Discurso durante a 169ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Ponderações acerca do anúncio da Ministra de Relações Institucionais quanto à intenção do Governo Federal em criar um novo imposto para o financiamento da saúde.

Autor
Alvaro Dias (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/PR)
Nome completo: Alvaro Fernandes Dias
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
SAUDE.:
  • Ponderações acerca do anúncio da Ministra de Relações Institucionais quanto à intenção do Governo Federal em criar um novo imposto para o financiamento da saúde.
Publicação
Publicação no DSF de 27/09/2011 - Página 39045
Assunto
Outros > SAUDE.
Indexação
  • CRITICA, ATUAÇÃO, GOVERNO FEDERAL, OBJETIVO, CRIAÇÃO, IMPOSTOS, FINANCIAMENTO, SAUDE PUBLICA, REGISTRO, ORADOR, NECESSIDADE, ALTERAÇÃO, REPASSE, VALOR, RESPONSABILIDADE, UNIÃO FEDERAL, ESTADOS, MUNICIPIO.

            O SR. ALVARO DIAS (Bloco/PSDB - PR. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Muito obrigado, Presidente Ana Amélia.

            Srs. Senadores, mais uma vez anunciou-se pela boca da Ministra Ideli Salvatti, que é hoje a principal porta-voz do Palácio do Planalto em Brasília, que o Governo deve insistir na tentativa de criar um novo imposto a pretexto de se dar sustentação aos serviços de saúde pública no País, como decorrência da regulamentação da Emenda nº 29, que atribuiria encargos maiores à União.

            Primeiro, trata-se uma afronta. E posso ir além, escárnio, desrespeito com compromissos da campanha eleitoral, quando nenhum candidato neste País ousou afirmar que defenderia aumento de impostos no Brasil, muito menos quem disputava a Presidência da República. É bom sempre repetir que foi a candidata Dilma Rousseff que, no debate da Rede Bandeirantes, afirmou taxativamente: “O Brasil vive momento de prosperidade, cresce e continuará a crescer. Não há hipótese de restabelecermos a CPMF ou de criarmos um novo imposto no País.” Ao contrário, taxativamente também afirmou: “Queremos reforma tributária para reduzir a carga tributária brasileira, que é uma das maiores do mundo.” São afirmativas que não podem ser esquecidas.

            Alguns meses depois, já se esquecem dos compromissos assumidos durante a campanha eleitoral. Além de subestimar a inteligência dos brasileiros, de abusar da generosidade dos contribuintes, trata-se de confissão de incompetência administrativa. Por quê? Porque o problema da saúde pública no Brasil não é de dinheiro. O Banco Mundial, há algum tempo, realizou um diagnóstico e concluiu que a questão é de incompetência de gerenciamento, ausência de planejamento e organização e de desonestidade, com o desvio de bilhões de reais - o que foi agora confirmado pelo Tribunal de Contas, ao revelar que R$2,3 bilhões foram desviados do setor de saúde pública no Brasil de 2002 a 2011, dia 30 de junho. Esse é um dado do Tribunal de Contas, mas não é o resultado do valor total dos desvios, porque é impossível para o Tribunal de Contas da União, com o limitado quadro de pessoal que possui, alcançar todos os repasses, todas as aplicações, todos os investimentos realizados na área de saúde pública, auditando a prática para verificação da correção ou da incorreção.

            Portanto, esse é um valor que não corresponde à grandeza dos desvios que ocorrem na área de saúde pública neste País.

            E é por essa razão, inclusive, que tentamos há algum tempo recolher assinaturas para a instalação de uma CPI na área de saúde, a fim de elaborar um diagnóstico, sem a pretensão de atingir quem quer que seja, a não ser que esteja envolvido em ilícitos eventualmente praticados, mas sem direcionarmos para este ou aquele partido, para este ou aquele governo, porque, como se sabe, a responsabilidade pela prestação dos serviços de saúde pública no País é do Governo da União, dos Estados e dos Municípios. Portanto, de todos os partidos.

