Discurso durante a 157ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Comemoração dos 109 anos de nascimento do ex-Presidente da República Juscelino Kubitschek de Oliveira (JK).

Autor
Rodrigo Rollemberg (PSB - Partido Socialista Brasileiro/DF)
Nome completo: Rodrigo Sobral Rollemberg
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
HOMENAGEM.:
  • Comemoração dos 109 anos de nascimento do ex-Presidente da República Juscelino Kubitschek de Oliveira (JK).
Publicação
Publicação no DSF de 13/09/2011 - Página 37042
Assunto
Outros > HOMENAGEM.
Indexação
  • HOMENAGEM, ANIVERSARIO DE NASCIMENTO, JUSCELINO KUBITSCHEK DE OLIVEIRA, EX PRESIDENTE DA REPUBLICA.

            O SR. RODRIGO ROLLEMBERG (Bloco/PSB - DF. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Exmª Srª Senadora Vanessa Grazziotin, Presidenta desta sessão, prezada Srª Anna Christina Kubitschek, neta do nosso homenageado e aqui representando a família do nosso Presidente Juscelino Kubitschek, Exmº Sr. Branislav Hitka, Embaixador da República Eslovaca, Exmº Sr. Paulo Octávio, Senador da República, Srªs Senadoras, Srs. Senadores, visitantes que nos honram com suas presenças, telespectadores que nos assistem pela TV Senado e que nos ouvem pela Rádio Senado, quero aqui, de forma muito especial, agradecer a colaboração do Coral do Senado, que nos brindou com o Hino Nacional e com a música tão querida e tão simbólica para Brasília, Peixe Vivo.

            Srª Presidente, Srªs e Srs. Senadores, para todos os que verdadeiramente amam o Brasil e sonham com uma pátria livre, próspera e democrática, o dia 12 de setembro deveria estar inscrito no calendário cívico nacional. Trata-se da data de nascimento daquele que foi, sem favor algum, o mais eloquente exemplo de estadista que nosso País conheceu: Juscelino Kubitschek de Oliveira. Eis a razão pela qual, com muita honra, requeri esta homenagem do Senado Federal em memória de quem, ao longo de uma trajetória pública ímpar, que culminou na Presidência da República, foi fundamental para que nos redimíssemos do atraso, da mentalidade tacanha e do medo de construir nossa própria história.

            Seja sob o ponto de vista da vida pessoal, seja como protagonista da cena política, Juscelino é exemplo que ilumina. Em primeiro lugar, pelo fato de ter aprendido, desde muito cedo, o valor da perseverança, do esforço ilimitado e da força de vontade para superar as dificuldades. Nascido de família humilde, na velha Diamantina de Minas Gerais, criança ainda, viu-se órfão de pai. Sob a liderança inconteste de sua mãe, Dona Júlia, cuja fortaleza moral foi o permanente sustentáculo da família, o menino “Nonô” buscou na educação o caminho que o levaria a uma vida melhor.

            E aqui, registro, com muita alegria, a presença do Coronel Affonso Heliodoro, grande brasiliense.

            Impossibilitado de pagar pelos estudos, numa época em que a rede pública de escolas era por demais reduzida e essencialmente voltada para o curso primário, Juscelino não teve alternativa senão entrar para um seminário, ainda que a vocação para a vida religiosa jamais tivesse nele se manifestado. Foi assim que, em plena mocidade, chega à capital do Estado para fazer o curso de seus sonhos, a Medicina. Sonho aparentemente impossível para quem, naquele tempo, vinha de família relativamente desprovida de recursos materiais.

            Juscelino não esmoreceu. Como outros jovens de situação parecida, como aquele que viria a ser um de seus mais diletos companheiros na vida pública, José Maria Alckmin, foi trabalhar arduamente para garantir o sustento em Belo Horizonte. Concluído o curso, não se contentou com o diploma de graduação. O próximo passo seria Paris, para onde se dirigiu a fim de se especializar em urologia.

            À margem da vida acadêmica, Juscelino teria uma experiência que marcaria sua vida em todos os sentidos: o encontro com a jovem Sarah, de família com larga tradição política no Estado. Pelos braços dela, entra em contato com um universo diferente daquele com o qual sempre convivera. Casam-se e, a par da carreira médica vitoriosa, Juscelino acaba se enredando pelos encantos da política.

