Discurso durante a 183ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Referência à Proposta de Emenda à Constituição 98, de 2007, que trata da imunidade tributária à produção de videogramas e fonogramas.

Autor
Vanessa Grazziotin (PC DO B - Partido Comunista do Brasil/AM)
Nome completo: Vanessa Grazziotin
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
TRIBUTOS.:
  • Referência à Proposta de Emenda à Constituição 98, de 2007, que trata da imunidade tributária à produção de videogramas e fonogramas.
Publicação
Publicação no DSF de 11/10/2011 - Página 41177
Assunto
Outros > TRIBUTOS.
Indexação
  • CRITICA, POSSIBILIDADE, APROVAÇÃO, CONGRESSO NACIONAL, PROJETO DE LEI, GARANTIA, IMUNIDADE, TRIBUTOS, SETOR, PRODUÇÃO, VIDEO, PROGRAMA, COMENTARIO, DEFESA, MANUTENÇÃO, TEXTO, CONSTITUIÇÃO FEDERAL.

            A SRª VANESSA GRAZZIOTIN (Bloco/PCdoB - AM. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão da oradora.) - Muito obrigada, Presidente, Senador Diniz.

            Srªs Senadoras, Srs. Senadores, companheiros e companheiras, na semana passada, estava pautada para ser votada, na Câmara dos Deputados, entre outras matérias importantes, uma que já foi objeto de muitos debates e discursos nesta Casa: o projeto de lei que estabelece o Estatuto da Juventude, um projeto importante. Mas estava também na pauta outra matéria, que, graças a um acordo de líderes, ficou adiada possivelmente para a semana que vem, com o objetivo de que se busque um acordo. Do contrário, ela irá a voto na forma como está. Srs. Senadores, Srªs Senadoras, refiro-me à Proposta de Emenda à Constituição nº 98, de 2007, proposta apresentada pelo Deputado Federal do Estado do Rio de Janeiro Otavio Leite.

            Essa proposta de emenda constitucional trata de questões tributárias relativas à produção de videogramas e de fonogramas, garantindo imunidade tributária a esse segmento, Sr. Presidente. Ou seja, ela modifica o inciso VI do art. 150 da Constituição Federal, Senador Mozarildo Cavalcanti, para conferir imunidade tributária ao setor de produção de videogramas e de fonogramas, o que significa dizer que os DVDs e os CDs - aqueles através dos quais ouvimos as músicas de artistas - não mais estariam sujeitos à tributação em território nacional. Ou seja, a proposta de emenda constitucional não é uma proposta que garante incentivo fiscal, mas, sim, imunidade tributária.

            Quero dizer que fiquei feliz com o adiamento da votação da matéria, primeiro, porque ela foi posta em pauta de forma abrupta, sem sequer ter sido aberto diálogo entre as lideranças partidárias e, principalmente, sem que a Bancada Federal do Amazonas fosse sequer comunicada. E por que a Bancada Federal do Estado do Amazonas? Esclareço isso desta tribuna.

            Ocorre que, hoje, a produção de CDs e DVDs no Brasil ocorre quase na sua totalidade na cidade de Manaus, no Estado do Amazonas, no Polo Industrial de Manaus, pertencente ao modelo Zona Franca de Manaus. Portanto, já é um setor incentivado, já é um setor que conta com incentivos fiscais do Governo Federal. Mas, Senador Alvaro Dias, trata-se de uma proposta que, se aprovada, será promulgada pelo próprio Parlamento brasileiro, pelo Congresso Nacional, por se tratar de uma emenda constitucional. Vem a proposta e estabelece: “Esse segmento será imune, do ponto de vista tributário, no País”.

