Discurso durante a 150ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Anúncio da apresentação, por S.Exa., de projeto de lei complementar que regulamenta a cobrança do imposto sobre grandes fortunas.

Autor
Antonio Carlos Valadares (PSB - Partido Socialista Brasileiro/SE)
Nome completo: Antonio Carlos Valadares
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
TRIBUTOS.:
  • Anúncio da apresentação, por S.Exa., de projeto de lei complementar que regulamenta a cobrança do imposto sobre grandes fortunas.
Aparteantes
Lídice da Mata.
Publicação
Publicação no DSF de 01/09/2011 - Página 35999
Assunto
Outros > TRIBUTOS.
Indexação
  • JUSTIFICAÇÃO, APRESENTAÇÃO, PROJETO DE LEI COMPLEMENTAR (PLP), REGULAMENTAÇÃO, IMPOSTOS, INCIDENCIA, CIDADÃO, CONCENTRAÇÃO, RIQUEZAS, NECESSIDADE, ESFORÇO, REFORMA TRIBUTARIA, COMBATE, INJUSTIÇA, DESIGUALDADE SOCIAL.

            O SR. ANTONIO CARLOS VALADARES (Bloco/PSB - SE. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Srª Presidenta Marta Suplicy, Srªs e Srs. Senadores, o crescimento econômico do Brasil, nos últimos anos, associado a programas de transferência de renda, propiciou ascensão social de amplas camadas da população à classe média.

            É uma conquista digna de aplausos e internacionalmente reconhecida, mas que está ainda longe de erradicar a pobreza entre nós e promover, no sentido amplo do termo, a justiça social.

            Temos ainda a carga tributária mais alta dos países emergentes. Uma carga não só pesada como injusta, que corresponde a 36% do PIB e penaliza os mais pobres e beneficia os mais ricos. Incentiva a acumulação e concentração de renda, aprofundando o abismo entre pobres e ricos.

            Os números quanto a isso não deixam dúvida: os 10% mais ricos concentram 75% da riqueza do nosso País. É um dado eloquente que dispensa adjetivos.

            Pesquisa recente elaborada pelo Ipea mostra que o quadro de desigualdade continua ainda existindo, porque, entre outras coisas, os pobres pagam mais impostos que os ricos. Os pobres pagam mais impostos do que os ricos!

            Essa pesquisa do Ipea mostra que os 10% mais pobres do País comprometem 33% de tudo que ganham com o pagamento de impostos, enquanto que os 10% mais ricos pagam 23% em impostos. Um diferencial a favor dos ricos de dez pontos percentuais.

            Trata-se de uma lógica tributária perversa, que não foi construída agora e que precisa ser invertida. Temos um sistema pelo avesso: regressivo e não progressivo, como deveria ser. Quem ganha mais paga menos, e quem ganha menos paga mais impostos.

            Temos que trabalhar um novo modelo para inversão dessa lógica absurda, que não apenas acentua as desigualdades sociais em termos de educação, saúde, habitação, transporte e segurança; como semeia revolta na população e consagra uma imoralidade tributária.

            É, por exemplo, o que ocorre com o ICMS, um imposto indireto, que incide sobre produtos e serviços, em que os ricos levam vantagem, pagando menos impostos. Os números da pesquisa do Ipea mostram que o ICMS, o PIS/Cofins, são os principais indutores dessa desigualdade. Os pobres pagam, proporcionalmente - segundo o Ipea -, três vezes mais ICMS do que os ricos. Enquanto os ricos desembolsam em média 5,7%, os pobres pagam 16% no mesmo imposto.

            Para atenuar esse quadro, cuja solução depende de uma reforma tributária ampla, estou dando entrado hoje num projeto de lei complementar que regulamenta a cobrança do imposto sobre as grandes fortunas.

            Outros Senadores e Deputados já fizeram tentativa igual, a começar pelo ex-Senador e depois Presidente da República, Fernando Henrique Cardoso. Paulo Paim, Serys Slhessarenko e alguns Deputados Federais. Mas essas propostas não chegaram, até hoje, a nenhuma definição e não tiveram êxito.

            Entretanto, Sr. Presidente, esse imposto, apesar de ainda não ter sido regulamentado, é previsto no art. 153, inciso VII, da Constituição Federal, mas até hoje não foi instituído no nosso ordenamento jurídico.

            É utilizado em diversos países, como França e Suíça, com o objetivo de tornar o sistema tributário mais justo, com incidência de um tributo que atinja os mais afortunados. Na França, por exemplo, surgiu em 1982, foi extinto em 1987 e recriado em 1989. Lá, representa uma arrecadação anual em torno de €4,5 bilhões anuais. Aqui, calcula-se que poderíamos arrecadar entre R$3 e R$5 bilhões.

            A Constituição de 1988 inovou o sistema tributário, entre outros aspectos, delegando a competência para instituir imposto sobre grandes fortunas, em moldes a serem definidos por lei complementar. O constituinte foi impositivo com a delimitação desse imposto sobre a grande fortuna e não sobre a fortuna em geral.

            Não se trata de iniciativa, Srª Presidenta, preconceituosa contra os mais ricos. Além de justo e necessário, é um imperativo constitucional que até agora não foi regulamentado. Várias tentativas, como falei, já foram feitas por Deputados, Senadores, mas sem qualquer êxito.

            Volto a fazê-lo por uma razão objetiva. Senti entusiasmo por parte da Presidenta Dilma para que se cumpra a Constituição. E não apenas levo em conta - e estou certo de que o Senado também o fará - o que se passa neste momento nos Estados Unidos e na França, em que os donos de grandes fortunas, como o megaempresário Warren Buffett, pedem eles próprios a cobrança de impostos especificamente para os seus ganhos.

