Discurso durante a 144ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Preocupação com a falta de políticas públicas eficazes voltadas para a recuperação do menor infrator.

Autor
Geovani Borges (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/AP)
Nome completo: Geovani Pinheiro Borges
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA SOCIAL.:
  • Preocupação com a falta de políticas públicas eficazes voltadas para a recuperação do menor infrator.
Publicação
Publicação no DSF de 25/08/2011 - Página 34397
Assunto
Outros > POLITICA SOCIAL.
Indexação
  • APREENSÃO, ORADOR, AUSENCIA, EFICIENCIA, POLITICAS PUBLICAS, GOVERNO FEDERAL, OBJETIVO, RECUPERAÇÃO, MENOR, NECESSIDADE, CONGRESSO NACIONAL, CONTRIBUIÇÃO, DEBATE, BUSCA, SOLUÇÃO, PROBLEMA.

            O SR. GEOVANI BORGES (Bloco/PMDB - AP. Para uma comunicação inadiável. Sem revisão do orador.) - Além de generosa, justa. Está bom assim? Melhorou?

            A SRª PRESIDENTE (Marinor Brito. PSOL - PA) - Elogios demais para o momento. Guardem o que vocês...

            O SR. GEOVANI BORGES (Bloco/PMDB - AP) - Srª Presidente, Senadora Marinor, lá do Estado do Pará, nosso vizinho, Srªs e Srs. Senadores, permitam-me fazer aqui breve registro acerca do tema que, na minha avaliação, fora acontecimento excepcional, deve ficar registrado como o mais impactante da semana pela complexidade, pela gravidade, pela desilusão e pelas previsões sombrias que anuncia.

            A semana nos traz as repercussões políticas da Líbia e as desventuras de seu ditador; a semana nos traz notícias de abalos sísmicos nos Estados Unidos; a semana nos entristece com os desdobramentos da morte da Juíza Patrícia Acioli; a semana nos coloca frente a frente com as demandas da política de reforma agrária em função do Movimento dos Sem-Terra.

            Enfim, acontecimentos não faltam.

            Mas eu ainda desejo insistir na tentativa em torno da ação daquelas sete crianças que invadiram um hotel na Vila Mariana, em São Paulo, e depois destruíram o Conselho Tutelar do bairro, completamente ensandecidas pelo efeito de drogas.

            As imagens falam por si. No pouco tempo em que ficaram contidas no Conselho Tutelar, aqueles meninos e meninas destruíram o que puderam, deixando um rastro pavoroso de vandalismo .

            Diante de policiais atônitos e de uma sociedade perplexa, tivemos uma demonstração gravíssima do rumo que a situação está tomando. Uma demonstração de como estamos sendo equivocados no tratamento que está ou que não está sendo dado à questão do menor infrator.

            Um dos adolescentes já havia sido apreendido mais de quinze vezes. Quinze vezes!

            Sr. Presidente, a realidade mostrada naquele bairro paulista não é diferente do que se vê em outras localidades brasileiras.

            Aqui, na capital do País, vimos esta semana o caos que se instalou no Centro de Atendimento Juvenil Especializado, o Caje, onde um adolescente que cumpria medida socioeducativa por roubo e furto foi enforcado pelos colegas.

            E, repito, também o caso de Brasília não é pior nem melhor que os das demais cidades. Mas, só para se ter uma ideia, lá nesse Cage, onde cabem sessenta internos estão amontoados quase quatrocentos. Não pode dar certo mesmo.

            Com muita frequência, aplaudo, elogio e mostro meu entusiasmo com os avanços que o Governo Federal tem conquistado na área social. Temos efetivamente tirado uma expressiva quantidade de famílias dos patamares da miséria para um nível melhor. Mas ainda é pouco. Ainda é muito pouco o que foi feito.

            Aquelas cenas dantescas de crianças de sete anos se atracando com policiais querem nos dizer alguma coisa. O grito está sendo ouvido por todos.

            Lamentavelmente, ainda estamos patinando nessa questão, ainda estamos de braços cruzados, ainda estamos esperando pelo pior, quando o pior já está aí.

            Além de jogá-los em celas nos Cajes da vida, o que mais estamos permitindo que se faça com esses menores infratores?

            Não há projeto político pedagógico para esses jovens. Não há projeto socioeducativo. Não há sequer projeto arquitetônico adequado para esses centros de recuperação infantil. Não há ensino técnico para esses meninos e meninas aprenderem uma profissão. As redes de internação de drogados - é preciso que se diga - estão completamente desaparelhadas e desestruturadas. Está tudo errado, senhores. É gente, não é bicho.

            Gente complicada, gente que ninguém quer, gente que dá medo, gente que fere e que mata, gente sem destino, gente a vagar... Mas é gente.

            Gente sem escola, sem banho, sem alimentação adequada, sem roupas, sem agasalhos, sem conscientização pessoal, sem qualificação para o trabalho, sem perspectiva de futuro... Mas é gente.

            São histórias complexas de vida e em absoluta situação de vulnerabilidade: são as vítimas do alcoolismo, da dependência química, dos abusos sexuais, da separação matrimonial, dos conflitos familiares, abandonados, pessoas desaparecidas da família, doentes mentais... Mas é gente.

            No Brasil, ao longo da história, demarcada pela criação de leis e decretos, a trajetória das políticas públicas voltadas para o adolescente infrator foi se constituindo de forma muito complexa.

            Uma hora a gente cria uma lei; outra hora essa lei não vale mais... Uma hora parece que a gente sabe aonde quer chegar; outra hora as políticas públicas voltadas para a infância e a adolescência parecem um barco à deriva...

            Os objetivos não são claros. Os executores das políticas não são claros. É uma falta de continuidade perturbadora...

            É verdade que esta Casa tem aberto diversas polêmicas referentes à redução da imputabilidade penal, inclusive com inúmeros projetos de lei em tramitação. Mas também é verdade que estamos correndo atrás do prejuízo porque lá fora a sociedade está acuada...

            O clima é de absoluta insegurança. A sociedade está cada vez mais assustada com o aumento da criminalidade e da violência. Isso tem gerado discussões calorosas, acirradas e radicais sobre as soluções para o problema. Então, há que se ter, antes de decisões possivelmente paliativas e equivocadas, uma visão mais ampla e profunda das características do adolescente infrator e do ato por ele cometido.

            Quais os limites? O que se pode e o que não se pode tolerar? O que um policial pode e o que não pode fazer? É um tatear no escuro...

            A cara de espanto dos policiais diante da selvageria daquelas crianças tão mirradas não me sai da cabeça. Por isso, Srª Presidente, quis fazer este pequeno registro, para que a semana não se conclua sem que cada um traga sua contribuição para o debate. Sem que aqueles que permanecerão nesta tribuna nos próximos meses e anos venham a público dizer o que acreditam ser o certo fazer.

            Por horas, aquelas crianças xingaram, espernearam, quebraram todas as instalações da pequena sala, mas elas já estão nas ruas de novo, e a gente pode supor como será o desdobramento desses comportamentos.

            É como iniciar um livro e já ter lido o final.

            Nossa palavra é de espanto. É de alerta. São Paulo, Brasília, meu querido Amapá, crianças daqui e de lá. Para elas, em favor delas, o nosso registro.

            Agradeço a V. Exª a generosidade de ter me concedido mais tempo.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 25/08/2011 - Página 34397