            A primeira consequência, caso isso seja aprovado - eu tenho uma esperança muito grande de que não seja aprovado; nós passamos um ano e meio em debates profundos na Câmara dos Deputados, negociando inclusive com o Ministério da Fazenda, com o Governo Federal, e ficou claro, ficou provado que pouco ou quase nenhum benefício essa medida trará para cantores, para intérpretes, compositores, nem mesmo para os produtores locais, mas trará um grande prejuízo tributário ao Brasil, e eu já vou explicar o porquê disso -, seria a transferência das fábricas instaladas no Polo Industrial de Manaus para outras regiões, principalmente para as regiões mais desenvolvidas do País, aquelas que contam não apenas com maior e melhor infraestrutura, com maiores e melhores condições logísticas, mas que estão ali ao lado do mercado consumidor.

            Então, Sr. Presidente, de tudo o que nós debatemos nesses anos todos, primeiro, nós devemos tomar muito cuidado quando discutimos questões tributárias, para não prejudicar um modelo importante. É bem certo que se trata de um modelo muito distante do grande centro produtivo do Brasil, porque, lá, ele está isolado de outras partes do Brasil, sendo feita sua ligação - por exemplo, a Capital, Brasília, ao Sul do País - basicamente por via aérea ou por via fluvial; e a BR-319, que era a estrada que ligaria Manaus a Porto Velho, está sem condições de tráfego, portanto.

            Mas é um polo industrial importante. Tenho dito com muita frequência, quase que diariamente da tribuna desta Casa, importante não somente para a Zona Franca, para a Amazônia, mas para o Brasil inteiro, porque ele tem se revelado um grande instrumento, por exemplo, de preservação da nossa floresta, da nossa biodiversidade.

            Veja, Sr. Presidente, aqui, digo que ficamos durante anos debatendo a matéria na comissão, uma comissão especial formada na Câmara dos Deputados - à época, eu era Deputada Federal -, juntamente com a Secretaria da Receita Federal, com o Governo Federal.

            Senadora Ana Amélia, essa medida, repito, aparentemente é muito bonita, porque foi apelidada, apesar de ser uma emenda constitucional que garante imunidade tributária à produção de fonogramas e videogramas, como PEC da Música. E aí eu pergunto aos Srs. Senadores, a quem nos ouve: quem neste Brasil é contra a música? E quem seria contra uma medida que, teoricamente, deveria melhorar as condições para a produção e o desenvolvimento musical do nosso País, principalmente em se tratando de uma Nação e de um segmento marcado profundamente pelo mercado informal, pelo mercado pirata?

            Sr. Presidente, quando digo que a análise e as conclusões a que chegamos é que mais prejuízos do que benefícios isso traria é porque, na realidade, essa medida, essa emenda constitucional seria insuficiente para fazer frente à pirataria, um segmento que tem hoje em torno de 60% do seu mercado tomado pelos produtos piratas, por aqueles produtos que vêm do exterior sem nenhum controle e que aqui têm as músicas replicadas. Agora, até mesmo com as músicas já sobrepostas eles vêm pelo descaminho; não é nem através do contrabando, eles vêm pelo descaminho e chegam ao mercado local.

            Ora, enquanto um CD original em uma loja custa em torno de R$30 a R$50 - vamos pegar esse preço médio -, você ou qualquer cidadão, ou qualquer pessoa, pode acessar o mesmo CD, com o mesmo conteúdo, obviamente que não com a mesma qualidade, mas com o mesmo conteúdo, por um valor de R$5. Muitas vezes vendem dois CDs por R$5, enquanto que, na loja, o mesmo CD custa R$50.

            Ora, se tirarmos toda a carga tributária daquele produto, ele não conseguirá, mesmo assim, ser competitivo com o mercado pirata, Senador Mozarildo. Não conseguirá, porque o mercado pirata, primeiro, não paga nem um centavo de tributo; segundo, ele é produzido em grandíssima quantidade e mandado para o mundo inteiro. E chega aos países sem licença, sem absolutamente nada. Grande parte dos CDs piratas - e a CPI instalada na Câmara provou isto - chega através do Paraguai, do Paraguai chegam ao Brasil sem pagar nada, sem pagar um centavo. E, aliás, isso tem sido também, em grande parte, uma manta para encobrir um crime tão grande ou até maior do que esse, que é o crime de contrabando de armas, o crime de contrabando de drogas.

