Discurso durante a 120ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Cumprimentos à presidente Dilma Rousseff por não permitir o uso de recursos do BNDES na fusão entre os grupos Carrefour e Pão de Açúcar.

Autor
Ana Amélia (PP - Progressistas/RS)
Nome completo: Ana Amélia de Lemos
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
PRESIDENTE DA REPUBLICA, ATUAÇÃO. POLITICA INDUSTRIAL.:
  • Cumprimentos à presidente Dilma Rousseff por não permitir o uso de recursos do BNDES na fusão entre os grupos Carrefour e Pão de Açúcar.
Aparteantes
Armando Monteiro, Casildo Maldaner, Cristovam Buarque, Pedro Simon, Randolfe Rodrigues, Wellington Dias.
Publicação
Publicação no DSF de 13/07/2011 - Página 28999
Assunto
Outros > PRESIDENTE DA REPUBLICA, ATUAÇÃO. POLITICA INDUSTRIAL.
Indexação
  • ELOGIO, DECISÃO, DILMA ROUSSEFF, PRESIDENTE DA REPUBLICA, NEGAÇÃO, UTILIZAÇÃO, RECURSOS, BANCO NACIONAL DO DESENVOLVIMENTO ECONOMICO E SOCIAL (BNDES), FUSÃO, EMPRESA DE COMERCIO VAREJISTA, SANÇÃO, LEI FEDERAL, ASSUNTO, CRIAÇÃO, EMPRESA INDIVIDUAL, RESPONSABILIDADE LIMITADA.
  • APREENSÃO, PERDA, INDUSTRIALIZAÇÃO, BRASIL, APRESENTAÇÃO, DADOS, DESEQUILIBRIO, BALANÇA COMERCIAL, REFERENCIA, IMPORTAÇÃO, PRODUTO INDUSTRIALIZADO, EXPORTAÇÃO, PRODUTO PRIMARIO, PROBLEMA, CONCORRENCIA DESLEAL, INDUSTRIA NACIONAL, PRODUTO IMPORTADO, NECESSIDADE, AJUSTE, POLITICA CAMBIAL, REFORMA TRIBUTARIA, REDUÇÃO, JUROS, CUSTO, ENERGIA ELETRICA, INVESTIMENTO, MELHORIA, INFRAESTRUTURA, LOGISTICA, TRANSPORTE, QUALIFICAÇÃO, MÃO DE OBRA, OBJETIVO, FORTIFICAÇÃO, INDUSTRIA, PAIS.

            A SRª ANA AMÉLIA (Bloco/PP - RS. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão da oradora.) - Caro Presidente Wilson Santiago, Srªs e Srs. Senadores, nossos Telespectadores da TV Senado, há pouco prestei muita atenção no pronunciamento do meu colega Senador Pedro Simon, que é um mestre na arte de uso da tribuna. Apenas gostaria, Senador Pedro Simon, de cumprimentá-lo por renovar o alerta e a necessária atenção que os governantes precisam ter com as questões éticas. Fico muito feliz que V. Exª tenha me antecedido aqui para tratar desse assunto, renovando os cumprimentos à atitude que teve a Presidenta Dilma Rousseff em relação ao episódio no Ministério dos Transportes.

            E eu hoje fiquei particularmente animada pela decisão tomada pela Presidenta Dilma Rousseff em fechar os cofres do BNDES à operação para a fusão do Carrefour e Pão de Açúcar. Esse gesto da Presidenta resgata a credibilidade do governante que tem o compromisso em defender o interesse nacional. Um banco de fomento ao desenvolvimento econômico e social não poderia, de forma alguma, usar um recurso tão grande - quase US$4,5 bilhões -, enquanto a indústria brasileira, a economia e os pequenos empreendedores sofrem sérias dificuldades, assim como os agricultores. E esse dinheiro seria usado para uma operação de duvidoso futuro jurídico, porque, é claro, os sócios já estão brigando antes de a operação estar concluída. Perderia o País.

            Cumprimento a Presidenta Dilma Rousseff por essa decisão de fechar os cofres do BNDES a essa operação ruinosa para o interesse nacional e de sancionar a lei que cria a empresa individual. Isso é um estímulo ao pequeno empreendedor e também uma forma de acabar com os laranjas que tanto infernizaram o noticiário com denúncias no País.

