Discurso durante a 183ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Considerações acerca da discussão sobre a competência constitucional reservada ao Conselho Nacional de Justiça; e outro assunto.

Autor
Jarbas Vasconcelos (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/PE)
Nome completo: Jarbas de Andrade Vasconcelos
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
JUDICIARIO.:
  • Considerações acerca da discussão sobre a competência constitucional reservada ao Conselho Nacional de Justiça; e outro assunto.
Publicação
Publicação no DSF de 11/10/2011 - Página 41216
Assunto
Outros > JUDICIARIO.
Indexação
  • COMENTARIO, NECESSIDADE, SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL (STF), GARANTIA, PRERROGATIVA, CONSTITUIÇÃO FEDERAL, RELAÇÃO, COMPETENCIA, CONSELHO NACIONAL, JUSTIÇA.

            O SR. JARBAS VASCONCELOS (Bloco/PMDB - PE. Pronuncia o seguinte discurso. Com revisão do orador.) - Uma das maiores piadas que existem aqui, nesta Casa, é se falar em Regimento Interno, como se o Senado cumprisse à risca o seu Regimento.

            Aqui, faz o uso da palavra o senador que tem simpatia da Mesa. Estou à procura do Senador Alvaro Dias para saber se, de fato, ele cedeu sua inscrição para outro senador, porque é, no mínimo esquisito, que o senador Alvaro Dias esteja como orador inscrito, fale como Líder e ceda sua inscrição para outro Senador que sequer é do seu partido.

            Esta Casa tem causado estranheza e vergonha, porque aqui, em vez de se estar discutindo os problemas do País, um país que está precisando debater e discutir vários temas, fica-se realizando sessões especiais para prestar homenagem de 18 anos, de 22 anos, de 33 anos de entidades que deveriam ser homenageadas por Câmaras Municipais ou por Assembleias Legislativas e não pelo Senado da República. Essa prática tem impedido diversos debates importantes.

            Amanhã, inclusive, é véspera de feriado. Cuidado para não se manter o painel eletrônico e depois vir com uma história de que se pediu para manter o painel. Até agora ninguém pediu a manutenção do painel.

            Srª Presidente Senadora Ana Amélia, a senhora tem sido uma revelação, uma pessoa digna, correta, determinada, que tem representado melhor do que qualquer outra pessoa o seu Estado natal, o Rio Grande do Sul. Desculpe-me por ter feito essa crítica...

            A SRª PRESIDENTE (Ana Amélia. Bloco/PP - RS) - V. Exª tem toda razão.

            O SR. JARBAS VASCONCELOS (Bloco/PMDB - PE) - ... com a senhora à frente da Casa e sem ter nada a ver com isso.

            A SRª PRESIDENTE (Ana Amélia. Bloco/PP - RS) - Eu já pedi, Senador Jarbas, providências a respeito dessa argumentação que V. Exª tem toda razão.

            O SR. JARBAS VASCONCELOS (Bloco/PMDB - PE) - Vou ter tempo suficiente para falar com o Alvaro e saber se a Mesa mentiu ou não.

            A SRª PRESIDENTE (Ana Amélia. Bloco/PP - RS) - Pois não.

            Concedo-lhe o tempo, agora, de vinte minutos, Senador.

            O SR. JARBAS VASCONCELOS (Bloco/PMDB - PE) - Pois não.

            Srª Presidente, a polêmica instalada sobre a atuação do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) dá o tom do incômodo causado por esse órgão a uma parcela dos integrantes do Poder Judiciário que não admitem o controle externo. Porém, aos olhos do cidadão brasileiro não tem o menor cabimento a insinuação de que o trabalho de seus integrantes teria exorbitado o raio constitucional de sua competência legal. Cabe ao Senado da República acompanhar de perto o atual impasse, de modo a evitar retrocessos e arranhões na democracia do País.

            Como se sabe, o CNJ ocupa lugar de destaque como órgão de controle administrativo e disciplinar do Judiciário. À primeira vista, estaria sob ataque de alguns magistrados, na imaginação dos quais o âmbito de suas ações deveria restringir-se a uma mera reunião protocolar de sábios.

            Entidade de representação da classe, a Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB) quer, de fato, transformar o órgão em conselho honorário, desprovido de qualquer responsabilidade democrática. Fruto disso foi a ação proposta pelos juízes federais junto ao Supremo Tribunal Federal, questionando o poder de regular e investigar transgressões cometidas pela categoria. A AMB reivindica exclusividade das corregedorias estaduais nas investigações que tenham a conduta juízes como objeto.

            Não por mera coincidência, Srª Presidente, ao comentar a possível restrição do poder do CNJ, em uma entrevista recente, a Corregedora do Conselho, Drª Eliana Calmon, causou mal-estar ao dizer que a Justiça sofre com infiltração de "bandidos escondidos atrás da toga".

            Na verdade, Srª Presidente, há uma enorme pressão para que o Supremo reduza as competências do Conselho, proibindo-o de investigar e punir juízes corruptos antes que as corregedorias dos Tribunais de Justiça dos Estados façam esse trabalho de apuração e julgamento. A AMB encabeça tal movimento, refletindo um sentimento corporativo que me parece desinteressado na modernização do Poder Judiciário.

            O que ocorre na prática é que as corregedorias dos Tribunais de Justiça existem para não funcionar. Com raras exceções, estão submetidas ao compadrio, ao espírito de corpo. Para coibir essa postura, a partir de 2008, com o Corregedor-Geral Gilson Dipp, o Conselho Nacional de Justiça passou a fazer inspeções em vários tribunais com indícios aberrantes de irregularidades. Mesmo de forma limitada e com recursos precários, as mazelas começaram a ser expostas.