            Então, o tributo daquele produto varia de 7% a 10%. É o quanto baixaria. Isso não faria com que o produto se tornasse mais competitivo. Em relação ao custo material da produção de videogramas, de fonogramas, também hoje chegamos a um CD com um preço de fábrica que gira em torno de R$1,50 a R$2. Então, onde está o grande custo da produção? O grande custo está principalmente na promoção. Eu não diria nem nos direitos autorais, que é uma parte importante, mas na divulgação, na promoção daquele produto.

            Portanto, Sr. Presidente, temos aqui vários argumentos a serem utilizados, entre eles, por que conferir na área de cultura... Aliás, precisamos incentivar muito, e todos nós...

(Interrupção do som.)

            A SRª VANESSA GRAZZIOTIN (Bloco/PCdoB - AM) - ...somos incentivadores da cultura, das artes e da música, sobretudo. Mas, se aprovada a proposta tal como está, estaremos incentivando apenas um lado da cultura, uma parte da cultura, uma manifestação cultural. Como ficaria o teatro? Como ficaria a dança? Como ficariam os audiovisuais, Sr. Presidente? Eles não estão contidos nessa Proposta de Emenda à Constituição nº 98.

            São inúmeras as leis que garantem incentivos fiscais a segmentos culturais no Brasil, incentivos tributários. Há segmentos culturais. Eu poderia citar aqui a Lei Rouanet, poderia citar a lei de incentivo à atividade audiovisual, a própria Lei de Informática, Sr. Presidente. E mais: a medida provisória que analisaremos em breve, que trata do Mais Cinema, trata também de incentivos aos estabelecimentos cinematográficos no Brasil. Mas todas elas são leis ordinárias. Aliás, foi o próprio Supremo que considerou a imunidade tributária, que é uma matéria constitucional, como cláusula pétrea; portanto, passível de modificação apenas numa revisão constitucional - como se trata de cláusula pétrea, não poderia ser modificada sem uma profunda reforma constitucional.

            Então, quero aqui fazer este alerta, Sr. Presidente, no sentido de que, aparentemente, a proposta é algo importante, algo bonito, mas que traz grandes prejuízos não só à Zona Franca de Manaus, porque nos subtrairia imediatamente, do Polo Industrial de Manaus - peço a V. Exª apenas mais um minuto para concluir -, aproximadamente cinco mil empregos diretos...

(Interrupção do som.)

            A SRª VANESSA GRAZZIOTIN (Bloco/PCdoB - AM) - ... sem aqui falar dos empregos indiretos. Então, não seria apenas uma grande injustiça; seria um grande equívoco.

            Negociamos muito com o segmento no passado recente, no ano de 2009, e penso que é chegada a hora de sentarmos novamente à mesa - os defensores dessa proposta de emenda constitucional, juntamente com representantes dos produtores e dos distribuidores - para que possamos chegar a um denominador comum, e não colocar a um Plenário, iludindo-o, a um conjunto de bancadas, que, se for aprovada tal medida, fábricas de produção de CDs e DVDs serão abertas no Nordeste e no Centro-Oeste. Não é essa a realidade. Pelo contrário, a proposta aprovada tal como está, primeiro, não é suficiente para enfrentar a pirataria e, segundo, ela apenas tiraria emprego de uma região carente, por ser uma região que ainda busca maior nível de desenvolvimento, e transferiria essas indústrias para as regiões mais desenvolvidas sob o ponto de vista da produção, como o eixo Rio-São Paulo.

            Por fim, Sr. Presidente, quero dizer que esse segmento da indústria vive um momento muito delicado, mas muito delicado mesmo, e que essas empresas que produzem CDs e DVDs estão buscando a diversificação para manter-se na área produtiva.

            Era o que tinha a dizer.

            Espero maturidade das bancadas parlamentares para que essa matéria não seja votada aos sobressaltos, sem que se conduza um processo de negociação tranquilo para que ninguém perca, sobretudo a Zona Franca de Manaus.

            Muito obrigada.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 11/10/2011 - Página 41177