Discurso durante a 203ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Alerta para a grande quantidade de brasileiros que não possuem conta bancária e dos conseqüentes possíveis benefícios dos quais estes cidadãos ficam excluídos.

Autor
Walter Pinheiro (PT - Partido dos Trabalhadores/BA)
Nome completo: Walter de Freitas Pinheiro
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
BANCOS.:
  • Alerta para a grande quantidade de brasileiros que não possuem conta bancária e dos conseqüentes possíveis benefícios dos quais estes cidadãos ficam excluídos.
Publicação
Publicação no DSF de 10/11/2011 - Página 46605
Assunto
Outros > BANCOS.
Indexação
  • DEFESA, IMPLANTAÇÃO, POLITICA, ACESSO, TRABALHADOR RURAL, CONTA BANCARIA, UTILIZAÇÃO, TECNOLOGIA, TELEFONE CELULAR, OBJETIVO, DESENVOLVIMENTO REGIONAL, INCLUSÃO, POPULAÇÃO RURAL, SERVIÇOS PUBLICOS, CREDITO AGRICOLA.

            O SR. WALTER PINHEIRO (Bloco/PT - BA. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Srª Presidenta, Srªs e Srs. Senadores, primeiro, quero chamar a atenção, na tarde de hoje, de um estudo do Ipea que revela que 39,5% dos brasileiros não têm conta bancária.

            Esse é um debate que nós abrimos, inclusive, com o nome de “bancarização”. A relação disso não é pura e simples o atendimento pelo banco ou do serviço bancário, mas é o aspecto inclusive da inclusão. Portanto, essa medida que estamos discutindo, batizada de “bancarização”, busca exatamente incluir esses cidadãos - e aí estamos falando de 50 milhões de brasileiros, conforme diz o próprio Banco Central - no aspecto de que uma conta corrente passe a ter uma relação direta, principalmente com o que se processa através das relações dessas pessoas.

            Majoritariamente, meu caro Clésio, as pessoas que estão nessa situação são trabalhadores rurais que têm uma relação, inclusive, com o Banco do Nordeste, que têm uma relação com o Pronaf, que têm uma relação com os programas de financiamento em todas as esferas e que se relacionam com a atividade comercial, até porque, para executar os recursos oriundos do Pronaf, essa gente tem que se dirigir a uma casa comercial para comprar implementos agrícolas ou, no caso dos assentamentos, para comprar os seus materiais, seja o crédito habitacional, sejam as ferramentas, seja lá o que for; portanto, tem um tipo de relação. Na maioria das vezes, esse procedimento acontece com essas pessoas se deslocando quilômetros e quilômetros de distância das suas cidades para buscar um ponto onde haja um banco, para fazer o saque do benefício.

            E aí vou dar um exemplo aqui, Senadora Marta Suplicy: o período da seca possibilita para os agricultores o que nós chamamos de seguro safra. Então, é muito comum que o seguro safra venha para suprir uma renda que aquele agricultor perdeu em decorrência dos efeitos da seca. Ora, esse agricultor, para sacar esse dinheiro, tem que se deslocar para uma cidade onde haja agência do Banco do Nordeste. E mais, esse agricultor não possui nenhuma conta, então ele vai ao banco, saca essa ajuda - o seguro safra é na ordem de R$600,00 - e, na mesma cidade onde ele saca, Senador Clésio, faz compras. Portanto, o dinheiro, que era para ajudar uma economia local, para resolver uma questão de caráter pessoal, enfrentar um procedimento num período de longa estiagem, convivendo com essas questões da seca, o benefício termina cumprindo um único objetivo: permitir que o cidadão adquira alguns produtos para a sua alimentação. O restante da cadeia, o restante das partes envolvidas, isso fica fora desse contexto.

            Portanto, a ideia que nós estamos trabalhando não é nada que não seja praticada em alguns lugares do mundo. E aí vou falar aqui de lugares bem mais difíceis do ponto de vista dessa aplicação. Não estou falando aqui de nenhum país desenvolvido que utilize tecnologia ao extremo, estamos falando das Filipinas, do Quênia, onde a movimentação dessas contas já podem ser feitas pelo celular. No Quênia, por exemplo, mais de dois milhões de quenianos têm uma operação usando o celular. Se dirigir, acessar a sua conta bancária ou receber o seu benefício e usar o mesmo aparelho de celular para se relacionar com a rede comercial. Portanto, transformando o celular numa espécie de cartão de conta bancária, de talão de cheque desse novo tempo.

            É óbvio que, quando se fala nisso, as pessoas dizem que esta população brasileira não tem celular. Quem disse? Estamos exatamente num momento onde o grande debate é, inclusive, levar essa tecnologia de celular para as áreas mais remotas do Brasil. Está marcado para o próximo ano o leilão de 450 megahertz, buscando fazer essa ampliação.

