Discurso durante a 121ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Considerações acerca de ação encaminhada, hoje, pelo Professor Dalmo de Abreu Dallari, ao Presidente do Tribunal Superior Eleitoral, defendendo que a decisão sobre a criação de estados no Pará seja objeto de plebiscito que abranja toda a população brasileira.

Autor
Eduardo Suplicy (PT - Partido dos Trabalhadores/SP)
Nome completo: Eduardo Matarazzo Suplicy
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
DIVISÃO TERRITORIAL.:
  • Considerações acerca de ação encaminhada, hoje, pelo Professor Dalmo de Abreu Dallari, ao Presidente do Tribunal Superior Eleitoral, defendendo que a decisão sobre a criação de estados no Pará seja objeto de plebiscito que abranja toda a população brasileira.
Aparteantes
Flexa Ribeiro, Mozarildo Cavalcanti.
Publicação
Publicação no DSF de 14/07/2011 - Página 29344
Assunto
Outros > DIVISÃO TERRITORIAL.
Indexação
  • SOLICITAÇÃO, TRANSCRIÇÃO, ANAIS DO SENADO, DOCUMENTO, JURISTA, DEFESA, CONSULTA, BRASILEIROS, RELAÇÃO, DIVISÃO TERRITORIAL, ESTADO DO PARA (PA).

            O SR. EDUARDO SUPLICY (Bloco/PT - SP. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Srª Presidenta Senadora Marta Suplicy, Srªs e Srs. Senadores, o professor Dalmo de Abreu Dalari, eminente jurista brasileiro, encaminhou nesta data ao Exmº Sr. Presidente do Tribunal Superior Eleitoral relevante ação na qual argumenta que a decisão sobre a criação de Estados onde hoje é o Estado do Pará, deva ser objeto de plebiscito não apenas da população do Estado do Pará, mas de toda a população brasileira.

            Diz o Professor Dalmo de Abreu Dallari:

Em sessão administrativa realizada em 30 de junho último, essa Egrégia Corte apresentou calendário e fixou algumas diretrizes para a realização de um plebiscito que terá por objetivo conhecer a vontade da cidadania sobre a pretensão de desmembramento do Estado do Pará e a criação de dois novos Estados no âmbito do atual território daquele Estado. Ficou então estabelecido, conforme instruções divulgadas pela imprensa, que deverá participar do plebiscito, manifestando a sua vontade, toda a população diretamente interessada e não apenas a das áreas que se pretendem desmembrar.

Entretanto, na divulgação das decisões adotadas naquela sessão administrativa, vem sendo atribuída a essa colenda Corte uma interpretação restritiva, evidentemente equivocada, da expressão “população diretamente interessada”, que consta do art. 18, §3º, da Constituição, em que está prevista a possibilidade de desmembramento dos Estados para a formação de outros, assim como do art. 4º da Lei nº 9.709, de 18 de novembro de 1998, que regulamentou a execução do disposto no art. 14 da Constituição, que trata dos direitos políticos. O que se tem divulgado é que na expressão “população diretamente interessada” estão compreendidas a população da área que se pretende desmembrar e, além dessa, apenas a população do restante do Estado cujo desmembramento é pretendido. Assim, estaria excluída, apesar de seu evidente interesse direto na decisão sobre o desmembramento, toda a população do restante do Brasil.

Como elemento esclarecedor, é importante rememorar que, sob influência da Constituição de 1946, desenvolveu-se, no Brasil, intenso movimento municipalista. E em muitos Estados foram externadas propostas de distritos que pretendiam sua emancipação, convertendo-se em Municípios. E para tornar mais viável sua aspiração tentaram sustentar que bastaria uma consulta aos moradores do próprio distrito. Contra essa pretensão prevaleceu a diretriz de que deveria ser ouvida toda a população diretamente interessada, que, no caso, era a população de todo o Estado, pelas conseqüências que decorreriam da criação de novos Municípios.

Naquela oportunidade, não se cogitou da criação de novos Estados, mas tem perfeita aplicação a esta hipótese a conclusão de que para a criação de novas unidades políticas, com a inevitável consequência de repercussão sobre os direitos e interesses dos que residem fora do âmbito dos que pretendem a emancipação, é necessário, jurídico e justo ouvir toda a população interessada. E isso tem aplicação tanto à criação de novos Municípios quanto de novos Estados.

Antes de tudo, é importante assinalar que tanto na Constituição quanto na Lei 9.709 o que consta, sem nenhuma delimitação, é a expressão “população diretamente interessada”, nada autorizando, nem pela redação dos dispositivos nem pelo significado das palavras e a intenção inerente ao seu conteúdo, que se considere população interessada apenas aquela do Estado cujo desmembramento se pretende. O que se determina é que seja ouvida a população diretamente interessada. Ora, basta considerar os aspectos principais das consequências que resultarão da criação dos dois novos Estados, que é o que se pretende em relação ao Pará e que deu ensejo à convocação do plebiscito, para que fique absolutamente claro que a população diretamente interessada é, nesse caso, toda a população brasileira.

