Discurso durante a 189ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Destaque para a Exposição do Ano Internacional dos Afro-Descendentes realizada, hoje, no Salão Negro do Congresso Nacional; e outros assuntos.

Autor
Paulo Paim (PT - Partido dos Trabalhadores/RS)
Nome completo: Paulo Renato Paim
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
HOMENAGEM. POLITICA SOCIAL. EDUCAÇÃO.:
  • Destaque para a Exposição do Ano Internacional dos Afro-Descendentes realizada, hoje, no Salão Negro do Congresso Nacional; e outros assuntos.
Publicação
Publicação no DSF de 19/10/2011 - Página 42500
Assunto
Outros > HOMENAGEM. POLITICA SOCIAL. EDUCAÇÃO.
Indexação
  • REGISTRO, REALIZAÇÃO, EXPOSIÇÃO, HOMENAGEM, DESCENDENTE, AFRICA, LOCAL, CONGRESSO NACIONAL.
  • COMENTARIO, ESTUDO, COMISSÃO, RELAÇÃO, AÇÃO AFIRMATIVA, INCLUSÃO, ACESSO, POPULAÇÃO, INDIO, NEGRO, BAIXA RENDA, UNIVERSIDADE ESTADUAL, UNIVERSIDADE FEDERAL.
  • REGISTRO, CONVITE, FEDERAÇÃO, BANCOS, PAIS, APRESENTAÇÃO, PROGRAMA, INCLUSÃO, ACESSO, POPULAÇÃO, INDIO, NEGRO, BAIXA RENDA, UNIVERSIDADE FEDERAL.

            O SR. PAULO PAIM (Bloco/PT - RS. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Srª Presidenta, queria informar à Casa que, aqui no Salão Branco do Senado, começou a exposição do Ano Internacional dos Afrodescendentes, uma exposição apresentada com a participação de mais de vinte embaixadores.

            Também, Srª Presidenta, venho à tribuna para lembrar que há exatos 140 anos era proclamada a Lei do Ventre Livre, que serviu para dar uma resposta, embora fraca, aos anseios daqueles que lutavam pela abolição da escravatura.

            A Lei do Ventre Livre, sancionada pela Princesa Isabel em 28 de setembro de 1871, significou, para os filhos de mulheres escravas, o início da ruptura da visão tradicionalista escravocrata e o começo de uma nova era, uma era de liberdade que chegaria somente 17 anos após, com a promulgação da Lei Áurea.

            A Lei Áurea também sofreu inúmeras críticas, mas, na essência, leva consigo a palavra liberdade, e liberdade significa vida, porque não há vida sem liberdade e não há liberdade sem vida.

            Mas, Srª Presidenta, a Lei do Ventre Livre, a partir de 28 de setembro de 1871, garantia que os senhores de escravos poderiam optar por ficar com o escravo até atingirem a maioridade de 21 anos ou então receberem uma indenização ao entregarem as crianças para o Estado.

            Lamentavelmente, naquele momento da história, tivemos as primeiras crianças de rua. Em contrapartida, foi aí que o movimento de liberdade apresentou-se como um caminho sem volta.

            Esse caminho ainda é trilhado por aqueles que defendem os direitos humanos e que lutam contra qualquer tipo de discriminação, seja contra branco, índio, negro, deficiente, idoso, mulheres, enfim, combate todos os preconceitos.

            Durante vinte anos nós debatemos aqui, no Congresso Nacional, o Estatuto da Igualdade Racial, projeto de nossa autoria, que foi sancionado, depois da aprovação na Câmara e Senado, pelo Presidente Lula, no dia 20 de julho.

            O texto do Estatuto, em sua totalidade, não foi aquilo que nós gostaríamos, mas, sem sombra de dúvidas, representa um marco jurídico histórico, social, moral em defesa daqueles que são discriminados - repito, homens, mulheres, idosos, crianças, brancos, negros, indígenas, ciganos, enfim, o Estatuto combate todo tipo de preconceito.

            A conquista dessa lei representa também um caminho, como eu dizia, sem volta para a inclusão. O grande exemplo é a política de ações afirmativas que são já adotadas nas universidades públicas e privadas.

            Lembro que exatamente hoje, dia 18 de outubro, o Estatuto está com a vida consagrada com o aniversário de um ano.

