Discurso durante a 157ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Satisfação com a proposição da Procuradoria-Geral de República de Ação Direta de Inconstitucionalidade sobre o Regime Diferenciado de Contratações Públicas para a Copa do Mundo de 2014 e Jogos Olímpicos de 2016.

Autor
Ana Amélia (PP - Progressistas/RS)
Nome completo: Ana Amélia de Lemos
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
ESPORTE.:
  • Satisfação com a proposição da Procuradoria-Geral de República de Ação Direta de Inconstitucionalidade sobre o Regime Diferenciado de Contratações Públicas para a Copa do Mundo de 2014 e Jogos Olímpicos de 2016.
Aparteantes
Mozarildo Cavalcanti.
Publicação
Publicação no DSF de 13/09/2011 - Página 37078
Assunto
Outros > ESPORTE.
Indexação
  • CUMPRIMENTO, DECISÃO, PROCURADOR GERAL DA REPUBLICA, ENTRADA, AÇÃO DIRETA, INCONSTITUCIONALIDADE, MEDIDA PROVISORIA (MPV), CRIAÇÃO, REGIME ESPECIAL, CONTRATAÇÃO, OBRAS, CAMPEONATO MUNDIAL, FUTEBOL, OLIMPIADAS, IMPORTANCIA, IMPEDIMENTO, DESCUMPRIMENTO, LEGISLAÇÃO, LICITAÇÃO.

            A SRª ANA AMÉLIA (Bloco/PP - RS. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão da oradora.) - Caro Presidente Anibal Diniz, Senadores, telespectadores da TV Senado, passei um fim de semana muito alegre, embora tenha trabalhado muito em meu Estado, o Rio Grande do Sul, desde a abertura oficial da Expointer, com a presença da Presidenta Dilma Rousseff, com a presença do Ministro da Agricultura Mendes Ribeiro Filho e da Presidente da CNA, a nossa colega Kátia Abreu e de autoridades, como o Governador de Santa Catarina, Raimundo Colombo e, é claro, do anfitrião, Governador Tarso Genro.

            Mas a minha alegria aumentou ainda muito mais, Sr. Presidente, Srs. Senadores, quando o Procurador-Geral da República decidiu entrar com uma ação direta de inconstitucionalidade contra a lei que criou o Regime Diferenciado de Contratações Públicas para a realização de obras da Copa do Mundo de 2014 e das Olimpíadas, no Rio de Janeiro, em 2016. Essa lei foi aprovada por esta Casa na forma da Medida Provisória nº 527, em julho passado, e, na prática, flexibiliza a Lei nº 8.666, conhecida como Lei de Licitações.

            Aqui presto homenagem ao ex-Ministro Luis Roberto Ponte, autor dessa lei, que ficou extremamente preocupado com o alcance e com a falta de democracia no processo desse chamado Regime Diferenciado de Contratações Públicas.

            Na ação direta de inconstitucionalidade, que levou o número 4.655, o Procurador-Geral da República, Roberto Gurgel, solicita a concessão de liminar para suspender a eficácia da norma até o julgamento definitivo da ação, baseado em dois argumentos: o mérito da lei, que põe em risco o patrimônio público, e a segurança jurídica, que precisa ser concedida à realização das obras para que tudo esteja pronto no prazo adequado.

            Essa ação direta de inconstitucionalidade foi distribuída ao Ministro Luiz Fux, a quem também foi confiada a missão de relatar outra ação direta de inconstitucionalidade, interposta pelo PSDB, pelo Democratas e pelo PPS, pelas mesmas razões.

            Srªs e Srs. Senadores, os motivos que levaram o Procurador-Geral da República a questionar a constitucionalidade dessa lei foram os mesmos que me fizeram votar contrariamente a essa matéria neste mesmo plenário. O primeiro motivo diz respeito à constitucionalidade da medida provisória que chegou ao Senado Federal. Muito temos combatido o excesso do envio dessas medidas provisórias pelo Poder Executivo, Senador Mozarildo, o curto prazo que é concedido para que nos dediquemos à discussão dessas matérias e a inclusão de assuntos diversos, misturados, coisas completamente diferentes em uma mesma medida.