Com efeito, não é preciso qualquer esforço interpretativo para se perceber que a criação de novos Estados na Federação brasileira, pelo desmembramento de um Estado ora existente, afetará seriamente os direitos políticos, que são direitos fundamentais de todo o povo brasileiro, além de criar pesados ônus que deverão ser suportados por todo o povo. Assim sendo, é mais do que óbvio que uma proposta para a criação de novos Estados interessa diretamente a todo o povo brasileiro e não só às pessoas que residem no Estado que se pretende desmembrar.

Como primeira advertência, é preciso lembrar que com a criação dos novos Estados, que, obviamente, ainda não terão renda, haverá, desde logo, a necessidade de que os cofres federais, ou seja, toda a população brasileira, pague a instalação do aparato governamental, ou seja, o governo do novo ou dos novos Estados com sua sede para o Poder Executivo, suas secretarias e todas as repartições necessárias, com o indispensável equipamento para o desempenho dos encargos que são de competência estadual. Acrescente-se a isso a necessidade de um Legislativo estadual e um Poder Judiciário, todos com instalações apropriadas para a instalação, o funcionamento e as comunicações, com também, obviamente, com os titulares ocupantes dos cargos, além do equipamento e do funcionalismo indispensáveis para o desempenho das funções e o relacionamento externo. Tudo isso representando um elevado ônus financeiro que deverá ser suportado por todo o povo brasileiro, afetando seriamente seus interesses.

Não há dúvida, portanto, de que a população diretamente interessada na decisão sobre a criação de novos Estados é toda a população brasileira.

Além dos elevados ônus econômico-financeiros que recairão sobre o todo o povo brasileiro, o que obviamente é do interesse direto de toda a população, acrescente-se ainda que serão direta e imediatamente afetados os direitos políticos de todo o povo, pois o mesmo eleitorado do Estado do Pará, que hoje elege três Senadores, que é o número de representantes de cada Estado, passará a eleger nove Senadores, ou seja, três para cada Estado, o que, obviamente, irá aumentar o peso político daquele eleitorado, reduzindo o peso e a influência de todos os eleitores de todos os demais Estados.

Haverá também um desequilíbrio dessa espécie na Câmara dos Deputados, pois segundo a Constituição cada estado deverá ter um mínimo de oito Deputados Federais, o que significará um aumento de pelo menos dezesseis Deputados, sem que tenha aumentado o número de eleitores. Também sob esse aspecto é mais do que óbvio que a decisão de criar novos Estados é do interesse direito e imediato de toda a população brasileira e não apenas dos eleitores do Estado cujo desdobramento se propõe.

            O Sr. Mozarildo Cavalcanti (PTB - RR) - Permita-me V. Exª um aparte?

            O SR. EDUARDO SUPLICY (Bloco/PT - SP) - Vou lhe conceder um aparte, Senador Mozarildo Cavalcanti, mas permita que eu possa pelos menos completar aqui os argumentos.

            O Sr. Mozarildo Cavalcanti (PTB - RR) - Vai acabar o tempo de V. Exª.

            O SR. EDUARDO SUPLICY (Bloco/PT - SP) - Mas é importante que eu aqui coloque.

            Então, eu vou lhe conceder e pedir uma tolerância da parte da Presidenta dada a relevância deste assunto.

A par de todos estes aspectos que envolvem relevante interesse público de amplitude nacional é fundamental ter em conta que segundo disposição expressa da Constituição da República em art. 18, § 3º, “os Estados podem incorporar-se entre si, subdividir-se ou desmembrar-se para se anexarem a outros ou formarem novos estados ou territórios federais, mediante a aprovação da população diretamente interessada, através de plebiscito.” Essa é uma determinação de natureza constitucional, que nenhuma lei ou autoridade ou instituição pode ignorar ou contrariar. Pelo que foi assim exposto, toda a população brasileira é diretamente interessada numa proposta de subdivisão ou desmembramento de Estado, pois tais medidas acarretarão graves conseqüências, diretas e imediatas, sobre os efeitos políticos, que são direitos fundamentais, e os interesses de toda a população brasileira.

            Concedo o aparte, Senador Mozarildo Cavalcanti.

