Discurso durante a 203ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Registro da aprovação, na Câmara dos Deputados, de projeto de lei, de autoria de S.Exa., que coíbe a lavagem de dinheiro.

Autor
Antonio Carlos Valadares (PSB - Partido Socialista Brasileiro/SE)
Nome completo: Antonio Carlos Valadares
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
LEGISLAÇÃO PENAL.:
  • Registro da aprovação, na Câmara dos Deputados, de projeto de lei, de autoria de S.Exa., que coíbe a lavagem de dinheiro.
Publicação
Publicação no DSF de 10/11/2011 - Página 46581
Assunto
Outros > LEGISLAÇÃO PENAL.
Indexação
  • REGISTRO, APROVAÇÃO, PROJETO DE LEI, AUTORIA, ORADOR, ASSUNTO, ALTERAÇÃO, LEGISLAÇÃO, COMBATE, LAVAGEM DE DINHEIRO, REFERENCIA, AMPLIAÇÃO, TIPICIDADE, CRIME, CONTRAVENÇÃO PENAL, NUMERO, PESSOAS, SUJEIÇÃO, CONTROLE, AUMENTO, PODER, JUIZ.

            O SR. ANTONIO CARLOS VALADARES (Bloco/PSB - SE. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador) - Srª Presidenta Marta Suplicy, Srªs e Srs. Senadores, sabemos que a lavagem de dinheiro é um dos estratagemas mais maléficos e eficazes no estímulo à expansão do crime organizado. Não é uma questão nacional. É uma pandemia, que aflige países desenvolvidos e emergentes.

            O Brasil, com muita lentidão, despertou para essa realidade, carecendo ainda de dotar sua legislação dos meios necessários a esse combate.

            Nesse sentido, no último dia 25 de outubro, a Câmara dos Deputados deu um grande passo para modernizar nossa legislação. Refiro-me à aprovação do Projeto de Lei n° 3.443, de 2008, que coíbe a lavagem de dinheiro, tornando-a mais rigorosa. Esse projeto teve início no Senado Federal; fui o autor e o relator foi o Senador Pedro Simon. 

            Depois de oito anos de tramitação, o projeto volta ao Senado para votação definitiva. Após cinco anos de tramitação, o projeto foi aprovado pelo Plenário do Senado, na forma do substitutivo formulado pelo Senador Pedro Simon.

            Então, foram cinco anos aqui no Senado Federal. Na Câmara, foram mais três anos e cinco meses para que o Plenário daquela Casa aprovasse o texto que passaremos a analisar rapidamente.

            Manifesto, desde logo, que, devido à importância da matéria e dado que o debate em torno dela já alcançou bom nível de maturidade, buscarei o apoio de todos os líderes para que seja analisado em regime de urgência.

            O projeto aprimora as regras e torna mais eficiente o sistema de combate à lavagem de dinheiro no País. Todos sabemos que a atividade criminosa lida com um paradoxo: quanto maior a soma de dinheiro que obtém, mais complexa a tarefa de lhe dá procedência. Lavar dinheiro tornou-se uma espécie de ciência, que mobiliza cérebros sofisticados a serviço do mal.

            Alguns crimes, como os de contrabando, seja o de armas, seja o de mercadorias, o tráfico de drogas, de armas ou de pessoas, as redes de prostituição, a corrupção e as fraudes, geram formidáveis quantias de dinheiro. Não é fácil ocultá-lo ou dar-lhe uma cara limpa, para que possa ser usado sem chamar a atenção das autoridades.

            A maneira de fazê-lo é distanciando-o de sua fonte - a atividade criminosa -, movimentando-o tantas vezes quanto possível, criando camadas de operações que tornem imensamente difícil recompor sua trajetória.

            Ao final, esses recursos acabam reinvestidos em uma atividade legal, de forma a que possa parecer inteiramente legítimo e não despertar atenção.

            E por isso que o Gafi (Grupo de Ação Financeira), que é o principal órgão no sistema internacional antilavagem de dinheiro, congregando 34 países-membros e diversas organizações internacionais, define a lavagem de dinheiro como o processo que tem por objetivo disfarçar a origem criminosa dos proveitos do crime.

            Podemos entender a lavagem de dinheiro como uma variante do crime de sonegação fiscal. Nessa, normalmente, há uma ocultação de receita legal, ao passo que, na lavagem de dinheiro, dá-se exatamente o oposto: ocultação de uma receita ilegal. De um modo ou de outro, a palavra-chave é ocultação.

            A lei brasileira define a lavagem de dinheiro como “ocultar ou dissimular a natureza, origem, localização, disposição, movimentação ou propriedade de bens, direitos ou valores provenientes, direta ou indiretamente” dos seguintes crimes, dos chamados crimes antecedentes: tráfico de entorpecentes, terrorismo, contrabando ou tráfico de armas, extorsão mediante sequestro, crime contra a Administração Pública, contra o sistema financeiro, crime praticado por organização criminosa e crime praticado por particular contra a administração pública estrangeira. Esses são os crimes antecedentes.

            Aqui está, então, a primeira inovação proposta pelo projeto: em vez de apenas oito crimes - ou grupo de crimes -, elencados na Lei n° 9.613, de 1998, a lavagem de dinheiro poderá se referir a bens, direitos ou valores provenientes de qualquer crime ou até mesmo de contravenção penal.