            Nós não tivemos, em nenhum momento, um propósito de interesse partidário. Ao contrário, o objetivo é o diagnóstico, a apresentação de propostas, a correção de rumos, a indicação de caminhos, para que o povo brasileiro possa ser atendido e não desatendido, como tem sido nos últimos anos, com corpos amontoados em corredores de hospitais, com filas enormes e pacientes que são levados à morte, porque a atenção do Poder Público não chega a tempo.

            Mas falar em novo imposto? Não! Decididamente, não!

            Nós verificamos que a receita cresce, e cresce significativamente, tendo como parâmetro períodos anteriores ou mesmo o Produto Interno Bruto do País.

            Não há por que criar novo imposto. O dinheiro para o serviço de saúde pública de qualidade está depositado nos cofres da União, tem origem nos tributos recolhidos pela Receita Federal e esses valores serão consignados no orçamento quando da sua elaboração, atendendo ao percentual que a legislação impuser.

            A saúde pública não é um setor alienígena da administração pública, que dependeria de uma moeda própria para a sua existência. É uma prioridade de governo. E os recursos consignados no orçamento da União os seriam de forma a atender às necessidades do setor prioritariamente.

            É fácil para o Governo falar em criar imposto. Tem sido difícil para ele falar em realizar reforma administrativa, adotar programa de controle dos gastos públicos e combater implacavelmente o superfaturamento de obras. Tem feito o contrário: flexibilizado a legislação e limitado a capacidade de fiscalizar do Tribunal de Contas da União, facilitando a corrupção, impulsionando os preços das obras públicas no País, que já atingiram um patamar jamais alcançado, em tempo algum, no Brasil. Reforma, nenhuma!

            Se nós temos a constatação de que a estrutura da administração cresceu exageradamente para dar resposta às demandas oriundas da base de sustentação, que cresceu exatamente em razão do apetite fisiológico que existe na política brasileira, cresce a base de apoio do Governo e a consequência é o crescimento da estrutura da administração direta e indireta.

            Veja este dado da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE): os postos de livre nomeação no Brasil chegam a 22 mil só na esfera Federal, na Administração Direta, sem contarmos a Administração Indireta - Petrobras, Banco do Brasil, Caixa Econômica, Eletrobrás, etc.-, 22 mil contra sete mil nos Estados Unidos da América, sete mil apenas; 780 na Holanda, apenas 780 na Holanda. Há Municípios no Brasil que têm mais cargo comissionados do que na Holanda; 837 no Chile, para ficar mais próximo.

            Ora, o exemplo Federal é seguido nos Estados e nos Municípios. Esse modelo que se implantou em Brasília da relação de promiscuidade com o loteamento de cargos públicos entre os aliados chega aos Estados e aos Municípios, e o povo paga a conta, e paga sem poder pagar.

            Não há como aceitar esse cenário de irresponsabilidade pública no Brasil. E o Governo quer encontrar saídas para escamotear a regulamentação da Emenda nº 29 no Senado Federal. Fala-se que o Senado, Senador Cyro Miranda, tem o dever de encontrar uma fonte de custeio, como se fosse tarefa do Senado Federal. Alguém se elege presidente da República e não assume as suas responsabilidades e quer transferi-las? Fonte? A fonte há. Os recursos existem. Estão nos cofres da União. O que se exige é competência para a sua aplicação com o estabelecimento de prioridade com correção e respeito, sobretudo, às aspirações da população, considerando que a saúde do povo tem de ser a suprema lei.

            Vamos à Emenda nº 29. O Senado Federal aprovou-a aqui. A proposta não foi da Oposição. Foi de um Senador do PT, o Senador Tião Viana, hoje Governador do Acre. Um grande companheiro que tivemos aqui nesta Casa. Apoiamos a sua proposta. Ela foi à Câmara dos Deputados, onde dormiu nas gavetas durante meses, porque o Governo não queria a sua aprovação. E houve mudanças que comprometem o seu objetivo definitivo, que é, obviamente, compartilhar responsabilidades entre os entes federativos.

