Discurso durante a 146ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Registro da necessidade de se adotar, a curto e a longo prazo, medidas de combate à criminalidade.

Autor
João Durval (PDT - Partido Democrático Trabalhista/BA)
Nome completo: João Durval Carneiro
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
SEGURANÇA PUBLICA.:
  • Registro da necessidade de se adotar, a curto e a longo prazo, medidas de combate à criminalidade.
Aparteantes
Cristovam Buarque, Paulo Paim.
Publicação
Publicação no DSF de 27/08/2011 - Página 35288
Assunto
Outros > SEGURANÇA PUBLICA.
Indexação
  • SOLICITAÇÃO, TRANSCRIÇÃO, ANAIS DO SENADO, DOCUMENTO, AUTORIA, DEFENSOR PUBLICO, ANALISE, PRECARIEDADE, SEGURANÇA PUBLICA, REPUDIO, HOMICIDIO, JUIZ, AMEAÇA, ESTADO DE DIREITO, NECESSIDADE, ESFORÇO, COMBATE, CRIME ORGANIZADO.

            O SR. JOÃO DURVAL (Bloco/PDT - BA. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srs. Senadores, Srªs Senadoras, o assassinato da Juíza Patrícia Acioli, há pouco mais de uma semana, em Niterói, no Rio de Janeiro, é um desses acontecimentos funestos que mancham de sangue as páginas da história do Brasil.

            Ela foi eliminada porque teve a coragem de cumprir o seu dever, o dever de aplicar penas ao pior tipo de criminoso que existe: o facínora que se esconde na pele da autoridade, o mau servidor público que se vale do poder a ele conferido pelo Estado para usar as armas e a violência a seu bel-prazer.

            Venho a esta tribuna, Sr. Presidente, fazer coro àqueles que me antecederam neste assunto, mas considero que ouvi poucas manifestações a esse respeito, provavelmente porque a tragédia deixou os palcos para se instalar corriqueira entre os cidadãos que circulam pelas ruas deste País.

            A morte, o sangue, as perdas, a violência, enfim, transformaram-se em situações comuns no dia a dia das pessoas e já não causam a catarse do público, que Aristóteles definiu como o objetivo maior da representação de uma tragédia no palco.

            Até quando, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, seremos espectadores passivos diante da inversão de valores que assola as nossas cidades, que invade as nossas casas e fere de morte instituições tão importantes quanto o Poder Judiciário?

            Trago a esta tribuna o grito desesperado dos que já não se conformam com esse estado de coisas, um alerta para que nós, políticos brasileiros, despertemos para a necessidade de tomar atitudes que façam o País voltar à normalidade.

            E tomo a liberdade de reproduzir aqui a constatação dura, nua e crua do meu amigo Dr. Sérgio Habib, um dos maiores criminalistas em atividade neste País e que, na semana passada, publicou um artigo iluminado no jornal A Tarde, da Bahia. Chocado com a morte da Juíza Patrícia Acioli, o nobre criminalista avalia que a onda de violência que invade as capitais brasileiras e que já chega ao interior gera intranquilidade e desassossego aos cidadãos. Ninguém mais se sente seguro, em casa, transitando pelas ruas, no trabalho ou simplesmente no lazer diário. O mais grave nessa constatação é que o crime organizado resolveu agora enfrentar o sistema judiciário. Essa ação atinge diretamente o Estado, já combalido, com o objetivo de desmoralizá-lo de vez. A ousadia dos criminosos nada mais é senão um recado direto aos governantes, um aviso aos que dirigem os destinos dessa imensa Nação, aos que comandam, aos que legislam, aos que investigam e aos que julgam, como se estivessem a dizer que eles não mais governam, não mais comandam.

            É gravíssimo, Sr. Presidente, Srs. Senadores, admitir que, quando se comparam as ações dos bandidos e as ações do Estado, esse último falha como agente de proteção da sociedade. Enquanto o crime se organizou, expandiu as suas forças, aumentou o seu poder de influência, recrutou novos adeptos, reforçou seus efetivos, adquiriu equipamentos sofisticados e modernizou o seu arsenal, enquanto fez tudo isso, o Estado recolheu e desarmou a população, sem que lhe oferecesse meios para se defender. O que nos surpreende é que, em vez de investir na polícia científica, investigativa e elucidativa, o Estado prefere o caminho mais fácil de comprar viaturas e construir delegacias, sem o equipamento necessário.

            Ao Estado cabe implantar programas sociais para não violência, em vez de elaborar leis que esvaziam os presídios. Devolvem-se às ruas homens que não pagaram por seus delitos, jogando-os à sanha de agredir a sociedade.