            As ações afirmativas têm sido fundamentais para a inclusão daqueles que são discriminados - repito, negros, indígenas, brancos pobre -, para que tenham acesso ao ensino superior.

            Atualmente, segundo a rede de cursinho pré-vestibular Educafro, existem 160 instituições de ensino superior que adotam algum sistema de inclusão.

            Segundo o estudo, entende-se por instituição de ensino superior as universidades, faculdades públicas estaduais e municipais e os centros federais e estaduais de educação. São cerca de 440 mil jovens que ingressaram nos programas. Se levarmos em consideração a política de quotas, adota pelo Prouni do Presidente Lula, vamos chegar a quase 900 mil jovens que tiveram acesso a partir desse processo de inclusão.

            Nos últimos 10 anos, os programas de ações afirmativas possibilitaram o ingresso de aproximadamente um milhão e trezentos mil jovens da classe trabalhadora, pobre, sejam brancos, indígenas e negros no mercado de trabalho.

            Na grande maioria, todos são os primeiros de suas famílias a ingressarem no ensino superior. Por isso digo, para alegria de todos nós, que a inclusão é um caminho sem volta.

            O Congresso Nacional precisa ouvir - como dizia Ulysses Guimarães - a voz rouca das ruas, a voz da sociedade, e aprovar o PLC 180/2008 da deputada Nice Lobão, do DEM, que institui 50% de reserva de vagas para estudantes da rede pública, sendo um percentual destinado, então, para negros, índios e brancos pobres.

            A Comissão de Direitos Humanos e Legislação Participativa realizou recentemente um debate lembrando os 10 anos do sistema de ações afirmativas no Brasil em 19 de setembro último.

            Um dos estudos apresentados foi o do Instituto de Estudos Sociais e Políticos - IESP-UERJ, primeira universidade a adotar as cotas em 2001, produzido pelo Dr. João Feres Júnior, intitulado "Ação afirmativa no Brasil: experiências e perspectivas".

            O Estudo apresenta a evolução da inclusão nas universidades públicas federais e estaduais. Das 98 universidades, 70 já adotam algum método de inclusão. Ou seja, 71,4% estão adotando as políticas afirmativas - e falo das políticas de cotas, sem sombra de dúvida um dado expressivo!

            A pesquisa diz mais:

            Em 2002, duas universidades estaduais adotaram o sistema de cotas e nenhuma Federal.

            Em 2003, passamos para sete universidades estaduais e uma universidade federal.

            Em 2004, 14 estaduais e três federais.

            Em 2005, dezesseis universidades estaduais e oito federais.

            Em 2006 tínhamos 20 universidades, 08 estaduais e 12 federais.

           No ano seguinte, 2007, 22 universidades estaduais e 17 federais.

           Em 2008, 27 universidades estaduais e 29 federais.

           Em 2009, 31 universidades estaduais e 36 federais.

           Em 2010, passamos para 32 universidades estaduais e 38 universidades federais adotando o sistema de ações afirmativas. Totalizando 70 universidades públicas.

           Quero aqui registrar também como estão subdivididas por região estas 70 universidades.

           Na Região Norte, das 12 universidades públicas, dentre federais e estaduais, cinco possuem ações afirmativas.

           Na Região Nordeste, 22 das 28 universidades públicas aderiram aos programas de inclusão.

           Já no Centro-Oeste, 7 das 8 instituições públicas disponibilizam o sistema de inclusão.

           Dados do Sudeste mostram que de um total de 26 universidades, 23 têm ações afirmativas.

           No Sul, das 24 universidades públicas, 13 adotam o sistema de inclusão,

           Srª Presidenta, esses dados mostram que a população conquistou aquilo que o projeto ainda não aprovou aqui no Congresso, ou seja, o nosso povo está bem acima da visão dos políticos aqui na Casa, porque não aprovaram ainda a política de quotas aqui no Senado - na Câmara já foi aprovado. E 77% das universidades adotaram, então, as ações afirmativas graças as Resoluções dos Conselhos Universitários, que avançam em todo o País.

           Os programas de inclusão nas universidades são formados basicamente por duas modalidades: cotas e bônus ou pontuação acrescida. E 84% das universidades adotaram, de maneira global, as cotas, 18,6% pela concessão de bônus/pontuação acrescida. Dentre estas duas modalidades, 33% também utilizam o aumento de vagas.

           É importante olharmos também para os beneficiários, que são exatamente os mais pobres beneficiados neste contexto.