            Está de parabéns a Presidenta Dilma Rousseff por essas duas iniciativas e por aquelas que o Senador Simon tão brilhantemente apresentou nesta tribuna.

            Com alegria, concedo o aparte ao meu Colega Pedro Simon.

            O Sr. Pedro Simon (Bloco/PMDB - RS) - Eu agradeço a V. Exª a gentileza em referendar a parte relativa ao meu pronunciamento, mas quero dizer que V. Exª traz um assunto realmente da maior importância. Está causando um impacto essa questão do BNDES. Eu, pessoalmente, vivi um momento angustiante, porque os dois últimos presidentes do BNDES são pessoas, são economistas do meu coração, daquela leva do tempo do velho MDB, daquela turma que sonhava em fazer um país novo. E o Luciano fazia parte dessa equipe. No entanto, eu não conseguia entender o que estava acontecendo. Não duvido da sinceridade, das boas intenções, da dignidade do Luciano. Tenho uma convicção absoluta de que ele é um homem de bem! Mas V. Exª tem toda a razão: não havia lógica, 4 bilhões para uma coisa dessa natureza! E, além disso, quererem dizer que isso faria com que produtos primários brasileiros entrariam na França. É piada! Eu acho que a atitude firme de voltar atrás, de dizer “não” é algo realmente positivo. Acho que V. Exª tem toda a razão: merece um respeito muito profundo uma decisão como essa. Havia quase uma revolta geral do País inteiro, e a Presidente soube entender, e o presidente do Banco soube entender. Eu felicito V. Exª por lembrar uma coisa tão importante como essa.

            A SRª ANA AMÉLIA (Bloco/PP - RS) - Muito obrigada, Senador Pedro Simon.

            Com alegria, também concedo o aparte ao Senador Wellington Dias.

            O Sr. Wellington Dias (Bloco/PT - PI) - Senadora Ana Amélia, quero parabenizá-la por trazer a esta Casa estes dois temas que considero importantes. O primeiro é essa atitude, eu diria, que nos enche de muita esperança e animação, da Presidente Dilma. E ouvir isso também de V. Exª me enche de alegria, pela postura correta, ética, de criticar o que tem de ser criticado, mas reconhecer as coisas positivas. Também registro a minha alegria, somando-me à de V. Exª, em relação à Lei das Micro e Pequenas Empresas. Acho que isso dá um novo alento. A gente deu alguns passos importantes e agora dá um passo muito grande, o que vai resultar, eu tenho certeza, na geração de emprego e de renda e no incentivo ao empreendedorismo. Muito obrigado.

            A SRª ANA AMÉLIA (Bloco/PP - RS) - Eu lhe agradeço muito e até faço questão de registrar, de sublinhar essa observação de V. Exª, Senador Wellington Dias. Eu tenho tido aqui, no Senado, nesses seis meses de mandato, uma atitude de independência em relação ao Governo da Presidenta Dilma Rousseff, no meu Partido, o Partido Progressista, comandado com grande brilho pelo nosso Líder e grande mestre, Francisco Dornelles. Tenho atuado aqui com independência. Então, estou muito à vontade porque esta foi minha conduta também como jornalista: criticar os erros, os equívocos e denunciá-los; e também reconhecer quando as coisas são feitas de maneira correta.

            Também concedo um aparte, com alegria, ao Senador Casildo Maldaner.

