Discurso durante a 161ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Enaltecimento à reportagem da revista Época, intitulada "O Doutor e o Álcool", acerca do impacto do alcoolismo nas famílias brasileiras.

Autor
Marcelo Crivella (PRB - REPUBLICANOS/RJ)
Nome completo: Marcelo Bezerra Crivella
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
DROGA.:
  • Enaltecimento à reportagem da revista Época, intitulada "O Doutor e o Álcool", acerca do impacto do alcoolismo nas famílias brasileiras.
Aparteantes
Paulo Paim.
Publicação
Publicação no DSF de 17/09/2011 - Página 37821
Assunto
Outros > DROGA.
Indexação
  • ELOGIO, ATUAÇÃO, PERIODICO, EPOCA, ESTADO DO RIO DE JANEIRO (RJ), MOTIVO, PUBLICAÇÃO, MATERIA, ASSUNTO, PREJUIZO, CONSUMO, ALCOOL, PERIODO, ADOLESCENCIA.

            O SR. MARCELO CRIVELLA (Bloco/PRB - RJ. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Senador Durval, viva a Bahia!

            Bom dia, Srs. telespectadores da TV Senado, Srs. ouvintes da TV Senado, Srs. presentes ao plenário, Senador Paim, meus companheiros, eu disse viva a Bahia porque vivi lá em Irecê, capital do feijão, durante alguns anos da minha vida e tive a oportunidade de percorrer o interior da Bahia cantando em shows que tinham por objetivo arrecadar recursos para o projeto da Fazenda Nova Canaã lá em Irecê.

            O projeto é tão bonito, são 500 crianças na escola, tem uma roça com 12 mil pinhas, planta-se muito feijão, muito milho. Semana passada minha esposa esteve lá visitando as crianças e ficou encantada, com o trabalho das professoras, dos agricultores, do pastor Manoel, que hoje toma conta da Fazenda, enfim, todos dão um exemplo de solidariedade e idealismo, meu irmão querido.

            É uma coisa tão linda que o povo brasileiro deveria conhecer. A Bahia, meu Deus, é das coisas mais lindas que existem no mundo. Não só o seu litoral, mas também o seu interior. Agora, o mais bonito da Bahia realmente é o coração do povo baiano. Quem vive lá nunca mais esquece. É Feira de Santana, é Xique Xique, Lençóis, aquela parte da Chapada Diamantina, Jequié. Cantei nesses lugares todos. Jacobina, com seu Cristo no alto do morro, aquela parte da cidade de Juazeiro, lá na beira do rio São Francisco, com aquela pujança de agricultura, a cidade de Luís Eduardo, uma das grandes produtoras de soja.

            As cidades da Bahia são maravilhosas graças ao povo trabalhador, a riquezas naturais, e também ao Presidente Lula e à bancada extraordinária que a Bahia manda para esta Casa, sempre lutando. O Senador Durval sabe disso. A bancada baiana tem um compromisso sagrado e inegociável com o seu povo e com as suas reivindicações. Já era assim na época de Antônio Carlos Magalhães, um homem muito controverso, amado pelos amigos e odiado pelos inimigos, mas que também, quando era para defender a Bahia, não deixava por menos. Tourinho, César Borges, a Bahia sempre deu políticos que extravasavam em seus mandatos esse amor pelo povo baiano, pela sua terra.

            Não sou baiano, sou do Rio de Janeiro - orgulho-me por representar o bravo Estado do Rio de Janeiro, mas vivi no interior da Bahia, em Irecê, dois anos - e passei a admirar e amar o povo do útero do Brasil. Falando carinhosamente, foi lá que nós todos, brasileiros, tivemos nossa origem, em Porto Seguro, em Salvador, terra querida.

            Sr. Presidente, gostaria hoje de enaltecer a reportagem da revista Época “O Doutor e o Álcool”. Ela trata de um tema em que, normalmente, a imprensa não gosta de tocar, até porque os fabricantes de bebida alcoólica são grandes anunciantes. Mas independente disso, é claro que todos nós queremos que as pessoas tenham controle, não é necessário o sujeito ser abstêmio, mas que tenham critérios no uso da bebida alcoólica. Ela mostra, nessa reportagem, o drama do nosso craque jogador, que tantas alegrias deu ao nosso País; e fala sobre a tragédia devastadora do alcoolismo no Brasil.

