Discurso durante a 123ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Análise da conjuntura econômica mundial, com alerta para potenciais efeitos negativos da crise econômica ao País.

Autor
Roberto Requião (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/PR)
Nome completo: Roberto Requião de Mello e Silva
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA ECONOMICO FINANCEIRA.:
  • Análise da conjuntura econômica mundial, com alerta para potenciais efeitos negativos da crise econômica ao País.
Aparteantes
Cristovam Buarque.
Publicação
Publicação no DSF de 16/07/2011 - Página 30080
Assunto
Outros > POLITICA ECONOMICO FINANCEIRA.
Indexação
  • ANALISE, ECONOMIA NACIONAL, CRITICA, DEPENDENCIA, EXPORTAÇÃO, MATERIA-PRIMA, QUESTIONAMENTO, MODELO, POLITICA ECONOMICO FINANCEIRA, MANUTENÇÃO, SUPERIORIDADE, TAXAS, JUROS, BANCO CENTRAL DO BRASIL (BACEN), NECESSIDADE, INVESTIMENTO, INFRAESTRUTURA, CIENCIA E TECNOLOGIA, PROTEÇÃO, CRISE, SISTEMA FINANCEIRO INTERNACIONAL.

            O SR. ROBERTO REQUIÃO (Bloco/PMDB - PR. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, inicialmente eu gostaria de dirigir aos telespectadores da TV Senado e da nossa Rádio uma mensagem.

            Tenho procurado dar mais intensidade ao diálogo entre o que dizemos na tribuna e os brasileiros através da Internet. A minha página é www.robertorequiao.com.br. E eu também me comunico pelo Twitter: @requiaopmdb. Desta forma conseguimos um retorno em relação àquilo que dizemos nesta tribuna.

            Ontem notei, assistindo do meu gabinete, o Plenário, que finalmente o Congresso, ou pelo menos o Senado, acorda para a discussão das raízes da crise econômica que o mundo vive e que atinge o nosso País.

            Vi, para meu espanto, o Senador Cristovam Buarque abandonar o tema da educação, tema que lhe é tão caro, e despertar para a sua profissão, economista e Professor de Economia que é da nossa Universidade de Brasília.

            Nós estamos, de alguma forma, esquecendo as raízes da crise e os seus reflexos da economia brasileira.

            Com o risco de ser recorrente, uma vez que já me referi a esse tema nesta tribuna algumas vezes, vou abordá-lo novamente.

            Tudo começou, Senador Cristovam Buarque em Bretton Woods, no grande encontro onde os Estados Unidos da América do Norte, virtual vencedor da guerra, impuseram o dólar como moeda de troca global, com uma restrição: para cada dólar emitido os Estados Unidos acumulariam, no famoso Fort Knox, o equivalente em ouro. Era o lastro da moeda norte-americana.

            É uma coisa que eu tenho dificuldade de compreender até hoje, porque é uma contrapartida medieval. O lastro da emissão de moeda de um país deveria ser a sua própria produção, o seu Produto Interno Bruto, os bens e serviços que ele coloca à disposição da sua sociedade e do mundo. Mas era, era o lastro ouro.

            A partir daí, os Estados Unidos puseram-se a pintar o papel de verde. E no Governo do Ronald Reagan esqueceram-se da contrapartida, emitiram sem contrapartida. E hoje certamente nós temos em papel pintado de verde, em dólar circulando no Planeta, algumas vezes mais que o Produto Interno Bruto não dos Estados Unidos da América do Norte, mas o Produto Interno Bruto do Planeta Terra.

            Muitas vezes mais, dezenas de vezes mais, centenas de vezes mais. E, com esse papel pintado, os Estados Unidos da América do Norte saíram comprando economias, estabelecendo o seu poderio e a sua dominação, tendo como lastro única e exclusivamente o seu poderio militar, que já estava firmado em Bretton Woods.