            A Medida Provisória nº 527 foi um exemplo típico das falhas desse poderoso instrumento usado pelo Poder Executivo. Enviada ao Congresso Nacional pela Presidência da República no dia 18 de março, tratava, inicialmente, de promover a criação da Secretaria Nacional de Aviação Civil e fazer modificações na Anac e também na Infraero.

            Mas, durante a tramitação dessa medida provisória na Câmara dos Deputados, foi incluída na medida provisória a criação do Regime Diferenciado de Contratações Públicas, chamado RDC, para as obras da Copa do Mundo, em 2014, e também das Olimpíadas, em 2016, no Rio de Janeiro.

            Competente e responsavelmente, o Procurador Roberto Gurgel afirma que a inclusão de matéria estranha à tratada na medida provisória viola o devido processo legislativo e o princípio da separação dos poderes, já que as MPs são de iniciativa exclusiva do Presidente da República.

            Mas esse é apenas um dos motivos elencados pelo Procurador para denunciar a inconstitucionalidade dessa lei. Os motivos que tratam dos riscos ao Erário são, da mesma forma, muito contundentes.

            Ao longo dessa ação direta de inconstitucionalidade, que tem 35 páginas, o Procurador-Geral afirma que os dispositivos da Lei 12.462, de 2011, que tratam do RDC, o Regime Diferenciado de Contratações, são inconstitucionais porque ferem os balizamentos que, necessariamente, devem ser observados pelas normas infraconstitucionais que regulam as licitações e os contratos administrativos no País.

            No texto, o Procurador Gurgel lembra que, de acordo com o inciso XXI do art. 37 da Constituição Federal, ressalvados os casos especificados na legislação, as obras, serviços, compras e alienações serão contratados mediante processo de licitação pública que assegure igualdade de condições a todos os concorrentes.

            Segundo ele, essa regra é infringida pela Lei 12.462, deste ano, porque a norma não fixa parâmetros mínimos para identificar as obras, os serviços e as compras que deverão ser realizados por meio do RDC. Ou seja, a lei não estabelece os parâmetros que tornam uma obra necessária aos eventos.

            Afinal de contas, o que é uma “obra da Copa”? O Brasil possui inúmeras deficiências logísticas que precisam ser sanadas, independente da realização de eventos dessa natureza e, também, dessa envergadura. Não podemos esquecer que a Copa do Mundo Fifa e os Jogos Olímpicos terão a duração de um mês cada um, enquanto as obras serão utilizadas por todos os brasileiros durante décadas.

            Srªs e Srs. Senadores, telespectadores da TV Senado e ouvintes da rádio Senado, em pronunciamentos anteriores, elenquei os principais pontos negativos da medida provisória que agora se tornou lei e que são contrários aos princípios da legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência que devem nortear a Administração Pública.

            Tornar sigilosos os orçamentos das obras, permitir a contratação integrada do projeto e da obra por uma mesma empreiteira e criar o instrumento da remuneração variável para o cumprimento de prazos e padrões é abrir precedente gravíssimo para o descumprimento desses princípios e abrir ou escancarar uma porta à corrupção.

            É compreensível que o Governo empreenda esforços para a realização das obras, procurando conceder agilidade à sua realização. Mas não podemos retroceder de maneira alguma. A Lei de Licitações foi concebida para conter um dos principais problemas históricos do nosso País e com o qual hoje estamos convivendo dramaticamente, esta grande praga: a corrupção e o desvio de dinheiro na realização de obras públicas.

            Abrir precedentes para o descumprimento da Lei 8.666 é abrir brechas para a má utilização do dinheiro público. Atualmente, quase a totalidade das demandas judiciais nas licitações acontece quando estas são desenhadas de modo a privilegiar alguma empresa. Se quisermos que as obras da Copa e das Olimpíadas sejam realizadas com rapidez, a preços justos e com qualidade, basta que as licitações sejam elaboradas com respeito à Lei 8.666 e que as empresas participantes cumpram os requisitos estabelecidos nessa lei.