            Nesse ponto eu gostaria de aplaudir a revista Época, porque ela não poderia usar outra palavra. Eu sei que precisa de muita coragem, mas ela não poderia usar outra palavra. Ela fala: “devastadora tragédia.” Está certo. Nós temos que aplaudir. Por quê? Porque o álcool está entrando cada vez mais sorrateiramente nas famílias brasileiras.

            Os meninos estão começando a beber uma latinha de cerveja, na praia, aos 14 anos. Se formos conversar com o Corpo de Bombeiros, em todo litoral, eles vão dizer que caso de afogamento é por causa da cerveja. Os meninos bebem demais e ficam tontos, vão mergulhar, brincar na água; daqui a pouco perdem o fôlego e estão estendendo a mão para o bombeiro salvar. Bebe-se demais no Brasil, ainda jovem.

            Nós temos o problema - vocês imaginam - até em engarrafamentos. Toda cidade brasileira tem engarrafamento. Parou o carro, vem o biscoito e a latinha de cerveja. No engarrafamento e nos estádios de futebol. Também se bebe à vontade nos estádios de futebol.

            Essa palavra álcool, Senador Durval, é de origem árabe. O sentido dela em português - se fôssemos traduzir álcool para o português - seria “sutil”. E não há nada mais sutil do que o álcool, porque entra devagarzinho na vida das pessoas.

            Olha, se o sujeito está triste, ele diz que vai tomar uma pra esquecer. Se está alegre, fala que hoje vai comemorar. Se está com frio, diz que vai tomar uma pra esquentar. Mas se ele está com calor, fala que hoje vai tomar uma geladinha.

            Na verdade, você encontra o álcool não só na confraria dos desabrigados, na confraria dos sem-tetos, debaixo da ponte, mas também encontra o álcool nas recepções, nos palácios dos presidentes da república, dos grandes reis, nas cerimônias mais importantes da sociedade, de tal maneira que ele encharca da sola do nosso pé à cabeça, vai se dissolvendo e fazendo com que uma linha se amarre ao redor do nosso corpo.

            Ninguém começa bebendo tomando porre. As pessoas começam tomando uma cervejinha, uma dose de uísque, etc e tal. E depois, se não vigiarem, aí elas acabam realmente nisto que a revista fala: na devastadora tragédia.

            Hoje um maço de cigarros traz a fotografia dos malefícios, mas a bebida alcoólica não traz. Podíamos colocar no rótulo de uma bebida alcoólica, sobretudo aquelas de alto teor, um fígado com cirrose, tipo do nosso campeão, podíamos colocar, ou um acidente de carro, ou podíamos colocar os tantos divórcios, tantos lares destruídos, tantos meninos e meninas envolvidos em acidentes de carro. Porque toda vez que a gente vê os meninos espatifados num poste de concreto nas grandes cidades, ali está por trás a bebida alcoólica.

            Senador Durval, que quero aplaudir então a revista Época, porque ela foi valente. Os meios de comunicação às vezes não gostam de tocar nesse assunto. Por quê? Ah, porque as companhias anunciam e não anunciam pouco não. Na televisão, se passar corrida de carro, domingo de manhã, tem anúncio de bebida. Mas de manhã, Crivella? De manhã é muito cedo e as crianças assistem isso! Mas tem. E as propagandas, são bonitas? As mais bonitas e sedutoras. Quem olha fica com sede, dá vontade de tomar.

            Olha, nossos jovens estão bebendo cada vez mais cedo. E eu preciso parabenizar a revista Época por isso e pedir o apoio do Senador Durval, do Senador Paim, dos meus colegas. Por quê? Porque há um excesso. Vende-se bebida hoje em posto de gasolina, bebida no posto de gasolina. Todo posto de gasolina hoje tem uma lojinha de conveniência, para que o motorista possa comer uma empadinha, comer um pastel, tomar um guaraná, uma Coca-Cola, ir ao banheiro, pegar ali uma bala, um chocolate, distrair-se durante a viagem. Mas também tem uma geladeira de bebida alcoólica, que hoje, no Brasil, custa mais barato do que o leite. Uma latinha de cerveja é mais barata do que o leite. Todo mundo pode comprar à vontade.

            Então, o que ocorre com isso? A pessoa toma cerveja, leva no carro, vai dirigindo e, de repente, tem um acidente.