           Srª Presidenta, ao terminar, quero ainda lembrar da importância da Lei do Ventre Livre, Lei Áurea e quero lembrar que, no meu entendimento, apesar das resistências havidas à época, a principal lei que o Brasil aprovou foi a do Estatuto da Igualdade Racial, que esta Casa aprovou, de nossa autoria e sancionada pelo Presidente Lula.

           Devido ao tempo, Srª Presidente, não dá, naturalmente, para falar de cada um dos artigos, mas é importante lembrar que no estatuto nós garantimos política de cotas que avançam na área pública; avançamos muito na saúde, avançamos na questão das ouvidorias; avançamos também nas terras das comunidades quilombolas; avançamos com certeza no campo da educação, quando nós mostramos que a verdadeira história do povo negro seja enfim contada também nas salas de aula mediante uma lei inserida junto ao estatuto.

           Por fim, só quero lembrar que recebi um convite nesta semana da Febraban, ou seja, a Federação Brasileira de Bancos, que quer mostrar o seu programa de inclusão. Quando vejo que os próprios banqueiros estão sensíveis à inclusão, quando noto que o Governador do Rio de Janeiro, Sergio Cabral, adotou o sistema de cotas, sei que o Senador Roberto Requião, quando governador, também adotou. Entendo que o Governo Federal, mais do que nunca, deveria regulamentar de forma definitiva o Estatuto da Igualdade Racial para que a gente possa mostrar ao mundo que aqui no Brasil, como disse Martin Luther King, enfim, o objetivo da inclusão foi assegurado.

           Srª Presidente, permita só que eu leia duas frases do Martin Luther King.

           A SRª PRESIDENTE (Marta Suplicy. Bloco/PT - SP) - Para encerrar, Senador.

           O SR. PAULO PAIM (Bloco/PT - RS) - Disse Martin Luther King numa oportunidade - e aí eu termino: “Já faz anos que eu ouço a palavra espere. Ela ressoa nos meus ouvidos e nos de cada negro com familiaridade aguda. Este espere quase sempre significou nunca. Temos que avançar. Esperamos por mais de 340 anos por nossos direitos.”

           Por fim, Srª Presidente, quero apenas dizer que lutaremos eternamente pela igualdade, pela justiça, pela liberdade, para que brancos, negros, índios, ciganos, tenham os mesmos direitos, deveres e oportunidades. Por isso digo que a minha história tem como inspiração Gandhi. Eu digo: sou Gandhi, sou Mandela, sou Brasil, sou Zumbi, sou Abdias, sou Luiz Inácio, sou Dilma Rousseff.

           Muito obrigado, Srª Presidenta desta sessão.

           Peço que considere na íntegra o meu pronunciamento.

 

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SEGUE, NA ÍNTEGRA, PRONUNCIAMENTO DO SR. SENADOR PAULO PAIM.

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            O SR. PAULO PAIM (Bloco/PT - RS. Sem apanhamento taquigráfico.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, há exatos 140 anos era proclamada a Lei do Ventre Livre que serviu também para dar uma resposta, embora fraca, aos anseios do movimento abolicionista.

            A Lei do Ventre Livre, sancionada pela Princesa Isabel em 28 de setembro de 1871, significou para filhos de mulheres escravas o início da ruptura da visão tradicionalista escravocrata e o começo de uma nova era de liberdade que, chegaria 17 anos depois, com a promulgação da Lei Áurea, em 1888.

            A lei áurea também sofreu inúmeras críticas, por não garantir a inclusão dos ex- escravos na sociedade brasileira, mas sem dúvidas, depois da vida, a liberdade é o principal direito fundamental.

            Determinava a Lei do Ventre Livre que, a partir de 28 de setembro de 1871, os senhores de escravos poderiam optar por ficar com o escravo até atingirem a maioridade de 21 anos ou então receberem uma indenização e entregarem as crianças para o Estado.

            Lamentavelmente, naquele momento da história tivemos as primeiras crianças de rua. Em contrapartida, foi aí que o movimento de liberdade apresentou-se como um caminho sem volta.

            Este caminho ainda é trilhado por aqueles que defendem os direitos humanos e que lutam contra qualquer tipo de discriminação.

            Durante 20 anos, nós debatemos no Congresso Nacional o Estatuto da Igualdade Racial, lei 12288/2010 que foi sancionado pelo presidente Lula no dia 20 julho de 2010.