            Reconhecemos que não é mais possível conviver com esse sentimento de insegurança nacional, que a todos amedronta.

            É urgente adotar-se, a curto e a longo prazo, medidas para conter a criminalidade, para se debelar essa nefasta crise de segurança pública.

            A questão é urgente e prioritária.

            O ilustre criminalista afirma que a “falência do Estado na luta contra a criminalidade é patente. Os últimos acontecimentos revelam isso, sem sombra de dúvida”.

            A luta para mudar esse estado de coisas é de todos nós, mas principalmente do Estado democrático de direito. O que determina que a vitória será, por certo, da cidadania.

            Sr. Presidente, Srs. Senadores, ao atingir uma representante do Poder Judiciário, o crime organizado atinge a cidadania brasileira e nos atinge também.

            Por isso, questionamos: De que vale, afinal, possuirmos todas as belezas naturais do nosso Brasil, termos uma das maiores orlas marítimas do mundo, se não podemos desfrutar de sua paisagem sem o risco dês sermos assaltados ou mortos?

            De que vale termos parques, jardins, praças e avenidas, se não podemos frequentá-los, pois somos impedidos pelos agentes do crime?

            É preciso reagir urgentemente, com rapidez e com decisão. Não se pode admitir sequer a possibilidade de termos uma Nação inteira refém da criminalidade.

            Pelas palavras de alerta, pelo conhecimento da causa e pela absoluta relevância do tema, encaminho, Sr. Presidente, o artigo do Dr. Sérgio Habib, em sua íntegra, para inclusão nos Anais deste Senado Federal.

            Era o que tinha a dizer, Presidente.

            Muito obrigado.

            O Sr. Cristovam Buarque (Bloco/PDT - DF) - Permite-me um aparte, Senador?

            O SR. JOÃO DURVAL (Bloco/PDT - BA) - Pois não.

            O Sr. Cristovam Buarque (Bloco/PDT - DF) - Senador João Durval, em primeiro lugar, muito oportuno o seu discurso, mostrando a situação de uma verdadeira guerra civil que o Brasil vive; não essas guerras civis entre políticos, entre ideologias, mas da violência em geral. Mas eu queria agarrar uma parte do seu discurso que me toca muito, esta parte em que o senhor diz: de que vale... De que vale a pena beleza natural se a gente não pode ficar na praia olhando o nascer ou o pôr do sol? De que vale a beleza natural se a gente não pode contemplá-la? De que vale a riqueza de ter um carro se a gente tem que fazê-lo blindado e correndo o risco de ser assaltado em qualquer parada de trânsito, ou mesmo de ter um belo carro e ficar preso no congestionamento durante horas e horas para ir de um lugar a outro? De que vale a pena a gente ter uma bela casa se tem que colocar arame farpado e ficar ali dentro como prisioneiro, no luxo, mas como prisioneiro? Na verdade, essa sua pergunta remete-me a fazer uma reflexão: essa riqueza não é riqueza. A riqueza só seria riqueza se a riqueza natural pudesse ser contemplada; se a riqueza do carro pudesse ser usada sem medo; se a riqueza da casa pudesse ser usada sem risco de assalto. A riqueza só é riqueza quando ela é total, e nós estamos trabalhando com riquezinhas parciais. Cada uma delas termina demonstrando uma pobreza. Os ricos brasileiros têm muito dinheiro, mas eles vivem na pobreza do isolamento, do fechamento, do medo, do risco. A gente tem que mudar o conceito neste País e começar a dizer: país rico é um país que permite à pessoa viver bem, permite à pessoa ser feliz. Daí o slogan da Presidenta Dilma ser correto: “país rico é um país sem pobreza”. Mas não só isso, é um país sem violência, é um país em que você pode ter uma riqueza, um carro, mas usar o carro sem problema. É a riqueza total, e o nome certo seria bem-estar. Nós até fizemos do Brasil um País rico do ponto de vista da produção, somos a sétima economia do mundo, mas, se a gente fosse olhar do ponto de vista do bem-estar, em que posição a gente estaria? Eu acho que as Nações Unidas e os outros órgãos que calculam a ordem em que nós estamos no ranking da riqueza material e da produção não calculam a ordem em que estamos no da riqueza plena, completa, da riqueza do bem-estar. O seu discurso é importante, porque traz para nós a ideia de que tão importante - eu diria mais importante ainda - quanto a riqueza apenas de ter a beleza natural, de ter o carro, de ter a casa é a riqueza de poder usar isso. E essa riqueza passa pela segurança, passa pelo fim da violência, passa pelo fim do medo. Ninguém é rico com medo. Pode ter todos os bens do mundo, mas rico pleno não é se está com medo, assustado; aliás, assustado porque é rico em algumas coisas. Então, parabéns pelo seu discurso, que provoca a gente a pensar: o Brasil pode ser a 7ª economia do mundo, mas nós estamos muito longe do ponto de vista do bem-estar de nossa população. Nós somos, talvez, um dos países com menor bem-estar. Não diria o menor, porque um país em guerra, como a Líbia hoje, tem menos bem-estar que nós; a Somália, com a fome, tem menos bem-estar. Mas é capaz de ser uma falta de bem-estar provisório. Resolvida a guerra civil na Líbia, com o petróleo deles, eles podem retomar a tranquilidade e o bem-estar. Na Somália, se acabar a seca, é capaz de eles retomarem uma situação e não passarem fome. Porém, parece que não é tão provisória assim a nossa falta de bem-estar, sobretudo por causa do tema que o senhor escolheu para hoje que é a violência que domina as nossas cidades, corrói a vida da gente e faz com que até mesmo uma pessoa que se considere rica não se considere com bem-estar.