            Portanto, a consolidação do celular, a própria ampliação da necessidade do serviço... falei aqui da agricultura familiar, mas isso se aplica ao Bolsa Família, se aplica ao Brasil Sem Miséria, se aplica a diversas outras formas de relação da economia solidária, do crédito patrocinado por diversas agências de fomento estadual, e se aplica à micro e pequena empresa em nosso País. Há o empreendedorismo individual, isso vai ao encontro do Programa Empreendedor Individual no Brasil, que já tem mais de 1,2 milhão de brasileiros cadastrados, que saíram da margem em que se encontravam, ou seja, à margem completamente do processo, e, hoje, fazem parte dessa economia.

            O objetivo disso é exatamente estabelecer essa relação, e aí tenho tentado de maneira cada vez mais, eu diria, com pressão discutir isso com o Banco do Nordeste, com o MDS, com o MDA, com o Governo de um modo geral, para facilitarmos a vida desse agricultor, para facilitar a vida desse cidadão, para envolver e para gestar políticas na economia.

            Vou dar outro exemplo bem claro, para encerrar, Srª Presidenta, da importância deste Programa. Vou pegar o exemplo do Município de Andaraí, na Bahia, que fica na Chapada Diamantina. Portanto, num lugar que todo mundo ouve falar por suas proezas e belezas. Mas nesse lugar, em Andaraí, tivemos de aplicar a política do Seguro Safra exatamente pela longa estiagem. Lá, meu caro Jarbas, aproximadamente uns mil agricultores tiveram de receber o Seguro Safra. Queriam fechar a agência do Banco do Nordeste nessa cidade. Se isso fosse feito, esses mil agricultores que receberam ajuda teriam de se deslocar para a cidade de Itaberaba. Portanto, iam consumir, iam interferir na economia de outra cidade e não na própria cidade.

            Por isso, estamos cobrando do Governo o estabelecimento dessa política de “bancarização”. O Banco do Brasil está fazendo isso, ele já avançou nessa linha. Por que a gente só pode ter a “bancarização” no esquema para uma determinada faixa da sociedade? O Internet Banking, ou o Móbile Banking, que é o banco pelo celular, só pode ser acessado por uma determinada camada da sociedade. Os bancos só se interessam pelos clientes que tenham uma movimentação de conta relativamente alta.

            Portanto, é importante que essa política seja adotada como ferramenta para o desenvolvimento social, para impulsionar a economia local, para a geração de postos de trabalho e, efetivamente, para atender o cidadão. Falo isso até lastreado num dado importante da Bahia.

            Na Bahia, até o mês de setembro, geramos mais de 80 mil novos postos de trabalho. Historicamente, esses postos de trabalho eram gerados na região metropolitana, na cidade de Salvador ou nas cidades da região metropolitana. Nos dados de 2011, comparados com os de 2010, vamos encontrar um crescimento de 5% na geração de novos postos de trabalho e, mais ainda, desses postos de trabalho gerados, os 80 mil gerados em nove meses, 47 mil novos postos de trabalho foram gerados no interior, fora da região metropolitana da capital, num percentual de 58,9%. Portanto, quase 59% de postos de trabalho gerados no interior. De onde vem isso? Vem dessa economia a que me referi aqui, vem da economia solidária, isso vem da economia da agricultura familiar, isso vem do investimento feito pelo Bolsa Família, isso vem de uma economia que sustenta, ainda, milhares e milhares de brasileiros, do artesanato e da cultura.

            Portanto, é fundamental que essa política seja adotada, para permitir que cada vez mais a gente impulsione o desenvolvimento local e vá ao encontro de um desejo que nós tanto temos discutido aqui, Senadora Marta, que é o de criar as condições para que a economia local possa se desenvolver e aí, efetivamente, a gente tenha uma capacidade maior de investimentos e, consequentemente, de serviços públicos prestados à população.

            Por isso, quero solicitar a V. Exª que acate, na íntegra, este meu pronunciamento, que aqui apresento, e que até, de certa maneira, também se some a essa iniciativa, para que a gente possa “bancarizar” principalmente os mais pobres deste País, levando crédito para eles.

            Muito obrigado, Senadora.

 

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SEGUE, NA ÍNTEGRA, DISCURSO DO SENADOR WALTER PINHEIRO.

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            O SR. WALTER PINHEIRO (Bloco/PT - BA. Sem apanhamento taquigráfico.) - Srªs e Srs. Senadores, estudo recente do IPEA revelou que 39,5% de brasileiros não têm conta bancária, estando no Nordeste o maior número de excluídos, com 52,5% das pessoas à margem do sistema financeiro.

