Discurso durante a 120ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Reflexões sobre o papel do Congresso Nacional na democracia brasileira.

Autor
Ricardo Ferraço (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/ES)
Nome completo: Ricardo de Rezende Ferraço
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
PODERES CONSTITUCIONAIS.:
  • Reflexões sobre o papel do Congresso Nacional na democracia brasileira.
Publicação
Publicação no DSF de 13/07/2011 - Página 29016
Assunto
Outros > PODERES CONSTITUCIONAIS.
Indexação
  • COMENTARIO, ESTUDO, AUTORIA, DEPARTAMENTO DE PESQUISA, UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO (USP), ASSUNTO, PAPEL, CONGRESSO NACIONAL, RELAÇÃO, PRESIDENCIALISMO, RELACIONAMENTO, PARTIDO POLITICO, APREENSÃO, PROBLEMA, PERDA, LEGITIMIDADE, REDUÇÃO, IMPORTANCIA, PARLAMENTO, COMPARAÇÃO, PODERES CONSTITUCIONAIS, EXPECTATIVA, ORADOR, VOTAÇÃO, REFORMA POLITICA, ALTERAÇÃO, TRAMITAÇÃO, MEDIDA PROVISORIA (MPV), OBJETIVO, FORTIFICAÇÃO, SENADO.

            O SR. RICARDO FERRAÇO (Bloco/PMDB - ES. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Muito obrigado, S. Exª, Senador José Pimentel, Presidente em exercício desta sessão.

            Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, brasileiros e brasileiras que nos acompanham através da TV Senado. Na antessala, Sr. Presidente, na última semana antes do recesso legislativo, desejo trazer a este Plenário uma breve, mas importante reflexão política.

            Infelizmente, o dia a dia na Casa, o calor do debate partidário, nem sempre permite que estejamos em todos os momentos fazendo uma avaliação da nossa eficácia, do nosso trabalho e, por que não dizer, do papel do Congresso Nacional em nossa democracia. Democracia hoje fundada no chamado presidencialismo de coalizão, um presidencialismo, é verdade, à moda brasileira, que traz benefícios, que tem benefícios, que tem muitas virtudes, mas que também traz em seu bojo imperfeições para uma convivência democrática, equilibrada e harmoniosa, pelo menos a meu juízo.

            Há pouco mais de uma semana, chamou-me a atenção um documento apresentado pelo Núcleo de Pesquisa de Políticas Públicas, da Universidade de São Paulo, da prestigiosa Universidade de São Paulo (USP). Um estudo muito interessante, intitulado O Papel do Congresso Nacional no Presidencialismo de Coalizão.

            O estudo, Sr. Presidente, mostra as duas faces dessa moeda. De fato, o presidencialismo de coalizão conseguiu resolver o problema da governabilidade. Por outro lado, esvaziou o protagonismo do Congresso e prejudicou o papel de fiscalização que este Poder deve exercer junto ao Poder Executivo.

            A tese central desse documento da nossa USP é de que a democracia brasileira incorporou a hipertrofia do Poder Executivo herdada do período militar. E abro um parêntese aqui para registrar o que é óbvio, o que todos nós estamos aqui cansados de martelar dia após dia nos debates, não apenas no Plenário, mas também nos debates em nossas Comissões Permanentes, ou seja, o uso abusivo, o uso excessivo das medidas provisórias, fonte de tanta polêmica e, por que não dizer também, de subtração das prerrogativas parlamentares dos nossos Senadores, do nosso Senado da República; sem falar, evidentemente, no orçamento meramente autorizativo, tantas vezes apontado como mera peça de ficção.

            Mas, voltando, Sr. Presidente, Srs. Senadores, ao estudo da USP, ele salienta ainda a importância da governabilidade, o fato de o Executivo não ficar paralisado diante de um pluripartidarismo fragmentado, com governadores fortes e o nosso federalismo fragilizado.

            O problema, nas palavras do coordenador da pesquisa, o Cientista Político José Álvarez Moisés, é que, no presidencialismo de coalizão, o Congresso Nacional tende a perder sua autonomia; historicamente, é reativo, paralisante ou submisso na relação com o Executivo, não tendo, na maior parte do tempo, uma agenda própria.

            Ele observa, o cientista José Álvaro Moisés, que os dois poderes não precisam viver em conflito, mas que a democracia não pode abrir mão da ação permanente de fiscalização do Legislativo sobre o Executivo.

