, em detrimento das demais unidades da Federação; os chamados primos pobres: Estados e Municípios.

            A solução definitiva para os problemas financeiros dos Estados e Municípios, portanto, todos nós sabemos, está na complexa Revisão do Pacto Federativo, que promova a justiça fiscal por meio da redistribuição justa dos recursos arrecadados.

            Mas enquanto esse sonho não se torna realidade, nós, aqui, Legisladores, Senadores e Deputados, temos que utilizar as prerrogativas constitucionais para diminuir os impactos da injustiça fiscal junto à população.

            É por isso que, Srª Presidenta, - e vou me encaminhando para o encerramento - atendendo aos pressupostos do §16 do art.100 da Constituição Federal, peço o apoio desta Casa ao projeto de lei de minha autoria, o PLS 373, deste ano, que modifica a

            Lei 9.496, de 1997, autorizando a União a refinanciar diretamente débitos oriundos de precatórios de Estados, Distrito Federal e Municípios.

            A referida proposição foi elaborada com a colaboração da Comissão Especial dos Precatórios Judiciais que foi criada e desenvolveu seus trabalhos na Assembleia Legislativa do meu Estado, Rio Grande do Sul, sob a coordenação do Deputado Frederico Antunes.

            Srªs e Srs. Senadores, sei das limitações de um projeto autorizativo, mas sei também das responsabilidades do meu mandato e desta Casa com as questões que envolvem a organização federativa da República com a independência e harmonia entre os Poderes e principalmente do compromisso com a sociedade brasileira e do meu Estado, a sociedade gaúcha, que clama por justiça nas relações desta Federação, hoje desequilibrada.

            Muito obrigada, Srª Presidenta.


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Este texto não substitui o publicado no DSF de 07/07/2011 - Página 27371