            Começa, então, Srª Presidente, a outra vertente da vida de Juscelino, justamente a que o consagraria e faria dele um dos brasileiros mais conhecidos, respeitados e amados por seus concidadãos. Em plena Era Vargas - período em que, a despeito do visceral autoritarismo do Estado Novo, o Brasil começava a se modernizar, lançando as bases de sua industrialização -, o jovem médico assume seu primeiro cargo público de relevância. Sob as bênçãos do todo-poderoso Governador Benedito Valadares, toma posse como Prefeito de Belo Horizonte.

            É exatamente na Prefeitura da capital mineira, Srª Presidente, Srªs e Srs. Senadores, que se revela a verdadeira vocação de JK. Movido por um dinamismo sem igual, por invejável capacidade de trabalho e - atenção! - pela perfeita identificação com o espírito de modernidade, ele revoluciona os métodos administrativos vigentes. Belo Horizonte se transforma num canteiro de obras. Numa decisão histórica, resolve fazer de uma região abandonada e distante do perímetro urbano a vitrine de uma nova concepção de urbanismo. Nascia, assim, a hoje célebre Pampulha e, com ela, a moderna arquitetura brasileira. O então jovem arquiteto Oscar Niemeyer ali começava, efetivamente, sua vitoriosa carreira, fadada ao reconhecimento e à admiração pelo mundo afora.

            Esse mesmo dinamismo JK emprestou ao Governo de Minas Gerais, para o qual foi eleito, no mesmo contexto em que Getúlio Vargas voltava à Presidência da República, agora pelo voto direto. Colocando em prática as ideias que o consagrariam mais tarde como Presidente, JK transformou radicalmente a realidade estadual. Com ele, um Estado tradicionalmente vinculado à agropecuária reorientava sua economia no sentido da industrialização. Para tanto, sua administração privilegiou, como nunca ocorrera, investimentos em infraestrutura, a começar pela geração de energia.

            A imagem do administrador público comprometido com o desenvolvimento logo ultrapassou as fronteiras de Minas. Ancorado no maior partido então existente, o PSD, embora não enquadrado no figurino demasiado conservador da agremiação, JK foi alçado à natural condição de candidato à Presidência da República nas eleições de 1955. Foram terríveis as dificuldades que teve de enfrentar.

            Em primeiro lugar, ele teve de vencer resistências internas para se candidatar. Velhas raposas pessedistas teimavam em não abrir passagem para uma candidatura moderna demais para seus padrões. Vencida a primeira etapa, o desafio era estabelecer alianças confiáveis em meio ao pesadíssimo clima político que se seguiu ao suicídio de Vargas, ocorrido em agosto do ano anterior.

            A aliança, como seria natural, se fez com o PTB, ponta de lança do trabalhismo getulista. Uma jovem liderança trabalhista - gaúcho, herdeiro político de Vargas - foi lançada à vice-Presidência: era João Goulart, o Jango. Isso foi o bastante para que se incendiasse o paiol oposicionista da UDN.

            Derrotada pelo voto do povo, a oposição, capitaneada pela UDN de Carlos Lacerda, escancara o projeto golpista que sempre acalentara, agora com o intuito de impedir a posse dos eleitos. A frase pronunciada por JK, “Deus poupou-me o sentimento do medo”, deu o tom de seu caráter e transformou-se na senha que uniria os legalistas. Graças à ação do Marechal Lott, a legalidade foi respeitada e, a 31 de janeiro de 1956, Juscelino assumia a Presidência da República.

            Começava, então, Srª Presidenta, a mais extraordinária experiência administrativa que o Brasil conhecera. Pela primeira vez na história, um governo se iniciava sob a égide do planejamento. Com o seu Plano de Metas, consubstanciado no lema dos “50 anos em 5”, JK imprimia um dinamismo até então desconhecido na máquina administrativa do País. Inteligentemente, manteve a estrutura ministerial existente, até mesmo como forma de acomodar interesses políticos diversos, mas fez questão de criar os “Grupos Executivos”, compostos por quadros técnicos de reconhecida competência e cuja atuação se fez à margem das tradicionais injunções políticas.

            Foi assim, Srª Presidenta, Srªs e Srs. Senadores, que o Brasil deu o grande salto de que carecia para efetivamente modernizar-se, integrar-se à economia global contemporânea. Investiu maciçamente em infraestrutura e optou pela instalação da indústria automobilística no País, justamente pelo caráter abrangente e multiplicador dessa atividade, que requer dezenas e dezenas de fábricas para atender às suas demandas.