            O texto do Estatuto, em sua totalidade, não foi aprovado como queríamos, mas sem dúvidas representa um marco jurídico, histórico, social e moral em defesa dos discriminados, sejam, homens, mulheres, idosos, crianças, brancos, negros, indígenas, ciganos, enfim de combate aos preconceitos e de promoção da igualdade.

            A conquista desta lei representa também um caminho sem volta para a inclusão. O grande exemplo é a política de ações afirmativas nas universidades públicas.

            As ações afirmativas têm sido fundamentais para a inclusão de negros, indígenas e brancos pobres ingressarem no ensino superior.

            Atualmente, segundo a rede de cursinhos pré-vestibulares Educafro, existem 160 instituições de ensino superior que adotam algum sistema de inclusão.

            Segundo o estudo, entende-se por instituição de ensino superior as universidades, faculdades públicas estaduais e municipais e os centros federais e estaduais de educação.

            São cerca de 440 mil jovens que ingressaram nos programas. Se levarmos em consideração os jovens do Prouni que atingem cerca de 900 mil.

            Nós últimos 10 anos, os programas de ações afirmativas possibilitaram o ingresso de aproximadamente um milhão e trezentos mil jovens da classe trabalhadora, pobre, indígena e negros. 

            Na grande maioria, todos são os primeiros de suas famílias a ingressarem no ensino superior... por isso que digo, a inclusão é um caminho sem voltas.

            O Congresso Nacional precisa ouvir as vozes da sociedade e aprovar o PLC 180/2008 da deputada Nice Lobão-DEM que institui 50% de reserva de vagas para estudantes da rede pública, sendo um percentual para negros e indígenas de acordo com cada Estado da Federação.

            Srªs e Srs. Senadores, a Comissão de Direitos Humanos e Legislação Participativa realizou um debate sobre os 10 anos do sistema de ações afirmativas no Brasil em 19 de setembro último.

            Um dos estudos, apresentados foi do Instituto de Estudos Sociais e Políticos - IESP-UERJ, primeira universidade a adotar as cotas em 2001, produzido pelo doutor João Feres Júnior, intitulado “Ação afirmativa no Brasil: experiências e perspectivas”.

            O Estudo apresenta a evolução da inclusão nas universidades públicas federais e estaduais. Das 98 universidades, 70 já possuem algum método de inclusão, ou seja, 71,4%. Um dado expressivo!

            A pesquisa descreve que:

            Em 2002, duas universidades estaduais adotaram o sistema de cotas e nenhuma Federal.

            Em 2003, passaram para 7 universidades estaduais e uma universidade federal.

            Em 2004, quatorze estaduais e três federais.

            Em 2005 a quantidade de universidades estaduais com sistema de ações afirmativas passou para 16 e de universidades federais para 8.

            Em 2006 tínhamos 20 universidades estaduais e 12 federais.

            No ano seguinte, 2007, 22 universidades estaduais e 17 federais.

            Em 2008, 27 universidades estaduais e 29 federais.

            Em 2009, 31 universidades estaduais e 36 federais.

            Em 2010, passamos para 32 universidades estaduais e 38 universidades federais adotando o sistema de ações afirmativas. Totalizando 70 universidades públicas.

            Quero aqui registrar também como estão subdivididas por região estas 70 universidades.

            Na região norte, das doze Universidades Públicas, dentre federais e estaduais, 5 possuem ações afirmativas.

            Na região Nordeste, vinte e duas das vinte e oito universidades públicas aderiram aos programas de inclusão.

            Já no Centro- Oeste, 7 de 8 instituições públicas disponibilizam o sistema de inclusão.

            Dados do Sudeste mostram que de um total de 26 universidades, 23 têm ações afirmativas.

            No Sul, das 24 universidades públicas, 13 adotam o sistema de inclusão. 

            Enquanto aqui no Congresso estamos debatendo a lei das cotas, a sociedade nos mais diversos estados assumiu a bandeira da inclusão nas universidades públicas, em sua grande maioria, graças a autonomia universitária.

            77% das universidades adotaram as ações afirmativas graças as Resoluções dos Conselhos Universitários, os outros 23% através de Leis Estaduais.

            Srªs e Srs. Senadores, os programas de inclusão nas universidades são formados basicamente por duas modalidades: cotas e bônus ou pontuação acrescida.

