Discurso durante a 117ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Manifestação em defesa do reitor da Universidade de Brasília, Sr. José Geraldo. (como Líder)

Autor
Cristovam Buarque (PDT - Partido Democrático Trabalhista/DF)
Nome completo: Cristovam Ricardo Cavalcanti Buarque
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
ENSINO SUPERIOR.:
  • Manifestação em defesa do reitor da Universidade de Brasília, Sr. José Geraldo. (como Líder)
Publicação
Publicação no DSF de 08/07/2011 - Página 28166
Assunto
Outros > ENSINO SUPERIOR.
Indexação
  • DEFESA, REITOR, UNIVERSIDADE DE BRASILIA (UNB), GARANTIA, LIBERDADE DE EXPRESSÃO, DEMOCRACIA.
  • CRITICA, INFLUENCIA, MEIOS DE COMUNICAÇÃO, PROCESSO ELEITORAL, ESCOLHA, REITOR, UNIVERSIDADE DE BRASILIA (UNB), IMPORTANCIA, MANUTENÇÃO, INDEPENDENCIA, ELEIÇÃO.

                          SENADO FEDERAL SF -

            SECRETARIA-GERAL DA MESA

            SUBSECRETARIA DE TAQUIGRAFIA 


            O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco/PDT - DF. Pela Liderança. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srs. Senadores, Srªs Senadoras, desde 1979, ou seja, há longo tempo - os jovens vão até se surpreender com isto -, sou professor da Universidade de Brasília e tenho, Senador Randolfe, muito orgulho desse meu trabalho. E continuo até hoje. Não deixei de dar aulas como governador, como reitor, como Senador. Estou lá toda semana, no Centro de Desenvolvimento Sustentável, que eu criei 15 anos atrás.

            E o que me atrai na UnB não é nenhuma remuneração, Senador Aloysio. Estou de licença sem vencimentos da Universidade. O que me atrai é o clima de debates que nós temos ali, o clima de debates sobre esses temas, como o desenvolvimento sustentável, e o tema de debate em geral na universidade.

            E esse debate seria impossível sem liberdade, porque, sem plena liberdade, sem tolerância, não há debate. Mas eu queria dizer uma coisa a mais: sem discordâncias não há liberdade. A liberdade, em um ambiente sem discordâncias, é uma liberdade que ninguém percebe. A gente só percebe a liberdade quando há desiguais, diferentes e pessoas com posições que não são as mesmas. E eu posso dizer que essa liberdade não houve sempre na UnB. Houve um tempo em que, na UnB, havia medo de se falar, de se discordar. Hoje, é impossível.

            Mas vou dizer algo mais: esse clima de tolerância não depende do magnífico reitor. Eu conheço o Reitor José Geraldo de Souza e posso falar com a maior certeza: é um homem do diálogo absoluto - às vezes, até irritantemente absoluto - e sem partido. Claro que deve ter sua simpatia partidária, mas não é filiado a nada. Eu devo dizer aqui que, por mim, haveria uma lei que proibiria reitor com partido. Eu fui reitor e não tinha nenhum partido. Eu só entrei em partido depois que saí da reitoria da UnB. O Zé Geraldo, o Professor José Geraldo é um homem sem partido; agora, com convicções, com postura firme, mas sem, em nenhuma hipótese, autoritarismo. Mas, se ele o fosse, não conseguiria ser.

            Toda semana o Conselho Universitário se reúne, em plena liberdade. Em cada conselho, o Conselho Departamental se reúne. Nos institutos, que somam os departamentos, os conselhos se reúnem. Às vezes, a Universidade demora tanto a tomar decisões que irrita, por “excesso” até, se a gente pode dizer isso - ponha entre aspas o excesso -, de democracia, de debate.

            Por isso, eu fico surpreso quando ouço matéria, como a gente viu esta semana, dizendo que há na Universidade de Brasília um clima de intolerância. Isso não é possível.

            Agora, vamos falar com franqueza: a discordância muitas vezes é mal-educada.

            A liberdade tem um alto componente de má educação no sentido de educação comportamento, não de educação formação. Por isso, de vez em quando, é verdade que, no meio de divergências, em vez de ouvir respeitosamente, os estudantes vaiam quem pensa diferente. Eu lamento muito, mas pode ser uma questão de idade.