            O Sr. Casildo Maldaner (Bloco/PMDB - SC) - Da mesma forma, Senadora Ana Amélia, nos dois aspectos, quero me somar; e com destaque à questão do BNDES. Há poucas semanas, votamos aqui um empréstimo de cerca de R$50 bilhões. E, justamente, naqueles dias, havia essa conversa dos 4 bilhões para os supermercados, o Pão de Açúcar com o Carrefour, ou coisa que o valha. No meu Estado, Senadora Ana Amélia, o pessoal me questionava: “Autorizaram emprestar 50 bilhões, e disso vão ceder 4 para unir os supermercados? E tem tantas questões fundamentais para o desenvolvimento do Brasil! Fizeram uma sessão para votar isso, Senador?” Eu disse: “Não. Nós autorizamos isso, é praxe, mas recursos do BNDES para projetos de implementação, para projetos de desenvolvimento do Brasil. Não tem nada nesse pacote de 50 bilhões, negócio de Pão de Açúcar, de supermercados. Não existe isso. Não está no pacote.” “Mas, mesmo assim, veja bem, agora estão se aproveitando, para jogar ali...” Isso para nós, responsáveis pela sociedade, é muito difícil. Não é fácil, ainda mais porque ajudei a presidir o BRDE com o Presidente, que é um banco de fomento dos três Estados do Sul. Participei oito anos da direção. São projetos de desenvolvimento, são recursos do BNDES, mas não para essas finalidades. De forma nenhuma. Participar até como acionista do BNDESPAR, muitas vezes. Isso não pega bem. E, com essa notícia agora de o Luciano Coutinho, Presidente do BNDES, amigo nosso, de muitas caminhadas junto conosco no BRDE, palestras! Temos uma afinidade de muitos anos, e, agora, essa notícia de a Presidente da República, inclusive, tomar essa decisão! Isso nos dá guarida, e nos ajuda, perante a sociedade, perante a Nação. Pega bem! Muito bem! Meus cumprimentos a V. Exª. Mas, digo mais uma vez: em seis meses, V. Exª atuando, criticando, defendendo, mas sempre a 100 por hora. Não pode ultrapassar, Senadora Ana Amélia!

            A SRª ANA AMÉLIA (Bloco/PP - RS) - Senador Casildo, e nós, como iríamos explicar à base, aos nossos produtores de arroz de Santa Catarina e do Rio grande do Sul que o Governo não arrumou 600 milhões para ajudá-los a garantir o preço mínimo, e havia 4,5 bilhões nessa operação?

            A Presidenta fez um gol de placa com esta decisão de fechar as portas do BNDES a essa operação. Aliás, acho até que, por uma questão, eu diria, de ética e até de desconforto, o empresário Abílio Diniz poderia muito bem pedir demissão desse conselho superior de aconselhamento, na área de gestão e qualidade, que ele integra junto à Presidência da República. 

             Seria um gesto, também, de boa conduta e de boa prática do Sr. Abílio Diniz se o fizesse.

            Mas, Sr. Presidente e Srs. Senadores, os bons resultados obtidos pelo Brasil na área social e na balança comercial, nos últimos anos, têm escondido um processo de desindustrialização e os riscos que isso implica para o futuro de nosso País.

            A desindustrialização ficou em alto-relevo na recente audiência pública, na Comissão de Assuntos Econômicos, requerida pelos Senadores Armando Monteiro e Luiz Henrique da Silveira. Aliás, para confirmar aquilo que, na semana passada, discutiu-se à exaustão e com muita competência dos expositores, representantes de vários dos segmentos industriais, de têxtil ao setor de bens de capital, no Valor Econômico de ontem, Senador Armando Monteiro: “Indústria perde investimento e vira deficitária”.

            Estamos fazendo a nossa parte. Nos últimos meses, a sequência de anúncios de indicadores geraram nos brasileiros a eufórica sensação de que o Brasil vem crescendo, mas atenção, porque, ao lado das boas notícias, estão também as más notícias.

            Vamos aos dados positivos, às boas notícias: nas últimas duas décadas, o País reduziu o Índice de Gini, que é o principal indicador de desigualdade de rendas dos países, mundialmente reconhecido pelo Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento, PNUD.

            Nós também reduzimos, substancialmente, o número de famílias que estão abaixo da pobreza, que já foi de mais de 40% da população no início dos anos 1980 e que, agora, está abaixo dos 18%, com tendências de maior queda ainda.

            A criação de empregos fez com que 36 milhões de brasileiros saíssem das classes de renda D e E, e ascendessem para a classe C, durante os últimos oito anos, provando que o Brasil conseguiu promover mobilidade social nesse período.

            O acesso ao crédito foi ampliado. Hoje, a oferta de crédito em nosso País atinge 46% do Produto Interno Bruto, sendo 17,5% crédito de consumo, mas ontem, aqui, nesta tribuna, o Senador Cristovam Buarque esmiuçou o alto endividamento dos brasileiros, especialmente na área do consumo.