            Com isso, o projeto insere o Brasil entre os países da chamada terceira geração, terceira geração de leis no combate à lavagem de dinheiro, que consiste na eliminação do rol de crimes antecedentes.

            Hoje, quem tenta ocultar ou dissimular a origem de valores provenientes de sonegação fiscal, por exemplo, não comete crime de lavagem de dinheiro, pois não se encontra no rol de crimes antecedentes, apesar de também nós sabermos que a sonegação fiscal traz também um agravante, que é a concorrência desleal de alguém que não paga o imposto devidamente e vende a sua mercadoria, portanto, mais barata, prejudicando aqueles que prejudicando aqueles que agem de forma legal ou legítima perante o fisco.

            Outros exemplos de novos crimes abrangidos por essa lei são o tráfico de pessoas, o lenocínio, o estelionato e outras fraudes, além de contravenções penais, como o jogo do bicho, exploração do jogo de azar, realização de loterias ou de bingos não autorizados. Também o roubo de cargas - prática constante no Brasil - está abrangido pela nova lei.

            A segunda inovação consiste em ampliar o número de pessoas sujeitas aos mecanismos de controle, via identificação de clientes, manutenção de registros e comunicação de operações financeiras. O projeto, dependendo do ramo da atividade, inclui as pessoas físicas. Entre elas, as que, a exemplo das pessoas jurídicas, prestem serviços de assessoria, consultoria, contadoria, auditoria, aconselhamento ou assistência em diversas áreas, como compra e venda de imóveis, gestão de fundos, valores imobiliários ou outros ativos, criação e exploração ou gestão de sociedade de qualquer natureza; fundos fiduciários ou estruturas análogas, alienação ou aquisição de direitos sobre contratos relacionados a atividades esportivas ou artísticas profissionais. Além disso, estarão submetidos ao controle do fluxo financeiro as juntas comerciais, os registros públicos, pessoas físicas, jurídicas etc.

            A ampliação do controle para todas essas atividades se justifica não por desconfiança, mas por uma questão de segurança. Todas essas atividades são lícitas e fundamentais para o desenvolvimento econômico do País. Por isso mesmo é preciso ter certeza de que o sistema público de controle é capaz de identificar e coibir as tentativas de exercê-la de forma ilícita.

            A lavagem de dinheiro, entre outros danos, provoca distorções no bom funcionamento da economia; injeta dinheiro em negócios legítimos, mas ineficientes que não se sustentam por si próprios, ou em negócios eficientes, mas, nesse caso, permitindo a quem lava dinheiro oferecer produtos a preços inferiores aos de mercado; ou até mesmo inferiores ao custo de fabricação, prejudicando enormemente a concorrência.

            Há muitos outros danos, como o risco à integridade e à reputação do sistema financeiro, diminuição de recursos governamentais, arrecadação de impostos, além de repercussões socioeconômicas, como o incentivo à criminalidade, aumento da sensação de impunidade e a desconfiança sobre agentes públicos e privados.

            De acordo com o Ministério Público, Srª Presidenta, as formas de lavar dinheiro são múltiplas e extremamente variadas. Os métodos utilizados e as técnicas empregadas mudam de acordo com a eficiência das medidas de prevenção.

            Descoberto um esquema, os agentes da lavagem buscam outras brechas nas leis e na fiscalização para atingir seus objetivos. Além disso, novas possibilidades de circulação de bens e valores trazem, igualmente, outras alternativas à lavagem de dinheiro."

            Por isso, a lei está em constante processo de aprimoramento e atualização. Nós, parlamentares, devemos estar atentos a isso. Precisamos manter um olho no texto escrito da lei e outro na realidade social.

            O projeto também promove outras alterações na lei de combate à lavagem de dinheiro, mas que não caberá aprofundar neste momento. Apenas pontuo algumas mais importantes, como: a ampliação dos poderes do juiz, que, ainda durante a investigação ou a ação penal, poderá determinar o bloqueio de bens ou a alienação antecipada de bens, impedindo sua transferência, sua transformação em capital financeiro ou sua utilização como meio de pagamento; destinação para os Estados, de bens, direitos e de valores relacionados, direta ou indiretamente, à prática de crimes de competência das justiças estaduais. Hoje, todos os bens e direitos objetos do crime de lavagem são destinados à União, não importando se a competência para julgá-los é da Justiça Federal ou da Justiça Estadual. Também ampliação das possibilidades de cooperação internacional.

            Srª Presidente, as alterações que a Câmara dos Deputados promoveu no texto aprovado pelo Senado foram importantes na medida em que contribuíram para quebrar resistências ao projeto. O Senado, ao analisar essas considerações, estará em condições de dar rápida resposta à sociedade, votando o projeto em regime de urgência, oferecendo uma nova lei ampliada e forte para o combate à criminalidade. Sabe-se que a melhor forma de combater o crime organizado é por meio do estrangulamento financeiro. Não basta - embora seja também indispensável - prender bandidos, pois as organizações criminosas os substituem e continuam agindo. Porém, suprimindo-lhes os meios - o que essa lei proporciona -, atinge-se o coração da quadrilha. No combate ao crime, a inteligência é mais eficaz do que a pólvora.

            É essa a lei que precisamos aprovar com urgência, porque reforça a ação da inteligência contra o mal.

            Era o que tinha a dizer, Srª Presidente. Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 10/11/2011 - Página 46581