            84 por cento das universidades adotaram, de maneira global, as cotas.

            18,6 por cento pela concessão de bônus/pontuação acrescida.

            Dentre estas duas modalidades, 33 por cento também utilizam o aumento de vagas.

            É importante, olharmos também para os beneficiários, são vidas que estão sendo mudadas.

            Os critérios de ações afirmativas são muitas vezes cumulativos, ou seja, uma universidade pode adotar cotas para a rede pública e negros e outra pode adotar somente para negros e uma terceira pode adotar somente para a rede pública.

            Com isso, a pesquisa demonstra que os beneficiários estão divididos da seguinte maneira, entre essas 70 universidades:

- 61 universidades adotam ação afirmativa para alunos de escola pública

- 40 universidades adotam ação afirmativa para alunos Negro

- 36 universidades adotam ação afirmativa para alunos Indígenas

- 13 universidades adotam ação afirmativa para alunos Deficiente

- 6 universidades adotam ação afirmativa para alunos Licenciatura indígena

- 3 universidades adotam ação afirmativa para alunos Quilombola

- 3 universidades adotam ação afirmativa para alunos Nativo do estado

- 3 universidades adotam ação afirmativa o recorte sócio econômico

- 3 universidades adotam ação afirmativa para professor da rede pública

- 3 universidades adotam ação afirmativa para alunos do Interior do estado

- 2 universidades adotam ação afirmativa para alunos filhos de policiais, bombeiros etc mortos ou incapacitados em serviço

- 1 universidade adota ação afirmativa para alunas Mulheres

            Sr. Presidente, quero falar ainda sobre outra Lei muito importante. Eu diria que a mais importante depois da Lei do Ventre Livre e da Lei Áurea. É o Estatuto da Igualdade Racial.

            Hoje é um dia especial, pois estamos comemorando o primeiro ano de vida do Estatuto da Igualdade Racial.

            O texto do Estatuto da Igualdade Racial aprovado no Congresso Nacional foi sancionado pelo Presidente Lula, dia 20 de julho de 2010.

            A lei, de acordo com o artigo 65 entrou em vigor 90 dias após a sanção,ou seja, dia 18 de outubro do ano passado.

            O Estatuto da Igualdade Racial é um convite a reflexão, aponta caminhos, resguardam direitos, legitima as ações afirmativas.

             Embora, quando da sua aprovação eu subi nesta tribuna para afirmar que o texto não foi o ideal, mas o possível.

            Neste momento não vamos seguir o caminho das lamentações, mas sim dos pontos estruturantes e do conjunto de ações assegurados no texto.

            Os que defendem os Direitos Humanos e os Direitos Sociais sabem que a luta é diária, assim como fazemos há 23 anos para ter Direitos Constitucionais garantidos, assim como fazemos há 21 anos para ter o Estatuto da Criança e do Adolescente garantido, assim como estamos fazendo há 8 anos com o Estatuto do Idoso.

            O caminho não é fácil, mas a vitória dos pobres e dos discriminados é possível.

            A implementação do Estatuto da Igualdade Racial não está sendo diferente de outras leis que possuem um olhar para os excluídos.

            Mas neste um ano de vigência da lei eu nunca vi um texto ser tão mal tratado pela União, pelos Estados e pelos Municípios.

            O artigo primeiro da lei não deixa margem para dúvidas quando diz:

            Art. 1º Esta Lei institui o Estatuto da Igualdade Racial, destinado a garantir à população negra a efetivação da igualdade de oportunidades, a defesa dos direitos étnicos individuais, coletivos e difusos e o combate à discriminação e às demais formas de intolerância étnica.

            Nós defendemos os direitos das mulheres, dos indígenas, de brancos, negros, ciganos, judeus, palestinos, enfim, dos excluídos e discriminados.

            Mas o Estatuto está engatinhando, por isso um setor do movimento negro vem debatendo algumas teses, a primeira é de ajuizar ações e representações contra os gestores públicos para responsabilizá-los pelo crime de improbidade administrativa em decorrência de após um ano não existir uma linha seque sobre a regulamentação do Estatuto da Igualdade Racial.

            A segunda é de impetrar mandado de segurança por omissão contra a Presidenta Dilma e os 27 governadores de Estado.

            O grupo está sendo liderado pelo advogado Humberto Adami, do instituto de Advocacia Racial e Ambiental, com apoio entidades do movimento negro e da capoeira.