            Por esses motivos, Sr. Presidente, protocolei, no âmbito da Comissão de Educação, Cultura e Esporte, o requerimento de audiência pública para que esse assunto fosse debatido com a presença do ex-Deputado, ex-constituinte e ex-Ministro Luis Roberto Ponte, autor da Lei de Licitações, com a presidência da Câmara Brasileira da Indústria da Construção civil. A Lei de Licitações data de 1992. Infelizmente, a medida provisória foi aprovada, atropelou tudo; e foi feita com tanta celeridade, Senador Mozarildo, que não foi possível sequer ouvir a opinião de um especialista no assunto antes da votação. Um não; mais especialistas sobre a matéria; claro, todos contrários à forma como essa medida provisória chegou aqui no Senado Federal e foi aprovada.

            Srªs e Srs. Senadores, em passado recente, ao realizarmos os Jogos Pan-Americanos de 2007, estimamos gastar R$ 300 milhões e acabamos chegando à assombrosa cifra de um gasto de R$ 3 bilhões.

            Ontem, os jornais traziam os primeiros indícios de que estamos prestes a repetir os mesmos equívocos, ao comparar os dados oficiais do Governo com as projeções das empreiteiras.

            O Portal da Transparência, do Governo, montado pela Controladoria- Geral da União, diz que a Copa custará R$ 23,4 bilhões, enquanto a Associação Brasileira da Infraestrutura e Indústrias de Base estima que o custo total da realização do Mundial em nosso País será de R$ 112 bilhões. É muito mais dinheiro do que o estimado pelo Governo.

            A realização dos eventos esportivos mais importantes do mundo é uma oportunidade ímpar em nosso País: ganharemos em exposição, mostraremos ao Planeta nossa capacidade de realização de grandes eventos e nos reposicionaremos perante as grandes nações mundiais que também já promoveram, ou irão promover, eventos dessa grandeza. Mas não podemos deixar que a realização da Copa do Mundo de 2014 e das Olimpíadas de 2016 sejam mais importantes do que a manutenção da ordem jurídica e a proteção ao Erário, até porque - permita-me o comentário, Senador Mozarildo, que é médico, - é preciso também um equilíbrio de prioridades.

            O Governo do Distrito Federal está fazendo marketing dizendo que o Estádio de Brasília é o mais atualizado em matéria de obra com investimento de mais de R$ 700 milhões para o Distrito Federal, para o Governo local nesse investimento. Enquanto isso está acontecendo, com orgulho do Governo local - é anunciado que esse grande estádio será o primeiro a ser inaugurado -, os pacientes aguardam nos hospitais públicos do Distrito Federal para serem atendidos para uma simples cirurgia. O Hospital de Base, Senador Mozarildo Cavalcanti, até há pouco tempo, não tinha reagente para exame de urina, que é um exame elementar num processo de atendimento à saúde da população.

            É preciso, portanto, que haja de parte da autoridade um compromisso com o interesse maior, que é atender à necessidade da população em primeiro lugar. O estádio é importante, mas mais importante do que o estádio é a saúde do povo, que paga impostos em grande quantidade para ter, como retorno, um serviço de qualidade adequado aos recursos que ele consome, seja para os Estados, seja para os Municípios, seja para o Distrito Federal. O cidadão paga imposto e quer um serviço de volta. No caso da saúde no Distrito Federal, lamentavelmente, não temos nenhum motivo para comemorar. A situação é dramática. Basta acompanhar os noticiários diários na televisão do Distrito Federal para ver isto.

            Vivemos num país que ainda tem sérias deficiências em setores básicos para a sociedade. O Congresso Nacional discute, há anos, a regulamentação da Emenda nº 29, de autoria de um Senador do PT do Acre, Senador Tião Viana, médico, buscando uma solução para a falta de recursos na saúde. Nossa educação é precária e os brasileiros convivem com o aumento diário da violência.

            Nesse contexto, a Procuradoria Geral da República dá uma relevante demonstração de independência ao propor ação direta de inconstitucionalidade dessa lei e reabre o debate sobre o Regime Diferenciado de Contratações Públicas, fazendo com que repensemos sobre as prioridades de nossa Nação.

            Parabenizo o Procurador-Geral da República pela iniciativa e digo que ela resgata a crença de que o Brasil pode, sim, acreditar no Estado de direito.

            Com muito prazer, concedo um aparte ao Senador Mozarildo Cavalcanti.