            A economia americana, a economia que surgiu com o George Washington quando se opôs ao Adam Smith, depois da independência - sinalizada, de forma conseqüente, quando o seu Ministro Alexander Hamilton manda para o Congresso americano o Tratado das Manufaturas, que se contrapõe ao liberalismo proposto pela Inglaterra, pelo Adam Smith, funcionário da Companhia das Índias, que pretendia transformar os Estados Unidos da América do Norte num produtor de matérias-primas e mão de obra barata, e a nova economia, através do Tratado das Manufaturas, propõe a inovação tecnológica, o financiamento das empresas, os Estados Unidos como produtor e agregador de valores, através do domínio da ciência e da tecnologia -, essa velha proposta norte-americana acaba se estiolando com a dominação do capital financeiro.

            Os Estados Unidos passam a se fixar praticamente no lucro das bolsas. As empresas criam prêmios para os seus executivos, não pelo que agregassem de tecnologia nova, não pelo que oferecessem de empregos e salários à população norte-americana, mas pelos lucros do cassino das bolsas. E a economia norte-americana passa a se preocupar muito pouco com o planejamento de médio e longo prazo, passa a se preocupar muito pouco com inovação tecnológica e se fixa nessa jogatina universal realizada nas bolsas do mundo inteiro.

            Ora, nessa época, Senador Cristovam, uma empresa japonesa que produzia automóveis - Jeep, mais especificamente - tenta colocar o seu produto nos Estados Unidos, com um fracasso absoluto; mas volta ao Japão, dedica-se ao planejamento, à inovação e hoje, depois da crise, quando a própria General Motors passa a ser uma empresa do Estado norte-americano, a Toyota assume o papel da maior e mais importante produtora de veículos do Planeta Terra.

            Mas o que aconteceu com os Estados Unidos, finalmente? Nesta loucura do lucro a qualquer preço, na ganância do cassino das bolsas, o salário dos norte-americanos foi congelado. Valia o lucro. A ganância se manifestava com a valorização das ações a cada momento. E, sem salário, o consumo se retrai. A engenharia financeira norte-americana substitui a oferta do ganho de produtividade aos trabalhadores norte-americanos por empréstimos de longo prazo e juros altos, os chamados subprimes, que, logo depois, também se multiplicam em derivativos, contaminando a economia do Planeta.

            Alguma coisa sobre isso poderia dizer o nosso Furlan, da Sadia.

            Salário congelado por décadas, por anos, consumo se retraindo, mas o subprime, empréstimo de largo prazo e juro alto, vai viabilizando o mercado interno norte-americano. Mas o salário estava congelado. A oferta era tão abundante e, a exemplo do que aconteceu na crise de 1927/1929, na Flórida, inicia-se um processo semelhante no mercado imobiliário. Uma família norte-americana podia refinanciar a sua casa de US$ 50 mil por US$ 100 mil, mais na frente, por US$ 150 mil, US$ 200 mil, US$ 250 mil, US$ 300 mil, mas o salário estava congelado.

            E o financiamento se estende também para o ensino superior, uma vez que o ensino básico é público e gratuito nos Estados Unidos, o que não acontece com o ensino superior. E se estende ao financiamento dos automóveis e ao financiamento da economia inteira, que se mobiliza, na ausência de salário, com o subprime, com empréstimo de prazo longo e juro alto.

            Até que, num determinado momento, o congelamento dos salários leva à inadimplência. E os americanos percebem que, se deixarem uma casa financiada ir à praça, poderiam comprá-la por interposta pessoa pelo valor real, não pelos US$ 300 mil do financiamento, mas pelos US$ 50 mil, pelo que realmente valia no mercado. E a economia americana cai como um castelo de cartas.

            A economia americana leva, diferentemente da crise de 1927/1929, quando estava segregada praticamente no próprio espaço americano, pelos efeitos da globalização, o mundo a um desastre.

            Aqui no Brasil as consequências foram duras, mas essa crise americana é uma crise do capitalismo industrial, e nós ainda somos um produtor de commodities, nós temos uma estrutura agroindustrial, nós sofremos menos. E sofremos menos também porque o Brasil tinha o Banco do Brasil, o BNDES, no Sul, o BRDE e a nossa Caixa Econômica Federal, que foram acionados pelo Presidente Lula para oxigenar a economia, evitando a debacle. De qualquer forma, nós sobrevivemos, mas fomos atingidos.