            Olha, nós precisamos proibir isso. Já luto há oito anos. Eu sou Senador desde 2003, pela bondade e pela generosidade do povo da minha terra. Eu não merecia. Sou o mais obscuro, o mais anônimo, o último desta Casa. Aliás, o povo do Rio tem uma generosidade extraordinária. Meu Deus, como eu devo àquela gente sofrida e valente do Rio de Janeiro! Eles insistiram e me mandaram de volta. Mas eles estão tristes, porque eu não estou conseguindo. Desde 2003, eu apresentei um projeto, que é das coisas mais óbvias: não deixar vender bebida em posto de gasolina. Então, os donos de postos de gasolina vieram aqui: “Não, Crivella, não podemos. Por quê? Porque vai atrapalhar os nossos negócios. Nós faturamos, nós temos empregados, temos impostos a recolher.” E eu, então, disse a eles: olha, então, vamos fazer um acordo. Vocês vendem a bebida, mas quente, para ele beber em casa. Não pronta para o consumo, porque, pronta para o consumo, vocês ganham de um lado, mas o Brasil todo perde do outro.

            Quanto custa a vida de um menino desses? Ele parte com 18, 19 anos - fica até feio dizer isso - mas é um prejuízo para a Nação, fora o coração estraçalhado do pai, da mãe, dos amigos, dos parentes, de todo mundo. Além disso, é um prejuízo para a Nação perder um rapaz, perder uma moça. Para nós é uma tragédia.

            Então, na ocasião, parece que eles não ficaram muito satisfeitos, mas nós fechamos esse acordo. Ocorre que o governo também é um problema sério, porque, quando eles veem bons projetos, eles pegam. Aqui é um problema sério. O governo pega projeto de todo mundo. Pode colocar um projeto aqui bom, o governo vai, pega e lança um projeto dele, lança uma medida provisória. Aí lançaram um projeto do governo. É o cúmulo do absurdo estarmos falando isso da tribuna, mas é.

            Eu tenho um projeto, por exemplo...

            O Sr. Paulo Paim (Bloco/PT - RS) - Senador Crivella, me permite um aparte, nessa questão específica, para não lhe deixar só?

            O SR. MARCELO CRIVELLA (Bloco/PRB - RJ) - Pois não, Senador.

            O Sr. Paulo Paim (Bloco/PT - RS) - V. Exª está falando somente a verdade, independente de quem seja o parlamentar e de quem seja o governo. Nós mesmos somos da base do Governo já há quase 12 anos. Independentemente de quem seja o governo, dezenas ou centenas de projetos do período em que eu estou aqui é exatamente isto: projeto bom o Legislativo discute, encaminha, faz audiências, conversa com a sociedade, aí baixam uma medida provisória. É fato e é real. Parabéns não pela ousadia, mas pela forma tão tranquila como falou desse assunto, que, para muitos, pode ser delicado. Para mim não é delicado, porque somente é a verdade. Parabéns.

            O SR. MARCELO CRIVELLA (Bloco/PRB - RJ) - Obrigado. O Senador Paim está aqui para não me deixar mentir.

            Interessante, eu fiz aqui, Senador Paim, um projeto sobre direito autoral. Também é difícil passar aqui, porque há muitos Senadores que têm rádio, têm televisão. Então, eles não querem pagar o Ecad. E o projeto era o seguinte: “Quem não está em dia com o Ecad não pode renovar a concessão de rádio e televisão.” Não pode, porque tem que pagar o Ecad. Se você não estiver em dia com os impostos do seu automóvel, não pode renovar sua licença. Se você não pagou as multas, não pode vender seu carro. Como vai vender com as multas atrasadas?

            Aqui, você pode passar, televisão, Globo, Record, seja o que for, se você não pagou nada de Ecad, usou a música da turma e não pagou... Lembro-me que, quando falei isso aqui, o Senador da Bahia chamado Antônio Carlos Magalhães Júnior, que é dono da Globo na Bahia, falou que é mentira, que a Globo paga. Não paga! Eu falei: “O senhor está chateado porque o senhor é o dono da Globo na Bahia, mas não paga.” O que a Globo faz é arbitrar um valor e depositar em juízo, mas o Ecad, os compositores não aceitam.