            A atual fragilidade do Congresso, segundo Moisés, tem raízes na nossa história recente. Entre 46 e 64, tivemos momentos de paralisia decisória por conta da permanente queda de braço entre o Executivo e o Legislativo, que tantos prejuízos trouxe ao interesse nacional.

            A guinada veio no regime militar, com os decretos-leis. Uma prática que a Constituição de 88 acabou de fato revivendo, com a adoção das medidas provisórias, que desequilibram, a meu juízo, a harmonia entre os dois Poderes.

            Outro problema, igualmente grave, é saber a que preço a coalizão que sustenta o governo se impõe como majoritária, no nosso dia a dia parlamentar. O legítimo, evidentemente, seria que a coalizão fosse subordinada à negociação política de um programa de governo - o que, lamentavelmente, nem sempre acontece.

            O estudo da USP não poupa o Parlamento: segundo ele, 80% dos brasileiros desconfiam da instituição; menos de 16% chegam a aprová-la. Para José Álvaro Moisés, o sentimento geral é que o Legislativo, que deveria incorporar a diversidade de posições da sociedade, não estaria representando as aspirações da maioria.

            Pior: o estudo aponta que, para um terço dos eleitores brasileiros, a democracia poderia funcionar sem o Congresso ou sem os partidos políticos.

            Esse é um sinal de alerta, julgo eu, da maior gravidade, que deve calar fundo no coração, que deve calar fundo no sentimento daqueles que fazem da sua vida uma militância política permanente.

            Precisamos, urgentemente, resgatar não apenas a credibilidade, mas também o protagonismo do Congresso Nacional.

            Nossas posições políticas devem ser pautadas pelo interesse público, não por negociações pontuais, muitas vezes incoerentes com as posições defendidas perante nossos eleitores.

            Se a coalizão é importante para a garantia da governabilidade, ela precisa ser baseada em compromissos claros, assumidos à luz do dia.

            O coordenador do estudo da USP observa bem: é possível fazer uma composição com forças que não sejam homogêneas e, ao mesmo tempo, manter uma linha programática durante o exercício do mandato.

            A sociedade cobra, com toda razão, coerência dos seus representantes políticos. Coerência e decisão. O levantamento feito pela USP contabiliza que há 26 mil projetos parados na Câmara e 8 mil projetos tramitando no Senado Federal.

            Convém lembrar que o propalado ativismo legislativo do Judiciário vem se dando na esteira da paralisia do Congresso, que deixa de debater e de decidir questões da maior importância para a sociedade.

            Certo é que, a meu juízo, Srs. Senadores e Srªs Senadoras, se o nosso Parlamento precisa, enfim, de reformas, por que não fazê-las o mais rápido possível?

            Já passou da hora de arregaçarmos as mangas e alterarmos de uma vez por todas o rito de tramitação das medidas provisórias. E precisamos fazê-lo num primeiro momento, tão logo termine o recesso parlamentar.

            Precisamos também votar mudanças que tornem menos burocrático, mais ágil e eficiente o nosso processo legislativo.

            Encerro, Sr. Presidente, com essa reflexão, na medida em que fazemos ou estamos caminhando para um balanço do primeiro semestre do nosso exercício parlamentar de 2011, na expectativa de que no segundo semestre nós possamos, efetivamente, produzir com mais eficácia, quem sabe, com um novo rito de MPs que possa assegurar um debate mais amplo, que possa dar condição aos Senadores de opinar, de criticar, de aprimorar, de aperfeiçoar e de impedir, de uma vez por todas, que os contrabandos, como se diz tecnicamente aqui no Legislativo, deixem de incorporar essa agenda, estando a todo momento os Senadores tendo de tomar uma decisão, muitas vezes, contra suas vontades.

            O economista e filósofo inglês John Stuart Mill, já no século XIX, chamava a atenção para o fato de que um sistema democrático não pode, de forma alguma, representar a ditadura da maioria sobre a minoria.

            É nessa expectativa que, se encerrando já o nosso semestre legislativo, renovo aqui a minha expectativa, a minha fé, o meu otimismo, a minha motivação de que nos segundo semestre nós possamos fazer tudo aquilo que não foi possível fazer em benefício do fortalecimento do Senado da República.

            Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 13/07/2011 - Página 29016