            Srªs e Srs. Senadores, eu sou daqueles que valoriza o dialogo para a construção de políticas públicas solidas e consistentes, mas respeito a postura do movimento social na busca dos seus objetivos.

            O Estatuto da Igualdade Racial aborda em seus 65 artigos os direitos fundamentais, o direito à saúde, o direito à educação, à cultura, ao esporte e ao lazer, à liberdade de consciência e de crença e ao livre exercício dos cultos religiosos, o acesso à terra e à moradia adequada, o trabalho, os meios de comunicação, o sistema nacional de promoção da igualdade racial,as ouvidorias permanentes e do acesso à justiça e à segurança, do financiamento das iniciativas de promoção da igualdade racial.

            Não irei discorrer sobre cada um dos artigos, mas apenas demonstrar como o poder público pode sim atuar de imediato ao ler o Estatuto.

            Mas os Ministérios e as Secretárias de Estado podem incluir em seus quadros, de forma transversal gestores que possuam um olhar para a diversidade, a igualdade e a justiça social e implementem as diretrizes do artigo 4º do texto que diz:

Art. 4º A participação da população negra, em condição de igualdade de oportunidade, na vida econômica, social, política e cultural do País será promovida, prioritariamente, por meio de:

I - inclusão nas políticas públicas de desenvolvimento econômico e social;

II - adoção de medidas, programas e políticas de ação afirmativa;

III - modificação das estruturas institucionais do Estado para o adequado enfrentamento e a superação das desigualdades étnicas decorrentes do preconceito e da discriminação étnica;

IV - promoção de ajustes normativos para aperfeiçoar o combate à discriminação étnica e às desigualdades étnicas em todas as suas manifestações individuais, institucionais e estruturais;

V - eliminação dos obstáculos históricos, socioculturais e institucionais que impedem a representação da diversidade étnica nas esferas pública e privada;

VI - estímulo, apoio e fortalecimento de iniciativas oriundas da sociedade civil direcionadas à promoção da igualdade de oportunidades e ao combate às desigualdades étnicas, inclusive mediante a implementação de incentivos e critérios de condicionamento e prioridade no acesso aos recursos públicos;

VII - implementação de programas de ação afirmativa destinados ao enfrentamento das desigualdades étnicas no tocante à educação, cultura, esporte e lazer, saúde, segurança, trabalho, moradia, meios de comunicação de massa, financiamentos públicos, acesso à terra, à Justiça, e outros.

Parágrafo único. Os programas de ação afirmativa constituir-se-ão em políticas públicas destinadas a reparar as distorções e desigualdades sociais e demais práticas discriminatórias adotadas, nas esferas pública e privada, durante o processo de formação social do País.

            O Ministério da Saúde e as Secretárias de Saúde do país podem solidificar o tratamento da anemia falciforme, implementando os incisos do artigo sétimo, dentre eles o que diz:

III - desenvolvimento de processos de informação, comunicação e educação para contribuir com a redução das vulnerabilidades da população negra.

            No âmbito da educação, o Programa do Ministério da Ciência e Tecnologia, intitulado “Brasil Sem Fronteiras” que destinará cerca de 75 mil bolsas de estudos pode seguir os princípios dos artigos 11 a 16 do texto e garantir a inclusão real de estudantes negros, ou seja, através de um percentual ou de bonificações.

            Garantir o ensino da capoeira nas instituições públicas e privadas pelos capoeiristas e mestres tradicionais, pública e formalmente reconhecidos conforme artigos 21 e 22.

            Em relação a moradia, a Caixa Econômica Federal e o Ministério das Cidades seguirem os princípios dos artigos de 35 a 37 e estabelecer um recorte étnico no Programa Minha Casa Minha Vida. Os negros viveram cerca de 350 anos em senzalas e muitos estão jogados nas favelas. Nós precisamos reconhecer que a história precisa mudar.

            O Ministério do Trabalho pode fazer valer o artigo 40 que diz:

            O Conselho Deliberativo do Fundo de Amparo ao Trabalhador (Codefat) formulará políticas, programas e projetos voltados para a inclusão da população negra no mercado de trabalho e orientará a destinação de recursos para seu financiamento.

            O Sebrae que possui programas para os descendentes de japoneses e mulheres pode fazer valer o artigo 41. As ações de emprego e renda, promovidas por meio de financiamento para constituição e ampliação de pequenas e médias empresas e de programas de geração de renda, contemplarão o estímulo à promoção de empresários negros.