            Sob esse mesmo espírito, a Corregedora Eliana Calmon procurou expandir tais investigações mediante parcerias entre o Conselho Nacional de Justiça e os órgãos de fiscalização como a Receita Federal, a Controladoria-Geral da União e o Conselho de Controle de Atividades Financeiras. No entanto, se prevalecer a tese do esvaziamento das atribuições, todo esforço erguido vai ser absolutamente invalidado.

            Trocando em miúdos, Srª Presidente, a ação da AMB pretende esvaziar o órgão nacional de controle e devolver aos Tribunais de Justiça a sua confortável falta de transparência. Na prática, a Corregedora Eliana Calmon já é asfixiada por uma gestão que a alijou de todas as comissões do CNJ. O que está em jogo é a impunidade togada e seus elos com crimes, corrupções e transgressões de toda ordem.

            Srª Presidente, V. Exª que hoje oportunamente tratou do mesmo tema que abordo neste momento: CNJ, antes de tudo, é bom que se esclareça que ninguém está contra a autonomia da Justiça nos Estados. Aliás, para dirimir quaisquer ruídos de comunicação, nada mais natural do que o Ministro Cezar Peluso compareça à audiência pública convocada pelo Senador Pedro Taques em nome da Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania.

            A julgar pelo que tem divulgado a imprensa, dos três Poderes, o Judiciário seria o mais opaco, o mais refratário à idéia de que deve se submeter a mecanismos de controles e exigência de transparência. Secunda a mesma a tese, a natureza deste Poder, cercado de pompas e formalidades que favorecem e servem de pretexto à atitude corporativa.

            Mais ainda, no entendimento dos especialistas, o conhecido bordão “decisão judicial não se discute” seria bem sintomático dessa mentalidade. Em outras palavras, o Judiciário não deveria prestar satisfações à opinião pública, nem poderia ser contestado.

            A Folha de S. Paulo publicou, recentemente, reportagem sobre os vícios administrativos praticados pelas corregedorias estaduais. Inspeções feitas pelo CNJ em Tribunais de alguns Estados apontaram casos de omissão e ineficiência das corregedorias regionais. Nas apurações do órgão, desde a sua instalação, foram identificados casos de desaparecimento de processos e manobras para evitar obtenção de quórum para aplicação de punições.

            Dois casos divulgados pela Folha são exemplares: “Em uma investigação no Tribunal de Justiça do Ceará, o CNJ identificou 6 exemplos em que a demora na condução das ações levou à prescrição do direito de executar as penas. Em Pernambuco, meu Estado, a equipe do órgão encontrou uma ação envolvendo um juiz que já se arrastava por mais de 16 anos. No período, o processo foi redistribuído 8 vezes a desembargadores da corte."

            Nos últimos 5 anos, de acordo com informações do CNJ, 10 juizes foram aposentados compulsoriamente como "punição" por irregularidades. Em qualquer outra nação suficientemente desenvolvida, a aposentadoria compulsória equivaleria a uma promoção. Mesmo assim, no Brasil, trata-se de deficiência propositada da lei, que deveria ser mais rígida com as transgressões dos magistrados.

            É sabido, Srª Presidente, Sªs e Srs. Senadores, que o Supremo suspendeu quase metade das punições aplicadas pelo CNJ a juizes acusados de cometer crimes, desde a fundação do organismo. Das 33 punições impostas pelo Conselho com fundamento em suas prerrogativas, nada menos que 15 foram suspensas por liminares concedidas por Ministros do Supremo.

            A indignação da sociedade é de tal monta que até alguns integrantes do CNJ, que em um primeiro momento simpatizaram com as intervenções do Ministro Peluso, já repensaram sua posição e emitiram nota - sobre a qual conversamos há pouco, senadora Ana Amélia - conjunta em apoio à Ministra Eliana.

            Foi muito oportuna a declaração desses representantes do CNJ à imprensa. Os Conselheiros reiteraram o protagonismo da instituição na construção da credibilidade da Justiça, destacando a previsibilidade, a celeridade e a intolerância com a corrupção como pontos essenciais na busca da segurança jurídica no País. Ao final, Srª Presidente, condenaram o atual foco das discussões sob a competência do CNJ, alertando para o que é verdadeiramente fundamental, o fortalecimento das corregedorias dos tribunais. ´

            Prevista na Constituição de 1988, a criação do CNJ, em 2004, tinha objetivos muito claros: se de um lado democratizaria o Poder Judiciário mediante a exigência da transparência, de outro fiscalizaria a atuação e a conduta dos Juízes.

            Quem ganha com isso é a população brasileira cuja esperança de ver o País se afastar gradualmente de um passado de privilégios, impunidade e corporativismo, conquista espaços mais nítidos de materialização institucional.

            Sob pressão da opinião pública, o Supremo Tribunal Federal achou por bem adiar a decisão sob a alegação de que a matéria mereceria maior e melhor reflexão.Que o bom senso prevaleça, visto que, ao longo dos debates públicos, o Brasil tomou consciência de que a eficácia do CNJ se ancora nas suas inspeções, um trabalho que expõe o resultado pernicioso do corporativismo.

            Diante do exposto, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, resta a esta Casa defender os interesses da sociedade brasileira e esperar dos Ministros do Supremo a sensibilidade suficiente para garantir as prerrogativas constitucionais do CNJ. Se depender do Senado Federal a independência do Conselho Nacional de Justiça jamais será transigida em seu papel crucial no processo de consolidação da democracia brasileira.

            Era o que tinha a dizer, Srª Presidente, nesta tarde, início de noite.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 11/10/2011 - Página 41216