            Tudo isso foi possível graças, é claro, a esse bom desempenho, à política de estabilização monetária e fiscal promovida nos anos 90, que teve início no Governo do nosso saudoso Senador e Presidente Itamar Franco, e que até hoje vem sendo seguida pelos seus sucessores.

            Esses números, Sr. Presidente, aliados ao extraordinário momento vivido pela economia mundial até meados de 2008, ao aumento da tecnologia e da produtividade e às importações facilitadas pelo câmbio, fizeram com que o brasileiro experimentasse um período expansão de sua capacidade de consumo.

            Srªs e Srs. Senadores, agora, as más notícias.

            Quando comparamos o Brasil com os demais países em desenvolvimento, percebemos que, na verdade, o nosso País perdeu a oportunidade de crescer mais e com sustentabilidade.

            Nos últimos oito anos, o Brasil ficou em último lugar em crescimento entre os Brics. Enquanto a média do crescimento chinês, um dos Brics, o “C”, nesse período, foi de 10,95%, da Índia, 8,2% e a Rússia, 4,8%, nós crescemos, em média, somente 4%.

            Neste ano, o Brasil continua segurando a lanterna do crescimento entre os Brics, que só agora está dividindo uma posição com a Rússia.

            Com crescimento de 4,2%, Sr. Presidente, no primeiro trimestre, comparado com o mesmo período de 2010, o Brasil cresceu menos que a China com 9,7%, a Índia, 7,8% e a África do Sul, 4,8%. O crescimento brasileiro só foi 0,1 ponto percentual maior do que o da Rússia, que teve expansão de 4,1%.

            Srªs e Srs. Senadores, o crescimento econômico poderia ter sido muito mais robusto se o Brasil não estivesse passando por um processo de desindustrialização, que, agora, ameaça a sustentabilidade dos nossos modestos índices.

            A indústria vem perdendo espaço na economia nacional.

            O resultado da balança comercial brasileira vem diminuindo desde 2007, e hoje está na faixa dos US$20 bilhões. Esse resultado é garantido, Srs. Senadores, pela exportação de commodities, que já representam 71% de nossa pauta de exportações (incluindo produtos básicos e industrializados de pequeno valor agregado).

            A balança comercial da indústria brasileira registrou um déficit, em 2010, de US$37 bilhões.

            Nos últimos dez anos, a participação dos produtos manufaturados tem diminuído, passando de 55%, em 2005, para 39%, em 2010. Já os produtos básicos cresceram sua participação na pauta de exportações brasileiras de 26% para 45%, de acordo com dados do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio.

            Além disso, o Brasil tem permitido a entrada de produtos asiáticos, especialmente da China, da Coréia, da Índia, Indonésia e Taiwan, que entram sem maiores problemas no mercado brasileiro, competindo em desigualdade de condições com a indústria nacional.

            Entram, no Brasil, legal ou ilegalmente, Sr. Presidente, desde calçados, como denunciam os produtores brasileiros, até equipamentos que envolvem alta tecnologia para a produção - nem se fala na área têxtil. Muitas vezes, esses produtos têm, em sua composição, a matéria-prima, a tecnologia e o design brasileiros, mas foram produzidos no exterior.

            Com alegria, concedo o aparte ao Senador Armando Monteiro, que foi, aliás, autor do requerimento para a audiência pública que fizemos na semana passada.