            Nós estávamos num processo de crescimento razoável em função da China. O desenvolvimento econômico da China e um consumo brutal de commodities puxavam a economia brasileira nos últimos anos, um pouco menos do que a economia de outros países sul-americanos e latino-americanos, mas puxavam a economia, o que, associado a uma política social inteligente do Presidente Lula, o Bolsa Família, as compensações e o aumento constante do salário mínimo, criava um mercado interno bastante interessante. Nós não tivemos o sofrimento que os países desenvolvidos de economia industrial tiveram.

            Mas como estamos hoje? O mundo inteiro reagiu a essa crise de uma forma diversa do que está fazendo o Brasil. A impressão que eu tenho é de que nós estamos repetindo o que os Estados Unidos fizeram na pré-crise, nós estamos repetindo. Estamos com juros altíssimos, 6.8% de juro real, o segundo juro real mais alto do Planeta é o do Chile, 1.5%. De 40 países examinados outro dia por um desses jornalões da República, 31 tinham juro negativo; os Estados Unidos com juro de 1.2%, 2.6% ou três qualquer coisa, com o spread e a inflação interna. Mas nós, não, nós com o juro lá em cima e congelamento de salários, o mesmo congelamento que sonegou aos Estados Unidos o crescimento do mercado interno.

            Bom, de 2006 para cá, Senador Cristovam, nós tivemos uma valorização do real de 40% e nós tivemos, de 2006 para cá, um aumento do volume de importação do País de 100%, e um aumento das nossas exportações de 5%.

            Por que essa balança não explodiu ainda? Ela não explodiu ainda por uma grande valorização das commodities, que são os grãos e os minérios que nós exportamos praticamente in natura. Nós estamos sendo contidos por isso, mas até quando essa valorização das commodities sustentará a economia brasileira?

            É uma pergunta que tem que ser respondida, enfrentada, porque é o prenúncio de uma crise anunciada. A inflação se dá no Brasil de uma forma quase que automática, por falta de investimentos em infraestrutura e investimentos na estrutura da indústria privada.

            Nós, a qualquer aumento da demanda, vemos o processo inflacionário se instalar por falta de resposta da estrutura produtiva do País. Essa resposta não existe e é agravada por uma inversão daquilo que o Raúl Prebisch dizia que era a valorização dos produtos de alta tecnologia e a desvalorização das commodities, que ocorre agora ao contrário, em virtude da crise internacional.

            Os produtos produzidos por países industrializados e de alta tecnologia, em função da crise, passam a ser baratos, e isso leva à destruição da indústria brasileira. Nós estamos num processo de primarização da economia, nós estamos nos transformando numa plantation.

            E, de repente, eu vejo toda uma euforia sobre o agronegócio, que é fantástico, é produção de alimento para o Brasil e para o mundo, mas que não pode ser a base exclusiva de um país que quer ser soberano. E essa soberania tem que se sustentar no mercado interno, na capacidade de consumo do seu próprio povo.

            Nós estamos entrando, sem a menor sombra de dúvida, numa entaladela. O Financial Times chamava a atenção, semana passada, para o endividamento da população brasileira, que, segundo ele, já é semelhante ou mais alto do que o endividamento da população norte-americana antes do estouro da bolsa, antes do estouro da crise, antes do desabamento da economia como que num castelo de cartas, uma após outra caindo.

            Quarenta por cento é o endividamento da família brasileira. Para cada R$100,00 de ingresso, temos comprometido R$40,00 em dívidas, e isso somando os salários e os benefícios do INSS.

            O nosso processo inflacionário é acelerado pelo empréstimo consignado, Senador Cristovam, não porque a massa de empréstimo consignado tenha um valor significativo, mas é que a rapidez com que ele é injetado na economia provoca a aceleração da inflação. E, ao contrário das receitas de todo o mundo hoje, nós estamos subindo os juros, congelando salários, não oxigenamos a nossa modernização industrial, não financiamos a produção e não estamos investindo, como deveríamos, em infraestrutura.