            O senhor imagina, por exemplo dizer, em um bom restaurante ou em um supermercado da Bahia: “Sou o Senador João Durval, vocês me conhecem?” “Conheço.” “Sou uma autoridade. Jantei, no cardápio estava inscrito R$70,00, mas não concordo. Vou depositar, em juízo, R$35,00. Depois a gente discute.” O senhor vai quebrar o restaurante. Vai em um supermercado e enche um carrinho de compras, mas, na hora de pagar, o senhor diz: “Sou o Senador João Durval, vocês me conhecem?” “Conheço.” “Então, quanto deu no caixa?” “R$300,00.” “Não, não concordo. Vou depositar em juízo R$100,00. Depois discutimos.” Não pode! Você quebra o supermercado.

            É assim que as empresas fazem: depositam o valor arbitrado. Têm poder. São importantes. Nós não podemos fazer isso. Então, o Senador Federal, que tem que olhar pelo compositor... Veio aqui o Jamelão. Veio aqui essa turma da bossa nova. Esse pessoal antigo chorou na Comissão. Quem estava lá viu. Eles choravam e diziam: “Poxa, fiz músicas lindas. Me dediquei. Estudei. O povo cantava na rua. Hoje não tenho nem o que comer? É justo envelhecer nessa amargura depois de ter trabalhado tanto pela alegria desse povo, que amo?” Não é justo! Por que isso acontece? Porque não se paga direito autoral. Está na Constituição, mas não se paga.

            Tem lá o projeto: não podemos renovar, tratando de direito autoral... Era para o Governo, pelo menos, respeitar a autoria do meu projeto. Copiaram. O Governo lançou. É um projeto deles o de consertar o direito autoral no País. Aplaudo, mas é um paradoxo, Senador: o Governo vai consertar o direito autoral roubando o direito autoral desse inexpressivo, obscuro, anônimo, mas trabalhador.

            São essas coisas que a gente não consegue entender, mas tudo bem.

            Eu queria mesmo parabenizar e também fazer este apelo, antes de me retirar, aos meus companheiros, dizendo que não podemos deixar vender bebida gelada; pronta para o consumo. Vende quente. O cara quer para o futebol, vai levar para casa, não tem problema nenhum, compra lá a caixinha dele de cerveja, compra o que for. Mas bebida pronta para o consumo em posto de gasolina, nós devemos essa lei para o nosso povo, para as famílias, para os pais. Essa é uma responsabilidade do Senado, isso é para o Brasil inteiro, precisamos ter uma lei federal. Nós precisamos tomar uma decisão séria e dizer não. “Mas a gente quer vender, precisamos faturar, temos empregados de posto para pagar”... Não, vamos vender sorvete, vamos vender coca cola, vamos vender o que a gente quiser, pode vender até roupa de cama, remédio, o que for. Mas não podemos deixar vender bebida pronta para o consumo para os meninos e meninas que ficam ouvindo música em posto de gasolina? Nas grandes cidades, param no posto, ouvem música, ficam brincando e tomando cerveja. Daqui a pouco, saem cantando pneu, se espatifam no poste e aí vamos amarguradamente chorar a vida de um menino que nós não soubemos proteger.

            Então, parabenizo a revista Época por essa reportagem. E ela usou as palavras corretas: a devastadora tragédia do alcoolismo no Brasil.

            Rapaz, antes de ser Senador, fui engenheiro civil. Depois, fui missionário, estive na África, estive na Bahia, morei dois anos lá, mas eu construía muitas igrejas. Um dos dias mais tristes da minha vida foi quando cheguei cedo para trabalhar, seis e pouco da manhã, e encontrei um operário caído numa cova de fundação. A gente faz a sapata e deixa os ferros de espera no arranque do pilar; ele caiu ali, o vergalhão cravou no seu rosto, ele esvaiu-se em sangue, ninguém viu, e morreu ali. Eu cheguei de manhã, no dia seguinte, estava lá o pessoal: “Olha aí o que aconteceu!” Bebida alcoólica! É um flagelo que precisamos cuidar, porque começa ainda quando a pessoa é jovem, quando é menino, ele adquire o hábito e acaba terminando numa situação triste, lamentável. São casos que precisamos corrigir.

            Senador João Durval, muito obrigado pelo tempo que o senhor me concedeu. Que Deus o abençoe!


Este texto não substitui o publicado no DSF de 17/09/2011 - Página 37821