            O Sr. Armando Monteiro (PTB - PE) - Nobre Senadora Ana Amélia, eu queria, desde já, registrar a minha satisfação em poder constatar que há, neste Senado, sobretudo nos novos quadros que aqui chegaram, alguém que, como V. Exª, tem revelado absoluta sintonia com essa agenda que nos desafia na perspectiva do futuro. E o tema que V. Exª traz hoje aqui ao debate é um tema da maior oportunidade e relevância. O Brasil vive, sim, o risco de um processo de desindustrialização. E o que é mais grave, Senadora, com esse bom momento que a economia brasileira ainda vive, esse quadro, que nos coloca uma grande preocupação a médio prazo, não é percebido claramente. Por isso é importante que vozes como a de V. Exª se levantem nessa hora, colocando esse debate no centro do debate do País. E mais do que isso: que o Senado da República possa discutir essa questão, que é da maior importância. Eu quero agregar ao pronunciamento de V. Exª a necessidade de o Brasil pensar também em promover um rearranjo na política macroeconômica. Porque se existe algo que hoje compromete a competitividade da produção nacional é essa distorção que se verifica nos dois principais preços macroeconômicos, que são os juros e o câmbio. Não é possível admitir que um País como o nosso, que avançou tanto, do ponto da sua economia nos últimos anos, que é credor externo líquido, que alcançou o grau de investimento em todas as agências de risco, que tem um ambiente institucional razoável, que tem uma democracia consolidada, como imaginar que este País ainda ostente a mais alta taxa de juros real do mundo? Há algo errado nessa questão. De outro modo, os juros promovem um incentivo para que a taxa de câmbio se aprecie mais e mais. Então, é hora de fazermos uma discussão também sobre a necessidade de um novo arranjo macroeconômico, que nos imponha a necessidade de que a política fiscal no Brasil possa ser aprofundada, que o Brasil inaugure um regime fiscal mais responsável, para que tenhamos condições, então, de reduzir essa taxa de juros real, e aí, sim, contribuir para que o câmbio não se aprecie ou que, pelo menos, o câmbio possa voltar a um ponto, a uma taxa de equilíbrio. Congratulo-me com o pronunciamento de V. Exª. Quero especialmente registrar aqui a sua posição sempre atenta ao debate das grandes questões econômicas, e dizer que me sinto muito feliz em poder estar ao seu lado nesse debate. Muito obrigado.

            A SRª ANA AMÉLIA (Bloco/PP - RS) - Muito obrigada, Senador Armando Monteiro. De fato, essa situação - não vou citar o nome do líder empresarial, mas é reconhecido, porque não pedi autorização, que emitiu um juízo que me chamou muito a atenção: da forma como está a política cambial hoje e a valorização do Real frente ao Dólar, nem juros a zero tornaria a exportação brasileira competitiva. Esse é um dos pontos.

            Outro ponto, nessa mesma audiência pública, é que temos focado muito a China, que está atraindo o capital brasileiro para usar a nossa expertise e, lá, a custos muito baixos, empresas brasileiras estão se transferindo. Agora a situação é tão complicada que os países do Mercosul estão sendo refúgio para as indústrias brasileiras. Indústrias do meu Estado, o Rio Grande do Sul, estão se transferindo para a Argentina, para o Uruguai, para o Paraguai, atraídas pelas facilidades e pelo ambiente favorável para esse processo de industrialização. Claro, o setor, para sobreviver, vai buscar o ambiente que lhe é mais favorável.

            Com alegria, concedo o aparte ao Senador Randolfe Rodrigues que, como eu, há seis meses chegou a esta Casa.

            Obrigada ao senhor pela gentileza.

            O Sr. Randolfe Rodrigues (PSOL - AP) - Senadora Ana Amélia, na verdade esses seis meses têm sido para mim de aprendizado com pessoas como V. Exª aqui nesta Casa, e eu não poderia deixar V. Exª concluir o seu pronunciamento sem ter a honra de aparteá-la, concordando com a linha apontada por V. Exª e pelo mesmo discurso ainda há pouco proferido pelo Senador Armando. Na verdade, o que me parece é que nós temos que iniciar uma fase nova da nossa economia. Nós tivemos um choque ortodoxo na economia brasileira ao longo dos últimos vinte anos. Nós temos tido uma política econômica pautada pela mesma receita, baseada no tripé: superávit primário, altas taxas de juros e meta de inflação. Creio até, e quero aqui reconhecer, que essa política cumpriu um objetivo, que foi a estabilidade econômica. O problema...

(Interrupção do som.)