            Mas temos aí essa bobagem do trem-bala e, ao contrário do que deveríamos fazer, não estamos investindo em ferrovias, em infraestrutura, em financiamento na modernização e inovação de empresas brasileiras. Estamos nos colocando numa situação extremamente difícil. Por que, ao invés de subir o juro que leva o lucro dos bancos aos recordes do livro Guinness, não aumentamos o depósito do compulsório, que enxuga a economia da mesma forma e não proporciona os lucros fantásticos da banca privada?

            O Ipea fala em R$266 bilhões de arrecadação do spread para 22 mil famílias de rentistas no Brasil. Os bancos mandam no Banco Central, o Governo esboça algumas medidas no sentido certo, mas numa intensidade muito modesta.

            E nós estamos aqui perdendo tempo com a crise do Palocci, a crise do Pagot, a crise do Ministério dos Transportes, que seriam crises a ser resolvidas com a devida energia pela Presidenta da República, enquanto o Congresso Nacional deveria estar discutindo as medidas econômicas, para que o País não entre definitivamente na crise que se avizinha, que se anuncia. Ou tomamos as providências necessárias, ou, logo mais na frente, estaremos transformados numa economia primarizada, numa plantation, como aquelas plantations da Inglaterra na Índia e na África, sem evolução tecnológica, sem geração de empregos e absolutamente subordinados aos jogos do capital internacional.

            Senador Cristovam, mais uma vez, venho à tribuna para trazer esse alerta. Não que o Ministro Mantega não tenha tomado medidas na direção acertada, mas medidas extraordinariamente modestas, diante do vulto da crise que se avizinha. Acho que estamos perdendo tempo. Estamos parando, quando devíamos estar avançando. O mundo inteiro tem determinada política, e nós vemos os jornalões falarem na crise da Grécia. Não é da Grécia, Senador Cristovam. É a crise do modelo capitalista. E a crise da Grécia pode levar a Europa a uma crise maior. O euro está definitivamente comprometido, e nós estamos vendo esse silêncio absoluto em torno das discussões que são realmente substantivas, e perdemos tempo com questões adjetivas. De corrupção no Governo, confio e espero que a Presidenta resolva, embora eu não tenha simpatizado com essa história de colocar no lugar do Nascimento, depois de ele ter sido defenestrado, o Secretário Executivo do Ministério, que, por quatro vezes, foi Ministro também; e essa história do Pagot, de fica ou não fica, está afastado ou não está afastado, está em férias ou está demitido. A Presidente precisa de atitudes mais enérgicas e, se ela vier a tê-las, terá uma surpresa extremamente agradável, que é o apoio do Congresso Nacional.

            A Presidenta não pode ter uma leitura equivocada do Congresso Nacional. Evidente que existem lobbies. Mas, num processo freudiano, se a referência da firmeza e da seriedade vier da Presidência da República, eu tenho certeza absoluta que o Congresso acompanha.

            Senador Cristovam, eu lhe concedo um aparte.

            O Sr. Cristovam Buarque (Bloco/PDT - DF) - Senador Requião, esse é um dos discursos que, a meu ver, marcam o Senado. O senhor conseguiu fazer um discurso firme, político e didático, que é a finalidade também da TV Senado. O senhor conseguiu mostrar a origem, como gostam de dizer por aí os acadêmicos, a gênese da nossa crise. E, realmente, foi lá em 1944, quando o Acordo de Bretton Woods colocou o dólar como a moeda mundial. É como se cada um de nós imprimisse o dinheiro em casa e todo mundo aceitasse. Se você diz: “Eu vou usar o dinheiro que eu imprimo, mas eu lhe dou um pedacinho de ouro”, apesar de ser medieval, pelo menos tem um sentido. Mas esse não tinha nada a ver, não guardaram ouro necessário, e aí uns disseram: “Não vale mais esse acordo assinado em Bretton Woods”. E ficamos sem uma moeda que, de fato, tivesse uma lógica, até porque os Estados Unidos começaram a se transformar num país endividado. Quem é dono de uma moeda tem que ter crédito e não débito. Mas, se eu fosse escolher um título para essa sua fala, eu diria: “Até quando?”. Mais importante até do que a bem-feita história da origem da crise, são os seus alertas daqui para frente. Até quando a gente vai aguentar, como o senhor disse bem claramente, uma economia cuja balança de pagamento se baseia no preço de algumas poucas commodities? Até quando?