            Vejam, eu recebi um convite da FEBRABAN para conhecer o seu programa de valorização da diversidade, da inclusão de negros, mulheres e pessoas com deficiência no setor bancário. Mas me digam, quando eu chegar lá, o que irei dizer das ações do meu governo? O que irei dizer das ações dos governadores que compõe a nossa base?

            Mas em um ponto, que a justiça seja feita, o Governador do Rio de Janeiro, Sergio Cabral adotou 20% de cotas no serviço público com base no Estatuto, assim como o ex Governador do Paraná e atual Senador Roberto Requião já havia feito, mesmo antes da aprovação do texto no Congresso Nacional.

            Srªs e Srs. Senadores, em relação a mídia, as cotas não foram aprovadas, mas está nítido que toda a publicidade elaborada pelo poder público, por suas autarquias, fundações e ou sociedades de economia mista podem sim adotar a participação de negros nas peças publicitárias de imediato. Este é um ponto que o Ministério Público pode investigar de imediato, conforme descrevem os artigos 43, 44, 45 e 46, vejamos:

Art. 43. A produção veiculada pelos órgãos de comunicação valorizará a herança cultural e a participação da população negra na história do País.

Art. 44. Na produção de filmes e programas destinados à veiculação pelas emissoras de televisão e em salas cinematográficas, deverá ser adotada a prática de conferir oportunidades de emprego para atores, figurantes e técnicos negros, sendo vedada toda e qualquer discriminação de natureza política, ideológica, étnica ou artística.

Parágrafo único. A exigência disposta no caput não se aplica aos filmes e programas que abordem especificidades de grupos étnicos determinados.

Art. 45. Aplica-se à produção de peças publicitárias destinadas à veiculação pelas emissoras de televisão e em salas cinematográficas o disposto no art. 44.

Art. 46. Os órgãos e entidades da administração pública federal direta, autárquica ou fundacional, as empresas públicas e as sociedades de economia mista federais deverão incluir cláusulas de participação de artistas negros nos contratos de realização de filmes, programas ou quaisquer outras peças de caráter publicitário.

            Temos ainda, a relação de direito dos quilombolas, a criação das ouvidorias, do financiamento das iniciativas de promoção da igualdade racial, bem como o Sistema Nacional de Promoção da Igualdade Racial.

            Em relação a regulamentação do Estatuto da Igualdade Racial e da aplicação dos seus artigos eu tenho escutado a palavra “ESPERE”, “ESPERE”, “ESPERE”. Isso me faz lembrar da “Carta de uma prisão em Birmingham”, escrita em 16 de abril de 1963, por Martin Luther King Jr, que em um trecho diz:

Já faz anos que ouço a palavra “Espere!”. Ela ressoa nos ouvidos de cada negro com uma familiaridade aguda. Esse “espere” quase sempre significou “nunca”. Temos de chegar à percepção, junto com um de nossos eminentes juristas, de que “a justiça adiada por muito tempo é justiça negada.

            Esperamos por mais de 340 anos por nossos direitos constitucionais e concedidos por Deus. As nações da Ásia e da África estão dirigindo-se com uma velocidade a jato rumo à conquista da independência política, mas nós ainda nos arrastamos a passo de cavalo e de charrete rumo à conquista de uma xícara de café em um aparador.

            Talvez seja fácil àqueles que nunca sentiram os dardos perfurantes da segregação dizer “espere”.

            Mas quando você viu bandos perversos lincharem suas mães e pais à vontade e afogar suas irmãs e irmão a seu capricho; quando você viu policiais cheios de ódio amaldiçoarem, chutarem e até matarem seus irmãos e irmãs negros; quando você vê a vasta maioria de seus vinte milhões de irmãos negros sufocando-se em uma jaula hermética da pobreza em meio a uma sociedade de abundância”

            Lutaremos eternamente pela igualdade, pela justiça e para que brancos e negros tenham os mesmos direitos e deveres.

            Por tudo isso, é que eu:

sou Gandhi,

... sou Mandela,

... sou Brasil;

... sou Zumbi;

... sou Abdias Nascimento;

... sou Luis Inácio Lula da Silva;

... e sou Dilma Rousseff!

            Era o que tinha a dizer.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 19/10/2011 - Página 42500