            Enfatizo, todavia, que o grande feito de JK foi ter incutido na alma brasileira a confiança em si mesma. Inundou-se o País com a mensagem de transformação plena, tudo se encaminhando para a conquista da modernidade. Na cultura, Bossa Nova e Cinema Novo, surgidos nesse contexto, explicitavam o sentimento criador que tomava conta do Brasil.

            Mas, acima de tudo, Srª Presidente, há que destacar aquele que foi, em minha opinião, o maior legado dos anos JK. Refiro-me à decisão histórica, de cujos frutos todos nós hoje usufruímos, de promover a interiorização do desenvolvimento nacional. Nessa perspectiva, na condição de meta-síntese de seu Governo, Juscelino materializou o sonho acalentado por tantos e por tanto tempo de transferir a sede do poder político brasileiro parra o interior do Brasil.

            Brasília é, pois, muito mais do que uma bela cidade, verdade que o mundo reconhece e que a Unesco identifica como Patrimônio da Humanidade. Brasília tem, assim, um significado histórico que em muito transcende a estética revolucionária da arquitetura de Niemeyer ou a proposta urbanística arrojada e singular de Lúcio Costa. Brasília foi e é a ponta de lança do processo de encontro do Brasil consigo mesmo e da tradição litorânea com o País profundo que permanecia praticamente desconhecido.

            Talvez o exemplo mais evidente do papel representado pela nova capital, plantada no coração do Planalto Central, seja a abertura da Rodovia Belém-Brasília, que, rasgando a densa floresta, tornou irreversível e definitiva a incorporação do Norte e do Centro-Oeste ao restante do País. Isso sem falar na expansão da fronteira agrícola brasileira e na montagem de novos polos industriais nessas regiões.

            Uma obra administrativa da magnitude da que foi empreendida por JK, entre janeiro de 1956 e janeiro de 1961, só seria possível porque, à frente dela, estava um homem público vocacionado para o desenvolvimento e visceralmente comprometido com a democracia. Eis a enorme diferença, Srª Presidenta: muitas ditaduras conseguem obter expressivos resultados econômicos, inclusive com alguma facilidade. O difícil é fazê-lo dentro do mais absoluto respeito às normas democráticas. Foi o que Juscelino fez.

            Aqui, aproveito para observar que, quando JK planejou Brasília, pensou a cidade para um novo Brasil, mais humano e com menos desequilíbrio. Compete a nós um olhar sobre o interior das cidades que se situam nos arredores das grandes metrópoles. Refiro-me, de modo especial, ao Entorno de Brasília, realidade sobre a qual terei a oportunidade, em pronunciamento próprio, de expressar e sugerir medidas, inclusive legislativas, objetivando auxiliar na conclusão do ideal sonhado por JK.

            Quero registrar também a tolerância, palavra-chave a definir a personalidade de JK. Afável no trato, extremamente simpático e a esbanjar otimismo, ele notabilizou-se pelo respeito ao contrário e na aceitação plena do outro. Ante uma oposição ensandecida, personificada na UDN, que o acusava de tudo, a começar por corrupção, tomava a iniciativa de convidar alguém desse partido para exercer função de comanda na construção de Brasília. Em jogada de extrema transparência e de extrema habilidade, JK nomeou um udenista, o Deputado Íris Maeinberg, na fiscalização das finanças da construção de Brasília. Nada melhor para desarmar uma feroz oposição. Como resposta às tentativas golpistas de determinados setores da Aeronáutica, como se viu nos episódios de Aragarças e Jacareacanga, ofereceu as mãos estendidas e o benefício da anistia.

            Esse foi o JK que aprendemos a admirar e a amar. Um JK que, desgraçadamente, foi ofendido e vilipendiado em sua honra pelo regime discricionário instaurado no País em 1964. Eleito Senador por Goiás, teve seu mandato cassado e os direitos políticos suspensos logo no alvorecer da ditadura militar. Impedido pela força do arbítrio de voltar à Presidência, como seria natural em 1965, morreu sem reassumir seu lugar na vida pública brasileira.

            Contudo, e este é o prêmio que a História reserva apenas às grandes figuras, permanece vivo na memória dos brasileiros e, especialmente, dos brasilienses. Vivo, respeitado e amado. Esta singela homenagem que lhe prestamos neste momento integra o sentimento majoritário presente na população brasileira de que JK foi o nosso maior estadista.

            Que aprendamos com ele! Que sejamos dignos de seu legado!

            Muito obrigado. (Palmas.)


Este texto não substitui o publicado no DSF de 13/09/2011 - Página 37042