            O Sr. Randolfe Rodrigues (PSOL - AP) - O problema é se essa política econômica dará conta dos desafios do Brasil para as próximas décadas. E eu quero cumprimentar - veja, eu sou do Partido Socialismo e Liberdade, mas quero cumprimentar - o artigo publicado na revista Carta Capital desse final de semana, do economista, ex-Ministro da Fazenda Antonio Delfim Netto, que aponta o papel que o Brasil poderá ocupar na próxima década na ordem econômica e política mundial, que pode ser um papel de mero exportador de commodities e dependente economicamente da China, que tem dado um salto no seu desenvolvimento econômico. E nós, o Brasil e a Índia, se continuarmos com essa ortodoxia na nossa política econômica, sim, podemos caminhar a passos longos para um dramático processo de desindustrialização e de ser, no aspecto econômico e na nova ordem econômica mundial, mero exportador de commodities.

            A SRª ANA AMÉLIA (Bloco/PP - RS) - Agradeço imensamente por duas razões: primeiro, pela alegria do seu aparte, sempre pontual e preciso, mas, sobretudo, por citar o meu guru em questões econômicas, o meu amigo, ex-Ministro Delfim Netto, que é sempre um mestre, com uma capacidade de lógica e de análise que impressiona a todos. Continua muito jovem nos seus oitenta anos. Muito obrigada, Senador Randolfe Rodrigues.

            Eu queria apenas pedir ao Presidente uma tolerância, porque eu estou encerrando o pronunciamento, que tem dados também que completam o raciocínio a respeito desse tema, Presidente Wilson Santiago.

            O SR. PRESIDENTE (Wilson Santiago. Bloco/PMDB - PB) - Peço licença a V. Exª, Senadora, para prorrogar a sessão por mais uma hora e conceder-lhe mais dois minutos para que possa concluir o seu raciocínio.

            A SRª ANA AMÉLIA (Bloco/PP - RS) - Muito obrigada, Presidente.

            Quando exportamos commodities ou bens de baixo valor agregado e importamos produtos industrializados, estamos exportando empregos que vão gerar renda e bem-estar em outros países.

            A participação desse setor na composição do PIB caiu de 36%, em 1984, para 15% apenas em 2010. A indústria já foi responsável por 30% dos empregos no nosso País - dados de 1985 -, e hoje responde por apenas 17,4% dos postos de trabalho.

            O Brasil não pode deixar que sua indústria retroceda, tornando-se um mero exportador de commodities. Um país que almeja o crescimento sustentável precisa ter sua indústria fortalecida. É na indústria que os empregos são gerados, Sr. Presidente. É na indústria que acontece o desenvolvimento tecnológico. É na indústria que o conhecimento é aplicado, agregando valor às matérias-primas. É através da indústria fortalecida que o Brasil pode deixar a posição colonial de exportador de recursos naturais para se tornar um fornecedor de conhecimento e inteligência para o resto do mundo.

            Mas a indústria nacional vem passando por sérias dificuldades. As pesquisas do IBGE já identificaram forte desaceleração na atividade industrial, com reflexos na produtividade e na geração de postos de trabalho, já dificultados pela escassez de mão de obra qualificada no mercado, como já apontou aqui também o Senador Cristovam Buarque. Neste primeiro semestre, aumentou quase 20% o número de registros de estrangeiros para o trabalho no Brasil. As empresas perdem em competitividade internacional por causa do câmbio, com o Real valorizado (39% nos últimos oito anos), e têm dificuldades de promover a modernização nos seus processos. Mantido esse câmbio, nem com taxa de juros zero o exportador ou a indústria teriam condições de competir.

            A tomada de crédito para investimentos é feita a juros altíssimos, como bem sustentaram aqui, nos apartes, os Senadores...

(Interrupção do som.)

            A SRª ANA AMÉLIA (Bloco/PP - RS) - ...sem subsídios governamentais. Há gargalos logísticos, como a energia, que encarece o custo dos produtos brasileiros. E também a questão da predominância de um modal rodoviário de transporte em estradas mal conservadas e o alto custo da energia elétrica brasileira oneram a produção e a distribuição da produção industrial. Dados da CNI demonstram, Sr. Presidente, que o Brasil tem a segunda energia mais cara do mundo, a um custo quase três vezes superior ao custo da China.

            O arcabouço tributário brasileiro é complexo e oneroso. O sistema tributário brasileiro tributa investimento. O custo da contratação de mão de obra dobrou nos últimos cinco anos e é encarecido pela legislação trabalhista, que data de 1946.