            O SR. ROBERTO REQUIÃO (Bloco/PMDB - PR) - Muito poucas.

            O Sr. Cristovam Buarque (Bloco/PDT - DF) - Muito poucas commodities. Acho que dá para contar, num número grande, com os dedos de uma mão, e aí acrescentar de lado um equipamento produzido, que não é commodity, que são os aviões da Embraer, que são frutos de uma escola de engenharia. Quando a China começar a produzir - e vai produzir soja na África, que é muito mais perto da China -, como é que vai ficar a nossa produção? Pois bem. Quando eles começarem a produzir outras coisas por aí, nós vamos ficar para trás, e muito para trás, e sem condições de reagir. Até quando é que a gente vai conseguir ter dólar sobrando graças ao fluxo de capital especulativo que entra aqui em busca dessa taxa de juros tão alta? Até quando? Porque manter a taxa de juros alta emperra; baixar a taxa de juros freia o fluxo. Vamos ter que resolver esse imbróglio. Até quando a gente vai resistir à taxa de juros tão elevada, mesmo que aquilo esteja pregando uma baixa artificial da taxa de juros, porque ela está ligada diretamente à necessidade de dólares que a gente não consegue exportando suficientemente para cobrir todos os nossos compromissos? Até quando - e o senhor tocou nisso - a gente vai resistir ao endividamento? E mais de um endividamento? Quando uma criança nasce no Brasil hoje, ela já deve dinheiro, porque os pais devem aos bancos; ela já deve dinheiro, porque os pais, do salário, já têm de pagar uma parte alta de impostos, já nasce devendo. Não é mais a dívida apenas da Nação brasileira, nós tivemos a dívida pública. Hoje é a dívida individualizada, personalizada do pobre que sofre, como aqueles que perderam suas casas nos Estados Unidos. Até quando a gente vai resistir à carga fiscal de 40%? E não estou propondo baixá-la, porque eu sei das consequências que teria, mas tem de resolver esse imbróglio. Não dá para continuar.

            O SR. ROBERTO REQUIÃO (Bloco/PMDB - PR) - É uma carga fiscal que não é dirigida ao desenvolvimento, à inovação, à infraestrutura, ao financiamento da iniciativa das empresas brasileiras. Serve única e exclusivamente para pagar os juros da dívida.