            Desde a Constituinte de 88, os encargos são repassados aos Municípios brasileiros sem a contrapartida do compartilhamento dos recursos que ficam, de forma leonina, nos cofres da União. Discutir a Emenda 29 e a sua regulamentação é um pouco rediscutir o sistema federativo e a partilha correta e isonômica dos recursos públicos entre as Unidades Federativas. Como é também rediscutir o sistema federativo debater a distribuição dos royalties da exploração do petróleo no Brasil.

            Pela lei que aprovamos aqui regulamentando a Emenda 29, do Senador Tião Viana, 10% sob responsabilidade da União, 12% Estados e 15% Municípios. Pelo texto aprovado na Câmara dos Deputados, a União é desafogada com redução de recursos que seriam repassados.

            Em 2011, pelo texto aprovado aqui no Senado, caberia à União repassar R$102,2 bilhões. Com o texto aprovado pela Câmara, R$70,6 bilhões. Portanto, uma redução de quase R$32 bilhões desafogando os cofres da União.

            Em 2015 isso significaria o seguinte: com a emenda aprovada no Senado, R$154 bilhões; com a proposta aprovada pela Câmara, R$106 bilhões. Portanto, quase R$50 bilhões a menos da responsabilidade da União. Não há como não buscar aqui, no Senado Federal, restabelecer a forma de origem. Ela foi amplamente debatida aqui por governistas e oposicionistas, e houve consenso. Se não me falha a memória, houve a aprovação unânime. Não há razão para reduzirmos a responsabilidade da União, que é privilegiada em matéria de arrecadação de tributos no País.

            Em relação à contribuição social para a saúde, a base de cálculo da contribuição social para a saúde, art. 16 do substitutivo, foi rejeitada na Câmara. No entanto, mantém-se o substitutivo, instituindo a contribuição social para a saúde, que é um dispositivo, do nosso ponto de vista, inconstitucional. Aqui, no Senado, devemos apresentar emenda suprimindo esse dispositivo.

            Obviamente, a prioridade para nós é restabelecer a forma original, instituindo responsabilidade de 10, 12 e 15% aos Entes federativos, a partir da União até o Município, e eliminar esse fantasma que vai rondar a cabeça dos contribuintes brasileiros enquanto estiver inserido na legislação do País. São providências que devemos propor no debate dessa proposta que vem da Câmara no Senado Federal.

            Olha, Srª Presidente Ana Amélia, o Senado não pode admitir essa alternativa da protelação. Já ouvimos que a proposta que veio da Câmara pode dormir na gaveta ou nas gavetas do Senado. Isso também é afronta, é desrespeito à sociedade.

            Nós temos de enfrentar a realidade, debater a questão e deliberar sobre ela. Afinal, essa regulamentação está atrasada. É uma regulamentação que deveria ter sido aprovada, há vários anos. Querer protelar, imaginando o risco de alterações no Senado que possam desagradar o Poder Executivo é afrontar a população do País, que não pode mais suportar esse atendimento de idade média em matéria de saúde pública no Brasil, ou esse atendimento da era das cavernas.

            O que se verifica, especialmente em algumas localidades do Brasil, é o caos, uma afronta à dignidade humana. Não são poucas as reportagens de TV que, pelo fato de poderem apresentar imagens, provocam grande impacto na opinião pública brasileira.

            Todos nós sabemos do desastre que é a gestão de saúde no País, mas, quando as imagens aparecem nas telas da TV, o espanto é maior. Por isso, Presidente Ana Amélia, creio que há uma prioridade, agora, que é indiscutível: aprovar essa regulamentação.

            Desejamos o ideal, queremos que seja o texto elaborado pelo Senador Tião Viana e aprovado pelo Senado Federal, mas, se não for esse, que seja outro, mas que atenda às expectativas do País.

            Muito obrigado, Srª Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 27/09/2011 - Página 39045