            Essa lamentável situação, à medida que a inclusão bancária é fundamental ao exercício da cidadania, atinge cerca de 50 milhões de brasileiros, conforme informações do próprio Banco Central.

            Uma conta corrente abre um mundo novo ao cidadão para poupar, acessar linhas de crédito, movimentar seu dinheiro e participar das vantagens oferecidas pelo sistema financeiro.

            A reversão dessa situação poderia começar com a abertura de contas simplificadas, sem as exigências feitas aos correntistas convencionais, cujos custos espantariam o consumidor de baixa renda do sistema financeiro.

            Como já ocorre com grande sucesso em outros países, como as Filipinas e o Quênia, a movimentação dessas contas poderá ser feita por meio do telefone celular.

            A tecnologia do cartão SIM, utilizado para identificar, controlar e armazenar dados de telefones celulares e da plataforma SMS (os torpedos), permite a comunicação direta e instantânea, inclusive para serviços financeiros.

            Mas a consolidação do celular como meio de pagamento e outras operações bancárias requer uma escala muito grande.

            Aqui entra novamente a vantagem do celular, pois nenhum outro serviço no Brasil tem a capilaridade social da telefonia móvel, que cresce também nas áreas rurais.

            Por entender que a sedimentação desse processo merece a cobertura de um diploma legal, de uma lei regulamentando a bancarização via telefonia móvel, apresentei projeto de lei nesse sentido que já tramita sob o nº PLS 635 de 2011.

            Com decisão terminativa da Comissão de Assuntos Econômicos, transformado em lei, o projeto se constituirá em forte estímulo para inclusão financeira e digital, além de ajudar a movimentar a economia local em regiões afastadas.

            Mas o que me traz hoje a esta Tribuna é o fato de que a inclusão bancária que proponho parece estar ocorrendo de forma enviesada

            Como um arranjo mal feito, as instituições bancárias de todo o Brasil vem implantando um sistema alternativo para o consumidor que deseja realizar compras em lojas e saques em caixas eletrônicos, o cartão pré-pago.

            O objetivo de bancos e administradoras é atingir principalmente os consumidores que não têm conta bancária, ou os 50 milhões de brasileiros estimados pelo Banco Central.

            Esse cartão funciona como um cartão de débito, e alguns deles permitem, até mesmo, a realização de compras pela internet.

            Para consegui-lo, paga-se uma tarifa pela emissão do cartão e pela primeira carga. Para as recargas e os saques feitos posteriormente, na maioria dos casos, também é cobrada tarifa.

            O valor da emissão do pré-pago varia de R$ 10 a R$ 15. A taxa de manutenção geralmente não é cobrada, mas pode chegar a R$ 3.

            O limite de carga mensal vai de R$ 2 mil a R$ 6 mil, a tarifa de recarga, de R$ 0,90 a R$ 5, e a tarifa de saque, quando não isenta, varia de R$ 3,5 a R$ 7.

            Como se vê, o cartão pré-pago, a despeito de ajudar seu portador a controlar seus gastos, como alardeia a propaganda em torno do produto, têm custos muito elevados para o pouco que oferece.

            Quem vai confiar o seu dinheiro a uma instituição financeira, para sacá-lo em ritmo de conta-gotas no pagamento de suas pequenas despesas, devia, em vez de pagar, ser remunerado por isso.

            Além das tarifas que cobram ao usuário do cartão pré-pago, os bancos aumentarão de forma extraordinária seu volume de depósitos. Sem nenhuma contrapartida.

            Terão à sua disposição a poupança de cinqüenta milhões de brasileiros para usarem da forma que bem entenderem, e sem nada oferecerem a quem depositou o dinheiro.

            Diante dessa situação, encomendei a minha assessoria um projeto de lei estabelecendo remuneração dos depósitos em cartão pré-pago igual à da caderneta de poupança: juros de 0,5% ao mês, mais a inflação do ano.

            Essa remuneração fará com que os bancos dividam com os usuários dos cartões pré-pagos, ainda que em proporção infinitamente menor, os lucros que podem obter com as aplicações dos recursos que lhe são confiados.

            A remuneração do depósito servirá como estímulo ao uso do cartão, ao controle das despesas do usuário e, sobretudo despertará o seu espírito de poupança.

            Entendemos a necessidade de modernização dos instrumentos de pagamento em nosso país, e sem dúvida o cartão de débito é um avanço.

            Mas também devemos estar alertas diante do volume desses cartões pré-pagos e certos da necessidade do estabelecimento de regras para a sua emissão em defesa da economia popular.

            Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 10/11/2011 - Página 46605