            O Sr. Cristovam Buarque (Bloco/PDT - DF) - Para pagar os juros da dívida quase tudo. Uma parte para pagar a dívida que a gente tem com os idosos desse País que pagaram a Previdência e a Previdência não consegue bancar e uma parte para pagar a dívida social dando algumas bolsas de assistência para que as famílias não passem fome. Essa é uma dívida que a gente está pagando aos pobres. Até quando a gente vai viver dessa dívida? É uma dívida que chamo porque a gente não fez o dever de casa há cinquenta senão não estava precisando gastar esse dinheiro com assistência social. Até quando a gente vai continuar com a incapacidade de inovação da economia brasileira? Nós produzimos só as commodities, como o senhor disse. Estamos transformando o Brasil em uma plantation como era o Brasil há quinhentos anos, com a cana, e acrescentando uma coisa mais nova - não chamei moderna - apenas nova, que são as montadoras de bens industriais. É capaz de haver montadoras de telefone, mas nada aqui da formulação, da inteligência, da formação, da criatividade, nada daqui, nem o desenho saiu do Brasil. Até quando a gente vai resistir sem inovação? Até quando é que a gente vai resistir sem capacidade de competição? Hoje quando a gente quer competir - e basta o senhor ver o jornal Folha de S.Paulo de ontem - tem que baixar subsídios, tem que dar incentivos fiscais, tem que demitir, tem que baixar salário. É o que ontem a Folha falava em um artigo sobre desindustrialização, como o senhor fala, comparando os preços dos automóveis brasileiros com os automóveis lá de fora. Em vez de a gente ter capacidade para inventar um carro novo que todo mundo quer comprar, como a Índia está fazendo agora com os carros elétricos, carros pequenos, a gente continua fabricando os mesmos carros desenhados lá fora. A única maneira de ter competitividade para baixar o preço é baixar o salário, é demitir, é dar incentivos fiscais, ou seja, tirar dinheiro dessa alta carga fiscal de um lado e colocar no outro. Essa não é a competitividade do futuro. Eu termino dizendo que, com isso, a gente está transformando o Brasil em uma grande plantation, produtora de bens primários e, ao lado disso, algumas fábricas de montagem, maquinadoras, como nos anos 70 se fez na América Central. Pois bem. Pois bem. Até quando? Voltando ao seu discurso. Essa frase foi sua “até quando?”. Até quando a gente vai fazer isso? Até quando? Até que derreta a economia como aconteceu nos Estados Unidos e como está acontecendo na Europa? Ou, antes disso? Até quando a gente vai agüentar? Até quando houver uma explosão da bolha. Ou até quando a gente conseguir esvaziar a bolha com competência. Essa é a pergunta que deixo como fruto do seu discurso. E um bom discurso e uma boa aula deixam perguntas também para que a gente fique refletindo. Até quando vamos continuar nessa dependência absurda que a economia brasileira tem hoje de fatores externos a ela?

            O SR. ROBERTO REQUIÃO (Bloco/PMDB - PR) - Quosque tandem, Catilina?

            Senador, um capital americano hoje está sendo remunerado praticamente com nada, alguma coisa nas letras do Tesouro norte-americano, e a dívida externa brasileira acabou sendo convertida em dívida interna.

            Como funciona esse mecanismo? O dólar, ou a moeda forte, entra no Banco Central, é convertida em real, e é aplicada na nossa economia a taxa selic de 12,25% ou nas debêntures que o Banco Central emite com valor maior. Nos Estados Unidos não ganhariam nada; aqui ganham.

            Agora, o que fazemos com esse dinheiro, Senador Cristovam?

            O Banco Central transforma isso em reserva cambial e aplica no quê? Aplica em letras do Tesouro norte-americano. Então, pagamos no mínimo 12,25%, que é o valor da taxa selic ou as emissões de debêntures num valor mais alto. E nós aplicamos em letra do Tesouro norte-americano, que deve estar hoje com rendimento real de 2% ou pouco mais de 2%, porque, se não fosse em letra do Tesouro, o juro dos Estados Unidos é negativo, para estimular crescimento da economia.

(O Sr. Presidente faz soar a campainha.)

            O SR. ROBERTO REQUIÃO (Bloco/PMDB - PR) - Imagine, perguntava-me um prefeito do Paraná o que aconteceria com o prefeito que tomasse dinheiro a 12,25% e aplicasse esse dinheiro a 2%. Iria para a cadeia. Mas é o que o Banco Central brasileiro faz. Toma, paga 12,25%, no mínimo, e aplica em letras do Tesouro norte-americano, que não rende absolutamente nada.

            Como V. Exª vê, Senador Cristovam, essas coisas não são discutidas pela nossa grande mídia. Nós estamos abafados, e resta a tribuna do Senado. Essa discussão senti iniciar-se na sessão de ontem, com a sua participação e a de outros Senadores que tomaram a palavra, como o Senador Pedro Simon. Eu acho que, dessa forma, podemos levantar o problema, mas nós estamos no adjetivo, Estamos nos perdendo com pequenos problemas, e o País está ameaçado por uma crise anunciada.

            Eu aproveito esses segundos que V. Exª me dá, Presidente Casildo, para dizer que quero levar essa discussão para frente, na Internet. A minha página é www.robertorequiao.com.br. E o meu twitter é @requiaopmdb. É uma forma racional, lógica e fácil de comunicação.

            Obrigado pelo tempo que me foi concedido.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 16/07/2011 - Página 30080