            Eu me preocuparia muito se os jovens universitários nunca vaiassem ninguém, como vaiam o reitor, como vaiaram o Lula, como é possível que me vaiem se eu fizer uma palestra de que eles não gostem. Claro que alguns não gostam do que a gente diz. Tem vaia? Tem. É lamentável? É, do ponto de vista da falta de respeito e educação. Mas, ao mesmo tempo, é a realidade dos jovens.

            Tem festas? Tem. Eu acho que no campus pode até ter festas; nas salas de aula, não. É capaz de ter em sala de aula. Agora, vai-se botar polícia para tirar jovem que faz festa numa sala? Não. Têm que encontrar um diálogo para que eles prefiram não fazer isso ali.

            Tem droga na universidade? É possível que tenha. Não sei. É possível que tenha. Agora, onde não tem droga hoje? Hoje a droga não é um problema da Universidade de Brasília, nem mesmo das universidades todas; é da sociedade brasileira.

            Não dá para acusar reitor ou administração pelo fato de que os estudantes fazem festas; pelo fato de que nas festas tem bebida; e pelo fato de que nas festas possa até ter droga também.

            Então, o que eu quero deixar claro aqui, primeiro, é minha manifestação de absoluta confiança no Reitor José Geraldo. Segundo, mesmo que eu não confiasse nele, eu diria aqui: não há intolerância, porque não é possível ter intolerância na administração hoje.

            A Universidade hoje é uma instituição democratizada desde 1985. E eu tenho o prazer de dizer que dei minha colaboração para isso como primeiro reitor depois do regime militar, e reitor eleito. Eu posso dizer: ali não há como ter outra vez alguém autoritário.

            Realmente há discordâncias, e essas discordâncias levam muitas vezes a comportamentos de que não gostamos, a vaias. Vaia não é sinônimo de intolerância; vaia é sinônimo de má educação. Mas eu prefiro um jovem mal-educado a um jovem passivo. Eu prefiro um jovem que vaia a um jovem que não ouve - quando vaia é porque ouviu; então, está discordando.

            Finalmente, a Universidade hoje - eu tenho orgulho disso - é tão grande e importante que estão usando veículos e tudo no meio da eleição para reitor no próximo ano. E é aí que eu lamento. Eleição de reitor tem que ser uma coisa completamente apartidária; tem que ser uma coisa que não saia de dentro do campus. Não pode ir partido lá influenciar nem meios de comunicação de fora. Deixem a disputa interna escolher um reitor, qualquer que seja. Fiquem certos de que ele pode até enganar os órgãos de fiscalização, o TCU; pode até enganar essas coisas, mas não conseguirá fazer nada transparentemente errado, porque a população, a comunidade não deixa.

(O Sr. Presidente faz soar a campainha.)

            O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco/PDT - DF) - E aí o fato que está levando muito a essas discordâncias - só um minuto a mais - que é o problema das quotas. Há uma paixão muito grande em relação às quotas. Eu, pessoalmente, estou de acordo que é lamentável que a gente tenha de usar quota, mas tem. É como ter dor de cabeça: é lamentável ter, mas tem que usar Aspirina. A quota é um jeitinho, é uma Aspirina em uma sociedade que tem cinco séculos de escravidão explícita ou de escravidão disfarçada.

            E aí não tem outro jeito, a não ser que a gente queira esperar 20 anos, se começar agora a fazer a revolução na educação de base, para acabar com esse negócio de quota. Mas, enquanto não houver uma revolução na educação de base, vai precisar ter quota para dar um jeitinho, porque o jeitinho é melhor do que nada.

            Eu concluo, Presidente, Senador Mozarildo, dizendo: vamos deixar a universidade fazer seus debates internos; vamos deixar a universidade continuar com sua tolerância, sem que haja envolvimentos externos nesse processo, como houve antes dos militares. E, agora, seria de partidos; agora, seria de fora para dentro. Vamos deixar que a comunidade se encontre corrigindo seus erros, porque a liberdade leva a erros muitas vezes. A diferença é que a liberdade permite corrigir os erros, e as ditaduras não permitem enquanto elas não acabam.

            Na UnB a ditadura já acabou! E, depois dela, ninguém é capaz de impor sua vontade. Só a própria comunidade, de uma forma tolerante, às vezes nem tão respeitosa como a gente gostaria, mas tolerante mesmo assim.


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Este texto não substitui o publicado no DSF de 08/07/2011 - Página 28166