            A reversão do processo de desindustrialização brasileiro é urgente. Se quisermos viver num país competitivo...

(Interrupção do som.)

            A SRª ANA AMÉLIA (Bloco/PP - RS) - Muito obrigada, Sr. Presidente.

            Se quisermos viver num país competitivo, onde a geração de riquezas é promotora do desenvolvimento econômico sustentável, precisamos promover uma série de reformas que exigirá participação ativa do Congresso Nacional.

            Concedo um aparte ao Senador Cristovam Buarque, a quem me referi agora há pouco no meu pronunciamento.

            O Sr. Cristovam Buarque (Bloco/PDT - DF) - Presidente, solicito um tempo curto, mas eu não poderia deixar, Senadora - inclusive eu estava assistindo a uma parte do seu discurso lá fora -, de fazer um comentário. Primeiro, a felicidade de ter uma Senadora que vem aqui alertar o Brasil de que a nossa economia está bem, mas não vai bem. Ela está bem quando a gente olha o momento, pelos indicadores de hoje. Ela não está bem pelos entulhos que temos adiante, que será necessário arrancar para que a economia cresça. A senhora falou aí, muito claramente, e eu gostei, de diversos desses entulhos, e eu queria tratar de dois, rapidamente. Um é o grau de endividamento que temos com os aposentados, que a senhora tocou, com os pobres, que obrigam gastos elevados de políticas sociais com os bancos. E isso cria um imbróglio muito grande, porque temos que ter carga elevada, temos que ter gastos elevados, e isso atrapalha. E o outro, de que não posso deixar de falar, é o gargalo da falta de capacidade e inovação na economia brasileira. Nós queremos ganhar competitividade reduzindo custos. Esquecemos que a grande competitividade de hoje está em inventar produtos novos, sobretudo aqueles de alta tecnologia. Ou enfrentamos os problemas que a senhora citou ou a nossa economia que hoje está bem, mas vai mal, daqui a alguns anos ela estará mal também.

            A SRª ANA AMÉLIA (Bloco/PP - RS) - Muito obrigada, Senador Cristovam. Aliás, citei-o porque ontem V. Exª abordou a questão do endividamento individual, especialmente na área de curto prazo, no consumo, que é bem mais grave ainda. Agradeço muito a valiosa colaboração de V. Exª, Senador Cristovam,...

(Interrupção do som.)

            A SRª ANA AMÉLIA (Bloco/PP - RS) - ...sempre atento às questões econômicas.

            Faltam apenas umas poucas questões, Sr. Presidente, para eu encerrar o meu pronunciamento. Entre as questões fundamentais para evitar a desindustrialização também incluo uma reforma tributária que promova desoneração do investimento e a diminuição da burocracia. Segundo dados do Banco Mundial, uma empresa brasileira gasta em média 2.600 horas por ano com burocracia só no pagamento de impostos. Uma revisão do câmbio, que hoje está supervalorizado. O Real precisa ser trazido para os patamares da realidade. Promoção de juros diferenciados para o investimento em tecnologia e inovação, Senador Cristovam Buarque, e estímulos para que este aumente a participação das micro e pequenas empresas na pauta de exportações industriais brasileiras.

            É preciso investir em novas ideias, em novas empresas, em novas tecnologias, como a que me foi apresentada na cidade de Pelotas, no sul do Rio Grande do Sul.

            Uma empresa está construindo casas a partir de casca de arroz, e o que era resíduo agora é matéria-prima. Qual é o papel do Estado no apoio ao desenvolvimento desse produto? Por enquanto, nenhum.

            Por isso, Sr. Presidente, eu queria dizer, por fim, que precisamos batalhar também para vencer o principal gargalo existente ao desenvolvimento da indústria brasileira, que é o gargalo da educação, Senador Cristovam Buarque, para que assim tenhamos mão de obra qualificada para suprir a demanda existente.

            Muito obrigada, Sr. Presidente, pela generosa permissão para que eu pudesse concluir o pensamento. Agradeço muito a todos os Srs. Senadores que apartearam este pronunciamento.

            Muito obrigada.


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