            O Sr. Mozarildo Cavalcanti (PTB - RR) - Senadora Ana Amélia, quero dizer a V. Exª que nós dois somos de partidos aliados ao Governo da Presidente Dilma, tanto o PP de V. Exª quanto o meu PTB, mas eu acho que o bom aliado é aquele que não é alienado, por qualquer que seja motivo. Acho que o bom amigo não é aquele que diz que está tudo certo e nunca aponta um equívoco. Acho que a Presidente Dilma tinha muita razão quando disse aqui, no Congresso, ao assumir, que iria cuidar muito bem de cada real do povo brasileiro pago através de impostos. Então, é preciso que todas essas brechas que podem levar à corrupção, que, infelizmente, é um grande mal neste País... Se a Presidente quer, como tenho certeza de que quer, acabar com a miséria no País, ela tem que acabar com a corrupção, porque é a corrupção a grande responsável pela miséria que ainda existe neste País. Portanto, aplaudo o pronunciamento de V. Exª e me alio, como temos estado aliados, porque, embora sejamos de partidos da base do Governo, não somos incondicionalmente a favor das coisas que julgamos não benéficas para o País. Portanto, parabéns!

            A SRª ANA AMELIA (Bloco/PP - RS) - Muito obrigada, Senador Mozarildo Cavalcanti. O senhor reafirma, com isso, uma atitude de independência, mas não independência... Porque o seu partido, o PTB, está dando suporte à governabilidade da Presidenta Dilma Rousseff. E eu respeito muito a sua posição e a sua coerência.

            Como V. Exª reafirma, o bom amigo é aquele que diz: “Não é esse o caminho, vai por aqui, corrige o rumo”. Então, é esse o objetivo que temos todos nós aqui. Nós respeitamos muito... Aliás, fazemos parte, V. Exª e eu, de um grupo suprapartidário, de Senadores de vários partidos, que estão aqui empenhados em dar a ela o respaldo político necessário a todas as ações que a Presidenta empreender na direção de fazer uma limpa. Não vamos nem usar aquela palavra que ficou em desuso, mas o fato é que a iniciativa corajosa da Presidenta Dilma Rousseff em afastar as autoridades que estavam de alguma forma comprometendo a viabilidade do projeto do Governo dela, comprometendo a lisura na forma de atuação, isso deu a demonstração ao País da seriedade com a qual ela administra o nosso País. Por isso, ela teve essa votação esplendorosa e espetacular.

            Então, nós aqui estamos... Eu sou uma Senadora independente. O meu partido, liderado pelo Senador Francisco Dornelles, tem ajudado o Governo nas questões importantes.

            Mas, novamente, Senador Mozarildo, quanto à Emenda 29, eu aprovo a Emenda 29, sou favorável à sua aprovação. São mais recursos. Os Municípios estão falidos. No meu Estado, 100% dos Municípios gaúchos aplicam mais do que determina a lei em saúde. Mas o Estado, não. O Estado aplica apenas 4,6%. Isso não é admissível. Então, a Emenda 29 vai ajudar a aumentar os recursos para os Municípios.

            Mas não posso, de maneira nenhuma, votar a favor do retorno da CPMF ou de qualquer novo imposto para financiar a saúde. Essa área precisa de uma nova atitude do Governo, uma qualidade de gestão no setor de saúde, porque o problema não é falta de recursos; é uma questão específica de qualidade de gestão numa área prioritária que é a saúde publica. Aqui há dinheiro para fazer um estádio, no Distrito Federal, mas não há dinheiro para botar num hospital, para ter reagente para fazer um exame de urina ou uma cirurgia nos hospitais das cidades satélites. São essas as prioridades que um homem público ou a mulher, no caso da nossa Presidente, deve mirar quando toma determinadas iniciativas em relação ao governo. É isso que nós todos esperamos.

            Agradeço muito, Senador Mozarildo, pela sua colaboração.

            Agradeço, Presidente Anibal Diniz, pela presidência que está comandando nesta tarde de segunda-feira. Ainda faltam três minutos para completar o meu tempo, mas deixo a tribuna com o compromisso de ter feito o que eu precisava fazer, que era elogiar e destacar essa iniciativa do Procurador-Geral da República, Dr. Gurgel.

            Muito obrigada.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 13/09/2011 - Página 37078