            O Sr. Mozarildo Cavalcanti (PTB - RR) - Senador Eduardo Suplicy, ainda bem que na leitura da peça elaborada pelo eminente jurista paulista Dalmo Dallari ficou claro que a preocupação é política. Nós vamos ter mais seis Senadores na Região Norte. São Paulo acha ruim. Vamos ter mais dezesseis Deputados Federais; não vai ser mais não, porque vai dividir. Então, essa preocupação é

            Então, a preocupação é política, porque não tem a ver... O contribuinte de São Paulo não vai gastar um tostão com esses Estados, haja vista Tocantins e Mato Grosso. Então, eu acho que quanto a esse assunto não adianta... Eu já tive um debate com o Senador Aloysio, que argumentou com um monte de coisas, também, no meu entender sem consistência, apenas porque o pano de fundo dessa questão é que teremos mais seis Senadores aqui da Região Norte e mais talvez dezesseis Deputados da Região Norte. Mas eu pergunto: por que São Paulo, já tem todo esse poderio econômico, tem medo que possamos ter mais poder político? Eu acho que o debate tem que ser feito em outros termos, aliás, nunca se criou Estado no Brasil com plebiscito. A Constituição de 1988, que estabeleceu isso, para justamente amarrar a consulta popular, o que é democrático. Agora querer que, além de ouvir o Pará, ouça todo o Brasil, é demais. Seria o mesmo que o Brasil, à época da independência, fosse ouvir Portugal para saber se ele queria, ou não, que fizesse a independência.

            O SR. EDUARDO SUPLICY (Bloco/PT - SP) - Senador Mozarildo Cavalcanti...

            O Sr. Flexa Ribeiro (Bloco/PSDB - PA) - Permita-me V. Exª um aparte?

            O SR. EDUARDO SUPLICY (Bloco/PT - SP) - ... há ainda diversos outros argumentos - vou conceder o aparte ao Senador Flexa Ribeiro -, mas, sobretudo, a redução da participação dos atuais Estados na distribuição dos fundos federais constitucionalmente previstos e a questão do elevadíssimo custo do aumento dos cargos de representação política nos órgãos representativos federais.

            Concedo o aparte ao Senador Flexa Ribeiro.

            O Sr. Flexa Ribeiro (Bloco/PSDB - PA) - Senador Eduardo Suplicy, V. Exª traz à tribuna uma questão, que hoje, aprovada pelo Senado e pela Câmara, estamos em via de ter o plebiscito, marcado para o dia 11 de dezembro, que vai ouvir a população interessada. População interessada é a do Estado do Pará, que é onde se pretende ouvir da população se quer ou não a criação de dois novos Estados. Está V. Exª se referindo a fazer uma escuta do País como um todo.

            O SR. EDUARDO SUPLICY (Bloco/PT - SP) - Sim.

            O Sr. Flexa Ribeiro (Bloco/PSDB - PA) - Eu acho que não há como...

            (Interrupção do som.)

            O Sr. Flexa Ribeiro (Bloco/PSDB - PA) - ... aprovar uma proposta como essa, porque V. Exª estaria entrando na questão de interesse de um Estado da Federação brasileira. Nós aqui discutimos, e eu vou fazer um pronunciamento, daqui há pouco sobre esse tema, a questão do trem-bala. Quando toda a base do Governo votou a favor da medida provisória, por que nós não fizemos também um plebiscito para saber se o País como um todo queria que fosse, ou não, construído algo que é um projeto “lulático”, ou seja, o trem-bala, a custos não definidos - já se fala em R$ 50 bilhões, que toda a população vai pagar para se fazer essa obra. Então, teria que ouvir o Brasil como um todo. Eu quero dizer a V. Exª que o que está sendo feito no Pará é algo democrático, e V. Exª é um Senador que defende o direito de todos se pronunciarem a respeito de algo de importância para o Estado do Pará. Com relação à efetiva criação dos Estados novos, terão que ser feitos projetos de lei complementar que irão tramitar no Congresso Nacional. Aí sim, vamos discutir essa questão de mérito, de gastos. Não agora. Agora, vamos ouvir a população do Pará, se vai aceitar ou não a divisão. Então, V. Exª trata a questão de um Estado como se fosse nacional. Não vamos discutir se haverá divisão do Estado de São Paulo, ou de Mato Grosso, ou de Goiás, ou de Minas Gerais. Existem dezenas de projetos tramitando aqui no Congresso Nacional também para a criação de novos Estados.

            O SR. EDUARDO SUPLICY (Bloco/PT - SP) - Srª Presidente, requeiro seja transcrito documento na íntegra.

            E certamente os membros do Tribunal Superior Eleitoral estarão analisando todos os argumentos que aqui estão sendo apresentados com muito cuidado pelo Professor Dalmo de Abreu Dallari. Ressaltei o que aconteceu historicamente no Estado de Goiás e de Mato Grosso, quando a decisão foi apenas pelos moradores dali, mas ponderou que nunca havia alguém examinado todos os argumentos que aqui são apresentados para que essa seja uma decisão de toda a população brasileira.

            Muito obrigado, Srª Presidenta.

 

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DOCUMENTO A QUE SE REFERE O SR. SENADOR EDUARDO SUPLICY EM SEU PRONUNCIAMENTO.

(Inserido nos termos do inciso I, § 2º, do art. 210 do Regimento Interno.)

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            Matéria referida:

            “Anexo ( Dalmo de Abreu Dallari)”


Este texto não substitui o publicado no DSF de 14/07/2011 - Página 29344