            Repito: os ricos, lá fora, estão pedindo para pagar mais impostos, naturalmente porque eles reconhecem que, se o desemprego se alastra pela Europa, pelos Estados Unidos, e há uma desigualdade que se acentua a cada ano, esses próprios ricos poderão ser as vítimas da revolta popular que pode surgir, como surgiram em épocas de um passado não muito longínquo.

            A Srª Lídice da Mata (Bloco/PSB - BA) - Senador Valadares, quando possível, solicito-lhe um aparte.

            O SR. ANTONIO CARLOS VALADARES (Bloco/PSB - SE) - Com muito prazer, Senadora Lídice da Mata.

            Se lá, onde os desequilíbrios sociais são menores, começa a haver essa conscientização, por que não aqui, onde as disparidades são bem mais avantajadas, são bem maiores?

            Em tais circunstâncias, penso que o ambiente está mais propício à reapresentação dessa proposta, que será reavaliada tendo em vista as mudanças que ocorrem não apenas na economia brasileira, mas na mundial. Mudanças, sobretudo, de mentalidade.

            O Senado Federal não pode ficar indiferente a essa nova realidade.

            Os recursos advindos do Imposto sobre Grandes Fortunas, nos termos que proponho, serão direcionados para áreas prioritárias, como quer a Presidenta Dilma. Áreas prioritárias como o SUS, de cujo funcionamento dependem mais de 130 milhões de brasileiros que não podem pagar planos de saúde e recebem tratamento abjeto nos hospitais públicos.

            Taxar as grandes fortunas não é apenas criar mais um imposto ou elevar a carga tributária simplesmente. Significa corrigir iniquidades como as da saúde, da educação, da segurança pública, que impõem um estado crônico de injustiça social para que já não é possível fechar os olhos.

            Creio que o País está maduro para essa discussão, que deve envolver a sociedade e os movimentos sociais, tendo o Congresso como indutor desse debate.

            Não se trata, repito, de medida persecutória, de teor preconceituoso que estimule vingança social. Pelo contrário, ao promover justiça tributária, que está prevista em nossa Constituição, essa proposta reduz o ambiente de hostilidade social e contribui para harmonizar o País.

            Uma coisa é certa: não se chega ao Primeiro Mundo com o povo do lado de fora. Se pretendemos promover de fato a inclusão social - e não tenho dúvida de que esse é o objetivo da Presidente Dilma, como foi do Presidente Lula -, precisamos corrigir a injustiça tributária. É apenas um começo, um passo modesto, mas significativo, que representará um alento à população e a certeza de que se busca de fato resgatar a promissória social.

            Com muito prazer, concedo um aparte à nobre companheira do PSB, do Estado da Bahia, Senadora Lídice da Mata.

            A Srª Lídice da Mata (Bloco/PSB - BA) - Caro Senador Valadares, nobre Líder do nosso Partido, quero parabenizá-lo por sua importante iniciativa, neste momento em que o Brasil inteiro discute o enfrentamento, o acompanhamento da crise internacional da economia. E V. Exª, dedicado que sempre foi às causas sociais, busca encontrar caminhos que possam financiar essas políticas públicas e criar uma justiça social maior em nosso País. Retoma a discussão sobre a taxação das grandes fortunas. Como V. Exª mesmo destacou, uma discussão hoje internacional, que já foi colocada em alguns países por iniciativa dos próprios milionários, grandes ricos, que, diante da crise internacional, buscam saídas, buscam se colocar contribuindo com o sacrifício daquela nação. É, portanto, meritório que V. Exª traga novamente à discussão essa tese, na tarde de hoje, no Senado. Que possa fazê-lo com a determinação e a competência que tem como Senador da República brasileira, representante do Estado de Sergipe, e com a contribuição de ter participado do Conselho Político da Presidente Dilma, de ter colocado essa posição junto à Presidente, de ter testado essa posição junto aos seus Pares aqui na Casa, antes de apresentá-la em plenário. Certamente, por tudo isso, receberá o apoio deste Senado Federal. Associo-me à sua luta, neste momento, e dizer que o nosso Partido, com certeza, estará unido nessa batalha.

            O SR. ANTONIO CARLOS VALADARES (Bloco/PSB - SE) - Senadora Lídice da Mata, agradeço a V. Exª.

            Quero registrar que, quando se discute lá na Câmara dos Deputados a regulamentação da Emenda nº 29, para efetuar controles de distribuição e aplicação dos recursos oriundos da Nação, dos Estados e dos Municípios, uma das primeiras preocupações da Presidenta Dilma é alertar, não só o Congresso Nacional, a Câmara dos Deputados e o Senado, mas toda a Nação, de que a regulamentação é bem-vinda, mas será um presente de grego se não vier acompanhada de um reforço financeiro, de uma nova fonte para o financiamento da saúde.

            Estou apresentando - logicamente que Deputados e Senadores podem ter outras idéias - o que disse lá na reunião do Conselho Político realizada nessa segunda-feira: uma proposta consentânea com os ditames constitucionais, com aquilo que o constituinte de 1988 previu: a cobrança de uma taxa especial acrescida sobre as grandes fortunas do Brasil.

            É um reforço, sem dúvida alguma, importante, é um aporte financeiro, caso essa medida seja aprovada, no sentido de oferecer ao Governo federal mais uma alternativa, além das já previstas no nosso orçamento, para fortalecer o Sistema Único de Saúde, que precisa, urgentemente, do apoio governamental e do apoio do Congresso Nacional, para efetuar, para promover uma saúde universal, uma saúde gratuita e uma saúde de boa qualidade, porque, afinal de contas, é o dinheiro do povo que está sendo aplicado em setor tão sensível da população brasileira.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 01/09/2011 - Página 35999