            O SR. JOÃO DURVAL (Bloco/PDT - BA) - Agradeço, meu caro colega, Senador Cristovam Buarque.

            O Sr. Paulo Paim (Bloco/PT - RS) - Senador João Durval, permite um aparte ao Senador Paim aqui?

            O SR. JOÃO DURVAL (Bloco/PDT - BA) - Pois não.

            O Sr. Paulo Paim (Bloco/PT - RS) - Senador João Durval, também cumprimento V. Exª por trazer esse tema à tribuna. V. Exª é feliz e lembra que outros Senadores falaram sobre a violência, referindo-se a essa questão específica do crime organizado que matou uma juíza no Rio de Janeiro. Eu disse também da tribuna que isso foi um tipo não da morte, mas de assassinato anunciado. Mais ou menos há um mês, antes de acontecer esse fato, nós fizemos uma audiência na Comissão de Direitos Humanos no dia em que os juízes decretaram greve em todo o País, por um dia, para pedir proteção, devido ao número de ameaças que eles estavam sofrendo. E eles diziam: juízes que estão na linha de frente contra o crime organizado serão assassinados. E foi exatamente o que aconteceu. E V. Exª agora, da tribuna, cobra medidas firmes e duras do Estado brasileiro. Eu dizia outro dia e repito: qualquer pesquisa que fizermos hoje, a população, na sua sabedoria, vai dizer: saúde, violência e educação. É aí que temos que avançar. E o Ministro José Eduardo Cardozo, da Justiça, ainda ontem dizia que para combater a violência é preciso agir na linha do que V. Exª está dizendo, neste momento, reforçando ele, a partir do Legislativo, aqui do nosso Senado, é investir em infraestrutura. Ele mesmo disse aqui, com muito conhecimento e sabedoria, porque é da área há anos, que a desarticulação entre Polícia Civil, Polícia Militar, Força Nacional, Forças Armadas e Polícia Rodoviária não tem ajudado nesse combate. É preciso que tenhamos todas as forças do Estado articuladas para combater o crime organizado. A impressão que nos passa - e V. Exª é feliz nesse aspecto - é de que eles estão mais organizados do que a própria sociedade civil e o Estado brasileiro. Por isso eu quero cumprimentar mais uma vez V. Exª e dizer que, a partir dessa audiência pública, o Senador Pedro Taques encaminhou um projeto de lei no sentido de dobrar a pena do crime cometido contra as autoridades do Judiciário. Eu acho que esse projeto tem que ser votado com rapidez nas duas Casas, para mostrar ao crime organizado que a gente não vai se intimidar e vai reagir. Questões como essa não podem acontecer. Por isso, Senador João Durval, aceite meus cumprimentos por trazer esse tema à tribuna. As vozes, aqui no Congresso e na sociedade, têm que continuar no mais alto som, exigindo que a sociedade brasileira se manifeste e trabalhe para que o crime organizado não passe a falar mais alto do que nós, intimidando aqueles que deveriam combatê-lo. Parabéns a V. Exª.

            O SR. JOÃO DURVAL (Bloco/PDT - BA) - Muito obrigado.

            A exemplo do aparte do Senador Cristovam Buarque, solicito ao Sr. Presidente que incorpore o aparte do Senador Paulo Paim ao meu discurso.

 

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DOCUMENTO A QUE SE REFERE O SR. SENADOR JOÃO DURVAL EM SEU PRONUNCIAMENTO.

(Inserido nos termos do art. 210, inciso I, §2º, do Regimento Interno.)

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            Matéria referida:

            “A Falência do Estado (Ou o caso da morte da magistrada)”


Este texto não substitui o publicado no DSF de 27/08/2011 - Página 35288